Dante pov.
– Só não repara a bagunça, não deu tempo de arrumar aqui antes de sair. – Arthur fala enquanto recolhe algumas roupas jogadas no sofá e as leva até seu quarto, acho que ele também teve dúvidas sobre o que vestir hoje.
Sorrio de lado e o acompanho com o olhar enquanto ele tenta “organizar” as coisas. – Arthur, ei, eu já vim aqui hoje, lembra? Aliás, eu venho aqui toda semana, não precisa se preocupar com bagunça não.
– Eu sei, mas você sempre vem aqui como meu aluno. – Ele explica, percorrendo os cômodos da casa, catando algumas coisas aleatórias que estavam fora do lugar e as guardando. – Hoje é diferente, você tá aqui como minha visita. – Arthur finalmente para de andar para lá e pra cá e se volta em minha direção, com as mãos na cintura. – Pronto, agora sim, fica à vontade.
Rio de sua linha de raciocínio, desacreditado demais para contestar.
– Isso nem faz sentido, sabia? Eu já conheço sua casa, e conheço você, não me importo com bagunça.
– Pra mim faz sentido. – Arthur dá de ombros e passa por mim, indo em direção a cozinha. – Vem, vou preparar alguma coisa pra gente comer.
– Não precisa não Arthur, estou bem. – O acompanho até o cômodo, e o observo abrir os armários do balcão, um pouco mais desesperado que o normal, em busca de algo para comer. – E você tem que descansar, não precisa se preocupar com o lanche.
– Preciso sim, Dante. – Ele se vira em minha direção de repente, se alterando de novo. – Eu estraguei o nosso rolê, eu… eu prometi a ti que iríamos nos divertir e estraguei tudo. Por favor, deixe eu fazer isso.
Arthur engole em seco e me encara, noto que ele está tentando não chorar e fico sem reação. O que está acontecendo? O que será que desencadeou essas crises nele? Será que foi algo que eu disse?
– Arthur… Arthur, olha pra mim. – Me aproximo dele, que voltou a fuçar os armários incessantemente, e tento atrair sua atenção para mim. – Vamos até a sala, ok? Vamos sentar no sofá. – O guio até o sofá e ele se senta, ver seu olhar vazio e perdido faz meu coração doer, mas me mantenho firme.
– Certo, está tudo bem viu? Vai ficar tudo bem. Você está seguro. Agora, tenta respirar junto comigo, certo? Vamos.
Faço os movimentos de inspiração e expiração por algum tempo e ele me acompanha. Aos poucos, consigo perceber suas mãos, antes contraídas, relaxando e a ansiedade diminuindo.
– Consegue falar? – O baixinho acena com a cabeça de forma afirmativa. Não resisto ao impulso e limpo seus olhos marejados com as costas da mão. – Certo, você sabe onde está?
– Em casa. – Sua voz sai embargada, baixa como um sussurro.
– Sim, está em casa. Você pode me descrever o que vê em sua volta?
Outro aceno de cabeça, então ele olha ao redor:
– Vejo um… um quadro de uma caverna. Vejo uma tv. Uma… almofada verde. – Vou acenando a cada item que ele lista, o encorajando a continuar. – Um boneco do Força G. Um Dante.
Arthur aponta para mim e sorri fraco, sorrio também, aliviado por ele estar um pouquinho melhor, pelo menos o suficiente para fazer piadinhas.
– Sim, também tem um Dante na sala. Como se sente agora?
Sem respostas. Ficamos em silêncio por alguns minutos, respeito o tempo do Arthur e espero ele falar algo.
– Eu posso… posso te abraçar de novo? Igual antes?
– Claro, Arthur. Vem aqui. – Abro os braços e o vejo se aconchegar em meu peito, seus braços se firmam ao meu redor com força. Alcanço seus cabelos e faço um pequeno cafuné enquanto o abraço.
Desde o dia que conheci o Arthur, sempre o interpretei como uma pessoa radiante, animada, do tipo que nunca se abala com nada.
Mas agora, vendo ele agarrado firmemente a mim, fungando em uma vã tentativa de segurar suas lágrimas, vejo o quão rasa foi minha visão sobre o pequeno.
Nesse súbito momento de clareza, percebo o quão forte o Arthur é, e o quanto ele tenta ser todos os dias.
E essa simples percepção dele me faz admirá-lo ainda mais. O Arthur foi uma das melhores pessoas que já conheci, e eu vou fazer o que estiver ao meu alcance para cuidar dele.
Faço um leve carinho em suas costas para confortá-lo, e murmuro:
– Pode chorar o quanto precisar Arthur, não tem problema. Vai te fazer bem. Eu estou aqui contigo.
E ele o fez. Aconchegado em meu abraço, Arthur colocou toda aquela angústia para fora e se permitiu chorar.
Vê-lo assim, tão vulnerável e machucado me faz querer guardá-lo num potinho. O abraço com força e fico em silêncio, ouvindo seus soluços e, sem perceber, pego no sono.
Não sei quanto tempo ficamos ali abraçados, mas me espanto ao acordar e ver o Arthur dormindo agarrado a mim. Seu rosto sereno e adormecido me faz querer não acordá-lo, sinto meu coração acelerar novamente, como em quase todas as minhas interações com o guitarrista.
Num impulso, levo minha mão em direção aos seus cabelos para os acariciar, mas me contenho no meio do caminho. Por mais que eu tente, não consigo mais ignorar esses sentimentos desconexos que me assolam quando estou com ele.
Isso não parece certo, o Arthur é meu amigo. Eu não deveria estar sentindo essas coisas por ele. Por que ele me causa tantos sentimentos diferentes? Isso é tudo tão confuso.
Eu me sinto culpado por isso, me sinto mal por não entender o que estou sentindo e sinto medo de perder ele, logo ele que se tornou tão importante para mim. Apenas pensar na possibilidade de perdê-lo já me faz ter vontade de chorar.
Com o coração apertado, apoio o Arthur no sofá e me distancio um pouco antes de acordá-lo. Limpo meus olhos marejados e o chamo:
– Arthur. Ei, Arthur. Está ficando tarde, eu preciso ir embora.
– Hmm. Já já. – Ele resmunga e se vira para a direção oposta. Chamo seu nome novamente e espero ele responder. Arthur resmunga de novo, ainda com os olhos fechados:
– Já tá tarde Dan. Cê precisa ir mesmo? Dorme aí.
“Dan”. O aperto em meu peito aumenta, eu não deveria gostar tanto do apelido que ele me deu e definitivamente não deveria gostar da forma que meu nome soa em sua voz.
– Eu preciso ir mesmo. Amanhã eu vou trabalhar, se não fosse por isso eu ficaria aqui.
– Certo, okay. – Arthur se levanta do sofá, todo molenga, e se arrasta até a porta, pego minhas coisas e o sigo.
– Toma cuidado viu, tá tarde, pode ser perigoso.
– Pode deixar. Boa noite, Arthur.
– Boa noite. Ah, e… – Me viro e o encaro, mesmo na escuridão da noite, consigo ver o rubor em seu rosto. Brincando com os aneis em seus dedos, ele sussurra, tímido:
– Ahn, obrigado. Por tudo. Você é um amigo incrível.
Suas palavras me atingem com força, e doem de um jeito incompreensível. Quero chorar, mas não posso chorar, não aqui, não agora.
Não me entenda mal, me sinto feliz por ter ajudado o Arthur, me sinto feliz por ter conseguido acalmá-lo durante as crises e realmente me sinto aliviado por ele estar bem.
Mas, ainda assim, por algum motivo, ouvir ele me chamar de amigo me deixou frustrado pra caralho. Engulo em seco e sorrio falsamente, não quero preocupá-lo com minhas confusões.
– Não precisa agradecer. Tchau Arthur. – Saio dali depressa, segurando as lágrimas que insistem em querer cair.
Chego em casa e vou reto em direção ao meu quarto, ignorando totalmente a Beatrice na sala, atordoado demais para conseguir responder qualquer pergunta que ela possa ter feito.
Tranco a porta e me sento na cama, abraçado aos meus joelhos. Nem um minuto depois, ouço a batida característica da Bea na porta, 4 toques suaves e ritmados.
– Mano? Tá tudo bem? O que aconteceu?
Respiro fundo antes de responder, não quero que minha voz soe falha ou embargada. – Está tudo bem, Bea. Eu só preciso ficar sozinho um pouco. – Silêncio. Nenhuma resposta. – Por favor.
– Tá bom, tá. Mas me chame se precisar de qualquer coisa, okay? Te amo, mano.
– Te amo também, obrigado. – Ouço seus passos se distanciando da porta e, finalmente, deixo as lágrimas rolarem pelo meu rosto.
O coração acelerado. O arrepio a cada toque. A euforia em ouvir o apelido. O aperto no peito. O medo subito. A decepção depois de ser chamado de amigo. Eu nunca senti nada parecido antes, e tudo isso é demais para mim. A culpa me consome cada vez que meu coração acelera perto dele e eu não faço ideia do porquê.
Eu não sei lidar com tudo isso, não sei lidar com essa angústia e não sei porque me sinto tão errado em relação ao Arthur. Tudo é tão agoniante e confuso.
Ouço o som de notificação do meu celular e me deparo com uma mensagem. Seu nome brilha na barra de notificações e sinto uma pontada no peito quando leio.
“Espero que tenha chegado bem.”
“Obrigado de novo Dan, boa noite.”
Por que, Arthur? Por que você me deixa tão bagunçado?
Sem ter forças para responder, bloqueio o celular e deixo o choro cair enquanto a ânsia me consome. Depois de um bom tempo, adormeço de cansaço.
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