Os portões altos feitos de blocos de gelo estavam diante deles, o sol fraco refletindo neles e os cegando momentaneamente.
Breu parecia pouco a vontade naquele meio branco, destoando do lugar com seus tons negros e face franzida.
-- Onde estão os guardas? -- Ele pediu baixo, como se temesse chamar a atenção deles.
-- Não há. -- Jack tocou os portões com as mãos e eles se abriram. -- É por reconhecimento. Se há magia de inverno em quem pede passagem, eles se abrem. Caso contrário, as sentinelas atacam.
-- Atacam, é? -- A sobrancelha arqueada dele assustou Jack a ponto de recuar e pegá-lo pelo braço para conduzi-lo para dentro.
Diferente do Mercado Central, ali era mais silencioso, os murmúrios abafados dos negociantes com seus clientes sendo o oposto das gritarias do outro mercado. Pitch olhava tudo com uma curiosidade inquietante, olhando ao redor e sendo observado de volta. Involuntariamente, Jack puxou seu capuz ainda mais para cobrir seu rosto.
Chegou até a tenda que vendia tecidos, de acordo com sua memória, e foi com alívio que notou que o lugar estava vazio. O olhar do duende foi pouco melhor do que o elfo que o atendeu com Bunny no outro mercado, mas ainda era enervante.
-- Senhor Frost. -- O tom dele era polido e frio. Respeitoso à sua maneira. -- Veio ver sua senhora?
-- Preciso dos itens dessa lista, por favor. -- Sua voz saiu trêmula depois da pausa perante as palavras do vendedor, mas tratou de não se ater a isso.
-- Será um prazer, senhor.
A droga do tratamento o deixou sem reação enquanto o duende esperava a lista com a mão estendida. Foi Pitch que a pegou de sua mão e a entregou, o olhando com cuidado. Duas auxiliares correram com ela para dentro e foram dispondo os itens aos poucos enquanto Jack esperava inquieto.
-- Aqui estão seus itens, senhor. -- O duende os estendeu, os tecidos embrulhados em papel pardo, os demais itens em uma sacola de mesmo material. -- Posso ajudá-lo em mais alguma coisa?
-- Só isso está ótimo. -- Se esforçou para sorrir, enfiando a mão no bolso. -- Qual o valor total?
-- Perdão? -- A confusão do duende foi clara.
-- O valor das compras. -- Jack devolveu a confusão dele com estranheza.
-- Eu não posso, senhor. -- Agora ele parecia ofendido. E com medo. -- A Rainha deixou claro que devíamos ser hospitaleiros com o senhor e repassar seus gastos para o Castelo caso o senhor retornasse. Não posso arriscar atrair a ira dela, meu senhor, espero que compreenda.
-- Tubo bem. -- Se voltando para Breu, estendeu a bolsa de moedas para ele, acenando para o duende. -- Pague por mim. Não há como negar isso.
-- Mas meu senhor...
-- É meu amigo que estará te pagando, não eu. -- Se lembrando do tratamento que recebia e da sua situação ali após as ações da Rainha, acrescentou em tom mais baixo. -- O senhor não deseja me ofender, não é mesmo?
-- É-é claro que não, meu senhor! -- Jack sentiu pena dele ao ver o olhar amedrontado que lhe lançava, mas não podia aceitar tamanha injustiça.
-- Ótimo. -- Sorriu outra vez, mais fácil agora. -- Nos repasse os valores. -- E pensando melhor, não querendo que a ira daquela maluca recaísse sobre o duende, acrescentou. -- E mande lembranças minhas à sua Rainha. Me dê um papel para que eu o recomende à ela e deixe claro como estou satisfeito com seu serviço e utilidade.
Depois de pagá-lo, Jack saiu com Breu, que logo abriu um portal de sombras para levá-los à sua casa.
O passeio foi... novo.
Mas o que o surpreendeu foi a reação das criaturas de inverno. Ou a falta de reação para com ele. O foco de todos estava em Jack.
Jack Frost, que era invisível no resto do mundo, seja mortal ou não; Jack Frost, que era tratado como um rei ali. Pelo que sabia da Rainha da Neve, aquela maldita não desistia das coisas, e ao seu ver, Jack ainda estava sob os olhos dela, ou ao menos ela queria que assim fosse.
Ele observou com cuidado o espírito que se espreguiçava em seu sofá, no mesmo lugar de sempre, curiosamente perto da lareira. Ele parecia à vontade. Sem medo.
Curiosamente, isso não o afetou de uma maneira ruim.
-- Eu preciso voltar. -- O garoto disse, se levantando.
-- A lebre deve estar arrancando as orelhas. -- Brincou, vendo um olhar estranho de Jack para seu sorriso. Ele ainda não sabia fazer essa coisa, seus dentes não eram feitos para isso.
-- Obrigado por hoje, Pitch. -- Jack se levantou e sorriu para ele.
Ele era bom nisso. Mesmo que Pitch soubesse quem nem sempre era algo real. Se pudesse, ele iria categorizar os muitos sorrisos de Jack Frost. E esse era um dos bons, verdadeiros. Com os olhos quase cerrados e covinhas à mostra.
-- Eu não tenho como descrever como foi bom tê-lo hoje. -- O sorriso permanecia enquanto ele recolhia suas coisas.
-- Eu que deveria fazê-lo. -- Disse, antes de alcançar o último embrulho de papel pardo para ele. O garoto pareceu surpreso, mas Pitch queria que o loiro se contentasse com aquilo. -- Faz tempo que não passeio, realmente, e a Corte Invernal é algo que alimenta a curiosidade de qualquer um. Agora vamos, vou abrir um portal para você. As barreiras do coelho vão te barrar, mas se ele reconhecê-lo, provavelmente irá abrí-las.
Jack acenou e o Guardião dos Pesadelos quis por um momento fugaz poder ajudá-lo com as muitas embalagens, mas assim nenhum deles iria entrar no Warren. Retribuiu a despedida ao fazer as sombras o engolirem, sentindo o momento exato que as proteções de Bunnymund o enxotaram e se abriram apenas para o garoto.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.