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História Clocks - Reencontros


Escrita por: versoacabado

Notas do Autor


Oláaaaaaaaa!

Como vão todos? Espero que ainda lembrem da fic. Então... Era pra eu ter postado há mais tempo, mas... bem, eu enrolei, desculpem :( E então fui viajar, escrevi outra fic (ops :O), mas enfim estou aqui!
Bem, não tenho muito o que dizer. Só que agora começamos a tentar resolver esse rolo que ficou entre o Reita e o Ruki. Tem ainda muita confusão entre eles, e até resolver isso... Vamos acompanhando!

Queria agradecer muito muito muito a todos que deixaram comentários e favoritaram no capítulo anterior! Acho que foi o capítulo mais comentado de Clocks até o momento, e eu fiquei com os olhinhos assim *___________* com cada um deles. Esse retorno que vocês me dão é importante demais pra mim, e podem ter certeza que eu valorizo cada linha que vocês me escrevem. Não fiquem com vergonha de comentar, mesmo que você não goste ou não consiga escrever algo grande, eu fico feliz demais quando vocês conversam comigo <3 Então podem conversar sim, tá? E eu me lembro de todos vocês u_u Até dos que somem. /autora stalker

Às leitoras sumidas que voltaram no capítulo anterior: saudades de vocês! Espero que continuem por aqui, hein!
A quem nunca tinha deixado comentário antes e resolveu sair do fantasminha camarada, vocês também são uns queridos!
Pra todo mundo que tá sempre aqui: ♥ ♥ ♥
Aos que favoritaram recentemente também, sejam bem-vindos!

Ainda não terminei de responder aos comentários todos, mas até amanhã espero dar conta. Como eu sempre digo, eu respondo tudo! Pode demorar, mas respondo com certeza! Então se você ainda não foi respondido, calma que o amor logo está chegando!

E beijo pra @thamiires que como sempre me deu várias opiniões até esse capítulo tomar a forma que tomou. Vocês não têm noção do processo de enrolação que ela tem que aguentar até o capítulo tomar uma vida. É muita perseverança e fé nessa autora que vos escreve XD

Sem mais, boa leitura!
Até o próximo, e bom feriado ♥

Capítulo 16 - Reencontros


[Ruki's PoV]

 

Se a vida fosse fácil e boa, dores sentimentais seriam como uma dor de cabeça: você toma um remédio, descansa um pouco e dali algumas horas já está bem de novo. Aquelas dores um pouco mais fortes seriam como uma gripe, demora alguns dias para passar mas você sabe que tomando a medicação certa logo você estará novo em folha.

Mas a vida não é fácil, e muito menos boa... Ao menos não o tempo inteiro, que seria o ideal, obviamente. É só que é impossível saber como curar uma coisa intangível, ou saber quando ela vai passar e se vai passar.

Certo, talvez seja um pouco dramático dizer que nunca vai passar. Mas alguém com um coração confuso e magoado tem total liberdade para um pouco de drama, já dizia o poeta.

Minha vontade era ficar na cama até o fim dos tempos naquela terça-feira, mas dormir e me lamentar não terminaria meus trabalhos pendentes nem pagaria minhas contas, então... É verdade que eu tinha o suficiente na minha conta para me fingir de morto em cima da cama pelos próximos anos, mas se eu quisesse que a situação financeira continuasse assim alguma hora eu teria que me levantar. Então com certo esforço e muitas ignoradas no despertador, 13h30 eu consegui me levantar da cama e rastejar para a cozinha em busca de um café milagroso para corações partidos.

Eu dizia coração partido, mas recordando a noite anterior eu não poderia afirmar que isso é o que estava acontecendo. Reita havia me magoado sim, e não estava certo ele ter escondido de mim o fato de ele ter uma namorada... mas ele não havia partido meu coração. Aquela conversa na verdade havia sido o contrário de um coração partido. Ele havia dito que gostava de mim. Corrido atrás de mim e se explicado...  se havia um coração partido aqui era o dele, a quem eu havia recusado e mandado embora. Pensando na situação de uma forma simples, é assim que as coisas eram... mas aquilo não era uma situação simples, se fosse eu não estaria com tanta dor de cabeça e com o coração tão pesado.

Porém eu tinha consciência de ter tomado a decisão certa. Não significava que não ia doer, de ambos os lados, mas a longo prazo era o melhor a se fazer. Tanto para ele quanto para mim.

E meu jeito de lidar com isso foi tentar me enfurnar em trabalho para ver se assim não pensava nele. Quanto mais distração eu tivesse para não ficar pensando, melhor. Porque é incrível como quando você não quer pensar numa pessoa, tudo tem relação com ela. Até olhar para o celular me deixava angustiado, já estava tão acostumado a receber mensagens dele a todo instante que a ausência delas me deixava com uma sensação de vazio no peito. Por isso larguei o celular de qualquer jeito dentro da bolsa, ignorando mais algumas mensagens de Uruha que eu vira chegar, e decidi ir para a loja e trabalhar até o cérebro entrar em curto circuito.

O problema é que... até o trabalho tinha a ver com ele.

Cheguei no estúdio às 15h e me isolei lá após ignorar Naoki, que estranhou meu horário de chegada e a falta de maquiagem e veio me bombardear de perguntas. Quando finalmente consegui me livrar do funcionário enxerido, tranquei a porta e coloquei meu tablet sobre a mesa de luz, logo acessando checklist de trabalhos pendentes.

O trabalho com prazo mais próximo eram justamente as roupas para o photoshoot da REDO, que eu precisava entregar até a reunião na próxima sexta-feira...

E Reita estaria novamente nessa reunião.

E eu não queria vê-lo novamente assim tão cedo. É claro que eu não poderia fugir dele para sempre, afinal, o ensaio fotográfico seria na semana seguinte e eu sempre participava de todo o processo nesse tipo de trabalho. Porque não era só um trabalho de design de roupa, ou eu só teria entregado o desenho e acabado ali. O motivo de gostarem de mim para esse tipo de trabalho é porque eu pensava o processo inteiro, desde o desenho à estilização de cabelo e acessórios do modelo no ensaio fotográfico, e eu mesmo fazia tudo: o desenho, a confecção e o trabalho de estilista no dia do ensaio.

Apesar de acabar ficando empacado no mesmo trabalho por várias semanas, como estava sendo o caso, eu gostava de fazer isso tudo. Mas só dessa vez eu estava arrependido de seguir essa linha de trabalho, já que eu inevitavelmente teria que encontrar Reita de novo...

E eu não o odiava, longe disso. Eu estava ressentido e magoado, mas eu nunca conseguiria odiá-lo. Mas eu sempre fui o tipo que precisa de distância para curar esse tipo de ferida, e vê-lo assim logo não ajudaria nada no processo.

Se bem que todo esse trabalho que eu estava fazendo para a REDO estava arruinando meu processo de melhora, já que eu não tinha saída naquela semana a não ser encarar as peças que eu estava fazendo sob medida para Reita e aquilo fazia lembranças voltarem à tona...

Lembranças da primeira vez que o vi e como ele estava estranhamente nervoso quando fui tirar as medidas dele. Será que ele já havia me achado interessante desde aquele dia? Será que foi naquele momento que ele sentiu... aquelas coisas todas que ele disse que havia sentido por mim? Quase como se eu fosse sua alma-gêmea...

Eu não conseguia deixar de achar curioso como havíamos nos envolvido tanto um pelo outro em tão pouco tempo, a ponto de eu estar mal desse jeito sem ao menos ter ido para a cama com ele.

Não tinha como negar que eu havia me apaixonado por ele. Aquela vontade de estar com ele, de conhecê-lo mais, a ansiedade por poder falar logo com ele, e o conforto único que eu sentia em sua presença misturado a um friozinho na barriga... Não importava que nos conhecêssemos há pouco tempo, se era possível que dois completos estranhos se apaixonassem imediatamente ao se verem por conta de um contador de pulso, porque eu não poderia me apaixonar por alguém em alguns dias também?

Eu não conhecia nenhuma história de pessoas se apaixonando sem a influência do contador, mas só porque eu não conhecia não quer dizer que era totalmente impossível, não é mesmo?

O contador nunca havia feito nada por mim, de qualquer forma. Apenas me decepcionar... Quando ficou vermelho na minha adolescência, e agora já adulto quando me aprontou essa brincadeira completamente sem graça de voltar a contar naquela noite de bebedeira.

Suspirei longamente, largando a calça que eu estava quase terminando sobre a mesa e me recostando de qualquer jeito na cadeira. Aquela tarde de trabalho não estava sendo nada produtiva. Eu não conseguia parar de pensar sobre Reita, sobre contadores, sobre essa confusão toda que estava acontecendo.

Minha mente repassava as coisas que Reita havia me dito na noite anterior, sobre ter sentido por mim coisas que ele nunca havia sentido por sua alma gêmea, sobre nunca ter se apaixonado realmente por ela.

Será que isso era mesmo possível? Apaixonar-se por alguém mesmo já tendo uma alma gêmea...

Meu contador havia resetado como se estivesse me dando uma outra oportunidade, que eu desperdicei estando bêbado e não me lembrando de nada. Reita dizia que gostava de mim, mesmo já tendo sua alma gêmea...

Será que havia a possibilidade da mesma pessoa ter mais de uma alma-gêmea? E uma delas ser mais compatível que a outra?

O que será que eu senti naquela noite da qual eu não consigo me lembrar? Se ao menos eu pudesse me lembrar...

Pensar nisso tudo estava me deixando tão frustrado que eu tinha vontade de chorar.

E foi nesse momento que meu celular abandonado dentro da bolsa resolveu tocar e me distrair daqueles pensamentos e daquela improdutividade. Levantei da cadeira, reparando que já estava escuro lá fora e eu não tinha feito quase nada, e procurei pela bolsa.

Quando encontrei o aparelho, notei que já eram 18h40 e o visor acusava uma ligação de Uruha. Eu já sabia o que vinha por aí, pois eu tinha ignorado suas mensagens desde o dia anterior, e Uruha não era uma pessoa que lidava muito bem com ser ignorado. Portanto nem ergui uma sobrancelha sequer quando aceitei a ligação e fui recepcionado com um tom extremamente sarcástico.

- Ah, então telefonemas você não ignora? Já tava achando que eu ia ter que mudar meu sobrenome pra Suzuki se quisesse ganhar um pouco da atenção de vossa excelência!

- Boa noite pra você também, Uru!

- E ainda me vem com “boa noites” fajutos? Apenas queria te lembrar quem foi que reclamou sobre ignorar os amigos por causa de macho quando eu conheci o Yuu. – Ajeitei o celular contra a orelha, rindo de leve do tom irritadiço de Uruha.

- Não é isso...

- Ah não? Veja bem, hoje é terça e eu não tenho notícias suas desde que saímos pra jantar no sábado! Desde ontem que te mando mensagem e você fica nessa de visualizar e não responder!

- Eu esqueci de responder, só isso. – Me expliquei, o que não era bem verdade porque eu nem tinha lido direito. – Agora tá virando o Aoi, regulando minha visualização de mensagens é?

- Não! Só estou fazendo uma constatação! E eu tinha te feito uma pergunta na mensagem, as pessoas costumam achar interessante quando as perguntas delas são respondidas, sabe!

- Ok, ok, desculpa. O que você tinha perguntado?

- Affe, tá vendo? Você nem leu! – Ele resmungou, sua voz ficando mais irritada ainda, mas ele continuou. – Mas então, vai ter um workshop com vários instrutores de guitarra no sábado! E no final vai ter meio que um showzinho, e adivinha quem vai tocar? Isso mesmo, meu noivo mais lindo do mundo inteiro!

Eu revirei os olhos nas órbitas mas sorri, por alguns momentos me distraindo com a empolgação de meu amigo e tirando um pouco as frustrações da cabeça. Era incrível como o humor de Uruha melhorava da água para o vinho só por mencionar o noivo.

- Desculpa, eu não consigo te ouvir, tem vômito escorrendo pelos meus poros e bloqueando meus ouvidos. – Provoquei, rindo.

- Continuandooo! – Uruha pigarreou, me cortando. – O show vai ser num barzinho, bem naquele estilo que o Yuu costumava tocar quando nos conhecemos, lembra?

- Sei!

- Então, aí pensei em chamar você e o dito cujo pra virem prestigiar, que tal? Se vocês já não tiverem nenhum plano e não for atrapalhar, claro!

Minha empolgação passageira morreu imediatamente à menção de Reita. Só porque eu estava fazendo um bom trabalho em não pensar naquilo por alguns instantes...

- Ele não vai. – Respondi um pouco mais seco do que deveria.

- Ué? – Uruha respondeu confuso. – Reita já tem compromisso no sábado?

- Não, é que... a gente não vai mais sair.

- Como assim? – A voz dele adquiriu um tom preocupado e eu suspirei, cansado. – O que aconteceu, Ru? É por isso que não estava respondendo minhas mensagens, não é? Você tá bem?

- Aconteceram umas coisas, sim... mas eu tô bem.

- Uhum, tô vendo. – O sarcasmo pingava na descrença do meu amigo. - Quer conversar sobre isso? Se quiser eu passo aí mais tarde e...

- Não precisa Uru, eu tô... eu não tô bem, mas eu não tô a fim de conversar sobre isso agora.

- Ruki... assim eu só fico mais preocupado. Vocês brigaram? Você tá em casa? Eu consigo chegar aí daqui meia hora.

Eu estava já abrindo a boca para insistir que ele não precisava vir quando ouvi uma voz de fundo, que eu imediatamente reconheci como Aoi, resmungando “Chegar onde? Tá falando com quem?”. Uruha respondeu um apressado “Yuu, agora não!” me fazendo chacoalhar a cabeça rindo, e só então eu falei.

- Uru, sério. Eu não quero falar disso agora, só quero ficar quieto na minha. E fala logo pro doido que você tá conversando comigo pra ele não se jogar da janela!

É claro que eu sabia que o loiro não ia aceitar aquela resposta, e continuou me bombardeando de perguntas.

- Mas estava tudo tão bem até sábado... O que ele fez? Tem certeza que não quer conversar?

- Tenho. Eu preciso terminar uns trabalhos, na sexta a gente sai e eu te conto tudo, ok?

- Mas Ruki!

Eu sabia que era injusto eu deixar meu amigo preocupado sem nem uma explicação mínima, mas... eu realmente não conseguia falar daquilo naquele momento. Minha cabeça estava cheia de pensamentos confusos e frustrantes, e eu não sabia se conseguiria explicar para um terceiro tudo o que eu estava sentindo.

Mas eu sabia que Uruha se preocupava muito comigo quanto ao meu bem estar emocional por causa de sua irmã. Assim como eu, a irmã mais nova de Uruha também era uma Zero. Ela tivera altos e baixos em seu processo de recuperação do trauma, mas o momento baixo desse processo todo para ela foi extremamente complicado. Aconteceu com Misa algo que era até comum entre os Zeros, mas que não deixava de ser preocupante: ela desenvolveu tendências suicidas de um instante para o outro, e por vários meses aquilo foi muito difícil para ela e para a família, e eles viviam no medo que ela tivesse uma recaída.

E eu sabia que Uruha se preocupava muito comigo por isso. Embora ele me conhecesse há anos e soubesse que eu aceitava minha condição com certa naturalidade, não tinha como prever o dia de amanhã. E eu agradecia a preocupação genuína de meu amigo, mas para mim o ideal no momento era só ficar sozinho e digerir minhas próprias coisas.

Até porque talvez Uruha discordasse da minha atitude. Talvez dissesse que eu estava sendo precipitado, que não entendíamos direito o que estava havendo com os contadores, que eu devia dar uma chance para Reita...

E eu não queria aquelas dúvidas naquele momento. Eu não queria que o meu lado que estava arrependido ganhasse mais força. Eu só queria fazer o que fosse menos doloroso para meus próprios sentimentos a longo prazo...

De algum modo, acabei conseguindo convencer Uruha a não me perturbar naquela noite, e fiquei no estúdio até 23h trabalhando, felizmente sem nenhuma interrupção pois os funcionários da loja já tinham ido embora às 20h.

Eu cheguei em casa depois da meia noite e depois de um banho caí direto na cama, e devia estar mais cansado do que imaginava, pois incrivelmente dormi bem e sem acordar nenhuma vez no meio da noite. Não me lembro de ter sonhado, e aquilo era até bom.

A quarta-feira não foi muito diferente, a exceção do fato de que eu cheguei 9h no estúdio, decidido a acabar as peças daquele ensaio ainda naquele dia, pois ao acordar naquela manhã fui acometido por uma brilhante ideia: Iria ligar para Kai assim que tivesse certeza de que ia mesmo conseguir terminar tudo naquela quarta-feira, perguntaria para ele se eu podia fazer a entrega das peças na quinta (ao invés da reunião na sexta), e então escaparia de encontrar Reita assim tão cedo.

Eu trabalhei sem parar a ponto de nem almoçar, e por volta das 16h como a última peça estava praticamente pronta, resolvi ligar para Kai. Enquanto procurava o número dele nos meus contatos, fiquei pensando que se houvesse um Deus misericordioso ele me faria essa generosidade de ter um horário disponível com o editor naquela quinta-feira.

Cliquei no número e depois de alguns toques fui recepcionado pela sempre animada voz de Kai do outro lado da linha:

- Editora REDO, Kai falando! Em que posso ajudá-lo?

- Kai-san, boa tarde! – Respondi. – Aqui é o Ruki, da Black Moral.

- Ruki-san! – Ouvi um barulho do outro lado da linha como se ele tivesse se surpreendido e quase derrubado alguma coisa, e ri internamente, me lembrando de como Kai era fã da minha marca e sempre se comportava um pouco menos profissionalmente do que deveria na minha presença. – Nossa, eu ia mesmo te ligar hoje! Pra confirmar a reunião da sexta!

- Pois bem, é justamente pra falar sobre isso que eu te liguei... Eu queria saber se é possível mudarmos o dia.

- Oh, o prazo está apertado? – Ele perguntou antes de me deixar concluir. - Você precisa de mais tempo, né? Ai como eu fui desorganizado em fazer uma agenda assim tão corrida e-

- Calma, calma! Na verdade é o contrário. – Ouvi Kai murmurar um “Uffa” de alívio do outro lado da linha. - Surgiu um trabalho inesperado na sexta-feira, e como eu consegui terminar as peças da REDO hoje, queria saber se é possível eu me reunir com você amanhã?

- Você já terminou hoje? – Kai exclamou, e era quase possível ouvir o sorriso dele pelo telefone. - Oh! Como sempre, você é fantástico!

- Imagina, eu estou dentro do prazo, não tem nada de fantástico nisso.

- Claro que tem, você não faz ideia de como isso é raro nessa indústria! – Kai e eu rimos juntos, eu sabia muito bem como funcionavam as coisas e ele tinha razão. – Mas sobre amanhã... Por mim tudo bem, fica um pouco em cima pra mudar a hora com o Reita mas eu posso ligar para ele e...

- Ah, tudo bem se ele não puder ir! – Me apressei em dizer, e então percebi como isso soava estranho e que Kai provavelmente estava erguendo uma sobrancelha agora mesmo enquanto sua cabeça formulava a pergunta “Mas ele não tem que fazer as provas?”.

Como explicar para Kai que Reita já tinha feito as provas antes de eu ir para o acabamento das peças, sem o editor saber ou aprovar nada? Bem, acho que não tinha problema eu ter me encontrado com um modelo fora do ambiente de trabalho... só não precisava entrar em detalhes, certo? Kai não precisava saber de nenhuma lasanha, de sorvetes, de um beijo na porta do meu apartamento...

- Como assim tudo bem? Mas e a prova final? – Kai perguntou, interrompendo meu devaneio sobre aquela noite.

- Bem... – Mordi os lábios, tentando pensar rápido. – É que eu tive uns contratempos com algumas medidas e liguei para o Reita-san na semana passada, e ele veio ao meu estúdio e conseguimos resolver. É por isso que consegui adiantar o trabalho.

Depois de ter me acostumado à intimidade que havia se formado entre Reita e eu naquelas últimas semanas era muito estranho usar um honorífico para me referir a ele. Soava tão estranho dizer o nome dele daquela forma, como se fosse errado. Mas agora nossa relação seria profissional, como devia ter sido desde o início, e eu precisava colocar essa distância. Era só um honorífico mas... não era apenas isso.

- Oh, mesmo? E porque você não me ligou? – O tom dele não era de repreensão, era apenas curiosidade.

- É que se tivéssemos que agendar outra reunião achei que ia demorar mais, e eu já te dei problemas com atraso por causa daquele modelo e... – Inventei uma desculpa qualquer, não podia dizer simplesmente que eu esqueci que Kai existia porque estava distraído demais me apaixonando por seu amigo. Fazendo-o trair a namorada, que Kai provavelmente conhecia e gostava...

- Imagina, Ruki-san, aquilo não foi culpa sua. Que bom que você e Reita conseguiram se encontrar então!

- Sim, ele me salvou! Por isso consegui fazer a prova antes do tempo, e como faltavam só os acabamentos para a entrega, então não precisa se preocupar com a prova final porque está tudo certo.

- Ah, se for assim. É que acho que amanhã não dá pra reagendar com o Reita, mas se você diz que está tudo bem, então eu confio!

- Obrigado, Kai-san.

- Bom, já que é só você a reunião deve ir mais rápido, então.... – Ouvi um barulho de páginas virando e imaginei que Kai estivesse folheando sua agenda. – Eu consigo horário pra você amanhã às 14h. Tudo bem?

- Claro, o que for menos complicado pra você!

- 14h está ótimo, então!

- Desculpa mesmo o incômodo de reagendar isso assim...

- Não, imagina! Imprevistos acontecem! Então nos vemos amanhã?

- Sim! Até amanhã!

- Já estou ansioso para ver as peças! Tenha uma boa tarde e até amanhã! – E com isso nós dois desligamos e eu quase me joguei no chão do estúdio, aliviado.

Ok, quase não.

Eu escorreguei da pequena poltrona em que eu estava sentado e me larguei de qualquer jeito no chão, deixando o celular de qualquer jeito do lado do corpo, e fechei os olhos, sentindo a superfície fria do piso do estúdio.

Suspirei longamente, me sentindo um completo idiota.

Idiota porque eu não conseguia ter firmeza da minha própria decisão. Idiota porque eu estava agindo covardemente fugindo de uma situação que eu deveria ter maturidade o suficiente para encarar.

Idiota porque eu estava com medo.

Eu queria tanto, tanto acreditar em Reita. Queria mandar tudo pro inferno, esquecer da realidade e aceitar o que ele dizia sentir por mim. Mas aquilo não era possível para uma pessoa como eu. Ele tinha a alma-gêmea dele, eles estavam em um relacionamento há 8 anos e o que eu era comparado a isso?

Pensando nos meus pais, pensando em Aoi e Uruha, até no idiota do meu funcionário Naoki e sua alma-gêmea... Eles eram todos tão felizes. Aquele elo invisível que se formava entre eles era algo que não podia ser atingido... mesmo com toda a minha amargura com relação aos contadores, eu não podia negar o que estava a minha frente.

Onde eu poderia entrar assim em algo que era mais poderoso do que eu poderia explicar?

Por isso eu tinha medo.

Medo de me deixar levar por algo e no final...

Se eu tivesse que encarar Reita de novo assim tão cedo, eu não sei o que eu iria sentir. E por isso eu estava sendo covarde, mas eu precisava de mais um tempo para aceitar as minhas próprias decisões, para me convencer delas. E para isso eu precisava ficar longe de Reita.

Para minha felicidade, eu havia ganhado tempo ao conseguir escapar daquela reunião na sexta-feira.

Ou era o que eu pensava. Porque para minha infelicidade, Kai era um terceiro 0% confiável.

E foi pelo fato de Kai ser totalmente não confiável, na quinta-feira depois que entrei no prédio da editora, peguei meu crachá de visitante e segui meu caminho para os elevadores...

A primeira pessoa com quem dei de cara, ali parado esperando algum elevador chegar, era exatamente aquele que eu estava tentando evitar.

Lá estava Reita, com as mãos nos bolsos, os ombros meio caídos e uma expressão pensativa enquanto encarava os números no visor do elevador se aproximando do andar térreo.

Meu cérebro queria fazer meu corpo dar meia-volta e correr para fora do prédio o mais rápido possível, mandar a reunião com Kai às favas e me esconder no meu apartamento até a semana seguinte. Mas meus músculos não obedeceram e eu fiquei ali parado no início do corredor de elevadores sem reação... aliás, minha única reação foi perder a força nos braços e derrubar a sacola de papel que eu segurava com as peças de roupa finalizadas a serem entregues na reunião.

O que obviamente chamou a atenção do outro, que até então olhava fixamente para o visor do elevador, e ele imediatamente virou-se na minha direção. Eu me abaixei antes que fizéssemos qualquer contato visual, e tratei de começar a recolher logo as roupas que caíram quando a sacola voou dos meus braços e se estatelou no chão, abrindo-se e espalhando todo o conteúdo ali no piso.

Enquanto recolhia as roupas percebi Reita abaixar-se à minha frente e em então ajudar-me a recolher as peças. Demorei mais do que deveria dobrando as que eu tinha recolhido e colocando-as de volta na sacola e quando eu não tinha mais desculpa para não encarar Reita, virei-me para frente e me deparei com o loiro agachado no chão me olhando atentamente, duas das peças de roupas em mãos.

- Ahm, não sei se dobrei direito... – Ele me disse sem graça, entregando-me as peças que eu tratei de colocar dentro da sacola e então me levantei.

- Tudo bem, obrigado.

Quando ele se levantou um dos elevadores havia acabado de chegar e nos dirigimos para dentro dele antes que o momento embaraçoso se prolongasse. Eu abracei a sacola à frente do corpo e me espremi em um canto do elevador, o mais longe possível do painel de botões. Só estávamos nós dois ali, e quando Reita entrou ele logo apertou o botão de número 8 e o elevador voltou a se mover.

- Q-quer que eu carregue? – Reita se ofereceu, indicando a sacola com os olhos.

- Não se preocupe, não tá pesado.

Desconfortável nem começava a descrever o silêncio que ficou sob nós depois disso.

Porque raios ele estava ali? Obviamente Kai havia ligado para ele, mas... É claro que Reita não era nenhum inocente e ele sabia exatamente porque eu havia pedido para remarcar aquela reunião. Se ele sabia que eu tinha feito isso de propósito para evitá-lo, então porque ele estava frustrando meus planos assim? Porque ele não podia aceitar minha decisão e... me ajudar a fazê-la funcionar? Aquilo era melhor para nós dois.

Além disso, eu me lembrava de ele ter mencionado algo sobre ter outro trabalho importante hoje. Ele não devia ter como comparecer a essa reunião de última hora comigo e com Kai a menos que tivesse desmarcado aquilo...

Ele estava desmarcando um trabalho importante só para me ver?

- Eu recebi a mensagem de Kai ontem sobre você ter pedido pra remarcar essa reunião... – Ele começou a falar quando achei que todo aquele percurso seria silencioso.

- Achei que você não ia poder vir. – Falei de forma meio direta, e ele desviou o olhar, pondo-se a fitar o chão. – Eu achei que você tinha outro trabalho hoje.

- Eu tinha, mas eu... eu desmarquei.

- Oh... – Eu não soube muito bem o que dizer diante daquela confirmação das minhas suspeitas. Um lado de mim achava frustrante, e o outro estava... feliz.

Feliz porque ele estava de certa forma se agarrando às poucas oportunidades que ainda teria de me ver, mesmo com esse clima péssimo, mesmo que corresse um grande risco de só ouvir coisas desagradáveis vindas de mim... mesmo assim ele ainda queria me ver.

Mas que droga! Porque era assim tão difícil pensar lógica e racionalmente quando eu estava perto dele?

O elevador escolheu bem esse momento para chegar no oitavo andar, e eu fui o primeiro a sair, não dando chance para que Reita dissesse mais alguma coisa. Eu só queria chegar logo na sala de Kai, tentar fazer dessa reunião o mais breve possível, voltar logo para casa e... sei lá, dormir. Ler um livro, ver um filme, trabalhar. Só queria fugir daquilo.

Nem me dei conta da outra pessoa parada no meio do corredor junto a um bebedouro, apenas passei reto, meu cérebro focado em alcançar logo a porta do editor. Mas antes que eu atingisse aquele objetivo, senti uma mão forte em um de meus braços, o que me fez parar de súbito e quase derrubar as roupas de novo no chão. Reita soltou meu braço quando eu me virei para ele, e com a outra mão ele mesmo havia segurado a sacola para impedi-la de voltar ao chão.

- Ruki, me escuta.

Eu inspirei e expirei uma vez, mas continuei parado no lugar e ergui os olhos para encará-lo, indicando silenciosamente que continuasse.

- Me desculpa... – Foi ele quem abaixou o olhar dessa vez, parecendo genuinamente sem graça, e eu me senti mal por aquilo. – Eu sei que você mudou o dia porque não queria me ver e... eu vim aqui de qualquer forma. Eu vim porque eu precisava te ver... mesmo que seja só de forma profissional, eu... eu só queria te ver. Eu sinto demais a sua falta, de uma forma que eu nem sei explicar.

Mordi os lábios, meu coração batendo tão forte contra o peito que eu me sentia até um pouco tonto. O que eu podia dizer diante daquilo...? Já era difícil ficar seguro da minha decisão longe dele, e com ele na minha frente, me dizendo aquelas coisas com a cara mais... magoada e machucada que seu rosto era capaz de fazer, como eu poderia não ficar abalado, não sentir nada?

Mas eu não tive a chance de responder naquele momento. Isso porque embora nós dois tivéssemos nos esquecido de que estávamos parados no meio de um corredor da editora, a outra pessoa que anteriormente pegava um copo d’água e que eu havia ignorado ao passar por ela não havia se esquecido desse fato.

E aquela era uma pessoa que certamente não lidava bem com ser ignorada, pelo que eu podia me lembrar de nosso felizmente único porém inesquecível encontro.

- Ora ora, o que temos aqui! – A voz entediada e anasalada ressoando propositadamente em um tom mais alto que o necessário se fez ouvir, e o momento entre Reita e eu foi quebrado quando ambos viraram-se para encarar a terceira pessoa presente naquele corredor.

Aquela expressão de desdém, os cabelos negros imaculadamente arrumados e sedosos e feições tão bonitas quanto eu me lembrava, lá estava Mimegumi Aki com um sorriso debochado no rosto, o olhar correndo de mim para Reita, e de Reita de volta para mim sem parar, como se fôssemos uma cena particularmente interessante de se ver.

Eu simplesmente revirei os olhos nas órbitas mas não disse nada. E pelo visto a fama de Mimegumi Aki era mesmo péssima, ou talvez ele já tivesse algum histórico com Reita que eu desconhecia, pois o loiro fez questão de não dizer nada também, apenas olhava para o outro modelo como se desejasse que ele pudesse desaparecer só com a força do pensamento.

Como nenhum de nós disse nada, Aki tomou aquilo como sinal positivo para continuar falando. E eu não precisava de uma bola de cristal para saber que seja lá o que ele fosse dizer a seguir, seria tudo menos agradável.

- Ora se não são o modelinho de gaze hospitalar e o designer de sub categoria.

Não entendia como podia haver uma pessoa que fazia tanta questão de ser insuportável como aquele modelo. Eu não fazia ideia do que Aki quis dizer com o insulto a Reita, mas pela cara fechada dele não devia ser coisa boa. E também só sei que se eu fosse um pouco menos educado eu já estaria voando nos cabelos irritantemente perfeitos dele pelo “designer de sub categoria”.

- Quer dizer que essa editora agora virou agência de cupidos? Que gracinha, incrível como a ralé se atrai... - Então ele tinha ouvido minha conversa com Reita ao sair do elevador e não precisava de 2+2 para saber o que estava havendo entre nós.

- Mimegumi, você não tem nada melhor pra fazer, não? – Reita se prontificou a responder antes que eu o fizesse. – Vai arranjar um hobby, sei lá, compra um videogame!

- Então quer dizer que agora você é desses que fica arranjando amantes, Suzuki? Não imaginava que você tivesse cara pra isso. – Aki continuou como se Reita não tivesse falado nada, mas ele encarava o loiro como um sorriso satisfeito nos lábios que me deixou com uma sensação pior ainda. – Ou será que isso é algum tipo obscuro de boa ação?

- O que...? -

E eu fiquei sem reação com o que veio a seguir.

- Você encontra um Zero qualquer e diz que vai mostrar o que é amor verdadeiro pra fazer uma caridade? – Aki riu sozinho. - É comovente, deixa eu enxugar aqui minha lágrima.

Eu só consegui ficar parado estático, apertando a sacola de roupas em minhas mãos.

Aquele desgraçado.... qual era a merda do problema dele comigo? Qual o problema dele com Zeros, porque ele tinha que ser tão...? Eu não conseguia nem pensar de tanta raiva, e por um instante até me esqueci de um pequeno fato.

- Um Zero...? – Reita balbuciou confuso.

Reita não sabia nada sobre eu ser um Zero. Ele não sabia sobre minha confusão dos contadores (e Aki então, não saberia nunca se dependesse de mim!). Na cabeça de Aki eu era e seria sempre um Zero, mas Reita... Reita não tinha a menor ideia do que estava acontecendo e eu nem planejava contar nada para ele.

Podia parecer idiota mas... Eu tinha um pouco de medo de que eu ser um Zero fosse mudar de alguma forma o modo como Reita me via, e por isso eu não quis contar isso para ele quando estávamos bem. Além disso havia o fato daquela confusão humilhante a qual eu queria esquecer e deixar para trás... E depois do que houve entre Reita e eu não tinha mais porque tocar em nenhum desses dois assuntos. Mas agora tudo estava vindo à tona por causa daquele modelo infeliz que não podia perder a chance de ser um desgraçado.

Eu apenas continuei encarando Aki, horrorizado, enquanto ele continuava a falar.

- Ah, então quer dizer que seu namoradinho não te contou que ele é um Zero? Ops. – Ele teve a audácia de rir, e parecia mais do que satisfeito com as nossas reações.

Aquilo era raro de acontecer, mas eu simplesmente não sabia como reagir.

E embora eu estivesse com muita raiva de Mimegumi Aki e quisesse voar no pescoço dele a qualquer instante, o que estava me deixando paralisado no lugar na verdade era receio.

Receio de colocar os meus olhos em Reita de novo e ver nele o mesmo tipo de repulsa que já vira no olhar de tantas outras pessoas desde os meus 14 anos...

 

(Continua...)


Notas Finais


PS: Vocês não esqueceram do nosso amiguinho Mimegumi Aki né? Hehe! Olha o sorrisinho dele de gente fina aqui http://i.imgur.com/oAdDzlf.jpg =w=


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