História Atlas - (2T) Está tudo bem, pequena

Alessia Blair Z.

17 de novembro

Então faltavam uma semana e meia para o grandioso casamento.

A casa estava cada dia mais louca e até sexta mais pessoas chegarão. Felizmente, Thiago viria hoje. Eu estava com Aurora no colo, prontas para irmos até São Paulo, quando Felipe entrou com uma cara atordoada.

— Caralho, o que foi dessa vez? — bufei, pegando minha bolsa. Aurora sorriu ao meu lado.

— 50 centavos — então Felipe a deu o dinheiro. Ela pareceu empolgada. Como previsto, já passava de 100 reais o valor que ela acumulou com meus palavrões.

— O DJ deu pra trás. Preciso que você e o Rafael vejam isso juntos — eu provavelmente estava de TPM, porque aquilo me irritou muito.

— Aurora,  vai lá perguntar a tia Gabs por que o seu pudim não tá pronto — soltei ela em direção a porta do nosso quarto.

— Mas, mom...

— Vai, Aurora — disse de modo rude. Ela assentiu e saiu. — Qual é o planinho de vocês? Tudo que eu faço tem que ser com Rafael. Seja por causa desse negócio de madrinha ou porque minha filha infelizmente é apaixonada por ele. Isso está acabando com meu emocional. Você sabe que gosto dele, por que está me obrigando a ficar junto com ele?

— Não tem planinho — ele disse inocente. — São atividades do casal de padrinhos desempenham junto.

— Meu cu — bufei. — Conversei com a cerimonialista, irmãozinho. Ela falou que a gente não precisa fazer metade do que estamos fazendo.

Então Felps se calou. Peguei-os no flagra.

— Vai se foder. Eu preciso ver Thiago, prometi que o buscaria. Mande alguém no meu lugar ou deixe pra amanhã — sem esperar resposta, saí com a chave do carro dele disposta a me afastar daquilo. Sentia falta da calmaria de NY, queria voltar para minha vida segura e sem o risco de perder minha filha para o pai dela. Eu estava estressada e sufocada, precisava da minha válvula de escape. Eu precisava de Thiago aqui e agora.

Logo o corpo esguio de Thiago surgiu, se despindo do suéter que NY exigia. Ele me viu e apressou o passo com seu sorriso estúpido no rosto.

— MEU DEUS EU AMO VOCÊS — ele disse, me abraçando e pegando Aurora no colo sem seguida. Ali estava minha família.

— Daddy, I miss you so much — minha pequena filha falou. Senti um arrepio me percorrer.

— Me too, little princess — nessa hora a saudade de casa apertou.

— Eu também senti sua falta, babaca, muito mesmo. Pode largar minha filha e me dar atenção também?

Thiago apenas riu. Ele me abraçou outra vez e eu resisti ao impulso de procurar refúgio em seus lábios.

Começamos a compartilhar experiências, principalmente ele e Aurora. Ri bastante e na metade do caminho, ela dormiu.

— Vamos lá, na escala de bad, em que nível você está?

No dia em que eu dei entrada no hospital para Aurora nascer, criamos a escala da bad, porque naquele mesmo dia, Trice e Thiago se falaram e ela apenas soube o xingar e o chamar de egoísta. A escala da bad consiste em 10 níveis. Eu nunca cheguei ao 10.

— Estamos num 8 — sorri.

— Ah, até que não está tão ruim — Thiago sorriu, acariciando minha coxa.

— Eu descobri que a Trice vem sábado. Tem uma janta de noivado com alguns convidados. Você está pronto?

— Não — disse apenas. Encarei-o perplexa.

— Como você demonstra fraqueza fácil assim?

— Eu sou humano, eu sofro, nada nem ninguém é perfeito.

Assenti, sentindo meu nervosismo aparecer. Acabamos falando sobre minhas aventuras com Rafael na última semana.

— Você acredita que nós cheiramos mais de 200 flores? E nem serão essas que vão ser usadas!

Thiago riu daquela maneira idiota dele. Sentia falta dele. Eu nunca deixaria de admirar o “Calango adulto”. Seu sorriso alinhado e sua postura impecável o deixavam confiante. Continuava a mesma besta de Uberlândia, mas agora já viajou boa parte do mundo comigo e Aurora.

Chegamos na mansão e ele abriu a boca em um O surpreso.

— Você nunca me convidou para vim aqui, sua falsa do caralho — ele disse abismado.

— Grande né? Meu pai era bem exagerado — Ele assentiu bobo. Estacionei o carro e Thiago pegou Aurora no colo, como bem gostava de fazer. Subi com ele para mostrar onde era nosso quarto. O jeito que ele segurava Aury era a coisa mais linda do mundo. Seu corpo miúdo parecia frágil para ele. Sem notar, Thiago fazia cafuné nela.

— O bonita, só pra lembrar que tua filha tá pesada — ele bufou. Abri a porta sorrindo e vi que Rafael observava aquilo com um misto de ciúmes.

— Psiu — Thiago disse, depois de largar Aury na caminha dela. Fechei a porta e me atirei na cama.

— Ih, lá vem — bufei irritada. Thiago se deitou, me envolvendo e dando um jeito de fazer carinho na minha cabeça. Eu amava muito ele.

— Rafael e a Aurora estão realmente tão próximos assim? O jeito que ela falava dele... Isso não se faz, Les.

— Eu não tenho culpa! Ele que resolveu ser um fodido. Não começa você também. Já ouvi sermão da Gabriela, faça-me o favor de não me xingar também.

— Isso foi no passado. Se ele descobrir por conta própria, será pior — ele disse, depositando um beijo na minha testa.

— Ele não vai descobrir. Vamos voltar para NY e ser a mesma família linda de sempre — virei para encarar ele. Thiago aproximou nossos rostos e me beijou ligeiramente. Naquele ato eu soube: ele estava com tanto medo quanto eu. Nosso Reino de papel estava prestes a ser derrubado.

Sexta-feira chegou tão rápido quanto a segunda depois de finais de semana. Quando ver, estávamos em mais de 15 pessoas na mesa. Eu sentia tanta falta deles. O número cresceria até domingo que vem.

Haviam chegado também T3ddy, Luba, Pk, Guaxinim, o Léo (!!!!!!!!!!!), Phoenix, e mais gente que estou com preguiça de lembrar quem são.

A mesa era cheia de confraternização e as perguntas se focavam na minha filhinha. Ninguém imaginava que eu teria uma filha e que ela tivesse de mim apenas os olhos.

Thiago me ajudou a responder e mudar o foco rapidamente, contando de seu estágio na Netflix. Aurora se sentia muito incomodada com as perguntas, mas logo Rafael a fez rir falando de boca cheia.

Confesso que tanto eu quanto Thiago estávamos com ciúmes daquela proximidade dos dois. O almoço acabou e, por ser “folga”, todos se dispersaram. Fui para a piscina com Aury, Thiago, Mae e Rafael.

— Então, faz tanto tempo que a gente não se fala — Maethe disse, se espreguiçando. Ela se dirigia a Rafael. Aurora ouvia música em seu celular.

— La vem bomba, só esperem — Thiago zoou rindo.

— Como tá a Érica? — Maethe falou para Rafael. Ele endireitou a postura. Lá vem.

— Ela está bem. Felipe me contou que ela vem para o jantar de ensaio.

— Quem é Érica? — disse. Mae olhou para Rafa como se pedisse autorização e falou.

— A ex-namorada de Rafael.

Então Rafael conseguiu namorar sério? Que legal. Muito legal mesmo.

— Ah sim — assenti, sorrindo falsamente.

 — Ela também é a secretária da nossa empresa — Rafael disse, envergonhado. Para, ele nem deve ter percebido minha cara de cu.

— Então, vocês viram que ensolarado o dia está? — Thiago falou, causando risadas em todos.

O resto da tarde consistiu em vários nadas. Até que a janta chegou. Todos se sentaram a mesa — novamente — e comeram no mesmo clima de boas. Depois que Aurora e Gabriel (o filho adotivo de Luba e Leo) foram dormir, nos juntamos na beira da piscina para conversarmos e por as coisas em dia.

Eu tinha tanto a falar e tanto a ouvir que já estava atordoada. Outra vez ouvi o nome Érica, ela era mesmo tão importante assim?

Bem, amanhã vou descobrir.

18 de novembro

15:45

— Caralho Gabriela, cala a boca — gritei. Ela caiu no sofá rindo. — Por que você está rindo desgraça?

— O jantar é meu e a estressada é você! — ela riu ainda mais.

— Você e o Felipe me estressaram, sua vagabunda.

— Relaxa e vai beijar o Rafael — ela sorriu irônica, através do espelho.

— Se você falar disso mais uma vez eu vou te bater. Acho que não vai te corretivo que esconda o roxo que vou deixar no teu olho — sorri de volta. Ela assentiu e se concentrou em fazer nada.

Aquela lembrança parecia vivida em minha memória, repetindo em um looping infinito. Thiago foi dormir assim como a maioria do povo, mas eu precisava beber mais e acabou ficando apenas eu, meu irmão e sua noiva e Rafael. Eles nos deixaram sozinhos e eu decidi ir para o quarto.

“— Les, espere — ele levantou, vindo até mim. Estávamos os dois embriagados.

— O que foi? — virei rápido, ficando mais perto que o desejado de Rafael.  

— Olhe a lua — ele apontou. Senti um arrepio percorrer minha espinha. Eu lembrava do dia do café. Aquele dia eu tinha certeza que amaria aquele sorriso.

— Linda, não é? — repeti sem querer. Ele deu o mesmo sorriso torto. Ficava lindo no rosto dele.

— Você cheira a problema, Les — ele sussurrou, encostando nossas testas. Nosso reflexo refletia junto com a lua na piscina.

—  Não é hora — suspirei me afastando.

— É sim. Sempre é hora de fazer o que queremos. Não vou cometer o mesmo erro de novo.

Então nossos lábios se tocaram e foi como se eu tivesse passado os últimos 5 anos sem beijar. Senti explosões de sentimentos no meu interior, além daquele friozinho na barriga. Assim que ouvi o barulho de um celular, separei o beijo. Eu e Rafael viramos nossos rostos sincronizada e automaticamente.

Gabriela e Felipe sorriam com seus celulares apontados para nossos rostos. Filhos da puta.”

E desde aí estou puta com eles.

— E essa cara de babaca? Tava lembrando do beijo no Rafinha, né? — Não me controlei e atirei uma almofada na cara dela.

— Vai tomar no seu cu, Gabriela — gargalhei. — Você tá muito escrota, vou por sertanejo se você não parar de ser chata — encerrei.

— Experimenta para ver, otária.

Quase disse que já tinha experimentado demais, entretanto, minha filha apareceu correndo. Atrás dela, Rafael tentava segurá-la.

— Desculpa, meninas, mas ela fugiu e disse que queria ficar aqui.

Acabei pegando ela no colo. Sua cara de choro denunciava algo errado.

— Qual é o problema, meu amor?

— Uma mulher me xingou enquanto o tio Rafa pegava suco para mim na geladeira. Ela disse coisas horríveis sobre você e sobre mim. Ela disse que sabia seu segredo e só estava esperando as coisas darem certo para você, aí ela ia estragar tudo! — Aurora parecia muito aterrorizada. Quem podia ser capaz de ameaçar uma criança?

— Está tudo bem, pequena — Rafael veio e acariciou a cabeça dela. Gab deixou um sorriso surgir no rosto dela ao ver nossa ceninha. Droga.

— Não se preocupe, filha. Deve ser alguém brincando com você. Ninguém sabe nada sobre a mamãe e você é incrível, nunca deixe que te digam o contrário.

Ela assentiu e sorriu. Me forcei a sorrir também.

No fundo eu sabia que as coisas estavam prestes a dar muito errado.