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História Angel After Death - Ações e reações


Escrita por: pedropaes86

Capítulo 10 - Ações e reações


No colégio Monte Olimpo, a notícia já havia se espalhado como água. O diretor determinara que breves palavras de condolências seriam formalmente proferidas junto com algumas informações sobre o funeral, como um ato de solenidade e só. As atividades que realmente importavam teriam prosseguimento, é claro. Fora sempre assim e continuaria sendo. Não era como se a escola quisesse ser lembrada por ainda manter algum vínculo com a garota expulsa recém falecida.

Na entrada, o movimento de alunos era incessante e o dia parecia como qualquer outro, fora o frio que castigava naquela manhã, tornando os agasalhos acessórios indispensáveis. Alguns grupos entravam despreocupadamente, outros corriam para não perderem suas atividades que haviam deixado para última hora. O porteiro Timmy, ou guardião, como Angeline gostava de chama-lo, fazia o seu trabalho diário de recepcionar os alunos como sempre, mas de uma forma mecânica, sem os brilhos nos olhos e o entusiasmo que sempre o acompanhava, mesmo nos dias mais rigorosos. Dessa vez o seu semblante era murcho e abatido, não parecia o mesmo que costumava sorrir abertamente com pequenas coisas. Se ainda existia alguma possibilidade de sorrir, ela seria anulada assim que aqueles comentários entrassem em seus ouvidos. Sua audição já não estava no auge, mas ainda funcionava muito bem.

-Hoje é um dia incrível, não é? – Leviatã King disse enfático a um colega. – finalmente a escória teve o que mereceu.

Era uma afronta. O tom escarnecedor daquela voz fez Timmy reagir institivamente. O garoto nunca esqueceria aquela expressão de fúria nos olhos no momento em que foi surpreendido. O guardião provavelmente o puxou com a mesma intensidade de força que teria puxado um homem adulto que houvesse insultado a sua honra ou algo semelhante.

-Acho que nós dois bem sabemos quem é escória aqui, seu moleque!

-Me solta, você está louco?

Sua raiva era intensa o suficiente para sobrepujar o próprio auto controle. Por um momento deixou de se importar com as consequências que aquilo poderia trazer. Por um feliz resquício de lucidez, ainda se freou o suficiente para não esbofeteá-lo até fazer o garoto cuspir cada palavra de todas as ofensas que deixara escapar, sem um pingo de remorso. Leviatã se virou assustado, impotente e sem força física para se livrar de seu inesperado algoz. Matt, o colega que sempre o acompanhava saiu de fininho, correndo para o interior da escola.

-Escute bem, seu pequeno verme. Você não vai entrar nesta escola hoje. Aproveite e vá dar um passeio pra refletir sobre uma coisa chamada empatia.

-O que? Você não pode fazer isso.

-Ah, eu posso. Eu sou o guardião e eu determino quem entra e quem sai. E hoje você não entra.

-Você só pode estar brincando! Eu vou falar com o diretor! Quero ver o que ele acha disso!

Foi neste momento que o homem o segurou pela gola com mais firmeza. Os olhos de Leviatã se arregalaram ainda mais, como se já estivesse prestes a implorar por socorro.

-Parece que eu estou de brincadeira, garoto? Se eu tiver que olhar pra essa sua cara nojenta ainda nos próximos dez segundos, eu vou dar um jeito nela, entendeu?

O garoto dessa vez não ousou mais desafiá-lo. Tremia de medo enquanto se viu obrigado a concordar que teria que se retirar. Não havia professores por perto e os outros alunos continuavam a entrar. Alguns olhavam, mas nada além disso. Não eram exatamente amigos de Leviatã ou apenas não queriam se intrometer. Como um legítimo covarde que era, o garoto esperou depois de recuar alguns metros para trás, para ainda vociferar com avidez.

-Você vai se arrepender disso! Terei um prazer enorme em te ver despedido e morando na rua, seu porteiro de quinta!

O porteiro, na menção de que iria atrás, o fez correr em disparada. Mas parou, como se quisesse dar apenas um último susto. Não se orgulhara do que fez e sabia que tinha se deixado levar pela impulsividade, mas não podia deixar de dar uma lição naquele que insultou gravemente quem não estava mais ali para se defender. Alguém com quem ele realmente se importava.

Depois encostou a mão na grande tranca de ferro e ficou parado um instante. Os ombros se curvaram até a orelha, esperando que, a qualquer momento, a mão de algum superior de natureza ruim o pegasse pelo ombro e o abordasse de forma repreensiva. Mas a rigidez que esperava não estava lá e o que viu quando levantou a cabeça foram estreitos e brilhantes olhos pretos que o contemplavam. Timmy não perguntou nada; já sabia. Ele próprio estava lutando contra aquela sensação. Era como se alguma mágica essencial a eles tivesse se esgotado.

-Você não precisava ter vindo hoje.

-Eu nunca devia tê-la deixado ir sozinha.

A princípio, Yukie achou que estava acontecendo dentro de sua cabeça. Murmurava em sua mente em um tom quase débil demais para ser ouvido.  Parecia perdida demais para saber o que estava fazendo ali. Cobriu o rosto com as mãos e deixou escapar uma amarga série de soluços.

Timmy, meio sem jeito, a envolveu com um dos braços e usou a outra mão para lhe tirar as mãos do rosto. A princípio, Yukie não queria deixa-lo fazer isso, mas ele foi persistente e as mãos delas desceram, revelando pequenos olhos que nadavam em lágrimas. O guardião trouxe o seu rosto para o ombro dele.

-Ouça, você não deve se culpar. Eu sou o responsável por quem entra e quem sai. Eu que não devia ter deixado ela sair naquelas condições.

Yukie ainda soluçava, o rosto da garota continuava afundado no ombro de Timmy. O sentimento de culpa do guardião também era real, mas sabia que era perda de tempo alimentá-lo e mais do que convencer uma menina de que aquilo não valia a pena, também precisava convencer a si mesmo. Falar é fácil, escolher as palavras certas, nem tanto. Não era de seu feitio consolar alguém, mas ele à sua maneira descomposta, deixou que as palavras saíssem com espontaneidade, dignas de um discurso fúnebre.

-Mas sabemos como ela era. Tão jovem, mas tão cheia de confiança e personalidade. Uma injustiça nunca passava batida aos seus olhos. Sempre a viam como uma rebelde sem causa que gostava de arrumar brigas e que não ligava pra ninguém. Mas sabe, acho que era exatamente o contrário. Suas palavras as vezes eram rudes, mas ela nunca humilhava ninguém. E sempre fazia de tudo pra proteger os outros em primeiro lugar. Não importa se eles não enxergavam. Nós a conhecíamos. Era alguém realmente boa a quem aconteceu uma coisa ruim. Fazer o que eu fiz agora foi uma forma de honrá-la. Se alguém tripudiasse de pessoas queridas ela nunca deixaria pra lá.

O vento gélido e uivante anunciava que aquele clima ainda permaneceria por um bom tempo. Alguns alunos ao redor encaravam a cena, curiosos. Outros apenas observavam rapidamente, mas seguiam o seu caminho. Um deles em especial voltaria até lá acompanhado. Enquanto isso Yukie, embora em prantos e mentalmente abalada, se identificava com cada palavra amável direcionada à sua amiga. Os olhos da garota agora encaravam os próprios pés, enquanto lentamente se soltava dos braços de Timmy. A voz quase falhando não a impediu de perguntar.

-Como você a conhecia tão bem, se só a via entrar e sair da escola?

Ele apenas sorriu, enigmaticamente.

-Como será?

Yukie não insistiria na pergunta, pouco importava naquele momento. A sensibilidade das palavras do guardião a confortaram um pouco, mas ainda não conseguia se conformar.

-Não é justo, Timmy...não é. Eu sinceramente preferia ter morrido no lugar dela.

-Vamos, não diga isso. - O guardião a entregou um lenço que guardava em seu bolso. – E pense no quanto ela iria ficar arrasada se fosse o contrário.

-Mas...

-Ouça, estamos tristes e tudo isso dói, mas lute. Lute e não se deixe enganar por esses pensamentos tolos.

Yukie não era de faltar as aulas e podia se permitir fazer aquilo, especialmente naquele dia. Mas ao mesmo tempo a ideia de permitir que ela voltasse andando sozinha para casa naquelas condições psicológicas também preocupava o guardião. E antes que ele a convencesse de ligar para os seus pais, Matt, o melhor amigo de Leviatã King retornou, mas desta vez sua companhia era outra. Quando ouviu o seu nome, Timmy se virou de imediato. No fundo já sabia o que o esperava, embora tivesse se distraído do incidente anterior, ao dedicar as suas últimas atenções a Yukie. Mas manteve-se erguido, sem demonstrar medo e com a voz mais serena que podia demonstrar.

-Olá diretor. Em que posso ajudá-lo?

Direto ao ponto e com uma expressão severa, o diretor, que era de poucas palavras, foi bem claro e sucinto.

-Junte suas coisas, Timmy. Não posso manter aqui um porteiro que agride os alunos desta instituição.

A vida é assim, tudo o que temos, vivemos, sentimos pode mudar em um piscar de olhos, o que nos leva muitas vezes a questionar até a própria existência. Uma perda leva a outra, assim como uma injustiça leva a uma série de outras injustiças. Embora as palavras do guardião para Yukie antes de se despedir ainda trouxessem uma mensagem positiva no final das contas, mesmo com o peso das circunstâncias, o sentimento de desesperança era plenamente compreensível. O colégio Monte Olimpo passava por um período sombrio, de uma dimensão que poucos poderiam imaginar ou sentir.



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