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História Anne with an e- continuação da série - Corações em chamas


Escrita por: roalves

Notas do Autor


Olá, queridos leitores. Estou postando este capítulo e espero por seus comentários a respeito dele. Em minha opinião, ele ficou bastante profundo, e não foi algo que fiz com facilidade, pois fazer uma análise emocional dos personagens e colocá-la nas falas de outro personagem é algo que demanda grande esforço, mas espero que meus anos de terapia tenham feito valer a pena a construção deste capítulo.Sinceramente, eu não esperava que ficasse tão longo, e me perdoem pela empolgação. Enfim, espero que tenham uma boa leitura, pois passei a madrugada toda escrevendo para deixá-lo pronto para vocês que estão esperando por ele ansiosamente. Mais uma vez, peço-lhes que me perdoem pela demora, mas o trabalho on line tem sugado todas as minhas energias, e me desculpem se caso os desapontei. Muito obrigada pela atenção. beijos.

Capítulo 79 - Corações em chamas


Fanfic / Fanfiction Anne with an e- continuação da série - Corações em chamas

 

GILBERT

O ar estava menos gelado aquela manhã quando Gilbert saiu para ir à faculdade, ainda assim, era frio o bastante para se desejar passar mais horas na cama ou tomar algo bem quente para se sentir aquecido por dentro.

Ele deixara Anne dormindo, confortavelmente aninhada entre as cobertas, e teria ficado abraçado com ela mais tempo se não tivesse três provas importantes naquele dia. A semana estava sendo cheia de atividades acadêmicas, e Gilbert tivera pouco tempo para descansar ou ter uma boa conversa com sua noiva, mas, ficaram juntos todo o tempo, embora cada um estivesse envolvido com suas próprias obrigações e estudos.

Anne começara no novo emprego aquela semana bastante animada, e o episódio de seu acidente, como ela chamava aquilo, parecia ter evaporado de sua mente, ou ela evitava deliberadamente tocar no assunto. Porém, Gilbert não conseguira esquecer de tudo com a mesma facilidade, e agir normalmente em torno daquilo tudo não estava sendo fácil. A culpa ainda era uma pílula difícil de engolir, e se livrar da sensação de que podia ter protegido Anne melhor das situações estressantes que a atingiram negativamente nos últimos tempos, era outra coisa que estava tentando fazer, mas, era um hábito que adquirira durante o seu período de namoro com ela que se agarrava a ele como uma erva daninha em seu coração.

Ele continuou caminhando em direção à faculdade, observando as pessoas na rua que passavam por ele apressadas, talvez indo para o trabalho ou para seus respectivos cursos no Campus como ele, e suspirou pensando em suas inúmeras tarefas daquele dia.

Gilbert marcara uma consulta par a Anne no terapeuta sugerido por Dora, e ele lhe pedira que fosse vê-lo antes para que pudessem conversar um pouco sobre a paciente, e saber de seu histórico clínico, e por isso, ele agendara uma hora em seu horário de almoço logo após sua saída da faculdade no fim do período daquela manhã.

Ele estava esperançoso que o tratamento ajudaria Anne com sua dificuldade em lidar com as suas emoções em relação ao seu aborto, e quem sabe ela começasse a considerar outras possibilidade de maternidade, caso realmente não fosse possível para ela gerar um filho biológico deles. Gilbert estava disposto a aceitar qualquer alternativa que lhe fosse apresentada, desde que fosse também o desejo de Anne, ele sonhava com o dia em que a veria satisfeita consigo mesma como mulher e deixasse para trás aquelas infinidade de sentimentos que causavam seu complexo de inferioridade, de pouca valia e depressão.

Anne se agarrava tanto aos pontos negativos das coisas, que não conseguia enxergar suas muitas qualidades. Ela era tão grandiosa que até Gilbert a invejava por seus inúmeros talentos. Ela realizava qualquer atividade perfeitamente bem, enquanto Gilbert apenas podia contar com sua boa memória e aptidão com números. Ele nunca se considerara realmente inteligente como cansara de ouvir seus colegas dizerem. Era apenas um rapaz que fora curioso a vida inteira, e buscara as respostas que queria através dos estudos.  Sua dedicação lhe dera bons frutos, e seus bons conhecimentos em diferentes áreas se devia aos anos de leitura de revistas, livros e artigos de jornais em suas noites insones em sua fazenda em Avonlea.

Ele nunca confessara a Anne, que durante o tempo em que viviam em competição pelas melhores notas, ela sempre fora o cérebro por trás de tudo, e ele sempre a vencia não porque fosse melhor do que ela, mas sim porque ele tinha uma mente prática que analisava todos os ângulos de uma questão, enquanto ela, em sua ânsia de vencê-lo, cometia erros bobos que não cometeria se não estivesse tão empenhada em provar a ele seu valor. Gilbert nunca de fato se importara em ganhar dela, ele apenas aceitava o desafio porque era a única maneira de tê-la por perto, e porque adorava ver Anne irritada a ponto de querer esganá-lo. A beleza dela chegava ao seu auge quando seus olhos se escureciam em fúria, as bochechas ficavam coradas deixando suas adoráveis sardas em evidência, e seu ar petulante de desafio que a fazia arrebitar o nariz pequeno e bem feito o deixava totalmente na dela, e ele descobria secretamente satisfeito que não tinha nenhum a chance quando ela o encarava daquele jeito. No jogo do amor, ele sempre perdera para Anne, e o prêmio dela fora o seu coração.  

Gilbert afastou suas lembranças do passado   para comprar café e rosquinhas. Ele tinha acordado atrasado, e não tivera tempo de tomar café da manhã, e agora sentia seu estômago reclamar, pois comera bem pouco na noite anterior também.  Gilbert voltara a ter suas famosas dores de cabeça tensionais, e nos últimos dias tivera várias crises, dificultando seu sono durante a noite, e quando conseguia dormir já era de madrugada.

Ele escondera aquilo de Anne, disfarçando bem quando sentia suas têmporas doloridas, para que ela não ficasse preocupada. Além do mais, ele sabia que as dores desapareceriam assim que as tensões abandonassem seu organismo.  Ainda estavam longe do período de férias, mas, a época natalina estava chegando, e com ela teriam um pequeno recesso, e Gilbert poderia deixar de lado suas preocupações e curtir um merecido descanso ao lado de Anne. Ainda não haviam feito planos para as festas de fim de ano. Antes, ele estava certo de que Anne iria querer ir para Green Gables passar o Natal com Marilla e Matthew, mas, ele ficara sabendo que Diana estava grávida e não tinha certeza se Anne gostaria de encontrar a amiga nessas condições, por isso, ele não lhe perguntara nada, esperando que ela abordasse o a assunto para que juntos decidissem o que iriam fazer.

Gilbert entrou na Faculdade e quando o alcançou o corredor da sala de aula onde ocorreriam as provas, ele viu Jonas conversando com Dora e sorriu.  O rapaz vinha cercando a amiga de Gilbert durante todos aqueles dias, mas ela evitava qualquer possibilidade de ficarem sozinhos.  Entretanto, de tanto insistir, Jonas estava conseguindo fazer Dora escutá-lo. Gilbert só não sabia se a garota estava acreditando nas palavras dele, pois a expressão dela era de quem analisava profundamente uma questão, antes de dar a ela algum tipo de consideração da sua parte. O rapaz se aproximou de ambos, tirando sua boina vermelha e ajeitando seus cachos escuros com as mãos Eles estavam precisando de um bom corte, mas ele vinha adiando isso, pois Anne havia pedido que ele os deixassem assim mais um pouco, porque ela adorava brincar com os anéis macios dos cabelos dele.

- Ei, Blythe, finalmente apareceu.  Eu te esperei mais de meia hora na biblioteca para estudar como combinamos. – Dora reclamou.

- Desculpe-me, Dora. Perdi a hora. Não deu nem tempo de tomar café em casa hoje.  Ele apontou para o copo de café e as rosquinhas que trazia embrulhadas em papel pardo.

- Ah, a ruivinha está te dando um baile, eh, Gilbert? Aposto que passaram a noite toda se divertindo. - Jonas disse com malícia e ganhou um olhar de reprovação de Dora que disse:

- Que comentário de mau gosto, Jonas. A intimidade de Gilbert não lhe diz respeito. - Jonas parou de rir e ficou sem graça, olhando para Dora com o canto dos olhos.

- Antes fosse isso, Jonas. Mas, a verdade é que ambos estamos estudando demais. Anne fará a prova de admissão para a faculdade na próxima semana, então, além de estudar para minhas provas, eu a estou ajudando com as dela. -  Aquilo era mesmo verdade. Fazia uma semana que ele e Anne não se relacionavam intimamente por conta de estarem ocupados com seus próprios interesses, e acabavam indo para cama morrendo de exaustão, e adormecendo logo em seguida.

- Fico satisfeita que Anne esteja focada assim. É sinal que as coisas estão voltando aos trilhos. - Dora disse sorrindo para Gilbert que retribuiu o sorriso, torcendo para que as palavras de Dora tivessem algum fundamento.

- Vocês estudaram para as provas de hoje? Confesso que me esforcei muito nos últimos dias, mas tenho dúvidas quanto à minha capacidade de absorver tudo que é necessário para realizar um bom exame. Minha cabeça parece uma folha em branco. – Gilbert disse preocupado. Suas dores de cabeça atrapalharam muito sua concentração naquela semana, por isso, não tinha certeza que teria um bom desempenho dessa vez.

- Francamente, Gilbert. Se você não for bem nessa prova, ninguém mais irá.  Conheço essa sua insegurança e sei que não faz sentido nenhum esse seu nervosismo. Parece que não é somente a Anne que tem mania de perfeição. – Dora disse, dando lhe um tapinha amistoso no ombro – Relaxa, você vai se sair bem.

Naquele momento, os três amigos entraram na sala de aula, mas antes de se sentar em seu lugar de costume, Gilbert foi impedido por Jonas, que falou em um tom baixo de voz para que Dora não ouvisse:

- Perdoe-me pelo comentário estúpido que fiz agora a pouco.

- Não tem importância, Jonas. Não fiquei incomodado. Mas, acho que Dora não gostou nem um pouco. - Gilbert comentou, colocando seu material embaixo da carteira e se sentando em seguida.

 - Acha que pisei na bola? - Jonas perguntou preocupado.

- Bem, para te afirmar isso eu teria que saber até que ponto o seu comentário desagradou Dora. O que posso te dizer é que reveja seus comentários e comportamento quando estiver perto dela. - Gilbert aconselhou.

- Obrigado. Vou tentar ter mais cuidado da próxima vez- Jonas respondeu se sentando atrás de Gilbert e ficando em silêncio logo em seguida, pois o professor já estava distribuindo os testes.

Pelas quatro horas seguintes, Gilbert libertou sua mente de qualquer tipo de pensamento que não fosse às provas que tinha a sua frente. Mas, às vezes sua mente voava para outro espaço trazendo a imagem de Anne dormindo naquela manhã. Ele sairá sem lhe dar um beijo, e sentia falta do abraço que ela lhe dava todos os dias, antes dele sair para faculdade. Era ridículo pensar aquilo, mas Anne era seu talismã, e ter ido para faculdade sem ouvi-la lhe desejar boa sorte, o deixara extremamente inseguro, mas, pelo menos tinha a foto dela para compensar, a qual deixou bem a vista para que olhasse para ela sempre que tinha uma dúvida. Gilbert voltou seu pensamento para a prova novamente, forçando seu cérebro a se concentrar no que lia, enquanto apertava a foto de Anne em suas mãos.

Perto do meio dia, ele se levantou e entregou o exame devidamente preenchido ao professor que aplicava a última prova, e saiu da sala seguido por Dora que também tinha terminado a dela.

- Meu tio me disse que você irá falar com ele hoje. – Dora perguntou enquanto seguiam pelo corredor que levaria até o refeitório.

- Sim, e a consulta começa daqui a quinze minutos. Tenho que me apressar ou chegarei atrasado.

  - Não vai almoçar? - Dora perguntou, preocupada com a agitação de Gilbert.

- Não tenho tempo, mais ainda sobraram algumas rosquinhas do café.  Vou ter que me virar com elas até ter tempo de comer algo mais consistente. - Gilbert respondeu quase correndo para o portão de saída, ajeitando sua boina na cabeça.

- Boa sorte.  Depois me conta como foi. - Dora gritou ao vê-lo passar pelo portão. Gilbert apenas balançou a cabeça assentindo, e depois apressou o passo, andando por toda a avenida principal até chegar ao endereço do consultório do tio de Dora, que se localizava em um edifício elegante no centro de Nova Iorque.

O estudante de medicina subiu as escadas de mármore, e ao entrar se surpreendeu com a sofisticação do lugar. A decoração era de extremo bom gosto, em tons pastéis, atribuindo uma calma estratégica ao ambiente. Na parede havia quadros originais de artistas importantes que deviam valer milhões, e até a placa do consultório médico era o sonho de qualquer aspirante a médico.  Era toda de prata com detalhes dourados que Gilbert não se arriscava em dizer que material era aquele, pois não era grande conhecer desse tipo de coisa.

- Sr. Gilbert.  – uma recepcionista muito elegante se dirigiu a ele assim que o viu. - O Dr. Spencer o espera. - ela o acompanhou até a porta do consultório do médico e Gilbert disse.

 -  Obrigado. - ele bateu na porta e uma voz grossa masculina o convidou a entrar, o que ele fez imediatamente.

O homem sentado atrás da mesa parecia estar na casa de seus cinquenta anos, era simpático e muito parecido com Dora. Ele lhe sorriu ao ver Gilbert parado no meio da sala, se levantando e apertando a mão dele com firmeza

- É um imenso prazer conhecer o famoso Gilbert Blythe.

- Famoso? - Gilbert perguntou sem entender.

- Sim, minha sobrinha é uma grande admiradora de seu talento inteligência, e não se cansou de tecer elogios ao seu respeito.

- Fico lisonjeado em saber disso. Eu também admiro muito Dora, ela tem me ajudado bastante nos últimos tempos com meus problemas pessoais.

- Minha sobrinha é o prodígio da família. Pena que resolveu seguir uma linha diferente da nossa. Ela seria uma grande psicanalista, mas creio que a traumatizamos com tantas conversas sobre os casos de pacientes que tratamos em sua infância. - O Dr. Spencer riu com humor.

- Eu também concordo. Já falei para ela a mesma coisa milhares de vezes. - Gilbert disse se sentindo mais à vontade, depois de superar sua inibição inicial ao estar frente à frente com alguém tão importante da área médica

- Sim. Mas, por favor, sente-se e me conte algo sobre sua noiva. Como ela se chama mesmo? - O Dr. Spencer ajeitou os óculos enquanto esperava pela resposta de Gilbert

- Anne, com e.- Gilbert sorriu ao dizer isso, pois se lembrou do quanto Anne frisava aquilo toda vez que dizia seu nome para alguém que acabava de conhecer. E com o tempo, Gilbert acabou adotando aquela sua particularidade.

- Dora me contou por alto, os problemas que ela vem enfrentando, mas, eu gostaria de saber sua visão sobre o assunto, já que vem acompanhando todo o processo de perto. - Dr. Spencer disse enfático.

- Bem, Anne foi adotada por um casal de irmãos, e tem vivido com eles desde então.  Antes disso, ela morou em um orfanato, e nunca soube exatamente nada muito substancial sobre seus pais biológicos. - Gilbert fez uma pausa, e o psicanalista disse:

- Prossiga, por favor. - Assim, Gilbert contou sobre o seu namoro com Anne, o noivado, os planos para se casarem que foram cruelmente interrompidos por uma sucessão de acontecimentos infelizes. Ele falou sobre o assalto, o tiro que levou ao tentar defender Anne, sua perda de memória.  A descoberta dela sobre a gravidez apenas ao abortar o bebê, o episódio envolvendo Sabrina, a luta dela para que ele recobrasse a memória, a descoberta de sua dificuldade de gerar filhos, a depressão profunda na qual ela mergulhou, a desistência da faculdade de seus sonhos, a vinda para Nova Iorque em uma tentativa de recomeçarem uma nova vida, a desconfiança de Gilbert de que ela tentara se machucar deliberadamente, e o medo que ele tinha de que ela tentasse se ferir outra vez. Após terminar sua narrativa, Gilbert sentiu um alívio imenso, nem mesmo ele tinha percebido o quão pesado estavam seus ombros e seu coração.

- Gilbert, fico satisfeito que tenha me contado sobre todo esse período difícil pelo qual Anne e você tem passado, e vou te dar agora o panorama pintado para mim aqui com sua narrativa. - Gilbert assentou, esperando pelas palavras do médico.

- O que vejo aqui é um rapaz extremamente inteligente e profundamente apaixonado por sua noiva, isso é perceptível para mim. Mas, ele carrega um peso enorme de culpa nas costas que não deveria estar aí – Gilbert abaixou o olhar e continuou em silêncio, apenas ouvindo o que o tio de Dora tinha a lhe dizer.

- Você tem que entender uma coisa, Gilbert. Eu compreendo a sua intenção de proteger Anne do sofrimento. Qualquer homem, que ama profundamente uma mulher faria o mesmo. Porém, isso não a está ajudando a passar pelo processo de luto que ela precisa experenciar da maneira que deveria ser. Torná-la dependente de você emocionalmente não a protege, na verdade a prejudica, pois vai chegar um momento em que ela duvidará de sua própria capacidade de decidir as coisas por si mesma. Eu compreendo que a sua intenção são as melhores possíveis, mas pelo que entendi, foi você quem decidiu trazê-la para Nova Iorque, foi você quem a influenciou a tentar passar no teste da faculdade. E se esse não for o desejo dela? E se Anne preferir fazer outra coisa? Você não a deixa decidir por si mesma. Concordo com você que um filho agora não seria bom para o estado emocional dela, mas o que você tem que se perguntar é se essa é a única razão de você não querer ter filhos

Quanto a tentativa de suicídio, você não tem certeza disso e somente deduziu o que aconteceu pelas aparências, e você não acreditou nela quando Anne lhe disse que foi um acidente. Isso foi outro erro grave porque você está provando com isso que não confia nela, e Anne pode se ressentir disso no futuro. Mas, o fator mais importante de tudo isso é a culpa que sente por ter perdido a memória, por não ter estado lá quando Anne perdeu o bebê, por não tê-la protegido de Sabrina, por ela ter supostamente tentado se matar e você não percebeu os sinais a tempo.

Agora, me diga, Gilbert onde tudo isso é culpa sua?  A perda de memória aconteceu contra a sua vontade, então, não se lembrar do relacionamento que tinha com sua noiva antes disso não foi escolha sua. A perda de um filho por aborto espontâneo também não pode ser atribuída a nenhum responsável a não ser ao corpo que por alguma razão, não realiza suas funções necessárias para que a gravidez seja levada adiante. Você como estudante de medicina deve saber como ninguém sobre isso. - Gilbert assentiu, e o médico continuou com sua análise. - A fatalidade que aconteceu depois disso a qual levou a sua noiva à ter problemas para engravidar me parece outra coisa que aconteceu sem aviso prévio, portanto, você não teria como saber que ocorreria, e por último, você me disse que em sua opinião, Anne se cortou propositalmente, e esse fato também estava fora do seu controle.  A mente humana é complexa demais, Gilbert.  Nunca sabemos na realidade, o que uma pessoa é capaz ou não de fazer. Pode-se conhecer alguém a vida toda, e não saber o que ela pensa sobre determinados assuntos. Sua noiva é adulta, tem o direito de fazer suas próprias escolhas, mesmo que estas escolhas não sejam as melhores. Você vai ter que confiar que ela agirá certo da próxima vez, pois assumir a responsabilidade pelos atos dos outros é completamente absurdo. Queremos sempre o melhor para quem amamos, Gilbert, mas não podemos garantir que o melhor que imaginamos para essa pessoa seja a mesma coisa que ela aspira para si mesma. Eu sei que não é fácil, mas cabe a você mudar suas expectativas acerca de algumas coisas, e parar de pensar que   é responsável pela felicidade de sua noiva. Ela somente será feliz se quiser ou estiver disposta a isso. - Dr. Spencer parou de falar, e Gilbert não soube o que dizer depois daquela avaliação completa que ele fizera de toda a situação. Ele nunca tinha pensado em tudo aquilo daquela maneira, e ver tudo o que acontecera pela ótica de outra pessoa lhe dava uma visão totalmente diferente do assunto.

- Eu nunca pensei que a estivesse prejudicando. Achei que meu amor pudesse salvá-la de si mesma. - Gilbert disse de cabeça baixa, olhando para o chão.

- E pode. Desde que seja feito na medida correta, e do jeito certo. Vocês precisam partilhar mais suas dores para que o fardo de ambos não acabe se tornando intolerável. – Dr. Spencer disse com simpatia.

- Obrigado, doutor. Vou pensar sobre o que me disse. – Gilbert disse quase sorrindo.

- Fico feliz em poder ajudar. Aconselho-o a não dizer à sua noiva que conversamos sobre esse assunto.  Isso pode causar sentimentos negativos acerca da consulta dela comigo amanhã. Algumas pessoas não reagem bem quando sabem que seus familiares compartilham seus fatos de sua vida com seu médico.

- Claro, Doutor. Eu sei da complexidade de tudo isso. - Gilbert disse com firmeza.

- Então, creio que terminamos. Amanhã conversarei com sua noiva, e assim verei por qual linha de tratamento começarei as sessões.

- Obrigado mais uma vez. - Gilbert disse, depois se lembrou de outra coisa e perguntou. – Não conversamos sobre os seus honorários.

- Não se preocupe com isso. Considere um presente meu. – O médico disse simpático.

- Mas, é o seu trabalho, Doutor. Precisa ser remunerado por ele. - Gilbert disse em protesto.

- Eu estou fazendo um favor para minha sobrinha, e acredite, ela não me deixa fazer muita coisa por ela. Então, esse presente eu sei ela não vai recusar.

- Bem, se é isso que deseja, fico realmente agradecido. - Gilbert respondeu, impressionado com a generosidade do médico.

- Até logo.  Espero encontrá-lo novamente em breve para falarmos dos avanços da terapia de sua noiva.

- Até logo. - Gilbert se despediu saindo da clínica.

Ele foi para o trabalho ainda impactado pela consulta que tivera com o Dr. Spencer. A avaliação que ele fizera sobre seus sentimentos em relação a Anne não poderia estar mais correta. Gilbert começou a pensar sobre tudo o que acontecera nos últimos meses, e chegou à conclusão que vinha protegendo Anne excessivamente. Precisava ser mais flexível e deixar que as coisas acontecessem naturalmente, sem tentar prevê -as com antecedência. A vida era cheia de imprevistos, e era tolice achar que se podia controlar tudo.

Quando voltou para a casa naquele tarde, ele encontrou Anne de olho em uma nova receita. Ela estava linda vestida com um avental de mestre cuca, e os cabelos presos em uma trança e o rosto sujo de farinha, os olhos concentrados nos ingredientes que estavam escritos em letras azuis. Ela lhe sorriu quando o viu entrar, e Gilbert rodeou-lhe a cintura dizendo;

- Nossa, como senti sua falta. - ele a beijou e Anne encostou seu corpo no dele, retribuindo o beijo com entusiasmo.

- Também senti sua falta. Você sequer se despediu de mim essa manhã. – Ela reclamou assim que se separaram

- Eu acordei atrasado, e não quis incomodá-la. - ele respondeu se desculpando.

- Aposto que não comeu direito até agora. - ela disse tocando o rosto dele com carinho.

- Comi umas coisinhas por aí. – Ele disse rindo.

- É por isso que está com essa cara de fome. Não comeu uma refeição decente.

- Estou com fome sim, mas de outra coisa. – Ele disse olhando para os lábios dela com atenção

- Gilbert, eu não acho que...- ele não deixou que ela terminasse, pois tomou os lábios dela com ardor, e Anne o beijou de volta, deixando para terminar a receita bem mais tarde.

 

ANNE

 

Anne fora para o trabalho horas depois de Gilbert ter ido para a Faculdade. Ela tivera o cuidado de acordar antes dele para preparar o café da manhã, e não acontecer como no dia anterior em que ele fora para a aula sem se alimentar direito, por conta do atraso em sem levantar.

Gilbert não andava comendo muito devido às tensões do dia a dia, e a preocupação com as inúmeras provas que teria aquela semana. Ele também voltara ter suas dores de cabeça crônicas, dormindo mal por isso, e tendo pesadelos. Anne odiava vê-lo assim, mas havia muito pouco que pudesse fazer para aliviar a carga negativa que estava sobre ele aquela semana. Ela apenas tentara manter o bom humor e evitar que ele se preocupasse com ela também.

Gilbert não lhe falara sobre as dores de cabeça, mas Anne sabia por experiências do passado, que quando ele apertava suas têmporas com as mãos ou massageava a nuca era porque uma terrível enxaqueca o estava incomodando, porém, ela não dissera a ele que percebera seu desconforto, ao invés disso, procurara facilitar-lhe a vida de todas as maneiras.

Mas, havia uma coisa da qual vinha sentindo falta aquela semana, e tinha que admiti-lo. Ela e Gilbert não tiveram nenhuma noite de amor naqueles dias, e embora entendesse que ele não estava no clima para isso, ela realmente estava carente desses momentos quando sua conexão com Gilbert se tornava mais intensa, e não era pelo sexo em si, e sim pela fusão dos sentimentos de ambos que acontecia quando se amavam, e seu corpo estava reclamando de saudades.

Antes de sair para mais um dia conturbado de provas na Faculdade, Gilbert lhe disse:

- Prometa-me que vai me esperar para ir à consulta hoje? Eu quero te levar até lá.- ele abraçou-a com cuidado enquanto enrolava os longos cabelos dela em suas mãos.

- Prometo, mas, você sabe que não é necessário. Posso ir sozinha. – Anne ajeitou a gola do casaco que ele usava, espalmando suas mãos no peito dele coberto por uma camisa escura.

- Eu sei, mas quero te fazer companhia pelo menos nessa primeira consulta. - Gilbert disse sorrindo-lhe daquele seu jeito encantador, e foi inevitável beijá-lo, assim como acariciar seus cachos agora um tanto compridos do jeito que ela amava. O beijo foi apaixonado e tão cheio de promessas, que ela se agarrou a Gilbert, desejando que ele não precisasse ir. Estava carente dele, de seu toque, e não estava controlando essa necessidade que gritava em sua mente como o eco de seus sentimentos cada vez mais imensos por seu noivo.

- Sinto sua falta. - ela disse ainda com os lábios sobre os dele.

- Eu também sinto a sua. Prometo que quando essa semana passar, não vou mais me desgrudar de você. - ele disse com as mãos correndo pelas costas de Anne de maneira descuidada, mas não menos excitante para Anne que não sentia aquele tipo de carícia a dias.

- Espero que tenha uma boa prova -Ela disse com seus olhos percorrendo todo o rosto dele.

-  Obrigado, amor.  Agora preciso ir ou chegarei atrasado. E esse professor é muito rígido com questões de horário. -   Gilbert disse beijando-a com carinho mais uma vez.

- Está bem. - Anne disse suspirando. Queria mais tempo com ele, mas entendia que Gilbert precisava ir.

Desta forma, ele se despediu e Anne voltou para a cama, pois ainda era muito cedo para ir ao trabalho. Porém, ao invés de voltar a dormir, ficou pensando no terapeuta que prometera a Gilbert que iria. Estava um pouco assustada com aquela situação, pois era algo ao qual nunca experimentara antes. Anne nunca fora boa em expressar seus sentimentos com quem a conhecia, muito menos para alguém estranho.

Mas, ela fizera aquela promessa a Gilbert, e uma palavra sua dada nunca seria quebrada. E Anne queria e precisava fazer algo por ele. Gilbert vinha sendo seu suporte durante todo aquele tempo, sem lhe pedir nada ou exigir nada, e somente a poucos dias conseguira compreender a extensão do sofrimento solitário de seu noivo. Ela o amava tanto, e um amor assim não  devia ser colocado a prova tantas vezes. Ambos eram parte de um mesmo coração e Anne necessitava encontrar uma forma de fazer o caminho inverso de tudo aquilo, e capturar a essência de seu espírito verdadeiro do início.

Por um bom tempo, aquela doçura e suavidade de Anne ver a vida tinha se apagado, e se não fosse pelo amor paciente de Gilbert, ela não teria retornado ao mundo dos sentimentos que valiam a pena. Era por ele e somente por ele que sua alma suspirava cheia de uma emoção tão difícil de explicar. Ela ganhava vida quando Gilbert a olhava com aqueles seus olhos de amor, pois Anne sabia que ali estava o seu abrigo eterno contra as adversidades do mundo, e  ela realmente precisava fazer Gilbert acreditar que poderia ser forte assim para ele também, e que em seus momentos de fraqueza poderia encontrar nos braços dela sua fortaleza particular.

Anne se levantou duas horas depois e se arrumou para ir para o trabalho. Em seguida, tomou seu café calmamente, pegou sua bolsa em cima da mesinha da sala onde a deixara no dia anterior, e logo estava caminhando em direção à livraria.

Fazia exatamente uma semana que estava trabalhando ali, e já se adaptara ao ambiente caloroso que encontrara ali. As outras pessoas que trabalhavam ali eram bastante receptivas, e Anne se sentia em casa em meio a tantos autores ilustres.  Sem dúvida, os livros eram sua melhor companhia. Na próxima semana, ela começaria com a narrativa de histórias para crianças. Ela se sentia temerosa e ansiosa ao mesmo tempo, pois amava ter crianças ao seu redor, mas tinha medo que as lembranças ruins ressurgissem, acabando com seu prazer em trabalhar com os pequenos. Esperava conseguir lidar com isso da melhor forma possível, pois tinha certeza de que seria uma experiência incrível.

Anne virou a esquina e chegou à livraria pontualmente às oito horas. Ela cumprimentou a recepcionista sorridente que atendia os clientes que entravam e saiam a todo o momento do estabelecimento, e foi direto para sua mesa. Seu trabalho naquele dia era cadastrar todas as obras de Lewis Carol, e ficou entretida nessa tarefa até quase no fim de seu expediente. Enquanto estava classificando a última obra, ela subiu na escada para colocar o livro em seu devido lugar, quando sentiu mãos masculinas a segurarem com firmeza em sua cintura. Ela se virou com um sorriso nos lábios pensando que fosse Gilbert, mas seus lábios se congelaram ao ver quem era.

- Roy, quer por favor me colocar no chão? - Anne disse com a voz zangada, desejando se livrar daquelas mãos indesejáveis que se agarravam em seu corpo.

- E se eu não quiser? - ele olhou para ela de um jeito atrevido que fez o sangue de Anne ferver de raiva.

- Acho que não vai querer que eu comece a gritar. - ela disse em tom de desafio. Ele então a soltou, e Anne desceu da escada, se sentando imediatamente em sua mesa e começando a organizar suas coisas, pois seu dia de trabalho estava no fim, e daí a quinze minutos Gilbert passaria por ali para levá-la ao terapeuta.

- Posso saber o que está fazendo aqui? - Anne perguntou sem olhá-lo.

- Vim saber por que não apareceu no clube de leitura na semana passada.

- E por que eu lhe daria alguma explicação? - ela estava irritada pela petulância daquele rapaz em exigir-lhe algo ao qual não tinha direito nenhum.

- Não seja tão má comigo, Anne. Eu sei que gosta de mim. - Anne ouviu aquilo em profunda indignação. Roy estava surtando, só podia ser essa a explicação para aquelas palavras tão descabidas.

- Já te disse que tenho noivo, Roy. Por que não procura uma garota que não seja comprometida? - Anne se levantou, vestindo o casaco e pegando sua bolsa para sair.

- Por que eu quero você, não outra garota. - Ele respondeu deixando claro o que exatamente queria dizer com aquelas palavras ousadas.

- Você está maluco. - Anne disse, tentando passar por ele e ir para a porta de saída, mas, Roy a segurou pelo braço, impedindo-a de fazer o que ela queria enquanto dizia:

- Sim, estou maluco por você. - Anne arregalou os olhos ao ver o desejo explícito naqueles olhos, e ela sentiu um asco tão grande daquele rapaz que seu estômago fez a bile chegar até sua garganta deixando sua boca amarga como fel.

- Solte-me. Você não tem o direito de colocar suas mãos em mim.

- Pare de ser tão difícil, Anne. Eu posso te levar ao paraíso a hora que quiser.

- Com o se atreve a me dizer esse tipo de coisa, seu pervertido? - ela tremia de raiva, e Roy parecia de divertir imensamente com isso.

- Ora, Anne.  Uma mulher como você merece um homem como eu. Duvido que seu noivo saiba apreciar tudo o que você tem a oferecer a um homem.

- Você não vale nada, Roy. Meu noivo é mais homem do que um dia você será, e em termos de caráter, você não chega aos pés dele.- com um safanão ela se libertou da mão indiscreta em seu pulso, ao mesmo tempo em que ouvia a voz de Gilbert dizer:

- Você está sendo incomodada, Anne? - ela sorriu sem perceber ao pensar que seu matador de dragões tinha chegado.  Ela correu para ele e o abraçou pelo pescoço, dando-lhe um beijo tão amoroso que ao se separarem Gilbert disse:

- Que recepção calorosa foi essa, meu amor? Ainda estamos na metade do dia e você já me tirou o fôlego.

- Estava com saudades. - Anne respondeu sorrindo para ele feliz.

- Eu também, desde hoje de manhã. - ele beijou-lhe a ponta do nariz e continuou- Podemos ir?

- Claro. - Anne respondeu, e depois olhou ao redor percebendo aliviada que Roy tinha ido embora.

- O que aquele cara queria? - Gilbert perguntou assim que pisaram para fora da livraria.

- Nada de importante. – Anne respondeu evasiva.

- Me pareceu que ele estava sendo inconveniente. - Gilbert insistiu.

- Um pouco, mas nada de que eu não desse conta.

- Não tenho dúvidas disso. Talvez você devesse carregar uma lousa na sua bolsa, e usá-la em uma próxima oportunidade. - Gilbert disse divertido, fazendo Anne rir daquela velha lembrança.

- Vou tentar me lembrar disso da próxima vez que alguém se meter a engraçadinho comigo. – Ambos riram do comentário dela. Depois, ficaram em silêncio por alguns segundos, observando o movimento da rua por onde passavam, e de repente, Gilbert perguntou:

- Está nervosa?

- Um pouco. - Anne respondeu olhando para frente.

- Mas não precisa ficar, está bem? Tudo vai dar certo. - Anne balançou a cabeça em afirmativa, mas preferiu não comentar nada. O bolo em seu estômago estava maior, pois não sabia o que a esperava naquele consultório médico.

Eles chegaram em frente do prédio, e Gilbert deu-lhe um selinho rápido dizendo:

- É aqui que nos separamos.

- Mas, você não vai entrar comigo? - Anne perguntou com a voz trêmula.

- Não. Eu acho que você já é adulta o bastante para fazer isso sozinha. - Gilbert disse para dar-lhe força.

- Eu queria que fosse comigo. - Anne disse sentindo-se subitamente muito nervosa.

- Amor, você consegue. Eu sei disso. Agora entre no prédio como a minha garota corajosa que sempre foi. Eu estarei no laboratório se precisar de mim.

- Está bem. - ela respondeu, sentindo o beijo suave de Gilbert em sua testa como despedida. Assim, ela subiu as escadas, e quando estava no último degrau, Anne acenou para Gilbert e entrou.

O Dr. Spencer já a esperava na porta, e disse sorrindo-lhe:

- Você deve ser a noiva de Gilbert Blythe.

- Sim. – Anne confirmou sem coragem de dizer mais nada.

- Sente-se, minha querida. Sou o Dr. Spencer.  Você é Anne, não é?

- Isso mesmo. - ela respondeu tímida.

- Então, me conte sua história desde o começo. Não quero que me omita nada, pois é muito importante que desde o começo estabeleçamos um laço de confiança entre médico e paciente- Anne concordou, e aos poucos foi contando sobre sua vida, desde sua saída do orfanato para a casa dos Cuthberts, até seu acidente com o espelho.

- Anne, como você classificaria seu relacionamento com Gilbert? - Dr. Spencer perguntou, olhando-a com seus olhos profundos.

- Temos um ótimo relacionamento. Gilbert é extremamente cuidadoso comigo. - ela respondeu sorrindo.

- E você diria que ele é excessivamente protetor?

- Ele é muito protetor em relação a mim, mas sei que a culpa é minha.-  ela disse com a voz mais baixa do que o normal.

  - E por que diz isso? -  O Dr. Spencer perguntou sabendo de antemão toda a história que fora contada por Gilbert no dia anterior, mas queria saber a versão de Anne sobre os fatos.

- Porque eu sempre lhe dou algum motivo para isso. Nos últimos tempos, eu não estive muito bem, e Gilbert foi o único em quem confiei para me apoiar.

- Mas, você não lhe pediu que o fizesse.  Foi Gilbert que escolheu se preocupar dessa maneira. - Anne não disse nada, então, Dr.Spencer partiu para a próxima pergunta:

- Sei que a perda do seu bebê foi difícil para você, mas por que se culpa tanto por ela? E a impressão que tive foi que de alguma forma você quer compensar Gilbert por isso. - Anne balançou a cabeça e depois respondeu.

- Gilbert salvou minha vida, Doutor. Ele levou um tiro que era para ter sido para mim, e eu retribui perdendo o nosso filho. – os lábios dela tremeram e ela segurou as duas mãos juntas em seu colo, enquanto tentava reprimir o choro.

- Anne, Gilbert salvou sua vida porque a ama, e não porque esperava alguma retribuição.  Não foi culpa sua ter perdido o bebê, assim como não foi culpa sua o que aconteceu com Gilbert. Seu corpo não estava preparado para a maternidade naquele momento, por isso aconteceu o aborto espontâneo.  Mas, isso não quer dizer que não possa tentar de novo.

- Mas, o Senhor ouviu minha história. Não sei se conseguirei conceber outro filho algum dia. - lágrimas vieram aos seus olhos e Anne fez um grande esforço para que não rolassem naquele momento. Precisava ser forte e enfrentar o que viesse.

- Existem outros meios de você ser mãe, se isso é tão importante para você. Pense nisso. – O Dr. Spencer falou com cuidado, e Anne concordou em silêncio mais uma vez.

- Me fale sobre a cicatriz no seu pulso. - ele pediu, e Anne relanceou um olhar para a marca branca em sua pele, e depois respondeu:

- Foi um acidente, mas o Gilbert acredita que tentei me matar. Eu nunca faria isso. Nunca passou pela minha cabeça acabar com minha própria vida.

- E o que você fez para Gilbert acreditar no que disse? - Anne não soube o que responder, e o Dr. Spencer fez sua própria a avaliação desse ponto.

- A questão aqui Anne é que falta um pouco de comunicação entre vocês dois. Por não querer preocupá-lo, você omite as coisas que sente, e isso abre margem para interpretação errada dos seus atos. Você disse que seu relacionamento com Gilbert é sólido, mas, apesar do que falou, vejo lacunas que os separam, e isso não é bom entre um casal. Às vezes é melhor magoar alguém dizendo a verdade, do que poupá-lo por meio de mentiras. Você é uma garota muito inteligente, mas que se machuca demais tentando ser perfeita, e nunca realmente está satisfeita porque acha que pelo fato de ser órfã não merece o mesmo tipo de felicidade que outras garotas merecem. Esse é outro ponto no qual deve pensar. Talvez investigar um pouco sobre sua família biológica a faça rever esses seus conceitos de pouca valia. Porém, discutiremos isso melhor em nossos próximos encontros. O que quero que pense hoje é que deve ser o mais sincera possível com seu noivo acerca de seus sentimentos. A perda de um filho é algo pesado demais para se carregar sozinho. A dor se torna menor se compartilhada. - Dr. Spencer aconselhou e Anne disse;

- Vou tentar, Doutor.

- Eu sei que não é fácil. Mas, pensar somente em si mesma quando existe outra pessoa que está sofrendo da mesma maneira, não me parece a melhor maneira de superar sua dor. Vocês dois são um casal, e devem resolver seus problemas juntos.

- Eu sei, mas é tão difícil falar de coisas que magoam. Dói demais – Anne disse com os olhos marejados.

- Eu compreendo, minha querida. Mas não falar, não levará a dor embora. Ela somente aumentará e acabará destruindo tudo pelo caminho, inclusive seu relacionamento. Pense nisso.

Anne deixou o consultório se sentindo mais leve. Não fora fácil relembrar coisas tão tristes, mas, agora que o fizera, ela tinha a sensação de que era uma sobrevivente. Ela não queria se afogar em suas mágoas, o que queria era se libertar delas, e libertar Gilbert também.  Durante todo aquele tempo em que pranteara seu filho em silêncio, ela arrastara Gilbert com ela em sua dor, e não enxergara o que fizera com ele. Não fora justa e nem um pouco piedosa, o fizera pagar por algo pelo qual ele não tivera culpa, e somente agora conseguia ver que todo o tempo em que Gilbert estivera com amnésia, seu subconsciente guardara uma grande ira dele, e por isso ela não se permitira compartilhar com ele o seu sofrimento. Eram tantos sentimentos misturados dentro dela naquela época, que Anne não conseguira e ver com clareza aquele ponto tão importante. Ela sentira raiva de Gilbert por tê-la esquecido, e por isso, ela se fechara completamente para ele depois, como um castigo pela maneira como ele a banira de sua mente. Estava claro que não fizera aquilo em sã consciência, estava doente demais em sua alma para entender tudo isso naquele tempo. Porém, analisando com objetividade o que acontecera, ela sabia que estava no caminho certo para sua cura completa. Gilbert não tivera culpa de nada, e sua raiva fora totalmente injusta. Ela daria um jeito para que ele entendesse que não precisava mais se preocupar com ela, pois ela necessitava apenas de um pouco mais de tempo para se sentir ela mesma de novo.

A brisa da tarde bagunçando seus cabelos a fez sorrir, e ela pensou no quanto uma coisa tão simples assim era capaz de aliviar a alma. Anne voltou para casa, e quando estava próxima de seu apartamento, ela viu uma figura loura familiar olhando para um pedaço de papel como se conferisse o endereço de onde estava. De repente, ele levantou a cabeça, olhou em direção à ela e sorriu, e foi aquele sorriso inconfundível de menino que fez o coração dela gritar de felicidade ao reconhecer seu velho e tão querido amigo.

- Cole! - ela gritou e em um segundo estava nos braços dele.

 

ANNE E GILBERT

 

- Como seu apartamento é bonito, Anne. Sem contar que você está maravilhosa com esse cabelo ruivo enorme. Não sei como você pode não gostar dele. É a coisa mais linda que já vi, e mesmo em Paris com toda sua sofisticação, nunca encontrei uma garota com o cabelo como o seu.

- Obrigada, meu amigo. Não posso dizer que concordo com você em tudo que disse, mas, acho que poderei vir a gostar mais de meu cabelo com o tempo. - Anne disse servindo chá de camomila em uma enorme xícara de porcelana, e entregando-a a Cole. Em seguida, serviu a si mesma e se sentou ao lado dele no sofá da sala.

- Não acredito que está aqui – Anne disse sorridente, enquanto apertava as mãos de Cole com carinho.

- Também estava com saudades, Anne. Sinto falta de nossas conversas e tardes de jogos que passávamos na casa de Diana.

- Mas, me conte. O que o trouxe a Nova Iorque? - Anne perguntou curiosa pela visita inesperada de Cole.

- Eu e Pierre estamos pensando e. vir morar aqui. Nos fizeram uma proposta de trabalho que estamos pensando em aceitar.

- É, mesmo? Isso seria maravilhoso, Cole! -  Anne disse quase gritando pela possibilidade de ter seu amigo por perto novamente.

- Sim. Se aceitarmos, iremos trabalhar para uma grande galeria no centro de Nova Iorque. - Cole contou entusiasmado.

- Espero que consiga.  Vou adorar ter você aqui comigo. - Anne lhe sorriu feliz.

- É você? Como anda essa sua cabecinha linda? – Ele disse tocando o ombro dela com carinho.

- Está melhorando. Gilbert me fez ir à um terapeuta, e hoje foi minha primeira consulta. - ela contou meio sem jeito. Ainda teria que se acostumar com aquilo.

- Que maravilha, Anne. Isso só te fará bem. Estou feliz que esteja tentando superar seus traumas.

- Confesso que não está sendo fácil, mas prometi a Gilbert que tentaria, e você sabe que faço qualquer coisa por ele. - Os olhos de Anne brilharam ao falar isso, e Cole os admirou dizendo.

- Você o ama muito, não é?

- Como no princípio. Gilbert é tudo que importa no mundo para mim. Quero muito fazê-lo feliz, e ser a esposa que ele merece.

- Você já é, Querida. Ele te ama por esse seu jeitinho único de ser. Não precisa mudar nada. - Anne sorriu novamente, e depois ficou séria ao perguntar;

- Você soube de Diana?

- Sim, como você se sente a respeito? - Cole quis saber, preocupado com a possibilidade de Anne se sentir incomodada com a gravidez de Diana.

- Estou feliz por ela, só não sei como me sentirei ao encontrá-la frente à frente. - Anne confessou.

  - Tenho certeza de que se sairá muito bem. Não pense sobre isso demais. - Cole a abraçou pelos ombros enquanto colocava sua xícara de chá sobre a mesinha da sala. - Vai passar o Natal em Green Gables?

- Eu e Gilbert ainda não falamos sobre isso.

- Estou pensando em visitar meus pais, quem sabe não nos encontramos por lá? - Cole disse esperançoso.

- Isso seria maravilhoso, Cole. - Anne disse entusiasmada com a ideia.

Desta forma, passaram muitas horas conversando e colocando seus assuntos em dia. Quando Cole foi embora, eram quase cinco da tarde, e ela o convidou para jantar com ela e Gilbert, mas, Cole dissera que Pierre estava esperando por ele no hotel, Então marcaram para outro dia um novo encontro, se ele ainda estivesse por ali.

Quando Gilbert chegou meia hora depois, encontrou Anne estudando, e suspirou aliviado ao vê-la sorrindo e bem disposta. Ficara preocupado com ela o dia todo, pensando que talvez falar do passado a deixasse deprimida por algum tempo, e ficava feliz por estar errado. Fora-lhe muito difícil deixá-la sozinha no consultório do Dr. Spencer, mas prometera que daria mais espaço para ela fazer suas próprias coisas sem sua ajuda, porém, descobrira com esse gesto que aquilo era mais fácil falar do que fazer, pois proteger Anne se tornara um vício, e se libertar disso ainda levaria tempo, especialmente porque gostava da ideia de sua noiva precisar dele, mas pretendia eliminar esse pensamento de sua lista de vontades o mais rápido possível.

- Com o foi seu dia, meu amor? - ele perguntou beijando-lhe o topo da cabeça, e colocando suas coisas sobre a mesa.

- Foi bem. Cole esteve aqui. - ela disse radiante.

- É mesmo? - Gilbert perguntou surpreso.

- Sim, ele disse que talvez venha morar com Pierre em Nova Iorque, pois receberam um proposta de emprego para trabalharem em uma galeria importante daqui.

- Isso é muito bom. Ele sempre foi talentoso. E também fico contente por você ter um pedacinho de Avonlea por perto novamente. - Gilbert disse tocando as mãos dela sobre a mesa com carinho.

- Eu também. – Ela examinou o rosto de Gilbert com atenção e então, perguntou. – Como foi seu dia? Parece cansado.

- Foi bastante movimentado.  E ainda não acabou.  Vou ter que estudar para uma prova difícil de amanhã. - ele disse suspirando e massageando a nuca. Anne sabia o que aquilo significava, e por isso disse:

- Vá tomar um banho. O jantar não demora a ficar pronto, e assim, estudamos juntos depois. Eu estava planejando revisar toda a matéria de literatura essa noite para minha prova na semana que vem.

- Está bem. Não demoro. – Ele disse beijando-a de leve nos lábios e seguindo para o banheiro. Tinha pensado em perguntar a Anne sobre a consulta daquele dia, mas resolveu deixar para mais tarde, quando ela desse sinais de que queria falar sobre aquilo. Não queria parecer invasivo e pressioná-la demais, pois ele sabia que aquilo era um assunto que deveria ser tratado com paciência e delicadeza.

Quando ele saiu do banheiro, Anne já estava quase terminando o jantar. Ela tinha acendido a lareira e o ambiente estava bastante aconchegante.  Em seguida, foi a vez dela tomar banho, e Gilbert preparou um suco de abacaxi, e jantaram assim. que ela voltou para a cozinha.

Mais tarde, depois que deixaram a cozinha toda organizada, se concentraram nos estudos, partilhando seus conhecimentos e se ajudando mutuamente. Perto das dez horas, Anne começou a bocejar e decidiu que era hora de ir para a cama, assim, ela olhou para Gilbert que fazia algumas anotações em seu caderno e disse:

- Vou para a cama, você não vem?

- Daqui a pouco, amor. Vou terminar de fazer algumas revisões. Preciso deixar as anotações prontas para amanhã.

- Está bem. Vou te esperar no nosso quarto então. – Ela o beijou no rosto e deixou-o estudando na sala. Assim escovou os dentes, vestiu uma camisola de renda preta, e se deitou debaixo das cobertas enquanto esperava por Gilbert. Porém, como ele demorou, Anne acabou adormecendo, e despertou novamente perto da meia noite, notando assustada que o lugar de Gilbert a seu lado estava vazio.

Ela se enrolou em uma coberta, e foi até a sala, onde o encontrou ainda sentado na sala de estar, com o livro aberto sobre a mesa, e apertando as têmporas com as mãos. Ela se aproximou devagar, ficando atrás de Gilbert, deixou o cobertor cair e começou a massagear os músculos tensos dos ombros dele, enquanto deslizava os lábios pelo pescoço masculino. Gilbert sentiu o impacto daquelas carícias em seu corpo e perguntou com a respiração irregular:

- O que está fazendo, Anne?

- Estou relaxando você. - ela respondeu continuando a massageá-lo e a beijá-lo no pescoço.

- Acho que está fazendo bem mais do que me relaxar. – Ele disse com a voz carregada de desejo que fez Anne dizer:

- É mesmo? Então, por que não vem para a cama comigo?  Nosso quarto está solitário demais sem você.

- Amor, eu adoraria, mas, preciso mesmo terminar de estudar. - ele disse respirando fundo, e tentando focar sua atenção no livro à sua frente.

Anne deu meia volta, e ficou de frente para ele, e Gilbert quase gemeu de excitação ao vê-la em uma camisola preta de renda, com um decote profundo que deixava à mostra o início dos seios dela, e bem pouco para sua imaginação. Ela se sentou no colo dele, colocando uma perna de cada lado, e disse com a voz carregada de intenções:

- Eu sei exatamente do que precisa agora. - ela se mexeu no colo dele, e Gilbert descobriu que não resistiria por muito tempo à aquela tortura. – Você precisa de mim – Anne completou a frase anterior enquanto suas mãos macias adentravam a camisa dele, e subiam pelo peito de Gilbert em movimentos circulares. Então, ela aproximou seus lábios da boca dele, e com a ponta da língua contornou todo o lábio inferior e posterior, beijando-o em seguida, fazendo Gilbert perder o fôlego com aquela provocação.

Uma semana sem tocá-la o deixara assim louco pela pele macia dela, por isso, ele sentiu que não conseguiria mais estudar enquanto não aplacasse as ondas de desejo que Anne provocava em seu corpo. Ele a pegou no colo e a levou até o tapete da sala, onde estendeu o coberto que ela jogara no chão, e logo, se deitou com ela em frente à lareira. O brilho das chamas que queimavam a lenha no fogo se refletia nos cabelos de Anne deixando-a gloriosamente iluminada, fazendo com que Gilbert a desejasse mais do que nunca.  A camisola que ela vestia assim como sua lingerie foram tirada às pressas, e Gilbert fez o mesmo com as próprias roupas, pois não conseguia mais esperar para tê-la. Ele sentia a abstinência de fazer amor com ela aumentar a temperatura de seu corpo, e em pouco tempo sua pele estava coberta por uma camada fina de suor, e ele estava completamente louco por Anne.

Seus lábios desceram pelo corpo de Anne desesperados para senti-la, tocando os seios sensíveis que pareciam um botão de rosa e se ofereciam para ele sem pudor, indo até o umbigo dela, onde sua língua se deteve um instante para brincar ali, fazendo Anne arquear seu corpo em uma entrega total. Nesse momento, Gilbert parou um momento para observar as reações de Anne ante suas carícias, e ficou totalmente ofegante ao ver a cabeleireira ruiva espalhada pelo tapete, os olhos fechados, os lábios entreabertos e molhados pelos seus beijos, e a pele dela toda marcada por suas carícias. Ela parecia uma deusa totalmente seduzida pela paixão dele, e fazendo o chegar até o pico mais alto do seu desejo por ela. Então, sem conseguir se controlar mais, Gilbert mergulhou no corpo de Anne, como se estivesse em um deserto e encontrasse ali a fonte da água mais pura e deliciosa que já bebera, e ela o envolveu todo naquele feitiço que tinha jogado sobre ele e não o libertaria até que ambos chegassem aonde seus corpos desejavam. Não havia limites para onde estavam indo, e nenhum dos dois realmente se importava em reprimir as sensações incríveis que se espalhavam por sua pele, aumentando assim as batidas de seus corações. Anne era tão quente,e queimou Gilbert em seu fogo enquanto ele a levava muito além do que sonhara, fazendo-a desejar se perder naquele homem que a seguia sem pensar naquela aventura de seus espíritos incansavelmente. Quando seus sentidos se colidiram, e seus corpos se tornaram uma fogueira de emoções intensas e misturadas, eles alcançaram juntos um voo único e magnífico se reencontrando finalmente no fundo de suas almas.

Alguns minutos se passaram até que Anne, com seus quadris ainda encaixados nos de Gilbert dissesse:

- Consegui relaxar você? - Gilbert sorriu com a malícia da pergunta e respondeu:

- Completamente.

- Ainda quer voltar a estudar?

- Creio que tenho outros planos em mente nesse momento. - ele disse encarando os olhos azuis brilhantes de Anne.

- É não vai me contar que planos são esses? - ela perguntou colocando suas mãos sobre o peito dele, sentindo-lhe o coração se acelerar mais uma vez

- Você vai descobrir em um minuto. - ele respondeu puxando-a para um beijo ardente, e pelas próximas horas tudo o que Anne e Gilbert sentiram foi a paixão que os consumia em suas labaredas, como o fogo na lareira que foi se apagando lentamente.

 

 

 

 

 

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Notas Finais


Beijos.


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