1. Spirit Fanfics >
  2. Como morrem as flores >
  3. Incoercível

História Como morrem as flores - Incoercível


Escrita por: stefannyabsolutah

Notas do Autor


Oi amoras, espero que estejam todes bem.
Bom, eu vi que algumas estavam cheias de duvidas sobre os misterios e acho que esse capitulo pode começar a mover algumas peças do quebra cabeça.
E preciso dizer que eu me esforcei para voltar porque tenho uma proposta para vcs: mamãe Itzi está concorrendo a um premio e, caso vcs consigam bater 100 votos até domingo, eu volto com mais um capitulo na terça e uma playlist da fic, vcs topam?
O link da votação é esse: https://www.fotogramas.es/fotogramas-de-plata/a36259684/fotogramas-de-plata-2020-finalistas/
Vocês podem me mandar prints por aqui (não sei se é possível enviar imagens aqui) ou na dm bom meu tt: @VihAbsolutah
Ah, e como a premiação será próxima ao aniversário da Itziar, será como um presente de aniversário. Votem muito e lembrem-se: quando a gente atinge a meta, a gente dobra ela!
Espero que vcs gostem do capítulo.
abreijos.

Capítulo 5 - Incoercível


Fanfic / Fanfiction Como morrem as flores - Incoercível

"Que não é coercível.

Que não se pode coagir.

Que não se pode conter, comprimir, encerrar.

"era um perfume que em tudo penetrava"

Que não se pode dominar, refrear, impedir; irreprimível."

***

 

Buenos Aires, Argentina - 13 de outubro de 1999

Estou sentada no chão, ao lado do telefone, por um período indeterminado de tempo; nesse momento eu passo a acreditar que as pessoas podem sim morrer de tristeza. A dor emocional passa a ser física, eu estou só, o mundo que eu costumava conhecer havia desaparecido. Perdi as minhas lentes de contato cor de rosa e agora tudo é cinza e inexpressivo.

Sinto meu estômago reclamar, ao olhar para o relógio na parede a minha frente, vejo que já passam das oito da manhã e, ao lado do telefone, encontro um pequeno objeto marcando uma mensagem que eu sempre desejei ler. Mas se há alguns dias alguém me dissesse que eu passaria por isso sozinha, eu iria rir e responderia que isso é impossível.

Mas é como dizem, “o impossível é só questão de opinião".

E aqui estou, em um país estranho, onde não conheço ninguém além dos meus dois vizinhos estranhos, sem família, abandonada pelo amor que me jurou ser eterno e com um teste de gravidez positivo em mãos. Se essa descoberta inesperada tivesse acontecido dois anos atrás eu não pensaria duas vezes antes em optar por um aborto; segue sendo uma prática proibida na Argentina, no entanto com uma boa quantia de dinheiro e a clinica certa isso é possível até no país mais conservador do planeta.

Olho mais uma vez para o objeto em minhas mãos, que apresenta duas listras, indicando a testagem positiva e o seguro com mais força e o levo ao peito, como em uma espécie de abraço e alii, prometo a mim e ao meus filho, que aqueles bastardo não iriam me tirar mais nada.

Seremos eu e meu filho contra o mundo.

Levanto rapidamente para começar o meu dia, não iria mais me permitir ficar triste, isso iria afetar diretamente a criança em meu ventre. Dou os primeiros passos em direção a cozinha e sinto uma forte pontada no meu ventre, para por alguns segundos e ponho a mão na região, olho para baixo e digo:

‘Calma filho, a mamãe não vai deixar nada de ruim acontecer com você"

Certifico-me de não sentir mais nada e então sigo para preparar meu café da manhã. Está tudo encaminhado quando tenho a impressão de sentir algo escorrer pela minha calcinha; mas deve ser apenas impressão, ou algum corrimento normal da gravidez, pois é biologicamente impossível menstruar durante a gravidez, então foco no preparo do meu desjejum esqueço do ocorrido.

Tomo todo o café que havia preparado e não sinto nada, então acredito que esteja tudo bem. Porém, ao tirar a roupa para tomar meu banho matinal, percebo que há uma significativa mancha de sangue na minha roupa inferior e mais uma vez sinto um desconforto na região do meu ventre. Farei o mais seguro, irei ao medico para me certificar de que não há nada fora do controle e volto ao quarto para me vestir e o faço o mais rápido que consigo.

Ao sair do meu apartamento, cruzo com Alicia, a ruiva que mora no apartamento em frente ao meu, ela me cumprimenta, mas neste momento perco o controle de meu corpo e sinto as minhas pernas falharem em sustentar meu corpo e se não fosse pela proximidade e rapidez da minha vizinha, eu teria desabado no chão. Antes de apagar escuto sua voz em um tom alarmado:

- Rubia, tá se sentindo bem? você está sangrando!?

 

Dois dias depois…

-Bem vinda ao lar, rubia - disse a ruiva, sorrindo.

- Nós viemos aqui ontem pra organizar algumas coisas para a sua volta - diz Darko, que entrou logo após Alicia - e eu sinto informar mas você não vai mais conseguir se livrar da gente - ele diz e sorri em minha direção.

- Eu não sei o que teria acontecido com a gente sem vocês. Muito obrigada, vocês salvaram meu bebê - digo, chorando mais uma vez.

Aliás, chorar era a única coisa que eu conseguia fazer sem precisar de esforços ultimamente.

-Nós não fizemos nada, guapa - minha vizinha senta ao meu lado - você é muito forte e sua filha vai ser igual! Um deslocamento de placenta não vai matar vocês - diz me abraçando de lado.

- Você realmente tá insistindo em ser uma menina, hein?! - digo rindo, ela já havia mencionado o sexo do bebê umas seis vezes nos últimos dois dias e em todas, deixou claro seu desejo por uma menina.

- Quel, você sabe que precisa de repouso, não é? - pergunta Darko, sentando ao lado de Alícia - e para a sua felicidade, nós estamos com você. Porém, para a sua tristeza, nós vamos ter que ficar com vocês integralmente.

- E nem se preocupe, amanhã mesmo virão três advogados aqui, para nós resolvermos a ameaça do fascista do seu avô da melhor maneira. Ele não vai conseguir o que falou. Não há nenhuma questão jurídica que faça de você uma pessoa inadequada para criar uma criança.

E foi realmente assim, eles ficaram comigo o tempo todo. Nós nos apoiamos  e eles me deram um novo lar. No outro os advogados vieram no período da tarde e mais uma vez eles estavam ao meu lado, me dando forças enquanto eu era obrigada a relembrar tudo o que havia sido dito na ligação que recebi de Segóvia, com a informação de que o Dr. Prieto estava ciente da minha gravidez e que planejava retirar a guarda do meu filho, pois segundo ele eu não tenho caráter para educar uma criança; foram eles que estiveram mais uma vez ali, ao meu lado. Me prometendo que daríamos um jeito e ninguém tomaria o "nosso neném". 

E foi ali, que eu vi que não estava mais sozinha e poderia contar com eles. Assim como eles poderiam contar comigo.

***

Entro no que deve ser a quinta loja do shopping Luz de Castilla, havia parado em algumas lojas no caminho da fazenda até aqui mas nenhuma tinha uma roupa adequada para o evento. 

Não que exista uma roupa adequada para um funeral de gala. Reviro os olhos mais uma vez, igual a todas as outras em que precisei lembrar desse maldito circo.

Já havia provado pelo menos oito vestidos, até já cogitei ir de calça e body. Mas o que passou pela minha imaginação não foi bem uma combinação social, para um evento social. Desde o primeiro dia sinto os olhares indecentes que Sérgio me direciona e eu apenas havia pensado em combinar um body rendado com uma calça preta. E a única intenção era para provocar ele.

Madre mía, eu não tenho mais 16 anos. 

Me sinto terrivelmente patética.

Na tentativa de liberar um pouco meus pensamentos, vou para a praça de alimentação. Silene sempre me convence que doce é a solução para tudo; penso nela e sinto um aperto em pensar que ficaremos tanto tempo distante. O máximo que já passamos separadas foram 15 dias e pelo que posso recordar foram horríveis e solitários.

Ela sempre preencheu a minha vida. Com a sua presença eu conseguia esquecer que não sou a mulher poderosa que dizem aos quatro ventos. Ela é e sempre foi meu pote de ouro no fim do arco-íris, ou melhor, ela é o meu arco-íris. Minha vida fica muito mais leve e colorida quando consigo ficar com ela.

Sinto meu celular vibrar na minha mão esquerda e é uma notificação do whatsapp, de Silene. Ninguém consegue explicar a nossa conexão, talvez seja pelo fato de uma ter salvado a vida da outra, literalmente. 

É o seu convite de aniversário, na verdade é um vídeo. Mas segundo ela os convites agora são assim, continuo achando uma maneira brega de convidar pessoas para eventos. No entanto, sabendo do quão cabeça dura ela é, preferi deixar ela decidir tudo.

Toda a minha teoria de que convites animados são bregas cai por terra logo nos primeiros segundos da mídia. Vê-la feliz, sorrindo, sendo livre e linda é o que mais me motiva na vida e é isso que me faz feliz diariamente, saber que ela consegue ser muito mais do que sequer conseguiria tentar.

As primeiras lágrimas já descem livremente pelo meu rosto, em uma corrida para ver qual delas conseguiria borrar mais maquiagem ou lavar mais rápido a dignidade da mulher "poderosa" que se desmancha em lágrimas com um vídeo em meio a uma praça de alimentação.

E logo as lágrimas já não são de felicidade ou orgulho mas de culpa; por lembrar que não poderei comemorar seus 21 anos com ela, como costumamos fazer.

A menina que sempre foi fantasiosa e extremamente exotérica e inteligente, esses dois primeiros traços de personalidade são influência de Darko e ninguém pode negar, esse mérito é todo dele. Já o terceiro...preciso dizer que foi de mim, o que não é de todo mentira, pois ela me faz lembrar de mim em seus traços de inteligência e na maneira como consegue ser perspicaz. 

Mas não vou me remoer com isso, pelo menos não agora.

Sorrio ao lembrar de quando, no seu aniversário de 16 anos, ela me contou em segredo que o universo estava lhe dizendo que sua vida iria mudar completamente aos 21.

Ojalá, ela consiga mudar a vida e conquistar todos os seus sonhos. Mas Ojalá mais ainda que a minha intuição não esteja certa e que essa mudança não tenha nada que ver com tudo o que está acontecendo na minha vida.

E quando volto os meus olhos para o celular em minhas mãos, vejo que ela está me ligando, a chamada de vídeo tradicional de 13h. Limpo o rosto o mais rápido possível, para que ela não perceba que eu chorei e aceito sua chamada.

-¡Mamá! - ela diz com a mesma animação de sempre - eu espero que você tenha gostado do vídeo porque essa vai ser a versão final, não há mais tempo para fazer outro - ela diz e percebo que não está sozinha.

- Hola, cariño. Você sabe bem que eu amo todas as coisas que você faz - digo e ela revira os olhos e sorri ao mesmo tempo - ainda mais quando é algo sobre a sua vida. A minha menininha é muito talentosa.

- ¡Por dios mamá¡ - ela protesta - você sabe que eu não sou mais criança. E você o que está fazendo? 

- Bueno, eu estou no shopping. E completamente desesperada - digo fazendo drama - eu tenho menos de 48h para encontrar o vestido perfeito para um evento de última hora mas parece que nenhum vestido se adequa à ocasião - digo comprimindo os lábios.

- Mas como assim a senhora juíza tem um evento importante e eu sou a última a saber?! - ela se finge de ofendida - triste pra você por não ter sua melhor companhia de compras aí. Mas como eu sou a melhor filha do mundo, me disponibilizo a ajudar. 

- Eu não sei o que seria de mim sem você. 

- Nem eu - ela diz sorrindo, o sorrisinho que a faz fechar os olhos e nesse momento eu paraliso um pouco, eles estavam cada dia mais parecidos; isso só pode ser carma de outras vidas.

- Oye, mamá. Ainda está aí?

- Si, Cariño. Sí - tento me recompor.

- Por favor me diz que o seu compromisso inesperado é com um espanhol sexy e sortudo que finalmente conseguiu conquistar a majestade - ela diz empolgada e ouço outra voz no ambiente, aparentemente a de Mônica.

- Silene, eu ainda sou sua mãe - digo fingindo tédio - e não, não tem nenhum homem na jogada - quem eu queria enganar? Nem eu havia me convencido do que acabo de falar - eu tenho um evento de gala e preciso de um vestido incrível para ele. Mas não consigo encontrar - digo em um falso tom de choro.

- Vale, pois me liga da próxima loja que entrar. Eu e tia Mon estamos ansiosas para escolher o seu vestido perfeito. Aproveita as compras, Cinderela - ela diz rindo mais uma vez - ah, e não esqueça que sua filha preferida está fazendo mais uma volta ao sol e um presente importado a faria muito feliz 

- Eu sabia que essa ajuda não seria de graça, não sei de quem você herdou essa dom de ser aproveitadora. 

Desligo a ligação bem mais animada do que quando atendi e termino o enorme sorvete que havia comprado. E por Deus, o sorvete daqui continua sendo o melhor! Já viajei meio mundo e nenhum se compara.

Talvez seja a sensação de casa que eles me fazem sentir.

Duas horas e meia depois, eu deixo o centro comercial com mais sacolas do que havia planejado. Só de vestido eu havia comprado cinco e dois deles eu com certeza não usaria, muito menos no evento de depois de amanhã.

Mas me fiz de desentendida e permiti que Silene me convencesse de que eu ficaria perfeita, ouvi Mônica rir no fundo da chamada, todas sabíamos que eles sumiram do meu guarda roupa e apareceriam no quarto ao lado na primeira oportunidade.

Alícia havia me informado que a minha licença foi aceita e a sua também; no sábado a tarde ela chegaria para me fazer companhia. Mas infelizmente não poderia me acompanhar ao funeral, pois não conseguiu passagem para chegar a tempo.

Ótimo, vou enfrentar os lobos sozinha.

Olho para o meu relógio e vejo que ainda são 16h da tarde, bom, eu não tenho que trabalhar por enquanto, não tenho certeza se estou pronta para caminhar por aquele lugar e lembrar de todas as coisas boas que vivi ali e com certeza, eu não quero ter que encontrar com Sérgio e muito menos perder esse dia ensolarado trancada no quarto. Como consegui sair sem o motorista da fazenda, tenho mais liberdade para caminhar e é exatamente isso que preciso fazer.

Caminhar livremente para desanuviar e não tem nada melhor do que turistar. Ainda que seja na mesma cidade onde você cresceu. 

Já não vivo aqui há bastante tempo e dificilmente alguém irá me reconhecer e há muito o que reconhecer por aqui. Parece outro lugar! 

Começo a minha caminhada pelo centro de Segóvia e percebo que senti mais falta dali do que jamais imaginei. Essas ruas tem muitas histórias; eu tenho muitas histórias nessas ruas. Vivi momentos incríveis aqui e momentos tensos também; a vida sempre foi uma gangorra.

Já não sei por quanto tempo estou caminhando, mas sinto que é mais do que deveria, principalmente considerando a altura do meu salto. Paro em uma praça, está tendo uma feira de adoção de pets. Não resisto e aproximo para brincar com as figurinhas ali dispostas. É muito mais forte do que eu, esses bichinhos são perfeitos.

E diga-se de passagem, se eu estivesse em casa levaria pelo menos um comigo. Mesmo estando do outro lado do mundo me vejo bastante tentada, mas sei que não posso. Pelo menos não hoje.

Faço algumas fotos dos bichinhos, não consigo me conter e compartilho algumas no grupo de whatsapp que tenho com minha filha e minhas "irmãs". Volto a caminhar, ainda distraída com o celular e rindo de suas reações exageradas. Alícia com certeza é a personificação de um hipérbole. Já avisei a ela que qualquer dia aparece sua foto em meio as definições dessa figura de linguagem na internet.

- "Poxa, Quel. Não custa nada você segurar um gatinho aí, o comissário tem estado muito solitário ultimamente e iria adorar um irmãozinho."

Ela protesta na tentativa de fazer uma chantagem emocional e quase consegue. Todo mundo ama o comissário, é quase um afilhado. Bom, quase não! É nosso afilhado e vez ou outra uma de nós o sequestra para passar fins de semana conosco.

 O gatinho é uma extensão de Alícia no mundo animal. A expressão de que os pets se parecem aos donos foi criada inspirada neles.

Caminho por mais algumas ruas e sei que já vivi muitos momentos ali, mas não consigo recordar especificamente como tinha ido parar ali. Isso indica que já passou da hora de voltar, chega de caminhada por hoje.

E faço a nota mental de nunca mais sair para caminhadas no centro ou em qualquer outro lugar com sapatos tão altos. Sinto que meus pés estão clamando por misericórdia.

Tiro o celular da bolsa outra vez, para me localizar e pedir o Uber para poder voltar para casa, enquanto digito o endereço da fazenda, tenho a impressão de ouvir alguém me chamar, mas com certeza é alucinação pelo cansaço.

Porém, escuto mais uma vez 

- Quel?! - ouço uma voz que não me é estranha mas que ao mesmo tempo não consigo identificar e isso me faz insistir no pensamento de que é apenas uma ilusão por revisitar tantos locais.

Mas ouço a voz ainda mais perto e dessa vez sinto uma mão tocar meu braço, o que me faz dar um pequeno salto de susto.

-Raquel Murillo?! - viro em direção a voz feminina que estava consideravelmente perto e me surpreendo com quem vejo - eu te assustei né?! Desculpa! - eu estou um pouco confusa, pois faz muito tempo que não tenho notícias dela e em nenhuma hipótese havia considerado a possibilidade de reencontrá-la aqui - oye, não lembra mais de mim?

- Carmem?! - digo forçando simpatia - por Deus, é claro que eu lembro de você!

- Imagino que você esteja na cidade pelo ocorrido com o Dr Prieto - ela diz deitando a cabeça em direção ao ombro - eu sinto muito Quel! A cidade toda ficou surpresa com o que aconteceu.

- Eu posso imaginar - me resumo a responder - mas está tudo bem. Esse é o ciclo da vida.

- Você tá com pressa? - ela pergunta curiosa - nós podemos tomar um café e conversar, para relembrar os velhos tempos.

- Putz, eu adoraria - sorrio levemente - mas eu estou extremamente cansada e meu Uber já está a caminho. Se você não se importa, nós podemos marcar para outro dia.

- Claro, como você quiser - ela diz sorrindo de maneira exagerada - bom, mas acho que não faltarão oportunidades para esse café e para nos atualizarmos sobre nossas vidas. Estamos todos na empresa esperando a visita de vocês! Não se fala em outra coisa por lá.

- Você trabalha para o meu avô? - pergunto surpresa.

- Eu trabalhava para o seu avô, mas acho que agora trabalho para você.

Sorrio forçando simpatia mais uma vez e agradeço aos céus por ver o carro chegando e a desculpa ideal para conseguir me livrar dessa conversa.

-Bom, eu preciso ir agora - digo abraçando-a para demonstrar educação - a gente se vê por aí.

- Com certeza - ela diz em um tom de voz que me soa um poço fora do comum.

Eu já estava entrando na parte de trás do carro, quando ela.me chama mais uma vez.

- Quel, sabe quem também está na cidade? - Ela parece muito empolgada para me dar a notícia e nem me espera responder - Alberto! 

Aceno para que ela entenda que eu estava ciente e sigo para o carro.

Carmem costumava ser a minha melhor amiga, minha confidente, ainda que vovó e Marta tenham implicado com ela a maior parte do tempo. Eu tenho consciência de que ela era um pouco sonsa demais.

Ela também havia sido a primeira menina que beijei, isso "fortaleceu" a nossa amizade. Mas fortaleceu ao ponto de ela achar que poderia interferir nas minhas decisões. Saber que ela trabalha em uma das empresas da família me surpreendeu, ela sempre se mostrou avessa ao meu avô, sempre disse que ela era como um ditador.

Bom, ela era minha melhor amiga até fazer com que o meu namoro com Sérgio fosse descoberto "acidentalmente". Todos sabíamos que não foi bem uma revelação acidental mas nunca havíamos conversado sobre isso e agora já não adianta mais chutar cachorro morto.

Ao mesmo tempo que nós nos envolvemos no início da adolescência, ela havia se encantado por Sérgio e desde que ela descobriu que tínhamos um envolvimento, as coisas começaram a degringolar.

Na época ela tentou me convencer a voltar com Alberto, meu ex-namorado abusivo.

***

River- Bishop Briggs

Like a river, like a river, sh-

Like a river, like a river, sh-

Like a river, like a river

Shut your mouth and run me like a river

Quando chego em casa, percebo que há um carro estacionado ao lado da porta principal da fazenda, logo imagino que sejam Agatha e Andrés, para saber se havíamos chegado a um acordo. reviro os olhos ao imaginar que teria que enfrentar outra reunião com os gracejos egocêntricos do advogado.

Ao lembrar o principal motivo por eu ter precisado passar a maior parte do dia fora, eu suspiro pesado. Não que eu tenha medo de Sérgio, longe disso! 

Mas alguma coisa me diz que ficar muito próxima a ela não seria uma boa decisão a ser tomada, então após o momento em que assinamos o contrato, precisei de muita concentração para não perder o controle e ignorar todos os olhares que ele havia me direcionado. E encontrei a desculpa perfeita para poder sair sem maiores questionamentos.

Obviamente eu não tinha que sair para encontrar um vestido, pelo menos não racionalmente; Alicia e Silene haviam entupido a minha mala com roupas adequadas até para visitar o Papa e a Rainha da Inglaterra. Mas deixei meu lado fútil me controlar e precisava de um banho de loja para relaxar, como costumo fazer sempre que o meu nível de estresse está muito alto,

Como Alicia sempre gostava de me lembrar, sexo era uma maneira bem melhor de diminuir o estresse mas as minhas úlitmas experencias me fizeram evitar problemas e sexo sozinha não aconteceria na intensidade que eu preciso para diminuir drasticamente meu estresse.

Diferente do que eu pensei, quando entro na sala principal da casa, eles não estão com a postura séria de outrora. Pelo contrário, os dois homens estão sentados cada um em um sofá, muito confortavelmente, cada um com um copo de whisky em mãos, a garrafa do mesmo disposta na mesa de centro e entretidos em uma conversa animada e noto que provavelmente Agatha não está presente. 

Não me esforço para escutar sobre o que ambos conversavam e para ser bem sincera não tenho interesse. O meu único esforço foi para passar despercebida e por alguns momento eu realmente acreditei que conseguiria, mas paro ao chegar no meio do percurso, o advogado fazia questão de verbalizar que havia notado a minha chegada.

How do you fall in love?

Harder than a bullet could hit you

How do we fall apart?

Faster than a hairpin trigger

- Olá Raquelita - faço um esforço sobrehumano para não revirar os olhos - você não achou mesmo que poderia passar despercebida, não é? - ele diz caminhando em minha direção - guapa, eu sinto informar mas a mistura perfeita de Atena e Afrodite não passaria despercebida nem mesmo no meio do apocalipse.

Pelo menos o elogio foi conceitual. 

- Buenas noches - digo tentando me livrar da situação - bom, cavalheiros, eu não quero atrapalhar o momento de lazer masculino então, se vocês me dão licença, eu vou para o meu quarto.

- Na verdade, nós estávamos esperando a dama para fazer um convite - nesse momento percebo Sérgio me olhar pela primeira vez desde que cheguei - eu os levarei para jantar em comemoração ao acordo assinado por ambos - ele diz alternando o olhar entre nós dois - e não vou aceitar uma recusa.

- Andrés, eu odiaria atrasar vocês, de verdade. Mas como você pode perceber, eu estava na rua e demoraria uma eternidade para tomar banho e me aprontar… - ele me interrompe imediatamente.

- Não se preocupe quanto a isso, o nosso amigo aqui é excelente em considerar variáveis e isso já havia sido cogitado - ele diz apontando para o homem que permanecia quase imóvel no sofá - então pode subir e levar o tempo que for necessário para se aprontar, nós estaremos aqui esperando. Não é hermanito? - pergunta a Sergio.

- Claro, a noite é uma criança - ele diz mais empolgado do que eu esperava.

- Vale, então parece que eu não tenho outra opção - digo me dirigido ao andar de cima

No instante em que entro no quarto, vi que Alicia havia me mandado mensagem, pedindo atualizações de como estava o martírio de viajar sem ela.

- Nesse momento eu estou me amaldiçoando por não ter dado uma desculpa melhor e agora tenho um jantar com o advogado.

- Foi exatamente pra isso que eu te criei, garota. 

- Dá um chá para ele!!!!

- Não revire os olhos para mim, a última pessoa que você foi para a cama foi o Angel, você não quer morrer tendo ele como última experiência sexual.

- Sérgio também irá!

- Eu daria um dedo para ficar aqui vendo um filme e comendo uma pizza.

- Melhor ainda!

- Você pode dar para os dois.

Não tenho como argumentar com ela, então deixo o aparelho na cama e ou em direção ao banheiro, não me apresso no banho. Tomo o tempo necessário para me preparar para a noite.

Decido por uma roupa básica, porém social, ponho um sobretudo por saber que a noite poderia esfriar. Vejo meu reflexo no espelho e fico muito feliz com ele, não que esteja muito produzida, estou com uma roupa básica, uma maquiagem leve e o cabelo preso em um coque e consegui fazer isso em menos de uma hora e meia.

Estou orgulhosa de mim mesma.

Desço e os homens ainda estão entretidos com a bebida, no entanto, Andrés me direciona um olhar furtivo e estala a língua ao me ver, percebo que Sérgio me encara com um olhar sombrio e indecifrável.

- Vejamos o que temos aqui - ele diz mais uma vez andando em minha direção - hermanito, acho que teremos que ligar para o Olimpo e avisar que tem uma deusa perdida aqui.

- Vamos Andrés, deixe de exagero - digo e ando em direção a saída.

O motorista já estava nos esperando, como ambos haviam bebido e por isso não poderiam dirigir, era a melhor opção, porque com certeza eu teria que beber também para suportar a noite.

Tomamos nossos lugares no veículo, Andrés logo se dirige para o banco do carona, e assim eu e Sérgio teremos que ir juntos no banco de trás.

O caminho até o restaurante dura uns 30 minutos, tempo suficiente para que o perfume do homem ao meu lado já possa surtir efeitos em meu corpo e tudo o que consigo fazer é me concentrar em não perder a serenidade, isso não vai acontecer.

Don't you say, don't you say it

Don't say, don't you say it

One breath, it'll just break it

So shut your mouth and run me like a river

 

Quando chegamos, percebi que é um ambiente bastante agradável, uma mistura de bar e restaurante; bastante aconchegante e discreto. As mesas são separadas por compartimentos, o que ajuda com a privacidade.

`Por incrível que pareça, a noite transcorre de maneira bastante agradável, eu até ouso dizer que me diverti bastante. Perdi as contas de quantos shots de tequila eu havia virado mas sei que foram suficientes para me deixar bem mais “alegre” que o normal. Ao sairmos do restaurante, me dirijo ao carro de braços dados ao advogado.

Jamais iria para a cama com ele, mas preciso admitir que depois de um certo nível de álcool ele pode ser uma boa companhia. Combinamos de o motorista deixa-lo em sua casa, outra hora ele voltaria para pegar seu carro, a caminho até o prédio dele foi bastante animado, riamos de uma maneira exagerada e descontrolada, por alguns momentos eu até me encostei no ombro de Sérgio enquanto inha uma crise de riso, ele como estava tão alterado quanto eu, não pareceu se importar com a minha proximidade.

Após nos despedirmos de Andrés, o ambiente no carro muda completamente, a tensão passa a ser palpável, nenhuma palavra volta a ser proferida até chegarmos em casa, quando nos despedimos do motorista.

Shut your mouth, baby, stand and deliver

Holy hands, will they make me a sinner?

Like a river, like a river

Shut your mouth and run me like a river

Choke this love 'til the veins start to shiver

One last breath 'til the tears start to wither

Like a river, like a river

Shut your mouth and run me like a river

 Subimos juntos mas ainda em silêncio, não sei o que falar com ele. Ao mesmo tempo que sua companhia era confortável e agradável, tenho a impressão de que tem um muro que nos impede de dialogar.

Chegamos ao corredor que dá acesso aos nossos quartos e eu me sento no sofá ali presente para me livrar dos saltos. Ele pára e fica me olhando, com o mesmo olhar sombrio de mais cedo.

- Você lembra da primeira vez que nós….- pauso para ficar de pé na sua frente - tomamos um porre?

- Eu lembro de todas as nossas primeiras vezes Raquel - ele diz e por algum motivo se aproxima de mim - todas elas.

- Não acredito em você, só está tentando me enganar por estar alcoolizada - digo me aproximando ainda mais dele.

Em um súbito momento sinto os nossos lábios encostarem, uma corrente de eletricidade cruza meu corpo. ele se afasta um pouco para me olhar e parece pedir consentimento para continuar. Avanço em sua direção mais uma vez, aprofundando o beijo, ele coloca as mãos em minha cintura e a segura com urgência, como se sua vida dependesse disso.

- Você acredita agora? - ele me beija mais uma vez, com ainda mais fome que da ultima vez - eu quis fazer isso desde o primeiro dia.

Tales of an endless heart

Cursed is the fool who's willing

Can't change the way we…

 

 


Notas Finais


E lembrem-se toda vez que alguem sai sem deixar um comentario, uma fada morre.


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...