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História Anne with an e- continuação da série - Tempestade


Escrita por: roalves

Notas do Autor


Queridos leitores, escrever este capítulo foi intenso e nem um pouco fácil. Espero que ao lê-lo possam sentir os sentimentos dos personagens, e que que aprendam com a mensagem que tentei passar aqui. Valorizem cada momento de suas vidas, cada instante de amor, cada carinho compartilhado, porque nunca sabemos quando será o último, (eu ouvi isso de uma amiga querida) , e é o que Anne está aprendendo com seu sofrimento e dor. Espero sinceramente que apreciem o que escrevi com o coração, e que me deixem seus comentários, Muito obrigada, até o próximo capítulo.
Beijos no coração, Rosana.

Capítulo 58 - Tempestade


Fanfic / Fanfiction Anne with an e- continuação da série - Tempestade

ANNE

 

“Você perdeu o bebê “, a voz de Mary parecia repetir a mesma frase vezes sem conta dentro de sua cabeça, e Anne não queria que fosse verdade, ela fechou os olhos com força, desejando que aquilo tudo fosse um sonho ruim, e que ela acordaria e estaria em seu quarto em Green Gables ouvindo Marilla ralhar com Matthew por ter deixado suas botas na porta de entrada.

Mas, ao abrir os olhos novamente, Anne viu Mary com seu olhar de compaixão, segurando em suas mãos tão pálidas quanto seu rosto, enquanto seu olhar se perdia no branco da parede do hospital. Um bebê? Como era possível? Ela é Gilbert tinham se cuidado tanto. Quando acontecera? Então, ela pensou em Paris, e nos dias de amor intenso que desfrutaram juntos. Talvez em uma das noites em que fizeram amor tinham se deixado levar e assim acontecera. Mas, por que aquele fato deveria importar já que não existia mais bebê algum? Ela perdera o seu bebê e de Gilbert, e isso era um fato terrível.

Anne baixou o olhar para sua barriga, e colocou suas mãos sobre ela, pensando que a poucas horas havia uma sementinha ali dentro, fruto do seu amor por Gilbert, que cresceria e seria a extensão de tudo o que representavam um para o outro, mas ela a deixara morrer, ela não cuidara dela o suficiente e agora ela não estava mais ali, e Anne se sentiu estranhamente vazia. Ela ouviu seu coração se partindo como se fosse feito do mais delicado cristal, e o som que chegou aos seus ouvidos eram os seus gritos de desespero.

Mary tentou acalmá-la, abraçando-a como Marilla faria, mas não conseguia fazê-la parar de chorar.  Era tanta dor naquele rosto pálido, que Mary se comoveu. Era horrível perder um filho, ela podia muito bem entender o sofrimento de Anne, ela era tão jovem para passar por aquilo, ainda mais Gilbert não estando ali para consolá-la. Ela não podia fazer muita coisa para ajudá-la a não ser dar-lhe o  conforto das palavras que não pareciam ser suficientes, porém era só o que tinha a oferecer.

Aos poucos, Anne foi se acalmando, até que parou de soluçar, e apenas lágrimas silenciosas escorriam por seu rosto. Mary ficou em silêncio, aguardando que aquele momento também passasse e que Anne pudesse dizer o que estava sentindo.

Era tão triste ver um amor tão lindo sendo abalado por aquele acontecimento infeliz. Gilbert teria amado saber do bebê, pois do jeito que ele adorava crianças, ficaria todo bobo com a notícia. Não ia ser fácil para Anne contar a ele, não queria estar na pele dela, mas do jeito que se amavam um consolaria o outro e no final ficariam bem.

Mary observou Anne fitar o vazio. Ela não falava nada, e estava começando a ficar preocupada.  Talvez devesse chamar a enfermeira para dar a ela algum sedativo, quem sabe se dormisse um pouco ela, se sentisse melhor.

- Anne, querida.  Fala alguma coisa. Não fique calada dessa maneira. Me diga o que está sentindo.- Mary disse tentando fazer com que a menina desabafasse e colocasse para fora toda a sua dor, mas Anne continuou calada, sua tristeza era nítida em seu rosto, e Mary desejou fazer alguma coisa para apagar aquela dor terrível, mas não sabia como. – Quer que eu chame Marilla? – Ao ouvir Mary falar da boa senhora, Anne olhou para ela com os olhos torturados e disse com a voz rouca:

- Por favor, Mary. Não conta para a Marilla o que aconteceu.  Ela não vai entender, e não quero nem que ela e nem Matthew sofram por mim.

- Mas, talvez ela pudesse te ajudar com a experiência dela.  – Mary disse afastando os cabelos emaranhados de Anne.

- Ninguém pode me ajudar, Mary. Não há consolo para o que sinto, não existem palavras para essa Minha dor.  Meu coração foi arrancado, e o que sobrou foi uma cratera enorme.- os olhos dela se perderam no vazio de novo, enquanto ela mantinha uma postura rígida de cortar o coração.

- Anne, eu imagino o quanto isso seja duro para você, mas você sabe que terá que contar isso ao Gilbert. Não pode esconder dele algo sério assim.- Mary tornou a falar.

- Eu sei disso, mas não sei como vou fazê lo.- ela suspirou colocando a cabeça entre as mãos, ficando nessa posição por algum minutos, depois levantou a cabeça de novo, olhando para Mary com os olhos marejados e disse:

- O que vou dizer a ele, Mary? Que deixei nosso bebê morrer? Que ele salvou a minha vida, e eu não consegui salvar a vida do nosso filho? Quanto tempo você acha que ele vai demorar para começar a me odiar?

- Querida, o Gilbert nunca vai te odiar. Ele te ama tanto. Vocês vão superar isso tudo. Você não deve se culpar assim.- Mary disse colocando sua mão sobre a de Anne.

 - Eu devia saber, Mary. Eu tinha um bebezinho aqui.- ela colocou as mãos sobre o ventre novamente.- Era meu filho e de Gilbert, era o nosso amor se transformando em vida. Você sabe o quanto eu amaria essa criança? O quanto ela seria uma benção em minha vida? E eu a perdi, Mary. Eu a deixei ir sem que ela soubesse o quanto seria amada, e que ela teria o melhor pai do mundo, o rapaz mais gentil e carinhoso que tive a sorte de conhecer nessa vida.  O que vou fazer agora com minhas mãos vazias? - Mary engoliu o bolo que se formava em sua garganta. Não podia deixar Anne ver o quanto sofria por vê-la naquele estado. Ela entre todas as mulheres do mundo não merecia passar por isso tão jovem. Era triste demais ver aqueles olhos azuis dilacerados pela dor, e Mary não tinha palavras suficientes para consolá-la naquele instante atribulado. Mas, mesmo assim fez um esforço para que suas palavras chegassem até o coração da menina e lhe devolvessem um pouco da serenidade perdida.

- Anne, eu sei que é terrível o que está sentindo, e que vai precisar de um tempo para se livrar desse sentimento de culpa, mas vai passar, e você vai voltar a sorrir de novo, e quando isso acontecer vai ver toda essa situação por outros olhos, e entendera que não foi sua responsabilidade.  Foi apenas uma fatalidade que infelizmente acontece com muitas mulheres. Você e Gilbert são jovens, ainda vão ter outros filhos.- Anne apenas escutava, mas sua mente divagava em outros pensamentos. Mary não entendia que ela queria aquele filho que perdera, pois ele era sua conexão com Gilbert, ele era a cura para sua alma tão atormentada por um passado do qual não tinha ideia de onde ela vinha. Ele era o seu amor por Gilbert tão profundo e imenso, e fora um presente que ganhara do universo, do qual não fora merecedora porque o deixara morrer.

- Querida, por que não descansa um pouco? Eu fico com você até adormecer.

Dormir, Anne pensou. Será que conseguiria? Sentia seu corpo pesado, mas seu cérebro se recusava a parar de pensar. Seria bom fechar os olhos e mergulhar na abençoada inconsciência, e encontrar a paz que de olhos abertos não estava conseguindo.

Ela assentiu, e se deitou na cama, enquanto Mary a cobria e acariciava os seus cabelos cantando uma canção de ninar como se ela fosse uma garotinha, e sem que esperasse acabou adormecendo.

Quando abriu os olhos novamente, já tinha escurecido e Mary não estava no quarto. De repente, a realidade das últimas horas a atingiu, e Anne sentiu seu coração doer de novo. Ficou imaginando como seria seu bebê se ele tivesse vivido. Será que teria cabelos ruivos como o dela ou escuros como o de Gilbert? Seria menino ou menina? Ela teria amado ter um bebezinho com os olhos de Gilbert, aquele sorriso maroto que aquecia sua alma mesmo nos dias mais frios de inverno. Ela teria amado lhe contar histórias, cantar as canções que aprendera quando ainda estava no orfanato, vê-lo dar os primeiros passinhos, e ouvi-lo chamá-la de mamãe, e ela teria amado ver o olhar de orgulho e amor estampado no rosto de Gilbert, dividindo com ela tantos momentos incríveis, vendo pelos olhos dele a consagração plena do sentimento que tinham um pelo outro.

Deus! Como aquilo doía.  Ela não conseguia respirar. Queria os braços de Gilbert ao seu redor sussurrando em seu ouvido que a amava acima de tudo, que tudo ficaria bem, que ele estaria ao seu lado e que jamais a abandonaria

Porém, ele não estava ali. Estavam separados por um quarto de hospital, e Anne nem tinha certeza se queria vê-lo agora. O que diria? Como contaria o seu fracasso? Estava envergonhada demais para dizer a Gilbert tudo o que acontecera.

Mas, Anne também sabia que não poderia fugir por muito tempo. Ela teria que buscar a coragem que não tinha em algum lugar dentro si, temendo a reação de Gilbert quando soubesse que o filho deles morrera e Anne fora a culpada.

- Anne? - Ela se virou e viu Matthew entrar no quarto. Ela quase tinha se esquecido que ele estava ali no hospital. Quando ele viu o rosto dela banhado em lágrimas se aproximou dizendo:

- Minha pobre criança.- Anne desabou de vez ao sentir as mãos de Matthew em seu ombro. Ela o abraçou pela cintura, e sentiu o bom senhor tocar seus cabelos com carinho enquanto dizia:

- Querida, chore, coloque para fora sua dor. Eu não consigo nem imaginar como é perder algo que se ama tanto. Mas, saiba que estou aqui por você.   – Anne ouviu chocada com as palavras de Matthew, olhou para ele com os olhos assustados e perguntou:

- Você sabe?

- O médico me contou, Anne.  – Ele respondeu continuando a afagar os cabelos dela.

- E você não está zangado comigo? - ela perguntou por entre as lágrimas.

- E por que eu estaria? Por que me zangaria por ver que minha garotinha cresceu, e que foi capaz de encontrar um amor tão grande que dele se gerou um ser iluminado?

- Mas, você sabe que as pessoas comentariam. Ainda mais por eu ser órfã. – Anne disse enxugando as lágrimas com as mãos.

- Anne, as pessoas falam de qualquer jeito. Você sabe melhor do que eu. E tenho certeza de que Gilbert se casaria com você no instante em que soubesse que teriam um filho. E eu ia adorar ter um netinho. – Matthew disse sorrindo tristemente.

- A Marilla também sabe?

- Não, vou deixar que você decida se quer que ela saiba ou não.  Mas, acho que ela iria pensar como eu.- ele enxugou com o dedo uma lágrima que ficara presa nos cílios dela.

- Me desculpe, Matthew por tudo isso.  Eu nunca pensei que algo assim pudesse acontecer.

- Anne você nunca foi uma garota como as outras, é alguém tão extraordinário e eu nunca me arrependo de tê-la levado para dentro de minha casa. Você foi a minha maior alegria durante esses anos.  Eu e Marilla te amamos, não importa o que tenha acontecido.  Conte conosco sempre.

- Obrigada, Matthew.- Anne não soube o que dizer. Estava emocionada com as palavras do seu velho amigo. Nunca pensara que Matthew pensasse daquela maneira. Ele dissera que ela era extraordinária, mas era ele que era extraordinário. Não tinha muita instrução, fora criado em uma sociedade preconceituosa, e ainda assim conseguia enxergar além das aparências, além do que havia na superfície, e só dizer aquelas palavras para ela, o bom senhor lhe mostrara que ser humano incrível ele era. Matthew Cuthbert era o pai que qualquer garota como ela desejaria para si.

- Vou sair agora, pois suas amigas Diana e Josie estão aflitas para vê-la. Prometo que volto amanhã para ver como você é Gilbert estão. – Anne deu-lhe um meio sorriso, e Matthew beijou-lhe a testa com carinho.

Assim que ele saiu, Diana e Josie entraram no quarto, e bastou um olhar de Diana para o rosto de Anne para sentir sua angústia, e correr para abraçá-la.

- Anne, minha amiga. Eu sinto tanto. A Mary nos contou. Fique tranquila que ninguém mais saberá além de nós.  Como você está? - Ela perguntou segurando sua mão direita, enquanto a Josie segurava a esquerda.

- Não sei, explicar. Nunca pensei que um dia passaria por algo assim, e que doeria tanto.- ela não estava mais chorando, mas sentia seu peito arder em brasas.

- Anne, você não está sozinha. Nos vamos te apoiar em tudo. Estaremos aqui para o que precisar.- Josie disse com os olhos úmidos pela dor da amiga.

- Obrigada, Josie.  Significa muito para mim tê-las aqui.- ela sorriu triste.

- E o Gilbert? Quando pretende contar para ele o que aconteceu? – Diana perguntou se sentando ao lado da cama da ruivinha.

- Eu não sei. Preciso criar coragem. Além disso, eu ainda me sinto muito fraca, não sei se consigo ficar em pé.

- A enfermeira disse a Mary que você precisa ficar de repouso por uns dois dias, você perdeu muito sangue e necessita recuperar suas energias.- Diana explicou a Anne.

- Dois dias? Meu Deus, o que vou fazer até lá confinada nessa cama de hospital? - Anne olhou para suas amigas desesperada.

- Nós podemos te fazer companhia. Vou dizer para minha mãe que você está mal por causa do que aconteceu com o Gilbert, e assim posso passar a noite com você. Quer que eu te traga algo para ler? - Diana perguntou ajeitando o travesseiro de Anne atrás de sua cabeça.

- Não sei se consigo me concentrar, mas de qualquer forma Obrigada.- Anne agradeceu comovida com a preocupação da amiga.

Naquele instante a enfermeira apareceu para trocar o soro de Anne, verificar sua temperatura e lhe trazer algo para comer. Ela fez uma careta para a sopa sem cor que estava em sua bandeja, mas logo ouviu Diana dizer:

- Você precisa comer ou não ficará boa logo. Vamos eu te ajudo.

E enquanto Diana lhe dava de comer na boca, Josie foi contando algumas histórias engraçadas que tinham acontecido com ela e Muddy, e embora Anne não tivesse vontade nenhuma de sorrir, ela logo se viu entretida com a narrativa da menina que tentava a todo custo distrai-la com suas caretas afetadas quando a história pedia um pouco mais de ilustração.

Dentro de si Anne ainda se sentia dolorida, e sentia que o pior ainda estava por vir. Dali a dois dias teria que recolher os cacos que restaram de sua alma, e confessar a Gilbert o que acontecera. Não estava a ansiosa por isso, mas era algo que ninguém mais poderia fazer por ela. E deitada naquela cama, olhando para as duas amigas que faziam de tudo para que ela ficasse bem, Anne enxergou nos olhos de ambas tudo o que   a verdadeira amizade tinha que ser.

 

GILBERT

 

Gilbert flutuava entre uma névoa espessa que tomava conta de sua cabeça, e que não o deixava abrir os olhos por mais que tentasse. Ele ouvia vozes ao seu redor, e não eram conhecidas, eram vozes estranhas, vultos que dançavam ao seu redor e os quais ele não conseguia identificar. Ele tentou mexer a cabeça, falar que estava com sede, mas a sua garganta seca e árida não emitiu nenhum som.

O sono era intenso, o levava para longe, e ele se viu caminhando entre nuvens e arco-íris, e uma voz que o chamava do outro lado do muro, o qual ele ultrapassou com a força do pensamento. Viu um homem que lhe acenava a uma certa distância, e conforme ele foi de aproximando Gilbert reconheceu-o emocionado

“Pai? ”- os mesmos cabelos brancos, os olhos escuros, o mesmo sorriso bondoso do qual Gilbert se lembrava. Ele o abraçou, e logo depois fez sinal para que ele seguisse em frente. Gilbert tentou ficar um pouco mais, pois tinha tanto para perguntar, mas uma força o puxava para outro lado tão forte que ele não conseguia resistir.

Um vento cálido tocou os seus cabelos, e um aroma suave de rosas chegou até ele invadindo-lhe as narinas, deixando-o encantado. Ele seguiu seus instintos a procura da origem de tal aroma, e caminhando alguns passos ele chegou até um lago de águas tão límpidas que ele podia ver seu reflexo no fundo. Então, seu olhar cruzou a linha do horizonte, e encontrou cabelos vermelhos como o fogo flutuavam pelo ar, olhos azuis se misturavam ao céu límpido sobre sua cabeça, e coleções de sardas se multiplicavam pelas estrelas. A garota estava de costas, e ele não conseguia ver-lhe o rosto, o som de sua risada se misturava com o barulho do riacho, fazendo um eco que preenchia todos os espaços de seu cérebro e que fazia seu coração bater na mesma vibração.

Então, a garota dançava ao seu redor como se o desafiasse a estender a mão e a tocar, mas assim que Gilbert o fez, ela desapareceu, mas o riso dela o rodeava como se fosse música e o incitava a procurá-la por todos os cantos.

Gilbert a encontrou por entre girassóis que lhe sorriam ao sol, e sentiu o toque dela em seus cabelos, podia sentir-lhe a respiração em seu pescoço, e quando os lábios dela tocaram os seus tão doces quanto mel, ele suspirou, sentindo que voava com ela em seus braços, e eles dançavam uma canção que vinha de dentro de sua alma.

Era um sentimento sublime, tão bem conhecido, que seu coração ansiava por explorar, mas em um segundo tudo desapareceu de sua frente levando embora sua fada ruiva cuja gargalhada ainda ecoava em seus ouvidos.

A enfermeira olhou para o rapaz que parecia estar sorrindo, deitado em seu leito com a cabeça virada para a parede, e se perguntou com o que, ele estaria sonhando. Era uma pena que um rapaz tão jovem e bonito estivesse naquele estado.  Disseram que a garota do quarto ao lado era sua noiva. Ela vira a menina e observara que ela tinha um lindo cabelo ruivo e um rosto de boneca de porcelana. Que casal lindo os dois formavam! Essa constatação só tornava mais triste o fato de que a menina tinha perdido o bebê que esperava, e quando algo assim acontecia parecia que o hospital ficava com um ar melancólico por vários dias.

A enfermeira sorriu de leve e ajeitou ia travesseiros do rapaz, pensando no quanto os acontecimentos poderiam influenciar em muitas vidas. Tanto o rapaz quanto a menina eram jovens e tinham uma vida inteira pela frente, iriam se recuperar de tudo aquilo com certeza. Ela terminou o que viera fazer ali, apagou as luzes e saiu, deixando Gilbert perdido em seus sonhos.

 

 

 

ANNE E GILBERT

 

Anne ajeitou os cabelos no espelho minúsculo do hospital. As suas roupas estavam um pouco amassadas, mas ela não se importou muito com isso, pois não estava indo a uma festa Acabara de ter alta, depois de dois dias confinada naquele quarto, e não via a hora de sair dali e respirar ar puro.

Ela passou um pouco de batom, querendo dar um pouco de cor ao seu rosto terrivelmente pálido que exibia olheiras em volta dos seus olhos azuis. Marilla viera vê-la e tivera que inventar que sofrera um colapso nervoso por causa do que acontecera com Gilbert.  Não estava preparada para contar a ela a verdade, pois a boa senhora era complicada para certos assuntos, e Anne não tinha ideia de como ela reagiria se soubesse da perda de seu bebê.

O que a estava matando por dentro era dizer a Gilbert essa verdade. O que ele lhe diria? Será que a odiaria muito ao saber que ela não fora capaz de manter o filho deles a salvo?

Aquele pensamento fez seu estômago se contorcer. Ela suportaria qualquer coisa no mundo, menos o ódio ou o desprezo de Gilbert. Deus! Ela o amava tanto, que podia senti-lo em suas veias, as batidas do seu coração, nos pensamentos que se agitavam dentro de sua cabeça, naquela dor que a estava dilacerando viva, e em cada respiração que dava vida ao seu corpo.

Todo aquele tempo ali sozinha, as lembranças dele não a abandonavam. Sentia tanta falta de Gilbert que pensara que fosse enlouquecer. Não lhe permitiram que o visitasse antes, e também não lhe davam muitas notícias dele. Diana dissera que era porque ela precisava de paz para se recuperar totalmente, e por isso era melhor que ficasse longe dele por enquanto, mas Anne percebera uma troca de olhares entre elas que a deixou intrigada, mas não perdeu muito tempo pensando nisso, pois tinha certeza de que se tivesse algum problema Diana não ia esconder dela.

Mas, se sentia estranha, inquieta e aflita. A conversa que teria com Gilbert não seria nada fácil, e ela a adiara por dois dias, e não podia continuar assim. Seu noivo tinha que saber o que acontecera, ele era o pai do seu bebê, a outra metade de seu coração, ele era o seu único amor, e ela o decepcionaria tão dolorosamente.

Anne se sentiu na cama e olhou pela janela. Lá fora o dia estava nublado, e parecia que uma tempestade se aproximava, e era como se sentia, uma tempestade se formava dentro dela e estava a ponto de desabar.

Anne estava cansada de ouvir todos dizerem o quanto ela era forte, ela não queria ser forte, ela não conseguia mais ser forte, ela queria apenas ter o direito de se esconder do mundo e chorar, mas ninguém podia ajudá-la agora, ela tinha que assumir a sua culpa e enfrentar o seu medo que estava exatamente do outro lado daquela porta. Ela se levantou decidida. Não tinha mais como adiar seu pesadelo, assim, ela se encaminhou para a porta, abriu-a e saiu.

O quarto de Gilbert era bem ao lado do seu, então, ela não teve que caminhar muito. Anne parou na porta, respirou fundo, virou a maçaneta e entrou. Mary estava sentada ao lado de Gilbert e segurava sua mão com os olhos tristes, enquanto Sebastian estava do outro lado da cama e seus olhos estavam fixos no chão

Anne levou as mãos ao coração que estava disparado e olhou para Gilbert que respirava por um tubo artificial, o rosto pálido como cera, enquanto seus olhos se mantinham fechados. Como doía vê-lo assim, tão frágil, tão indefeso, tão longe de suas mãos. Mary olhou para o lado e a viu, seu semblante ficou preocupado no mesmo instante. Ela veio em sua direção e Anne perguntou sem tirar os olhos de Gilbert:

- Mary, o que aconteceu? Por que ele está assim?

- Anne, você tem que ser forte.- não, Anne pensou, ela não queria ouvir aquilo de novo. Ela fechou os olhos e se preparou para o que ouviria a seguir já sentindo seu coração diminuir dentro de seu peito.

- Querida, Gilbert teve uma parada cardíaca e os médicos tiveram que reanimá-lo, e conseguiram, mas, ele não acordou mais. – Os olhos de Mary pareciam conter o choro, e Sebastian sequer olhava na direção dela, talvez por que estivesse arrasado na mesma medida.

- Você está me dizendo que ele está em coma? - Anne perguntou com dificuldade, e Mary assentiu com a cabeça incapaz de pronunciar qualquer palavra.

Anne balançou a cabeça em negativa. Ela não podia acreditar. Aquela dor nunca teria fim? Ela perdera seu filho, e agora a vida também queria lhe tirar Gilbert? Ela não ia permitir que ele fosse arrancado do seu lado daquela maneira, por que se isso acontecesse ela deixaria de respirar também.

Ela se aproximou de Gilbert e seus olhos marejaram ao estender a sua mão e tocar-lhe o rosto, a pele macia e morna dele entre seus dedos fez com que ela mordesse os labios com força. Dentro de si mesma Anne implorava para que ele abrisse os olhos, e olhasse para ela com aquele carinho que conseguia acalmar qualquer furacão dentro dela.

 - Não posso perdê-lo, não posso. – Ela disse com a voz baixa suplicante, então, sentiu uma mão em seu ombro e seu olhar encontrou com o de Sebastian.

- Não vai perdê-lo, Anne. Gilbert te ama demais para te deixar assim.

- E eu o amo mais ainda e não aceito deixá-lo ir.- ela fez um esforço tremendo para não chorar, pois lágrimas não fariam Gilbert despertar, aquilo não era um conto de fadas, e sim a droga de um mundo real, onde pessoas maravilhosas como Gilbert passavam por tragédias terríveis apenas para salvar a vida de uma garota ruiva idiota que jogara pela janela o seu amor.

- Anne, querida. Não é melhor ir para casa descansar? Você precisa se cuidar. Passou por um trauma enorme. Não é bom que tenha uma recaída.- Mary disse.

- Não. – Anne protestou- Vou ficar aqui até ele acordar.

- Anne, você não sabe quanto tempo vai demorar para isso acontecer.

- Não importa.- ela disse teimosamente.- Eu vou ficar aqui nem que isso dure a vida toda.- Anne se sentou ao lado de Gilbert e segurou em sua mão. Mary viu que não adiantava insistir e se limitou a sentar-se ao lado dela e esperar.

Nos dias que se passaram, Anne continuou assim ao lado de Gilbert saindo apenas para comer alguma coisa e tomar banho. Matthew tinham lhe trazido roupas limpas e alguns livros que ela lia em voz alta como se Gilbert pudesse escutá-la. Algumas vezes ela tivera a impressão que ele mexera a mão ou tremeram os olhos, mas depois percebia que  não passara de ilusão.

Mas, Anne não desistia. Falava com ele a todo momento. Descrevia como estava o tempo enquanto ajeitava-lhe o travesseiro. Relembrava em voz alta dos momentos que passaram juntos em Nova Iorque, Paris, e também contava a Gilbert como seria a casa que estavam construindo e onde iriam morar depois do casamento.

Todos que a viam ali naquela total dedicação ao seu noivo a admiravam pelo amor abnegado que demonstrava por ele, mas, o que ninguém sabia era que dentro dela havia um arrependimento tão grande e também uma lamentação que agora era completamente inútil.  Anne pensava no quanto tinha sido idiota por não reconhecer o amor de Gilbert como sendo absoluto por ela. Enquanto ele lhe dedicara sincera devoção, ela apenas procurara uma maneira de afastá-lo, nunca acreditando de verdade que merecesse aquele amor. Agora em vias de perdê-lo, ela compreendia o tamanho de seu erro. Se algo acontecesse a Gilbert antes que ela pudesse dizer a ele tudo o que sentia, Anne sabia que nunca se perdoaria.

Ela sacudiu a cabeça diante daquele pensamento.  Não ia perdê-lo, se recusava a aceitar que a história deles terminasse assim. Se havia uma pessoa que merecia viver era Gilbert.  Ele tinha tanto a realizar, tanto a construir, tanto a ser amado por ela, todos os dias, a cada minuto e segundos.  Gilbert não podia ir sem antes Anne dizer e demonstrar tudo o que se passava dentro de si por ele. E naquela manhã de sexta-feira, a chuva pintava o dia de cinza e Anne sentia o cheiro de terra molhada que deixava ainda mais melancólico, tudo o que se passava ali naquele quarto.

De repente em uma súbita inspiração, ela buscou papel e caneta para escrever um poema que se formava naquele instante em sua mente. Depois de alguns minutos, ela acabou de escrevê-lo, e leu-o em voz alta, pois quis compartilhá-lo com Gilbert, mesmo que ele não pudesse de fato ouvi-la:

 

Prometa-me que flores ainda existem

E que o arco íris está depois daquela nuvem.

Prometa-me que vai caminhar comigo além das estrelas

E me beijará a cada manhã quando o sol nascer.

Prometa-me que a chuva não é mais triste

E que esse sorriso ainda é para mim.

Prometa-me que a onda que quebra na areia da praia                                         

E a mesma que te confessa o meu amor.

Prometa-me que as lágrimas ficaram no passado

E que a imagem que vejo no espelho

E a realidade dos meus sonhos.

Prometa-me que aquela canção que um dia aqueceu meu coração

Ainda existe em suas lembranças.

Prometa-me que os espinhos que me magoaram ao longo do caminho

Se transformaram em rosas no meu jardim.

Prometa-me que a distância que um dia foi o meu infortúnio

Não te levará nunca mais para longe de mim.

Anne terminou o poema com lágrimas nos olhos. Nunca, depois de tantos anos escrevendo ela fora tão sincera e profunda em seus sentimentos, colocando-os no papel de maneira precisa e intensa.

Então, uma mágica aconteceu, e sem que Anne estivesse esperando, as pálpebras de Gilbert tremeram e com grande dificuldade, ele abriu os olhos fitando-a com aqueles olhos castanhos incríveis pelos quais se apaixonara à primeira vista. O coração dela falhou mil batidas enquanto ela olhava para o rosto tão amado e pensava no milagre que acabara de acontecer. O seu poema tinha arrastado Gilbert da escuridão onde ele estivera mergulhado para a luz daquele amor que brilhava explicitamente no rosto de Anne.

Ela controlou as lágrimas que ameaçavam cair a qualquer momento, assim, se aproximou de Gilbert e disse acariciando os cabelos dele com carinho:

- Oi, meu amor como se sente?

Gilbert olhou para ela sem entender exatamente o que ela falava e perguntou confuso:

 - Quem é você? - e então, a tempestade desabou dentro dela.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Notas Finais


Tenham uma boa leitura.


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