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História Com amor, Lizzie - VIII


Escrita por: Brokenprince93

Capítulo 9 - VIII


Fanfic / Fanfiction Com amor, Lizzie - VIII

Assim, a segunda-feira chegou e, com ela, o primeiro dia de trabalho com meu avô.
Minha mãe me dirigiu as primeiras palavras desde o dia em que ela soube do acordo que eu fiz com meu avô naquela manhã: um breve "tenha cuidado, Mark" antes de sair para trabalhar.

Fui me arrastando até a escola, tentando não ser levado pelo vento que soprava sempre na direção contrária, até que um conhecido veículo parou ao meu lado fazendo barulho o suficiente com seus  motores da idade da pedra para acordar boa parte da vizinhança. A porta do passageiro se abriu e eu entrei sem pensar muito a respeito, até uma carroça serviria naquela ventania.

"Vamos sair logo daqui antes que você acorde todo mundo", eu disse ao entrar no fusca. Elisa não respondeu, apenas acelerou o veículo pelo caminho até a escola. 
Obviamente, algo não estava bem.

"Ainda não consegui falar com Lizzie", começou ela, vestindo um casaco cinza gasto que em nada combinava com seu cachecol amarelo berrante, "ela não atende minhas ligações, não responde minhas mensagens e eu não sei se devo ir até lá chutar a bunda dela". Seus cabelos despenteados flutuavam ao redor de seu rosto, que demostrava toda a sua frustração por não conseguir se comunicar com a prima. "O que aconteceu, Mark? Ash me disse que você conversou com ela".

"Sim", respondi, "te devo alguns sanduíches por me ajudar a sair vivo daquela festa. Obrigado...", a garota tirou os olhos concentrados do caminho por alguns instantes e me encarou com certa surpresa. Eu não era muito bom em agradecimentos, até porque eu odiava depender de outras pessoas para o que quer que fosse. Elisa não pareceu se importar com meu modo desajeitado de lhe agradecer, apesar de toda a surpresa demonstrada.

"Tudo bem, sem problemas. Só não me pague com nenhum daqueles sanduíches de merda que você costuma comer", respondeu ela, voltando seus olhos novamente para a direção. "Agora diz logo o que aconteceu entre vocês ou eu te jogo desse fusca em movimento", intimou a garota. Eu respirei fundo, sem estar com muita vontade de reviver aquela conversa.

"Ela pediu pra eu me afastar", resumi. Elisa fez menção de dizer algo mas eu continuei, "eu expliquei a ela tudo o que aconteceu, sobre Jessica e Matt, ainda assim, ela... ela se decidiu por isso", finalizei. A garota se manteve em silêncio enquanto manobrava o fusca para estacioná-lo na esquina anterior à escola.

"E você, Mark?" Perguntou ela enquanto tirava um maço de cigarros do bolso e colocava um entre os lábios, se preparando para acendê-lo. "O que você quer?" 

"Quero fazer o que ela me pediu, quero ficar longe dela."
 
                                 ***

Graças ao plano do meu pai de me fazer trabalhar com meu avô, eu acabei desistindo das minhas matérias opcionais, além de pedir para sair das turmas avançadas e passar para as intermediárias nas outras matérias obrigatórias. Com isso, eu adquiri alguns horários vagos ao longo das semanas;
e foi em um desses horários que a Professora Banks veio me procurar, enquanto eu vagava pelo colégio pensando em como seria meu primeiro dia de trabalho na empresa do meu avô e me esforçava para não pensar em Lizzie.

"Mark", chamou ela, acenando de maneira constrangedora em minha direção no corredor, enquanto eu guardava o material da aula anterior no armário. "Tem um minuto? Preciso falar com você", disse, caminhando até onde eu estava. 

Janet Banks era uma mulher muito bonita, no alto dos seus aparentes quarenta e tantos anos de vida. Tinha um rosto marcado por traços fortes e firmes, com maxilares proeminentes e um nariz reto e largo, cercado por olhos verde-amarelados. Seus cabelos sempre presos em um coque no alto de sua cabeça completavam o ar de rigorosidade que emanava de sua figura, contrariando a doçura e a simpatia que lhe eram características.
Caminhei a seu lado até chegarmos em sua sala, onde ela começou a retirar alguns livros de sua bolsa e pediu que eu fechasse a porta ao passar. Eu já havia estado ali várias vezes antes, quase sempre para discutir assuntos relacionados ao clube; o qual jamais teria sido fundado sem seu apoio.
Sentei-me na cadeira de frente para ela e esperei enquanto ela organizava os livros em uma estante no lado sem janelas da sala. Ao terminar, ela se sentou em sua cadeira do lado oposto da mesa e começou a me olhar de maneira triste, sem dizer nada.

"É sobre o clube de cinema, não é?" Adivinhei, tentando fazer a conversa render. 

"E o fato de você ter abandonado a turma avançada", acrescentou ela, um tanto desapontada. "No que você está pensando, Mark? Se esqueceu da importância desse último ano para conseguir entrar numa boa universidade?" Perguntou ela, sem tirar os olhos de mim.

"Não, eu não me esqueci. Eu só tenho prioridades maiores no momento, não posso concilia-las com o que o clube e as turmas avançadas exigiam de mim". Os olhos da mulher se arregalaram ao ouvir uma resposta tão direta, a verdade é que eu já imaginava que aquela conversa aconteceria e já tinha me preparado para ela.
Janet balançou a cabeça algumas vezes, em silêncio, processando o que eu havia dito.

"Thomas me disse que você tinha arrumado um emprego", começou ela, "mas também me disse que talvez isso podia ter algo a ver com a saída de Alicia anteriormente", acrescentou, me olhando de maneira especulativa. "Pensei que talvez houvesse algo que pudesse ser feito para que você reconsiderasse sua decisão".

Eu balancei a cabeça negativamente, "isso não tem nada a ver com ela, foi apenas uma infeliz coincidência", respondi. "E não há nada que ninguém possa fazer, eu simplesmente não posso dar conta de todas essas exigências enquanto trabalho", completei. A frustração era visível no rosto da mulher sentada a minha frente, e acentuada por seu tom de voz ao falar.

"Entendo, fico triste por isso, Mark. Você é um garoto com um potencial gigantesco, espero que saiba o que está fazendo", começou ela. "Ainda assim", acrescentou, enquanto mexia em uma gaveta de sua escrivaninha, "eu queria te dar isso". Finalizou ela, estendendo alguns panfletos em minha direção. Peguei-os e percebi que se tratavam de informativos sobre diferentes universidades espalhadas pelo país. "Teremos aconselhamento com um orientador na semana que vem, além de algumas palestras sobre alguns cursos específicos; posso contar com a sua presença?" Perguntou ela, com um sorriso tímido em seu rosto rígido.

"Hum... farei o possível...", respondi. A realidade é que, ao contrário do início do ano letivo, ir para a universidade era algo muito distante da minha realidade naquele momento. 

Tão distante que alguém como a professora Banks jamais seria capaz de ver.

Eu precisava sobreviver àquele ano primeiro.

                             ***

"Oi", disse Alicia ao se aproximar da mesa onde eu estava sentado comendo sozinho meu sanduíche no almoço. Respondi com um movimento de cabeça enquanto ela tirava a mochila das costas e se sentava de frente pra mim. "Janet me chamou para conversar hoje, disse que você também saiu do clube", falou ela, me olhando com aqueles grandes e doces olhos escuros.

"É verdade, saí das classes avançadas também", respondi, ela pareceu surpresa ao ouvir isso.

"Mark, isso..." começou ela, hesitante.

"Isso não tem nada a ver com você", falei, respondendo antecipadamente sua pergunta ainda por fazer. "Eu também conversei com ela, hoje", acrescentei, ao vê-la novamente surpresa por eu saber o que ela pretendia perguntar. Ela moveu a cabeça em sinal de confirmação, olhando o seu copo de chá gelado com uma intensidade anormal.

"Achei que você, mais do que qualquer um, fosse entender", comentei. Ela levantou os olhos do copo e eles se encontraram com os meus por um breve instante antes dela os afastar bruscamente.

"Não, a verdade é que eu não entendo" começou ela, e pela primeira vez eu pude notar certa raiva em seu tom de voz e no modo como me olhava, "eu realmente não entendo porque você está jogando seu futuro fora, Mark". Concluiu, olhando para o pátio do colégio pela grande vidraça da lanchonete. O tempo nublado indicando que provavelmente teríamos neve cedo naquele ano.

"Não é como se eu tivesse alguma escolha", eu disse. Ela deu uma risada irônica, ainda sem me olhar, e tomou o primeiro gole de seu chá.

"Por que eu tenho a impressão de que isso tem a ver com a garota ruiva?" Perguntou ela, de maneira retórica. Ela estava estranha, eu nunca a tinha visto tão invasiva antes. Haviam manchas escuras em torno de seus olhos, provavelmente da mesma tonalidade das que existiam ao redor dos meus, indicando falta de sono. Seus cabelos cabelos escuros e desarrumados presos de qualquer forma em rabo de cavalo, suas roupas amassadas e vestidas de forma desleixada... eu devia ter percebido aqueles sinais na época. Se eu os tivesse notado naquele momento eu provavelmente não teria dito o que disse a seguir.

"Talvez porque você não sabe o que está acontecendo e fica tirando conclusões precipitadas", respondi. "Sabe, você não é a única pessoa com problemas, Alicia", acrescentei enquanto me levantava e pegava meu material da ultima aula sobre a mesa.

"Não, você tem razão. Eu não sou a única pessoa com problemas, mas talvez eu seja a única aqui que entenda o tamanho do sacrifício que é abrir mão de uma boa universidade", disse ela, a raiva ainda permeando em seus olhos.

"E a única que ainda não entendeu que as vezes não temos escolhas", falei, colocando a mochila no ombro e saindo do local.

                                  ***
Pronto, tudo o que eu não precisava era mais uma coisa para pensar no caminho para meu novo emprego com um agiota vendedor de órgãos. Agora, graças a Alicia, eu me pegava pensando na minha formação, mais uma coisa da qual eu estava tentando não pensar. É bem provável que a raiva que eu sentia dela naquele momento fosse na verdade direcionada a mim, por ter me colocado em toda aquela complicada situação.

"Você trabalhará aqui", disse a mulher alta  que me apresentava um escritório com várias escrivaninha espalhadas. Uma das paredes da sala era composta pelo vidro que revestia o prédio externamente, dando uma vista interessante da cidade e seus tantos outros edifícios. "Você ficará encarregado de auxiliar os funcionários daqui no que eles precisarem e que não lhe parecer muito degradante", falou ela com um sorriso no rosto, contrastando com seus cabelos fixados em excesso com modeladores e presos em um pequeno coque no alto de sua cabeça. Ela usava óculos com uma grossa armação preta e vestia roupas sociais sóbrias e formais, mas que, ainda assim, eram dignas da secretária do presidente da empresa.

Um dos homens no escritório se levantou e veio até onde eu estava, estendendo uma mão em minha direção. "Você deve ser o Mark, o novo office boy". Disse ele, sorrindo. "Me chamo Walter", apresentou-se, "esse aqui é o Edmund, aquele na mesa do canto é o Gabriel, a moça estranha no fundo é a Katie, ao lado dela temos o Gabriel e, por último e bem menos importante, temos a Rebecca", falou ele, apontando para cada um dos funcionários presentes enquanto os apresentava. Eu acenei de volta para cada um deles a medida que me foram apresentados. A mulher que ele dissera se chamar Rebecca se levantou com uma pilha de papéis nas mãos e os estendeu em minha direção.

"Podemos começar?"

                                 ***

Meu primeiro dia não foi de todo ruim ou desafiante, a ideia de meu pai de que meu avô me envolveria em algum de seus "negócios paralelos" não se confirmou naquele dia e tudo o que fiz foi, basicamente, tirar xérox e trazer cafés. Assim, eu chegava em casa naquele dia aliviado, de certa forma, por não ter feito nada além do esperado para um adolescente em seu primeiro dia de trabalho. Ao me aproximar de casa, notei minha mãe sentada a varanda com um cigarro entre os dedos, fazia anos desde que a vira fumar; a última vez sendo provavelmente na época em que meu pai nos deixou. Seus olhos estavam inchados e seus lábios tremiam tanto que mal prendiam o cigarro quando ela tragava a fumaça para seus pulmões.

"Mark, meu Deus..." sussurrou ela enquanto me apertava com força contra si. Uma ação um tanto estranha para alguém que mal me olhava ultimamente. Se afastou um pouco e segurou meu rosto entre suas mãos, como se me olhasse para ter certeza de que realmente se tratava de seu filho, o cigarro ainda preso entre seus dedos.

"Estou bem, mãe", respondi, observando seus olhos se encherem de lágrimas e ela se virar na direção da rua.

"Sim. Que bom, filho..." respondeu, apenas. Caminhei até a entrada e escutei sua voz às minhas costas: "você tem visitas, ela está te esperando há um bom tempo". Tudo o que veio a minha mente naquele momento foi Lizzie, era incrível a forma como eu queria vê-la e estar com ela depois de toda a ansiedade que senti naquele dia. 

Mas tudo o que recebi foi Jessica, sentada no sofá na sala de estar enquanto me olhava hesitante.

"Preciso te contar minha história, Mark"



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