Aos Olhos do Mundo
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Capítulo XVII - 1ª Parte - Um Presente para Você
Estou sentada na cadeira perto da porta, jogada, cansada mental e fisicamente. Pensar em um jantar - por mais simples que seja -, correr até o mercado, voltar, higienizar cada alimento, preparar, tomar banho, tudo isso depois de um treino de quadra com Roger e preparação física com recuperação... pensar no quão cansada estou me deixa mais cansada.
E, ainda, tem o elefante branco na minha sala. Devo falar do elefante branco?
De onde estou, vejo minha sala de estar inteira, com o grande sofá confortável que foi cuidadosamente escolhido por mim (por já saber que seria o primeiro lugar em que largaria meu corpo ao chegar em casa), o tapete felpudo que nos primeiros dias desafiou em meu organismo o começo de uma rinite alérgica (mas superamos o mal entendido) e as prateleiras vazadas do lado oposto ao sofá.
Não há divisa física entre sala de estar e de jantar: é tudo um grande cômodo só e, então, há o elefante branco: a mesa retangular de jantar de vidro com fucking oito lugares. O que eu devo fazer com o resto do espaço que vai sobrar?
- Você deveria comprar a mesa redonda - alertou Daniel naquele dia em que o levei para me ajudar a comprar os móveis.
Abdico desse estresse todo e vou verificar o andamento do forno. Quero - gostaria de - que seja perfeito; que Mr Cumberbatch sinta-se bem na minha casa e que possamos passar mais que uma ou duas horas juntos.
É muito estranho sentir-se atraída por alguém em que o google sabe mais dele que você. Suspiro diante da minha imagem do espelho do closet. Uma das coisas boas de ser atleta é que você não precisa estar preocupada com o que vestir, afinal, o mundo a vê com roupas esportistas por quase o ano inteiro.
E uma das coisas ruins de ser atleta e ter preguiça (e talvez a ordem seja inversa) é a dificuldade para vestir qualquer coisa que não envolva um shorts de lycra® e tênis. Alguma possibilidade de ficar de shorts e chinelo?
A decisão é pelo vestido um pouco acima dos joelhos de cor preta, alças finas que descem retas para o decote que revela quase que totalmente as minhas costas. Ele não é justo ao corpo e me proporciona o conforto e preto combina com um scarpin magenta novo que ganhei. Opto pelos olhos marcados, lápis preto e esfumaçado em marrom e rímel.
Parecem detalhes fúteis, desnecessários, mas é a primeira vez em muito tempo em que quero me preocupar com eles: desde a escolha do batom até o fato de arriscar no modo como meus cabelos vão secar. É a primeira vez em que eu tenho que olhar para eles. Geralmente, Anne está aqui munida de uma equipe e já decidida quanto a qual roupa e sapato devo pôr.
E - óbvio - tem aquele fator que envolve você se sentir confiante o suficiente para encantar uma outra pessoa.
A caminho da cozinha, paro para me sentar numa das cadeiras estofadas do elefante branco no recinto. Pode ser que a ansiedade tenha se manifestado agora e de repente preciso buscar o ar em intervalos curtos. Parece que tem um nó no meu estômago e eu não tenho fome - o que será muito inconveniente para a noite.
Abaixo a cabeça sobre minhas mãos e respiro fundo. Talvez seja a falta de prática quanto à situação. Ele vem na minha casa, vai sentar comigo e vamos falar sobre o quê? E se não tivermos nada em comum para falar? Não posso abordar Dr. Strange pelo resto da noite! Eu deveria ter assistido à série. Deveria ter elaborado uma lista com possíveis pautas a serem abordadas...
E me vejo rindo de mim mesma. Possíveis pautas? Quem faz isso geralmente é Anne, mesmo que depois de algum tempo as perguntas durante as entrevistas não sejam tão diferentes assim. Será que eu deveria ligar para ela e pedir por algumas dicas?
Arrumo a mesa.
E espero.
Mr Cumberbatch. Tento formar suas feições na minha cabeça, como meio de um lembrete do que verei ao abrir a porta: um homem alto, com postura e porte, cabelos castanhos alinhados, barba feita e extremamente rente à pele, mãos de dedos compridos, firmes, os tendões e algumas veias salientes em sua pele alva, que têm o poder de me fazem ciente da presença quando praticamente podem enlaçar minha cintura... e olhos.
Os olhos... azuis que às vezes estão verdes que ele coloca sobre mim e nunca desvia enquanto conversamos. Olhos verdes que às vezes são azuis que ele enlaça a mim, me fazendo querer manter nosso olhar - o seu olhar - até eu me sentir nua. É mais fácil se entregar do que resistir. É mais fácil dançar ao pedido deles do que sair correndo.
Mesmo que isso me queime o rosto.
Me queime o corpo.
Meus devaneios são desfeito no momento em que a campainha toca. Vou até a porta e antes de girar a maçaneta dou minha última inspirada profunda o suficiente para me preparar. Mas, convenhamos, nada do que eu pudesse ter feito antes me prepara o suficiente para a imagem que vejo parada à minha porta segurando uma garrafa de vinho e uma caixa de presente.
Definitivamente Mr Cumberbatch é o homem mais charmoso que eu já vi na minha vida.
Calça jeans alinhada ao corpo, camiseta cinza e jaqueta preta.
- Você está linda, Srta Lunière. - Ele entra pela porta me olhando nos olhos e não desvia mesmo quando retira a jaqueta e a coloca sobre a cadeira que eu gentilmente aponto. - Para você - e estende a caixa embrulhada em um papel que parece uma colcha de retalhos.
Maravilhada pela estampa, passo a mão pelo papel e sinto sua textura aveludada e me demoro um pouco nisso. Sinto ele me olhando ainda, com um leve sorriso nos lábios e se aproximando aos poucos. Sinto sua mão sobre a minha e o choque que isso me causa:
- Não achei que você fosse gostar mais do embrulho do que o presente em si.
Sua voz de timbre grave me desperta e me obriga a desviar a atenção e ergo a cabeça para vê-lo tão perto de mim.
- É que eu realmente gosto de texturas - respondo sem jeito por expor minhas esquisitices tão facilmente. - Mas, o senhor não precisava me trazer nada, Mr Cumberbatch.
- Eu sei. Mas - ele segurou a caixa em uma das mãos e com a outra tomou a minha e, juntos, desatamos o laço, - eu já vi como a senhorita fica feliz ao receber presentes - e tiramos a tampa da caixa e meus olhos, curiosos, me fazem inclinar para conseguir ver ali dentro - que foram pensados especialmente para você.
É uma foto.
Uma foto minha.
Uma foto minha segurando uma taça. O fundo desfocado, algumas luzes em destaque como pingos, e eu, parada, olhando o que pode ser diretamente para o fotógrafo. Retiro a foto da caixa com cuidado e observo cada detalhe dela. Minha cara de perdida, a possível busca por algum amigo e a surpresa em meu rosto pelo o que vi.
- Foi no jantar do Roge.
- Você quem tirou a foto?
Ele solta um riso e se afasta um pouco de mim.
- Não. Isso seria muito estranho, não acha?
- Não sei. Existem tantas pessoas que tiram fotos minhas e eu nem sei. Pelo menos essa seria de uma pessoa conhecida.
- Bem colocado, mas infelizmente não. Não fui eu. Roger quem tirou.
- E ele te enviar uma foto minha não é estranho?
- Não culpe nosso amigo, senhorita. Ele me mostrou por acaso e eu pedi. Sabia que em algum momento seria um bom presente para você. Confesso que estava na esperança de apresentá-la a você no Natal.
Natal? Existem, então, planos que envolva nós dois e um presente de Natal?
- Bom... em todo o caso, foi uma foto bem tirada. E - olho de novo para a imagem - um presente bem atencioso.
- Fico feliz que tenha gostado. Não sei se gostou mais do que o papel de embrulho - e nós dois rimos. - Mas tudo bem. Uma bela coleção você tem aqui.
Eu deixo a caixa de presente sobre a mesinha de centro e sigo até ele para as prateleiras vazadas.
- Fã de Star Wars!
- E Harry Potter - acrescento, apontando para a prateleira de cima.
- Você realmente é uma pessoa repleta de peculiaridades, Srta Lunière.
- É... - coloco a minha foto junto a um dos tantos bonecos do Darth Vader. - Roger me diz isso também e às vezes não é como elogio.
- Então acho que deveríamos abrir essa garrafa de vinho para que eu possa ouvir mais sobre você.
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