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História Cachecol Yaoi - O Cachecol que não existiu


Escrita por: Taimokio

Notas do Autor


Preparados para o último capítulo?

Capítulo 12 - O Cachecol que não existiu


Fanfic / Fanfiction Cachecol Yaoi - O Cachecol que não existiu

Estávamos deitados ali. Eu estava de costas para o teto o encarando. Ele estava de peito para cima olhando para a madeira do teto. Parecia pensar muito... não tinha como saber o que se passava em sua cabeça.

— Sabe... André... você é o meu melhor amigo. — Digo com um sorriso calmo e sincero no rosto.

— Todos nós somos amigos. — Ele diz e sorri fraco.

Depois de eu ter dito aquilo, ele apenas ficou quieto olhando para cima. Me senti um pouco triste e recebi alfinetadas com uma dor próxima do coração. Estranhamente ele tinha ficado silencioso.

Aquela foi a última vez que nos vimos.

— Você gosta de uma das meninas? — Digo.

— Que meninas? — Ele diz.

— Ana ou Julie. — Digo.

— Quem são essas? — Ele diz.

Lágrimas escorreram dos meus olhos e pingaram diretamente no lençol da minha cama. Olhei para o lado e ele não estava mais ali. Entre soluços intensos, coloquei a mão onde ele estava deitado e tentei sentir seu calor.

Escutei batidas grotescas na porta do meu quarto.

— Filho, você não vai vir jantar?! — Minha mãe diz.

— Já vou. — Digo tentando parecer firme e bem.

— Vem logo. Você não faz nada o dia todo. Ficou o ano todo sem estudar porque não conseguiu passar na faculdade e agora vive jogando. Pelo menos jante com a sua mãe que te sustenta. Você nunca mais fez isso. — Ela diz com raiva e vai embora.

Gabriel deitou por cima de mim e me abraçou por trás.

— Eu te protejo. — Ele diz.

Fiquei corado por instantes, mas logo minhas bochechas voltaram ao normal e meus olhos se tornaram frios.

— Você não existe. — Digo.

Sozinho no quarto, levantei e fui até a mesa do meu notebook. Peguei um papel com caneta e comecei a escrever uma carta. As lágrimas não paravam de cair dos meus olhos. Eu não acreditava que faria aquilo, e tinha medo.

Por um momento, parei de escrever e abri o bate-papo de minha melhor amiga virtual. O nome dela era Giulia, e ela era muito parecida com a Julie. Digitei:

— Giu... eu estou triste. Não sei mais o que fazer. Se acontecer alguma coisa, me desculpa, tudo bem?

Depois disso, enviei uma carinha de coelho para ela. Tínhamos combinado um código secreto de amizade. Toda vez que enviássemos uma carinha de coelho fofinha significaria que nos preocupávamos um com o outro independente da distância. Ela apenas visualizou a mensagem e não respondeu uma só palavra.

Fiquei folhando a lista de amigos e não achei mais ninguém com quem pudesse contar. Minhas amigas, todas elas virtuais, estavam sempre ocupadas com alguma coisa de escola, e nunca tinham tempo para mim. Pensei naquela hora que a Giulia realmente não se parecia com a Julie, pois essa amiga sempre se preocupava comigo e estava todas as horas disponível.

Passei horas jogando e esperei minha mãe dormir. Quando ela foi dormir, fui jantar. Depois, escovei meus dentes e voltei ao quarto. Continuei jogando a madrugada toda e dormi demais como sempre fazia. Minha mãe foi à escola como diretora enquanto eu dormia o dia e a tarde inteiros. Acabei sendo acordado bruscamente por ela, mas continuei jogando e seguindo a mesma rotina de jantar quando ela estivesse dormindo.

A madrugada chegou novamente, e meu pai tinha mandado uma mensagem no celular:

— Saudades de ti, meu velho.

É claro que eu também estava com saudades dele, mas meu pai sempre foi violento e ainda não aceitava por completo eu ser gay. Desde que levei meu ex-namorado para visita-lo comigo um ano atrás e ele não gostou, eu nunca mais o visitei novamente. Sempre tive medo de ele me agredir, e não confiava nas suas mensagens de amor, mas era esse o pai que na infância se atirou no esgoto para salvar meu bloquinho de notas que tinha caído; era esse o pai que estava sempre sentado na sala comigo assistindo filmes; era esse o pai que se emocionava e me dava total atenção com qualquer vídeo novo que eu tivesse encontrado; era esse o pai que tinha vergonha de dizer que faria tudo por mim, mas fazia tudo e mais um pouco; era esse o pai que ambos brincavam e xingavam um ao outro. Meu pai sempre sorriu.

Apesar da infância ter sido boa com o meu velho, eu não tinha nenhum amigo na minha primeira escola. Quando meus pais estavam casados e eu era bem novinho, morávamos em uma casa bem pobre no interior em uma floresta. Fui criado como um “garoto do mato”, e não sabia nem sequer como se colocava os lábios para tomar uma garrafa de água. Tudo mudou no dia em que eu comecei a estudar. Não tinha feito pré-escola e nem participado do jardim de infância, e ainda por cima comecei a primeira série com minha mãe dando aula diretamente para mim.

No meu segundo ano de estudos, meus pais se separaram e eu decidi morar com ele, pois era sempre mais divertido e atencioso comigo. A escola nova e a cidade grande eram assustadoras. Pessoas me olhavam de todos os lados. Consegui fazer apenas uma grande amizade. O nome da garota era Michele, e ela era minha vizinha. Minha tia a apresentou para mim quando a pegou colhendo tomates na horta próxima de nossas casas.

Eu seguia a Michele por todos os cantos. Não parava de copiar os movimentos dela, e tinha medo de atravessar a rua sozinho. Ela se divertia dizendo que eu era um chiclete. Brincávamos sempre um na casa do outro, mas na escola eu não podia me aproximar dela. As meninas eram separadas dos meninos pelas próprias crianças. Se eu me aproximava dela, eu teria de ficar próximo de suas amigas também, e elas detestavam que meninos se aproximassem. Minha aparência parecia muito feminina, e isso acabou afastando os garotos de mim.

Os únicos garotos de quem eu conseguia me aproximar, eram aqueles que roubavam o meu lanche feito com carinho por meu pai. Eles eram pobres, e por isso eu os perdoava. Eu era apenas um garoto covarde, tímido e solitário na época. Minhas notas não eram nada boas, mas meu pai me ajudava tanto que eu comecei a mudar. Me tornei mais inteligente por ser solitário. Ninguém conversava comigo, exceto para fazer brincadeiras de mal gosto. Por não ter contato com os colegas, acabei conseguindo prestar total atenção nas professoras, com isso ficando mais inteligente.

Minhas notas subiram muito e eu passei a ser considerado o menino mais inteligente da turma, embora não fosse. Ninguém me conhecia e nem conversava comigo, e meu jeito quieto me fazia parecer inteligente, mas na verdade eu era só um garoto normal.

Meu pai finalmente comprou um computador para mim, e logo após, colocou a famosa internet. Esse foi um dos pontos cruciais de mudança para minha vida, e que a marcou completamente. Aos poucos fui parando de visitar a Michele, parando de andar de bicicleta e parando com todas as coisas divertidas fora de casa. Me isolei do mundo e me deslumbrei quando conheci amigos virtuais. Eles eram tão incríveis, e eu podia senti-los perto de mim com muita facilidade. Aguentei anos sozinho apenas por ter amigos virtualmente.

Aos poucos toda a emoção foi se esvaindo com o peso da solidão. Assistia seriados em que mostravam amizade entre amigas, e queria aquilo para mim. Era tão triste ver todos os meus colegas marcando planos enquanto eu apenas podia ouvir. Foi aí que a raiva começou a tomar conta de mim. Os amigos da internet não mais conseguiam me tocar, e nem eu senti-los. Passei a me rebelar na escola e briguei com a professora de inglês de verdade. Não pude ser tão corajoso como em minhas imaginações e nem a enfrentei na frente de toda a turma — também muito menos tive apoio de amigos —, mas senti adrenalina ao ignorar a oferta de trabalho em grupo da mesma e desprezar sua forma de ensino em redes sociais.

Eu sempre tive esperança, e depois de me rebelar, resolvi morar com minha mãe. Queria a todo custo fazer amigos, e não tinha outra escola na cidade de meu pai, sendo uma nova escola o motivo principal de eu trocar o meu lar.

Na nova escola, consegui fazer um amigo, e me apaixonei pelo mesmo. Até consegui namorar com ele, mas ele não me amava de verdade e estava “descobrindo” sua bissexualidade. Ele apenas me usava para sexo e nada mais. O namoro era irritante para ele e o tal sempre queria terminar comigo. Com pavor de ficar sozinho de novo, insistia e me humilhava para continuar o relacionamento, mas chegou o dia em que eu não pude mais insistir.

Chorei muito abraçado nele o dia todo. Eu queria tanto que desse certo. Era meu primeiro homem amigo, melhor amigo e namorado. Ele me visitava, assistia coisas que eu gostava, jogava comigo e me fazia companhia na escola. Nunca tive ninguém assim, e não queria que aquilo acabasse de jeito nenhum. Não consegui parar de chorar e ele não sabia o que fazer.

Comecei a namorar um garoto virtualmente. Ele era especial para mim, pois o mesmo queria me visitar pessoalmente. Ele até me enviou um cachecol azul por correio, mas eu não o amava. Apenas tinha me encantado por pela primeira vez alguém ter dito que iria me visitar. Terminamos o namoro e eu nunca mais me aproximei de ninguém por medo de acontecer algo errado de ambas as partes.

Concluí o ensino médio e não consegui ingressar em uma faculdade, pois minhas notas não tinham sido muito boas e minha mãe não tinha dinheiro para pagar o curso de computação que eu queria. Com isso, fiquei um ano inteiro sem fazer nada, apenas jogando e imaginando como seria minha vida se eu tivesse os amigos que tanto sonhei desde a infância.

Eu teria quatro amigos: André, Julie, Gabriel e Ana. Um deles seria um bad boy bastante lindo e sempre notaria minhas necessidades sentimentais. O outro seria um homem grande e de bom coração, eu nunca conseguiria me decidir sobre namorar o malvado ou o gigante. Minha amiga loira seria sempre divertida e animada, e Julie seria dócil e correta.

Permaneci sozinho por muito tempo e lutei por muito tempo. Não consegui me livrar da solidão desde a infância. Isso já me corrompeu. Não mais sinto os pássaros, as cores e os jogos. Nada mais é tão interessante na vida, e eu sei o porquê. Quando nos magoamos várias e várias vezes, a vida vai perdendo o valor e as cores. Chama-se depressão. No fim, não pude aguentar.

— Já está na hora de parar de pensar... — Digo.

Peguei o papel e comecei a escrever: “Quando você tiver um amigo, sorria. Sorria apenas por ter um amigo e por ele estar perto de você. Faça sempre as pazes com quem se importa com você. Não brigue por motivos bestas e se sacrifique por eles. Você não sabe a dor de viver sozinho a vida toda, então valorize cada um dos que são próximos. Ria das piadas de sua Ana; siga os conselhos de uma Julie; enxergue o coração bondoso de um Gabriel; entenda o valor que algum André te dê. Você pode aguentar tudo quando as pessoas estão ao seu redor. Se um dia seus amigos virtuais não mais te ajudarem, mude a sua vida e tente de novo fazer amizade com qualquer um. Não acabe como eu. Não acabe tendo que se forçar a imaginar melhores amigos e situações que te deixariam feliz. Valorize aqueles que estão perto, e lembre-se: sempre sorria para o próximo. ”.

Fui até o quarto de minha mãe e peguei sua espingarda debaixo da cama. Ouviu-se um barulho de tiro e de alguém subindo as escadas correndo.


Notas Finais


Capítulo baseado em fatos reais.
Espero que gostem.
Obrigado por terem acompanhado a história!


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