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História Apenas um sonho III - Herdeiro do trono - Amarga amargura


Escrita por: Maallow

Notas do Autor


Me sinto bem melhor dps do apoio de vcs <3
Toma ai um capítulo fresquinho.
Narração da Alice
Assim, na primeira temporada era mais a narração da Alice e do Tarrant (algumas do Stayne)
Na segunda temporada era mais a narração da Alice e da Val (algumas do vilão pq né... haha)
E nessa terceira to focando mais na Alice e no Gil. (E umas do Stayne)
Espero que vcs não se importem.

Capítulo 17 - Amarga amargura


O feto recém descoberto que se desenvolvia dentro de mim se remexia. Meus olhos estavam bem abertos naquela noite, eu não sei bem se o motivo era a minha gravidez, ou passar mais uma noite em Marmoreal.

No entanto, quando me virei para o outro lado da cama, percebi que não havia ninguém ali.

Talvez passasse de uma da manhã e Tarrant ainda trabalhava em seus chapéus.

Eu o xingaria em pensamentos.

Se não me inclinasse para frente de repente, com a dor.

Toquei o meu ventre.

A dor era terrível, tão terrível que me fazia suar. Era como se algo me prensasse, e o prensasse também.

Peguei um dos castiçais, por sorte não precisava me preocupar com Catharine Louise, ela estava sob os cuidados das muitas criadas do Castelo, assim ordenou Mirana, ela fazia questão que meus dias em Marmoreal fossem os mais sossegados possíveis, e após nossa discussão desnecessária, a Monarca observou que eu estava um tanto quanto estressada em ter que cuidar de minha filha mais nova o tempo todo.

Busquei meus calçados de pano e não hesitei em me observar no espelho. Estava usando uma chemise branca, de algodão, um pouco mais larga do que o habitual para que ninguém notasse a saliência intrigante acima de minha bexiga.

Suspirei, a dor pareceu me dá trégua, mas minha garganta implorava por água.

Quem sabe, também deveria visitar Tarrant e implorar para que ele ignorasse sua insônia e seu fascínio por chapéus e voltasse para o nosso quarto.

Girei a maçaneta da porta. Os corredores silenciosos e vazios também portavam o frio da noite, certamente deixaram algumas janelas abertas. Cruzei os braços, apenas torcendo para que o castiçal não se apagasse com os ventos.

- A-ain. – Meu ventre se comprimiu outra vez, e então, curvei meu corpo para frente por um instante, sentindo alguns rastros de sudorese descendo por minha testa.

Apenas prossegui quando a dor passou.

Estiquei o castiçal, permitindo que o fecho de luz iluminasse cada pequeno passo meu. Embora aquela única vela quase toda desgastada não fosse capaz de abrilhantar o vulto escuro que atravessou correndo o cruzamento entre os corredores. - E-ei! – Apertei meus passos.

Poderia ser um soldado se ele não estivesse com as vestes tão escuras.

Todos os soldados da Rainha usavam armaduras de ouro branco.

Corri para a direção do outro corredor. – Pare! – Mandei, ainda correndo. – Pare agora mesmo!

Quem quer que fosse, ainda de costas, de repente me obedeceu. Ele ou ela enrijeceu seus ombros, ajustando a postura. Tinha quase o meu tamanho, vencendo-me por alguns poucos centímetros.

Enquanto eu me aproximava hesitante, notei que usava calças.

Bom, era um homem.

Os cabelos estavam soltos, em meio a escuridão, não conseguia distinguir a cor. – Quem é você? – Sussurrei, esperando que ele se virasse e por fim alimentasse a minha curiosidade que se desenvolvia mais rápido do que o feto dançante dentro de mim.

Ele respirava ofegante.

Quando se virou.

E a luz do meu castiçal iluminou seu rosto, por fim. Aquele rosto masculino com traços que lembravam os meus.

E os de Tarrant também.

- Filho. – Sorri em lágrimas.

Ele não parecia feliz por ter sido encontrado.

Pelo contrário, nunca o vi daquela forma.

Estava acabado.

Olheiras profundas, a barba por fazer, os cabelos longos e emaranhados, como se a dias não visse uma escova...

Além dos seus olhos. Ou o seu olho...

Laranja intenso.

Ele pressionava o seu braço. A mão que pressionava saia sangue entre os espaços de cada dedo. – Oi, Alice. – Torceu seus lábios ao dizer. - E-eu tenho que ir. – Se preparava para partir quando o segurei.

- O que houve com o seu braço? – Analisava.

Ele abaixou os ombros. – Bom, eu me feri. Entrei no castelo para encontrar algum curativo que me fizesse parar de sangrar. Mas eu não queria que ninguém me visse.

Suas palavras me atingiam. – Você foi embora e nem se despediu de mim. – Toquei o seu rosto, estava áspero e tão sujo. – O que houve com você?

Ele juntou as sobrancelhas. – Tenho que matar o Valete.

Então, largou o braço ferido para buscar uma garrafa retangular, presa ao seu cinto. O que quer que bebia era tão forte que meus olhos arderam, mesmo sem estar tão perto, e meu nariz coçou. - E-eu nem vou perguntar o que é. – Murmurei.

Eu o vi rir, então. – É melhor mesmo a senhora não saber.

Por mais que usasse as palavras sem hesitar, ou gaguejar, ou nem mesmo trocar de sentido. Eu sabia que ele estava bêbado.

Pois se apoiava na parede do corredor.

- Como se machucou?

- Alice... Alice... – Ele cerrou seu olho. – Preciso ir. – Sussurrou, tomando de sua bebida.

- Me dê. – Estendi os braços. – Eu não quero que o meu filho vire um andarilho alcoólatra.

Ele riu, ria em deboche como o seu pai. – Boa sorte. – Mas me entregou.

Peguei sua mão. – Vamos. – Antes que questionasse o por que eu o arrastava para o caminho contrário do corredor, decidi explicar. – Eu não deveria estar acordada a essa hora, mas já que estou  e já que o encontrei. – O olhei por um instante. – Acho que o mínimo que devo fazer é impedir que ande por ai parecendo um órfão plebeu.

Eu o fiz entrar em meu quarto. - E-eu não quero encontrar com Tarrant. – Era seu único pedido, afinal.

- Vou trancar a porta. – Assim o fiz. – Não vou deixar que ele entre, prometo.

Seu olho, apesar de laranja e raivoso, estava intensamente triste.

– Meu filho. – Alisava sua nuca, os cabelos sujos e mal penteados. – Estou tão preocupada com você.

- Não queria preocupá-la, mãe.

Toquei sua barba aloirada, e desci minhas mãos por sua roupa. Puxei seu sobretudo preto, a ferida em seu braço quase grudava no tecido e estava mais feia do que imaginei.

Um corte, profundo.

Era possível ver as camadas de carne de sua pele.

Um simples curativo não seria tão eficaz.

- Quero que me diga para onde você foi e onde arrumou este ferimento no braço.

Não havia saída, afinal. – Fui a taberna da lua. – Ele sussurrou.

Ele jamais iria a um lugar que o lembrasse de sua pseudo mãe tão fortemente se não houvesse uma necessidade maior incluída.

E sim, havia.

Rapazes solteiros de sua idade precisavam de mulheres para aliviar-se de seus hormônios. – Eu entendo. – Tentei sorrir. – Não há nada de errado nisso, afinal. – Me sentei no colchão, não gostaria de imaginá-lo na companhia de damas da noite. Mudei rapidamente o assunto. – E como se machucou?

Ele pensou. – Briguei com um... Soldado embriagado que encontrei por lá. E-eu não me lembro bem como foi.

- Vou... Lhe dá roupas limpas. – Levantei, Gilbert me observou caminhar até o closet. – Creio que alguns ternos de seu pai quando tinha a sua idade deve servir. – Me virei para encará-lo. – Embora... Você me pareça estar mais magro.

- E a senhora está grávida.

- Ahn... – Não esperava por isso. Olhei brevemente para o espelho, pensei que uma chemise larga pudesse disfarçar.

- Bom, Tarrant deve estar feliz.

- Ele ainda não sabe. – Eu o guiei para outra porta. – É melhor você se banhar, eu vou ajudá-lo. – Toquei em seu cinto.

Mas havia limites entre um filho homem e uma mãe. – E-eu consigo sozinho! – Berrou, desesperado. – Alice, a senhora não precisa ser tão prestativa!

- Você está bêbado e com certeza não se alimentou, pode desmaiar na banheira. – Cruzei os braços. – Não entendo o por quê está tão constrangido.

- A senhora não vai me despir. – Prontificou em dizer. – Muito menos vai me banhar!

Assenti, afinal. – Estarei no quarto. – Ele concordou, um pouco mais calmo.

[...]

Depois de meia hora, minha preocupação passou a ganhar mais força. Ele prometeu que não trancaria a porta e eu prometi que não a abriria sem a sua permissão. – Filho? – Bati na porta do banheiro pela primeira vez.

Sem obter respostas.

Meu bebê se remexia dentro de mim, mas ignorei toda a dor que poderia me causar.

Empurrei a porta, por fim.

Gilbert estava na banheira, mas como imaginei, estava desacordado. O pescoço pendurado na borda de porcelana, e os dois braços para fora, um deles manchando o chão de sangue.

A água levou toda a sujeira de seu corpo.

Bati em seu rosto. Mas ele estava mole, em sono profundo.

Pensei em como faria para puxá-lo dali.

[...]

- Obrigada, Amélia. – Sorri para a criada. – Foi a única acordada para atender ao meu pedido.

A mocinha olhava corada para o rapaz despido em minha cama. – Não sabia que a senhora tinha um filho homem. – Seus olhos estavam atentos a nudez do mesmo. – Eu nunca o vi antes.

- Não queria te dá este trabalho. Mas ele apagou na banheira e bom, eu não poderia chamar meu marido, prometi ao meu filho.

- Oh, não foi trabalho nenhum, senhora. – Sorriu, sem tirar seus olhos do corpo masculino na qual eu evitava encarar.

Ela passava a navalha em sua barba, limpando todo o seu rosto daqueles pelos indesejáveis, exatamente como lhe pedi.

- Se não for muito incômodo... – Comecei, enquanto procurava as vestes de Tarrant. – Seque-o com a toalha que está na cabeceira quando terminar de tirar a barba.

- Incomodo nenhum, muito pelo contrário. – Respondeu.

Remexia os cabides. Tarrant tinha inúmeros ternos e calças de alfaiataria, no entanto, segundo a minha experiencia em ser esposa de um costureiro, a maioria de suas roupas não serviriam em nosso filho. Gilbert havia perdido muitos quilos desde que descobriu que o Valete estava vivo.

Eu temia por sua saúde.

Me virei lentamente.

A criada o secava timidamente. É claro, sem evitar que seus olhos parassem na parte principal do corpo masculino.

Seus olhos estavam arregalados, e pela cor acentuada de suas bochechas eu sabia que aquela era a primeira vez que via um homem sem roupa. – Amélia. – Sussurrei, ela se assustou.

- Senhora? – Ela olhou para mim.

- Depois de secá-lo, me ajude a limpar seus ferimentos e a vesti-lo?

- Com certeza, senhora. – Corou. – Faço o que me ordenar.

Assenti, voltando a atenção para as vestimentas. – Talvez este sirva. – Encontrei um conjunto de terno e calça verde água.

- Ai, eu adoro o meu trabalho. – Sussurrou a moça. Descendo a toalha pela barriga de Gilbert.

- Amélia. – Circulei pela cama. – Por acaso... consegue enxergar algo incomum em mim? Me observe com atenção.

Ela parou para me olhar. Até mesmo dei uma volta. – Não senhora. Há algum problema?

-Não é bem um problema. – Então, puxei a lateral de minha larga chemise.

Marcando a saliência em minha barriga. – Estou de quatro semanas de gestação.

Ela estava imensamente surpresa. – Eu e as outras criadas a vestimos todos os dias desde que veio para cá, não notamos.

- S-sim... Isso é o mais curioso. Ninguém do palácio percebeu, a não ser... – Me aproximei, apoiada na cabeceira. – Meu filho. Ele notou com uma facilidade extraordinária, sem nem mesmo precisar tocar em mim... Ou perguntar para que tivesse certeza. – Alisei seu rosto adormecido.

- O que a senhora quer dizer com isso?

A encarei, a verdade é que nem eu mesma sabia explicar.

- Não... – Balancei a cabeça, forçando um sorriso, não queria ter que atrapalhar seu trabalho com os meus absurdos. – Por favor, continue a secá-lo. Era só um pensamento estranho.

Molhei o algodão na bacia de madeira que continha o antisséptico para o seu braço e o levei até o corte profundo, pressionando para que entrasse em sua pele.

Gilbert acordou com o estímulo da ardência do tal remédio.

Assustado por estar despido, e principalmente na presença de sua mãe e de uma moça desconhecida, que na certa não tinha nem dezesseis anos. – O o-oque?! – Ele arrancou a toalha violentamente das mãos de Amélia, escondendo seu corpo da cintura para baixo. – Mãe!

- Você adormeceu. – Respondi simplesmente. – Esta é a Amélia. – Apontei para a moça. – Ela me ajudou a tirá-lo da banheira.

- Muito prazer senhor Hightopp. – Ela ajeitou os óculos redondos e os cabelos soltos para ficar mais apresentável.

Ele a encarou por breves segundos.

- Acho que você já pode ir, não é? – Resmungou com antipatia.

- Desculpe. – Ela passou por mim. – Senhora Hightopp, não hesite em me chamar caso houver um outro incidente deste.

Sorri. – Com certeza não hesitarei. – Destranquei a porta.

Ela se foi, mas não antes de observar o rapaz semi nu uma última vez.

- Você foi muito grosseiro. – Comentei. – Amélia é uma serviçal muito prestativa.

- E-eu não poderia estar mais envergonhado! – Levantou cambaleando, enrolando a toalha na cintura.

- Eu não precisaria chamá-la se não fosse sua teimosia. – Lhe entreguei a roupa.

- Vire-se pra lá. – Pediu com pudor.

- Tudo bem. – Obedeci. – Mas a essa altura, seu pedido nem mesmo faz sentido, eu já vi tudo.

Ele resmungou qualquer coisa, comentando em seguida que sua cabeça latejava.

Me avisou quando terminou de se vestir, então, eu o olhei. – Ah... – Eu não poderia estar mais feliz. – Você está tão lindo. – Sem a barba conseguia visualizar melhor o seu rosto.

E ele possuía um ferimento no canto dos lábios. Um corte pós soco. – Com quem você brigou? – Ele desviou o rosto com a pergunta.

- Não me lembro de nada.

Assenti, embora soubesse que aquilo não era verdade. – Pedi que Amélia lhe trouxesse chá também. – Lhe entreguei a xícara. – Talvez o ajude na ressaca.

- Estou com muito sono. Na verdade, estou exausto.

Eu o fiz sentar na cama. – Então é melhor que durmas.

Ele não pestanejou, não venceria seu cansaço.

Me deitei do seu lado, seu olho voltou para a cor castanha e sua mão tocou minha barriga. O bebê que se remexia sem parar desde que acordei, simplesmente se aquietou.

E isso só me intrigou ainda mais.

- Eu te amo, mãe. – Disse ele, sonolentamente.

E a melhor parte daquela noite foi vê-lo adormecer diante do meu afago.

Eu não dormi. Não queria acordar e ver que ele não estava mais ali, preferi me atentar ao meu filho.

Ele poderia não ser muito parecido com Tarrant fisicamente, mas a pouca luz do ambiente e aquele terno colorido me lembrava o chapeleiro.

Gilbert também se mexia demais.

Era inquieto em seus sonhos.

Eu me sentei e reacendi o castiçal, o observando bem. Ele virava a cabeça para um lado e para o outro.

Embolava as palavras, igualzinho ao seu pai. Por sorte, eu conseguia compreender cada uma delas. - M-meu destino... – Murmurava, toquei sua testa, estava com febre. – M-matar e morrer. M-matar e morrer... – Aproximei o castiçal do seu rosto, as sobrancelhas se comprimiram. – B-beba em meu lugar.

- Beber o que? – Perguntei.

- P-preciso m-matar o Valete.

Deixei o castiçal no criado mudo. Estava preocupada com sua febre e o acordaria, agora mesmo.

Se não fosse aquele nome desconhecido que o ouvi dizer.

“Soraya.”

- Quem é Soraya? – Soprei.

E a porta se abriu.

Era quase três da madrugada quando Tarrant chegou. É claro que ele estranhou eu estar acompanhada de alguém em nossa cama.

Mas pulei do colchão no mesmo instante antes que ele tivesse um ataque. – É o nosso filho! – Exclamei. – É o nosso filho, Tarren. Ele está dormindo, sonhando.

Ele retirava a faixa de carretéis coloridos, sempre presentes em seu corpo quando estava trabalhando.

Se aproximou cauteloso do rapaz.

- Ele está falando algumas coisas sem sentido. – Avisei.

- Então ele está delirando.

- Acredito que sim. Estava com um pouco de febre, talvez tenha sido por que adormeceu na banheira.

Tarrant retirava seu terno, dei a volta e me sentei no pouco espaço que tinha no colchão ao lado de Gilbert. – Não está mais resmungando. O que ele dizia?

- Falava sobre o Valete. E dizia para... beber no lugar dele.

- Beber o quê? – Tarrant olhou para o nosso filho com mais atenção.

Balancei a cabeça. – Não sei. Mas acabo de lembrar, eu o encontrei com isso. – Peguei a garrafinha de alumínio retangular, a tampa era de rosquear. – O cheiro era tão forte que ardeu meus olhos e meu nariz.

Eu lhe entreguei. Tampando o nariz. – Não abra, n-não quero vomitar.

- Vomitar só por sentir o cheiro?

Eu tocaria o meu ventre se isso não lhe desse dicas demais. – Sabe que não gosto de bebidas alcoólicas.

- Não pode ser tão forte assim.

Dei alguns passos para trás, tampando o nariz.

Ele então, desrosqueou a garrafa, levando até o seu olfato.

Tarrant tossiu. - E-ele... – Tossiu mais, em meio a algumas risadas involuntárias. – E-ele bebeu isso?! – Eu não queria me preocupar com o modo como meu marido questionou, o jeito como arregalava os olhos, nervoso.

- Bebeu quase tudo.

A garrafa caiu de suas mãos, molhando seus pés. O cheiro se intensificou por todo o quarto. Ele o sacudiu. – F-filho, a-acorde.

- O que houve, Tarren? – Meu coração se apertou.

Ele me ignorava, sacudindo Gilbert com veemência. – Chame um médico, querida.

Segurei o meu choro. - P-por quê?

- P-por que tem mercúrio na bebida.

O que quer que bebia era tão forte que meus olhos arderam, mesmo sem estar tão perto, e meu nariz coçou. – E-eu nem vou perguntar o que é. – Murmurei.

Eu o vi rir, então. – É melhor mesmo a senhora não saber.

- E-ele disse que era melhor eu não saber... – Chorei.

Tarrant o deixou. – Querida, ele vai ficar bem. Mas é melhor que alguém o examine.

Assenti, segurando sua nuca. – Quem foi a alma maldosa que pôs mercúrio em sua bebida?

Meu marido parecia ter a resposta certeira. – Foi ele mesmo, Alice. – Balancei a cabeça em negação. – É a verdade, você sabe disso. Agora eu entendo. – Ele limpava minhas lágrimas, Tarrant possuía sanidade por nós dois. – Nosso filho não está pensando bem.

- E-eu disse... Eu te disse, Tarren, v-você não me escutou.

[...]

O dia havia amanhecido, e Tarrant e eu nem mesmo notamos. Tarrant não estava tão preocupado quanto eu, embora sua preocupação atingisse níveis elevados.

Eu observava como meu marido batia os pés no chão, enquanto sentava-se na poltrona, observando cada movimento do médico ao avaliar nosso filho.

– Ele ficará bem, doutor? – Questionei, alisando os cabelos de Gilbert.

- Acredito que sim, já que sua febre baixou. Mas ele ainda passará algumas horas desacordado. O seu corpo é bem resistente, ele tomou uma boa dose de veneno diluído. – O médico ajeitava seu estetoscópio sobre o ombro. – Em mulheres e crianças isso seria fatal.

-Ficamos mais aliviados. – Tarrant levantou, carregando sua xícara de chá para acompanhar o médico até a porta.

Pedi que a fechasse quando ambos saíram.

Eu observava meu primogênito, me perguntava o que havia acontecido para que ele tentasse dá um fim em tudo.

Ele queria morrer mais do que qualquer coisa.

E talvez uma certa mulher fosse a resposta.

[...]

Por sorte consegui arranjar uma capa de cetim para cobrir-me.

Esse lugar arruinava a reputação de qualquer mulher de respeito. E por mais que eu não me importasse, sei que Tarrant não se agradaria de saber que eu estou aqui.

Respirei fundo e empurrei a porta, o sino tocou e alguns curioso olharam para mim. Apesar da capa ser um tanto quanto suspeita, minhas vestimentas não eram provocantes como as das meretrizes que varavam a noite na taberna da lua.

No entanto o movimento não era tão grande quando cheguei.

Poucos homens, algumas meretrizes e o dono da taberna, sempre atrás do balcão, polindo copos com um pano sujo. – Com licença. – Parei a sua frente, escondendo o meu rosto.

- Pois não? – Por sorte, ele nem mesmo me encarava.

- Eu gostaria de saber se alguma mulher chamada Soraya trabalha aqui.

- Se ela não estiver sentada na mesa ao lado do piano, fumando, ela está lá em cima, mas não vai demorar. – Respondeu atento as manchas de sujeira do copo.

Olhei em volta até procurar a mesa ao lado do piano.

Estaria vazia se não fosse um cinzeiro de ferro, bem ao centro da mesa. – Eu vou aguardá-la. – Caminhei pelo balcão até encontrar um banco que não incomodasse a anágua do meu vestido.

Mas me assustei, quando encontrei Francis caído no canto.

Corri para acudi-lo. – Francis... – Ele acordou com o meu balanço.

Não apenas estava embriagado, como muito ferido também. Em uma das mãos segurava um punhal, sujo de sangue. – Eu pensei que passaria a semana longe. Onde está a minha filha?

Ele secou seus lábios úmidos pela baba que escorria de si. – Senhora Hightopp. – Ele mantinha uma expressão de desgosto. – S-sua filha? Acha que sei de sua filha?

- É o marido dela. – Me levantei junto ao soldado, que se levantava com a ajuda das pernas de madeira da banqueta ao lado. – Deveria saber.

- Eu adormeci na carruagem e Valentina sumiu em nossa núpcias, quando me pediu que retornássemos a Marmoreal. Desde então eu estou aqui, bebendo as mágoas de um casamento que nem mesmo foi consumado.

- Ela atravessou o espelho. – Sussurrei. – Gilbert não me contou. Talvez ele não saiba que ela está em Londres. – Eu olhei para o marido de Valentina, ele tomava os últimos goles que restou de sua bebida, a essa altura quente. Observei seus ferimentos, e a faca suja, agora sobre o balcão. – Brigou com Gilbert.

- Ele me viu aqui e simplesmente começou a me atacar, disse que eu não fui capaz de fazer com que Valentina o esquecesse. Havia algo... – Ele tocou a testa, se esforçando para lembrar. – Algo errado na cor de seu olho. Estava laranja como o entardecer.

- Você viu com quem ele estava? – Francis assentiu, ele olhou para as escadarias e eu segui o seu olhar.

- Estava com ela. – Apontou para a meretriz fumante que descia os degraus.

Ela não era como imaginei.

Para começar, tinha uns dez anos a mais do que eu.

Embora a idade não lhe trouxesse prejuízos. Ela era bonita, cabelos longos, presos a um topete alto que livrava apenas algumas mechas, caindo em cascata por seu rosto. – Por favor, podemos conversar? – Eu a parei nos últimos degraus.

Ela mantinha uma expressão de desprezo e desdenho para os poucos homens daquele lugar.

Mas bom, para mim, ela soltou a fumaça de sua piteira e me olhou com pesar. – É a Alice? – Assenti. – Venha. – Ela subia as escadas outra vez.

Eu a segui para um quartinho vazio.

Era a primeira vez em que eu entrava em uma taberna como essa. – Você é como Gilbert descreveu. – Ela abaixou minha capa. – É linda.

- O que sabe sobre ele?

- Ele sempre vem aqui para me procurar.

Aquiesci. – Eu não sabia disso. – Tentei não corar. – Me poupe de certos detalhes.

- Não... – A mulher balançou a cabeça. – Pode ficar tranquila, não lhe direi nada a respeito disso. – Ela soltou a fumaça outra vez. – Seu filho é um rapaz maravilhoso, que precisava de alguém para ser ouvido. – Ela se sentou do meu lado. – Ele disse estar arrependido de não ter impedido Enid de entrar no relógio.

Peguei sua mão, meu coração doía. – P-por quê?

Ela se levantou. – Ele disse que isso fazia parte do seu destino. O destino dele de não existir. Se ele não existisse, não estragaria a vida da irmã e não arruinaria a sua família.

Fechei os olhos. – Tarrant. – Murmurei com dor. – Por que foi dizer isso a ele?


Notas Finais


Alice com dor do bebê e super desconfiada por Gil descobrir sua gravidez com tanta facilidade, com certeza nessa cabecinha fertil vai rolar algum pensamento maluco e mirabolante quanto a isso.

A criada gostou do nosso menino incompreendido hahah shippam?

Gil com crise de existência e cada vez mais doente. Algo aconteceu para que ele desistisse de tudo, o que acham?
No último capítulo postado ele e a Val não estavam se dando bem. Alguma teoria? =/
Acham que Tarrant tem culpa pela mente perturbada do Gil? Ou o maior culpado mesmo é o vilão? Ah e eu não esqueci do Hamish.
Mt menos do valete <3

Será que o Gil não deveria mesmo existir? Será que o certo mesmo teria sido a Alice perder ele no aborto?

Mts perguntas eu sei.
Comentem mt!


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