História Como Treinar O Seu Dragão - Reencontros

Os primeiros raios de Sol rasgaram o céu límpido. O clima agradável com brisas sutis transformara-se no parceiro de vigília de Zitao. O guerreiro sagaz não pregara seus olhos desde o anunciado por Mimi, estava a espera de seu maior inimigo, aquele Dragão pelo qual nutria um desejo de vingança imensurável. O cansaço começava a pesar em seus ombros, sabia que poderia contar com os outros abençoados para manter a segurança do esconderijo, mas almejava ser o primeiro a erguer a espada com o rei de Long.

O abençoado por Panda lutava contra as pálpebras cansadas quando ouviu uma voz serena lhe chamar. Dirigiu seu olhar para a origem do som e encontrou um sorridente conselheiro trazendo, em seus pequenos dedos, uma tigela repleta de frutas picadas. O menino de madeixas douradas se aproximou e, sem permissão, enfiou um pedaço de banana dentro da boca de seu amigo. Ambos riram de modo infantil, entretanto, as feições tornaram-se sérias no momento seguinte. Precisavam conversar sobre a realidade que os cercavam.

Sentaram-se ao chão colocando a comida entre os dois. A respiração do conselheiro denunciou sua preocupação quanto ao possível ataque. O rapaz de pele morena esticou o braço para acariciar o cabelo de seu companheiro.

-Tenha calma, Lu. – A voz grossa escapou. – Eu estou pronto para lutar.

-Você sabe que as coisas estão mais complicadas agora... – Luhan fora bruscamente interrompido.

-Nós sobrevivemos dentro do território inimigo. Agora estamos em vantagem, eu vou salvar Yixing e voltaremos para Du Jiao Sho, restauraremos a nossa paz.

-Você é prepotente, Panda. – Lau surgiu acomodando-se próximo a suas visitas. –Dividam a comida!

-Eu não vou perder dessa vez, Lau. –Afirmou o guerreiro.

-Eu espero que não, Panda.  Onde está Mimi?

-Ele saiu logo cedo, disse que iria até a praia ver se o barco dos Dragões já estava próximo o suficiente para ancorar.  – Respondeu, Zitao.

-Mimi é um Tigre tolo mesmo. Não podemos ser vistos! Eles irão nos matar!

-Não seja medroso, Lau. – Panda sorriu dando tapinhas nas costas do anfitrião. –Temos a vantagem de você e Mimi conhecerem essa ilha muito bem. Acho que tive uma ideia.

-Que ideia, Zitao? – Luhan se pronunciou de boca cheia.

-Mimi e Lau conhecem muito bem a ilha, eles podem atrair Yazi até o esconderijo.

-Você está louco? Por que eu deveria trazer um Dragão para casa? –Lau exaltou-se esbugalhando os olhos.

-Porque serão quatro abençoados contra um.

-Quatro? – Indagou, Luhan. – Eu não posso lutar!

-Não estou me referindo a você, Lu. Estou me referindo a Yixing. –Zitao calou-se quando a folhagem seca anunciou passos acelerados em direção ao esconderijo.

-Chegaram! –Mimi surgiu por entre as folhas, ofegante. – O barco dos Dragões acabou de ancorar.  E agora?

-Certo. – Zitao se levantou. – Hora de colocar minha ideia em ação.

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O coração de Yazi tamborilava com ânsia. Finalmente haviam chegado em terras novas e seu espírito de dominador estava rasgando sua garganta com ordens para que os pequenos barcos fossem postos a água a fim de levá-los até a praia. Não demorou muito até seus soldados prepararem os remos, o transporte e todas as outras exigências. Yifan fez questão de levar o unicórnio ao seu encalço e seu irmão também optou por fazer a transferência junto ao capitão.

Em contra partida, o unicórnio sentia-se repleto de desgosto, seus braços cruzados mostravam o quão irritado o pequeno curandeiro estava com toda aquela situação. Havia muita coisa passando em sua cabeça; havia muita raiva transbordado de seus poros. É claro que todo ódio iminente não passou despercebido pelo Dragão que, de forma traiçoeira, resolveu provocar seu animalzinho lhe acariciando a bochecha. O pequeno Qilin esquivou movendo-se até ficar o mais longe que conseguira, quase agarrado aos braços de Taotie, irmão de Yifan.

-Agora vai me trocar pelo meu irmão? –Yazi disse em tom de deboche.

-Eu odeio você. – Resmungou, Yixing.

-Só porque lhe roubei muitos beijos ontem? Ah, unicórnio, você gosta dos meus beijos, não gosta?

As mãos ligeiras de Yazi contornaram a cintura de sua presa com afinco, seus dentes predadores capturaram os lábios vermelhos do menor. Yixing assustou-se e relutou com toda sua força aquele beijo forçado. Entretanto, havia algo ainda maior que lhe retirava as forças. E por mais que o pequeno unicórnio pensasse em quão repugnante era selar seus lábios aos do inimigo, mais o seu corpo queimava. Novamente Qilin se via servo de Yazi.

Aos poucos Yixing se entregara, deixava a língua de Yifan lhe possuir a alma levando consigo a sanidade. Depois se arrependeria, e ficaria com o rosto emburrado por mais algumas horas. Mas no momento em que o beijo acontecia, o curandeiro não conseguia ao menos se culpar. A cada dia, odiar o Rei de Long se tornava uma tarefa difícil. Em seu momento racional, gostava de reforçar os feitos do inimigo, recordava-se do motivo por precisar renovar tamanho rancor, lembrava-se de seu pai. Por outro lado, os sentimentos que aquele Dragão despertava em si era assustador e muito bom.  E mesmo que negasse até seu ultimo suspiro, desejava, antes de dormir, que Yifan não fosse Yazi. Mas as páginas escritas não poderiam ser reformuladas e ele precisava findar com a profecia o quanto antes para não acabar se apaixonando.

Taotie precisou afastar o irmão com um empurrão nada carinhoso. Yifan parecia perder os sentindo quando atracava-se a boca de Qilin, parecia que toda a força de sua existência escorria dos lábios finos do curandeiro. Quando sua consciência voltou, percebeu que já estavam na ilha e saltou em satisfação para fora do barco.

-Não temos conhecimento algum sobre a Ilha das Oferendas. Precisamos de cautela e coragem para explorar esta nova terra pertencente, a partir de agora, a Long! –Os soldados bradaram exaltados.  –Precisamos aguardar aqui até a tempestade passar. Recolham madeira, comida e façam fogo. Eu irei, junto a Taotie, explorar as redondezas da ilha.

As palavras foram captadas e logo os guerreiros começaram a executar as tarefas ordenadas pelo Rei. Yifan ergueu Shi Shen Li e a cravou na areia fina declarando aquela ilha como sua, da maneira como lhes era de costume. Então voltou a atenção para a floresta logo a frente e se pôs a caminhar trazendo seu unicórnio consigo.  Yixing estava possesso, mas marchava junto ao seu dono sentindo seu sangue borbulhar nas veias. Estava tão nublado em fúria que nem percebeu Yazi pausar a caminhada, acabando por chocar em suas costas. Felizmente seus pés ficaram firmes na areia e seu corpo não caiu. Ele tentou raciocinar rapidamente, buscando com os olhos o motivo da parada.

Alguns metros a frente, um dos homens de Yifan estava desmaiado com um pequeno espinho preso ao seu pescoço. A agitação foi instantânea, todos começaram a chacoalhar as mãos em uma ansiedade incomum. Yazi correu desesperado aproximando-se do corpo pálido e aparentemente sem vida. Suas mãos fortes bateram sem muita delicadeza no rosto do desfalecido para tentar despertá-lo, porém nada acontecia. De repente outro zumbido lhes chegou ao ouvido e mais um rapaz veio ao chão. Taotie foi amparar o segundo soldado que também possuía um espinho em seu pescoço. Então Yixing resolveu se intrometer.

O pequeno curandeiro ajoelhou ao lado do primeiro soldado e lhe tocou a testa com uma mão, enquanto com a outra, media a pulsação. Ainda havia vida, apesar da fraqueza das batidas. Yixing percebeu a sudorese e, ao retirar o espeto cravado, sentiu um aroma que lhe era familiar. Repetiu os mesmos atos com o soldado ao lado, observando os mesmos sintomas. Um terceiro guerreiro fora acertado, a paciência de Yazi estava esgotando-se.

-Chega! Vamos atrás do inimigo. Ninguém vai derrubar meus soldados e sair ileso. – Brandou erguendo-se em fúria, porém fora puxado bruscamente para baixo pelo unicórnio.

-Não seja tolo. Todos, abaixem-se. –Ordenou o menor. Os Dragões acabaram o obedecendo sem pestanejar, afinal, aquele era o bichinho do Rei.

-Você não manda em mim... – Yazi contestou já pronto para se erguer, mas o barulho típico lhe atingiu o ouvido e, por centímetros, escapou de ser atingido.

-O atirador está sobre a copa de uma árvore. Mas ele está distante e só consegue nos ver por algum vão entre a densa floresta. Abaixados, ficamos fora de seu campo de visão. –Explicou Qilin com um tom sério na voz.

-Eu sei, unicórnio. Mas eu não vou deixá-lo escapar.

-Certo. Seus soldados estão contaminados com um entorpecente que eu gosto de chamar de anestesia. Suas propriedades são paralisia total do corpo e perda da consciência por aproximadamente cinco horas. Mas isso depende do porte físico de cada pessoa.

-Unicórnio inteligente. –Debochou Yifan. – Tome cuidado. Deixem esses três em resguarda. Taotie venha conosco.

O irmão do Rei engatinhou aproximando-se dos companheiros de caça. Qilin, Yazi e Taotie seguiram para a entrada da floresta com os corpos rebaixados, joelhos sobre a areia e ouvidos bem atentos. Escutaram ainda, mais quatro tentativas de ataque do misterioso inimigo, até o barulho da folhagem seca prevalecer em uma altura incomoda. Yazi sabia que estavam próximos de sua caça e sua ganância fez com que seus passos ganhassem maior velocidade obrigando ao frágil Qilin a apertar suas passadas também.

As folhas machucavam os braços descobertos, alguns galhos também chegavam a ferir os pés poucos protegidos. A fadiga começava a aparecer no peito, os pulmões não aguentariam por muito tempo. Entretanto, o espírito de luta do grande Dragão assassino não deixaria que uma simples presa escapasse de suas garras. Ele trincou os dentes, preparou as garras, mas fora surpreendido. Precisou frear bruscamente, uma vez que um vale encoberto surgira magicamente a frente deles. Yixing trombou contra seu corpo e ambos foram ao chão, quase rolando pela ladeira semelhante aquela onde Qilin havia conhecido Yazi. A sorte de ambos fora a agilidade implacável de Taotie que lhes segurara com êxito. Estavam a salvo.

O Rei de Long, após recuperar um pouco do ar perdido por toda a correria, debruçou na beirada da ladeira forçando os olhos para observar o vale. Havia pessoas com uniformes em vermelho. Pareciam farrapos, lembravam vagamente soldados pós uma grande batalha. Os três aventureiros ficaram avaliando brevemente a cena que presenciavam  até que um dos homens do vale se aproximou revelando sua feição.

-Um intocável! –Yixing exaltou-se elevando a voz em um volume não desejável. O rapaz havia os escutado.

-O que eles estão fazendo aqui? –Indagou a si mesmo, Yifan. – Aquele ali nos viu. Vamos atacar.

-Não. –Taotie se intrometeu. – Eles devem ser os responsáveis pelo ataque de outrora. Possuem o tal veneno e isso seria muito perigoso agora. Você precisa se esconder e esconder o unicórnio.

-Você tem razão, Taotie. – Yifan levantou chamando ainda mais atenção dos intocáveis. –Você os atrai até a praia, tenha certeza de eliminá-los. Eu pego outro caminho com o unicórnio.

Taotie estava pronto para responder quando notou os intocáveis se aproximarem com rapidez e raiva no olhar. Não entendia ao certo o motivo de tamanho ódio, uma vez que haviam negociado dias atrás.  Mas não tinha tempo para raciocinar, ele e seu irmão sumiram entre as folhas de bananeira fazendo o caminho de volta.

-Vocês Dragões vão pagar pelo que fizeram! – Brandou o braço direito do imperador, erguendo sua espada. Haviam sido atingidos por certo veneno assim que conseguiram chegar a ilha mesmo com toda a tempestade que enfrentaram. Poucos estavam vivos, iriam guerrear pela vingança de uma tentativa de morte após tamanha catástrofe.

O que ambos não imaginavam, é que Mimi corria desesperadamente para o esconderijo em busca de proteção após colocar as duas aldeias uma contra a outra. Os planos de Zitao eram arriscados, mas eles estavam dispostos a arriscarem suas vidas para salvar o amigo unicórnio. O abençoado pelo Tigre Dente de Sabre conseguiu se desvencilhar com facilidade dos troncos e chegou ao local onde seus amigos esperavam ansiosos. Estavam aliviados por verem o companheiro bem, entretanto não possuíam tempo para comemorações, o pior ainda estava por vir.

No centro da floresta, os gritos eram a atração principal da ira dos Intocáveis. Taotie atrasou seus passos ficando propositalmente para traz, a fim de ser visto pelo inimigo enquanto distraía a esquiva do irmão. Despediram-se com a promessa de que se reencontrariam quando aquilo tudo acabasse. Yixing subiu nas costas de Yifan enrolando ainda mais as correntes em seu pé para não atrapalhar na corrida do Dragão. O Rei segurou com força as coxas do menor e saltou sentindo-se mais confortável para sumir dali. Tivera a impressão de escutar alguém passeando pelas árvores e estava curioso demais para não segui-lo.

Yixing escondeu o rosto na curva do pescoço do maior, sentia seu corpo tremer pela velocidade que alcançavam. Estava assustado e muita coisa bagunçava seus pensamentos. Seu coração saltava pela boca, lembrava-se do beijo dado em Yifan, pensava nos amigos que haviam sido levados pelos intocáveis e também podia sentir saudade de sua mãe e sua aldeia. Tudo aquilo mesclava-se a sentimentos indecifráveis, parecia que a cabeça do tão vingativo Yixing esvaziava-se de tudo. E ele almejou que aquilo fosse um sonho. Queria muito abrir os olhos e retornar, não para um tempo onde Yazi não existisse em sua vida, mas sim para o dia em que conhecera aquele Dragão. Deveria tê-lo treinado melhor.

Após um longo exercício, Yifan chegara a uma parte descampada e extremamente organizada. Não poderia chamar aquele lugar de aldeia, mas havia um local para descanso, madeiras arrumadas em forma de fogueira, foices e arco e flecha espalhados pelo chão, além de uma bacia de furtas frescas. O Dragão ativou seus olhos atentos buscando qualquer sinal de vida. Yixing também se atentou, porém, com os ouvidos. Um silêncio suspeito deixava ambos com uma incerteza incomoda. Parecia fácil demais encontrar um lugar tão arrumado para se esconderem. Aquilo só poderia ser uma armadilha. E de fato era.

Zitao moveu seu músculo cautelosamente erguendo o braço em um sinal para Mimi que se encontrava sobre uma árvore. O rapaz de grande estatura abaixou a cabeça minimamente focalizando melhor o alvo. Entretanto, Yixing estava preso nas costas de Yazi, o que dificultava o êxito de sua tarefa. Buscou uma parte livre para atacar e acabou optando pela panturrilha do Dragão.  Ao redor do esconderijo, o soldado moreno já preparava sua espada, Lau tinha uma foice em suas mãos e Luhan escondia-se aflito atrás de uma moita. Segurava um arco e flecha, mas sua função era passar a arma para o unicórnio assim que os outros conseguissem cercar Yazi.

Mimi estava pronto para o ataque, porém Yixing resolveu descer das costas do Dragão deixando o alvo ainda mais fácil. Assim que o unicórnio afastou-se de seu dono, Mimi atirou usando uma zarabatana e um corpo caiu desmaiado. Os olhos de Lau arregalaram-se novamente naquele dia, estava com o corpo trêmulo pelo próximo passo. Aquilo não era para ter acontecido. Yixing estava envenenado.

Zitao entendeu perfeitamente o que acontecera. Notou a corrente prendendo Yazi a Qilin e soube que o amigo havia puxado seu pé derrubando o Rei e ficando vulnerável ao ataque. A única coisa que não entendia era o motivo do curandeiro ter salvado seu inimigo. Mas o plano não poderia parar. Zitao saltou em direção a Yazi que percebeu o ataque e o defendeu com Shi Shen Li. Os olhos se encontraram e um sorriso nasceu nos lábios do Dragão.

-Olha quem está aqui. Um Panda. –Ouviu-se o tilintar das espadas em mais um ataque. Yifan ainda era muito bom em manuseá-la. –Vejo que acertou o alvo errado.

-Calado. – O erro de Zitao era desesperar-se a frente de Yazi. Acabava ficando fraco e pecava nas investidas. – Dessa vez eu vou arrancar o seu coração com os dentes.

Yifan riu de forma escandalosa e meteu sua espada na corrente que lhe prendia a Qilin. A mesma se partiu dando a tão almejada liberdade ao curandeiro. Uma pequena que ele não pudesse desfrutá-la. O Rei de Long preparou-se para um novo ataque, Panda também posicionou-se melhor para desfrutar daquela batalha. Era hora de mostrar do que era capaz. Moveu o braço com força e agilidade com a intenção de cortar a lateral esquerda de Yifan, mas o maior conseguiu desviar da espada contra atacando no mesmo momento, quase acertando a orelha do aldeão de XiongMao. Os ataques recomeçaram, Shi Shen Li cortava o vento em uma velocidade assustadora; se o Panda havia melhorado em suas habilidades, Yazi estava ainda mais audacioso nas investidas e conseguia conduzir a luta sem muitos problemas e com muitas vantagens.  O que ele não esperava era que uma lança aparecesse do nada próximo a suas costas. Conseguira desviar por pouco, rolando pela terra  até bater em um tronco.

Quando se pôs de pé, percebeu mais um guerreiro a sua frente. Lau estava com o rosto cheio de raiva e sua lança rodopiava entre seus dedos. Aquilo era novidade para o Dragão, não conhecia o rapaz a sua frente, mas os olhos do menino lhe chamou muita atenção.

- Quem é seu amigo? – Questionou Yifan. – Já desistiu do conselheiro desajeitado?

-Não ouse a criticar Luhan. –Zitao gritou.

-Eu sou Lau, abençoado pela Serpente.

-Serpente? –Yazi demonstrou uma breve confusão. – Vocês não estavam extintos? Tenho certeza que nós Dragões aniquilamos com todos vocês.

-Todos não. Eu sou o último vivo. – Lau sentiu-se estranhamente forte. Sentiu aquilo que há tempos havia perdido. Estava pronto para lutar em nome de sua família. Defenderia sua honra em uma aliança com um filho de XiongMao.

Lau atacou mesmo sem experiência, Zitao deu cobertura quando Yifan contra atacou. Parecia que quanto maior fosse o desafio, melhor Yazi ficava para lutar. Sua espada dançava entre as lâminas do Panda e da Serpente e seu corpo esquivava sem receber nenhum corte. Devido a lentidão de Lau, Yifan conseguiu cortar superficialmente sua perna fazendo o rapaz tropeçar para traz. Sentiu uma dor imensa, como se sua alma estivesse sendo sugada pelo corte. Então aquele era o verdadeiro poder de Shi Shen Li? Desistir não era uma opção. Engoliu o medo e a dor voltando a correr em direção do inimigo.

Não tardou para que Mimi entrasse na luta. Ele poderia ser bom com ataques a distância, mas com o movimento daquela batalha, seria impossível acertar o veneno no Dragão. Saltou do galho alto e decidiu ajudar os amigos. Ergueu a lança e bloqueou o ataque de Yazi sobre o corpo de Zitao.

-Mimi, abençoado pelo Tigre dente de Sabre. Único herdeiro de uma aldeia devastada por Dragões. Será uma honra executá-lo junto a meus amigos. –O rapaz alto rodopiou e raspou a ponta de sua lança nas vestes do Rei de Long. Até Zitao ficou impressionado com a agilidade de Mimi.

-Mimi? – Os olhos de Yazi aumentaram de tamanho com aquela informação. Sentiu um arrepio percorrer pelo corpo e mudou completamente sua posição de ataque.  Suas pupilas aumentaram, seus dedos pressionaram a espada com mais força. –Você é o “Espírito do Tigre”?

-Eu mesmo. – Declarou Mimi ficando entre Zitao e Lau.

-Zhoumi. O Espírito do Tigre. – Shi Shen Li fora em direção ao peito de Mimi, mas o mesmo desviou com perfeição.

-Zhoumi? –Lau virou-se para o amigo cheio de dúvidas. – Seu nome não é Mimi?

-Ah, então eles não sabem? –Yifan riu de forma provocativa.

-E nem precisam saber. Isso é passado, esse homem não existe mais.  –Mimi adiantou-se num ataque conseguindo rasgar mais um pedaço da calça do Dragão.

-O que não precisamos saber? – Zitao rosnou. –Fale!

-Vocês não sabiam? Foi o Zhoumi quem ajudou os Dragões a destruir a própria aldeia.  Nós tínhamos um acordo. Ele envenenou boa parte do exército, facilitando a nossa entrada. E tudo isso em troca de poder. Por que ele era um garotinho de sete anos muito esperto. E não queria pertencer a uma aldeia tão fraca quanto a dele.

-Isso... Isso é verdade? –Lau estava abalado. Aquele era seu amigo, não  poderia ser verdade. – Responde, Mimi!

-Lau... – Mimi apertou sua lança sem conseguir responder a pergunta.

-Mostre para eles o seu real poder, Espírito do Tigre.

"Toda luz possui uma sombra...

...dentro do bem pode haver o mal"

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Os Intocáveis haviam chegado a praia onde encontravam-se os soldados de Yazi. A luta ali era tão intensa quanto a do esconderijo. As espadas também gritavam enfurecidas. O sangue começara a manchar o solo da Ilha. Taotie comandava como podia, não sabia liderar uma batalha, era bom com navegação e não com mortes. Aquele era um contratempo que poderia mudar o rumo de todos os planos para ambas as partes. Para os Dragões, a perda em massa seria péssima quando os soldados chegassem a China, uma Terra completamente desconhecida. Por outro lado, os chineses não poderiam perder, uma vez que aquela missão poderia ser a única esperança para o Imperador.

Lutavam com suas vidas em jogo.  O suor acompanhava a bravura, a coragem e a sede por vitória. Eram poucos contra quase nada, mas o desejo de manter-se respirando estava mais presente que em grandes guerras. Aquilo apenas mostrava uma prévia de um futuro cada segundo mais próximo.

Taotie parecia exausto, seu braço tremia cada vez que era necessária uma defesa mais elaborada. Estava muito concentrado no inimigo a frente, não teve tempo para uma visão periférica das coisas. Não percebeu que o braço direito do Imperador não se fazia presente. Tão pouco imaginou que o mesmo poderia ter ido atrás de seu irmão. Mas deveria ter levantado tal hipótese. Aquela era a realidade, afinal.

Não longe dali, o chinês de farda vermelha buscava com afinco o Rei dos Dragões por entre cada vão de arbusto. Fora guiado por seu instinto e pelas frestas de luz encontradas pela floresta. Atencioso, percebeu os galhos quebrados, ainda estavam cheios de caldo, sinal de que haviam sido arrancados há pouco tempo. Ouviu um som estridente vindo de mais adiante e rastejou até entender que outra batalha acontecia entre Yazi e o garoto que havia negociado.

O soldado permaneceu estudando os ataques e investidas por poucos minutos, logo seus olhos captaram algo de muito interesse. O rapaz loiro que estava como seu prisioneiro arrastava um corpo desmaiado para longe daquele caos. Mas o que lhe chamara a atenção não fora a ação do menino, e sim, a marca que destacava-se no pulso do desfalecido. Era o desenho de um unicórnio, então aquele era o menino da profecia.  O menino que salvaria a vida do Imperador Qin Shihuang.

O chinês esperou Luhan afastar-se com Yixing em seus braços. O conselheiro escondeu-se atrás do mesmo arbusto e abraçou o amigo levando o rosto do mesmo até seu peito enquanto seus dedos deslizavam pelos fios do mesmo.

-Vai ficar tudo bem, Yixing. Agora nós vamos salvar você. –A voz de Luhan saiu fraca, seus olhos embotavam-se de lágrimas.

O conselheiro respirou fundo e fechou as pálpebras quando sentiu algo gélido lhe tocar a garganta. Quando conseguiu criar coragem para olhar, notou o Intocável a sua frente, com as mãos a agarrar o quimono de Yixing. Luhan relutou não acreditando que aquilo estava acontecendo. Será que não encontraria paz nunca? Não conseguiria ao menos proteger a pessoa que amava?

Sabia que não possuía forçar para lutar contra aquele guerreiro e acabou permitindo que Yixing fosse arrancado de seus braços mesmo a contra gosto. O chinês jogou o corpo apagado em seu ombro e tratou de correr para longe dali. Luhan se ergueu cambaleando, o pranto já lhe deixava a garganta. Tropeçou nas pedrinhas e apareceu no meio da batalha entre quatro grandes guerreiros abençoados por Totens diferentes. Conseguiu a atenção deles com um grito fino em um pedido para que parassem.

-Yixing foi levado pelo Intocável. – Declarou começando a chorar. De repente, a cabeça de Yazi rodou e sua espada foi ao chão.

"Quando se perde algo de valor...

... Se busca recuperá-lo a qualquer preço"