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História Consequence. (Clexa g!p ) - 07


Escrita por: wanheda102

Capítulo 7 - 07


LEXA

Quando chego em casa depois do dia todo na Briar, estou me arrastando.

Não sei o que odeio mais — os fins de semana, quando trabalho na boate até duas ou três da manhã e depois tenho que organizar pacotes e cartas das quatro às onze, ou os dias de semana, em que tenho aula de manhã e trabalho no correio de tarde, ou ainda quando começo o dia com um turno desumano no correio e depois vou para a aula. Hoje foi o segundo caso, então estou exausta ao deixar minha mochila no chão do corredor.

Mesmo que quisesse ver Clarke de novo (e a maioria das partes do meu corpo é a favor disso), estou esgotada demais para fazer qualquer coisa além de ficar deitada de barriga para cima.

Mas… Talvez isso não fosse de todo ruim. Ela poderia me fazer uma massagem, me comer devagar, e eu ia só ficar deitada, aproveitando.

Me dou um tapa imaginário. Clarke e suas habilidades são a última coisa que devia estar na minha cabeça.

Na cozinha, vovó está mexendo uma panela no fogão, vestindo uma calça jeans apertada, uma camiseta de lycra que está perdendo a elasticidade e as sempre presentes pantufas cor-de-rosa atoalhadas.

“Que cheiro bom!”, digo a ela.

O molho de tomate no fogo enche a cozinha com o aroma mais celestial. Meu estômago ronca, e me lembro que não comi nada desde o bagel que engoli no café da manhã, antes do trabalho.

“Menina, você parece prestes a desmoronar. Senta aí. O jantar vai estar pronto num segundo.”

Ela não precisa falar duas vezes, mas quando noto a mesa vazia dou a volta e pego pratos e talheres. Pelo corredor, vejo o topo da cabeça de Gustus, enquanto ele assiste à televisão. No mínimo está se tocando. Tremo ao tirar os pratos do armário.

Vai querer leite ou água?”, pergunto, arrumando a mesa.

“Água, querida. Estou me sentindo inchada. Sabia que Anne Hathaway tem intolerância a lactose? Ela não come lacticínio nenhum. Talvez você devesse cortar laticínios da dieta.”

“Vó, isso significa nada de queijo nem sorvete. A menos que um médico me diga que vou morrer se comer laticínios, quero tudo que as vacas têm pra me oferecer.”

“Só tô dizendo que pode ser por isso que você tá sempre cansada.” Ela aponta a colher na minha direção.

“Não, tenho certeza que é porque tenho dois empregos e tô fazendo período integral na faculdade”, respondo, secamente.

“Se ela parar de comer laticínios, vai ficar menos rabugenta?”, pergunta Gustus, entrando na cozinha. Está com a mesma calça de moletom de sempre. O tecido está tão desgastado na virilha que juro que dá para ver uma pele rosada de relance. Quase tenho ânsia e me viro, antes que a visão estrague meu apetite.

“Gus, não começa”, reclama minha avó. “Meu amor, pega o escorredor pra mim?”

Meu padrasto me cutuca quando passo por ele. “Ela tá falando com você.”

“Não brinca. Porque ela sabe que falar com você é a mesma coisa que falar com o sofá. O resultado é o mesmo.

Pouso o copo d’água ao lado do prato da minha avó e corro até a pia para pegar o escorredor. Vovó serve o molho numa tigela e me encarrego de cuidar do macarrão.

Gustus, por sua vez, se reclina contra a geladeira feito um sapo preguiçoso e nos observa correndo de um lado para o outro na cozinha.

Odeio esse homem com todo o meu coração. Desde o instante em que minha mãe apareceu com ele em casa, quando eu tinha oito anos, sabia que Gustus era sinônimo de problema. Falei isso para minha mãe, mas ela nunca foi muito boa em ouvir a filha. Nem em ficar por perto, aliás. Mamãe fugiu com outro cafajeste quando eu tinha dezesseis anos, e nunca mais a vi. Ela liga algumas vezes por ano para “ver como estou”, mas, até onde sei, não tem planos de voltar a Boston algum dia.

Nem sei onde mora atualmente. O que sei é que não existe razão nenhuma para Gustus continuar morando aqui. Ele não é meu pai — o privilégio é do canalha que abandonou minha mãe depois de engravidá-la — e com certeza não é da família. Acho que a única razão pela qual vovó o mantém por perto é porque o seguro- desemprego dele paga um terço do aluguel. Imagino que transe com ele pelo mesmo motivo. Porque ele é conveniente.

Mas, Deus, ele é tão inútil que acho que até os vermes torceriam o nariz para ele. Quer dizer, se vermes tivessem nariz.

Só quando a mesa está posta e o macarrão fumegante pronto para ser servido é que Gustus se senta.

“Cadê o pão?”, pergunta.

Vovó pula da cadeira. “Droga. Tá no forno.”

“Pode deixar”, digo a ela. “Senta aí.” Por mais que os comentários grosseiros da minha avó machuquem, a mulher me criou, me vestiu e me alimentou, enquanto Gustus ficava sentado com aquela bunda nojenta, fumando maconha e se masturbando na frente da TV .

Lanço um olhar para trás e noto, pela primeira vez, um envelope branco enfiado dentro de sua calça de moletom. No mínimo é uma conta. A última vez que Gustus escondeu uma conta da gente (porque tinha visto um monte de pornô no pay-per- view), ficamos com três mensalidades atrasadas para pagar. Nosso orçamento só funciona se não tivermos esse tipo de surpresa inesperada.

Tiro os pães do forno, coloco numa cesta e levo para a mesa. Ao me sentar, puxo o envelope das costas da calça de Gustus. “O que é isso?”, pergunto, balançado a carta no ar. “Alguma conta?”

“Você não andou assistindo àqueles programas sujos de novo, andou, Gus?” Os lábios de minha avó se curvam para baixo.

Ele fica vermelho. “Claro que não. Já falei que não vejo mais essa merda.” Então se ajeita na cadeira e me lança um sorriso zombeteiro. “É pra você.” E arranca o envelope das minhas mãos para esfregar debaixo do nariz. “Pra mim, tem cheiro de gente rabugenta e metida a besta.”

Um vislumbre de vermelho na beirada faz meu coração bater mais rápido e me jogo na direção do envelope, mas Gustus afasta o braço, fazendo com que eu tenha que me espremer contra ele. Meu Deus, odeio esse cara.

“Dá a carta pra ela”, exige minha avó. “A comida tá esfriando.”

“Tava só brincando”, devolve ele, deixando o envelope cair junto do meu prato. Meus olhos se fixam no brasão carmim no canto superior esquerdo.

Abre”, instiga minha avó.

Seu tom tem um quê de ansiedade. Ela pode zombar da minha educação inútil e de meus sonhos ridículos, mas acho que no fundo está vibrando. Pelo menos isso vai servir para esnobar as mulheres no cabeleireiro, cuja netas estão tendo filhos em vez de entrar para Harvard.

Só que… o envelope é tão fino. Todas as minhas cartas de aceitação para a faculdade vieram em envelopes gigantes, cheios de brochuras bonitas e catálogos. “Ela tá com medo. Provavelmente não passou.” As palavras de Gustus estão imbuídas tanto de desdém quanto de alegria.

Pego a carta e rasgo o envelope com a faca dele. Uma única folha de papel cai lá de dentro. Tem vários parágrafos, nenhum dos quais leio por inteiro porque estou só passando o olho em busca das palavras mais importantes.

Parabéns pela admissão na Faculdade de Direito de Harvard! Esperamos que você se junte a nós em Cambridge, como parte da classe de

“E aí?”, pergunta minha avó.

O maior sorriso que a humanidade já viu se abre por todo o meu rosto. A fome, o cansaço, a irritação com Gustud, tudo sumiu.

“Eu… passei.” As palavras saem num sopro de ar. Repito, gritando desta vez. “Passei! Meu Deus! Eu passei!”

Balanço a carta no ar, dançando descontroladamente pela cozinha. Não costumo baixar a guarda na frente de Gustus, mas o filho da mãe nem sequer existe para mim agora. Sinto a empolgação pulsando em meu sangue, junto com um alívio tão intenso que me impede de ficar em pé por muito tempo. Eu me jogo sobre os ombros de minha avó e dou um abraço apertado nela.

Ih, vai ficar ainda mais metida agora”, ouço-a reclamar, mas nem ligo.

“Que nada, isso não faz dela alguém especial nem nada assim”, resmunga Gustus. “Ainda tem dois buracos que nem qualquer vagabunda. Três, se você contar a boca.”

Fico esperando que minha avó me defenda, mas, aparentemente, o ciúme está ganhando do orgulho neste momento. Ela ri do comentário repugnante, e, na mesma hora, não quero mais comemorar com essas pessoas. Não vejo a hora de sair desta casa.

Ainda assim, me recuso a deixar qualquer coisa afetar minha felicidade agora. Dou as costas para eles e saio saltitando pelo corredor para dar a notícia às minhas amigas.

“E o jantar?”, grita minha avó atrás de mim.

Ignoro-a e continuo caminhando. No meu quarto, me jogo na cama e escrevo para elas.

Eu:Passei .

Lauren ganha de Raven por um milésimo de segundo.

Laur: Ai meu Deus! Parabéns!!!!!!!!

Raven responde: FOTO! FOTO! FOTO!

Tiro uma foto da carta e mando. Enquanto espero as respostas, corro pelo corredor, faço um prato de macarrão, enfio um pão na boca e volto às pressas para o quarto. Minha avó e Gustus dizem alguma coisa, mas nem escuto. Meus ouvidos estão zunindo de alegria.

Tem uma dezena de respostas esperando por mim quando chego ao quarto. Laur: <3

Rae: QUE LINDO! Vc é tão incrível!

Laur: Tô tão orgulhosa. Vc vai ser a melhor advogada do MUNDO. Por favor, diz q vai me representar se eu for processada por erro médico.

Rae: ISSO É A COISA MAIS LINDA!

Laur: Qdo a gnt vai comemorar? E “não”, “nunca” e “não vai acontecer” não são respostas aceitáveis .

Mastigo o pão e escrevo de volta.

Eu: A) Vcs duas acabaram d garantir assessoria jurídica d graça pro resto da vida. B) Comemorar amanhã. Prometo estourar o cartão de crédito d vcs .

Laur: No creio! Vou fzr reserva no Santino’s .

Rae: Esse lugar precisa d reserva?!

Laur: Não sei! Jeito d dizer. Mas a gente podia ir no Malone’s d nv, se vc quiser comemorar com sexo .

Eu: Ainda tô c/ o telefone da garota d sábado passado. E vc? Seu parque d diversões funcionou ontem?

As duas tinham ido juntas a uma festa na casa de Costia. Será que Clarke estava lá? E se estava, quem será que ela levou para a caminhonete? A ideia daquelas mãos grandes e calejadas nos peitos de outra me faz cerrar os dentes de inveja, mas não tenho o direito de ter ciúme. Bloqueei o telefone dela, afinal. Deixei bem claro que não estava interessada em sair com ela.

Então por que desbloqueou o número dela, hein?

A voz de escárnio na minha cabeça me faz morder o lábio. Tá, é isso aí, desbloqueei o número. Mas não foi porque queria sair com ela nem nada assim. Só achei que podia ser útil para o caso de… uma emergência.

Nossa, sou tão patética.

Meu celular apita, despertando-me dos meus pensamentos.

Rae: Não. Fui uma santa .

Laur: Mentira! Ai meu Deus, q mentirosa. Manda 1 foto do chupão. Agora, ou eu mando . 

Rae: Tá bom. Eu te odeio branquela.

Às vezes, queria tanto morar com elas. Engulo mais um pouco de macarrão enquanto espero a foto de Raven. Quando a imagem chega, quase engasgo com a comida.

Eu: Vc pegou um lobisomem adolescente ontem?

Rae: Não. Finn Collins .

Vasculho a memória e me vem a imagem de um menino de um metro e setenta, de cara redonda e gentil.

Eu: Um q joga na defesa? Tem carinha d anjo!

Rae: É. Acontece q gosta d chupar. Ainda bem q tá frio, pq camiseta tá fora d cogitação . 

Eu: E além d tentar tirar sangue dos seus peitos, vc gostou?

Rae: Não foi ruim. Ele sabia usar o equipamento .

Eu: Rá! Minha teoria sobre atletas continua firme e forte!

Laur: Entre Clarke e Finn, parece q a hipótese da Lex. é válida . 

Rae: Vcs sabem q não é assim q o método científico funciona, né? 

Eu: Sim, mas não estamos nem aí .

Laur: Quer dizer q a Grif vai ganhar uma segunda rodada?

Eu: Duvido. Ela é boa, mas qdo tenho tempo?

Continuamos trocando mensagens por mais alguns minutos, mas o pico de adrenalina está passando. Apoio o prato pela metade na cabeceira e abraço a carta de Harvard junto do peito. Está tudo acontecendo. Todas as coisas boas pelas quais trabalhei tanto estão se concretizando. Nada pode me parar agora.

Pego no sono com um sorriso grande e feliz no rosto.

Vou ter q deixar pra próxima, mulheradarespondo para minhas amigas no dia seguinte, depois que Laur escreve perguntando se quero almoçar com elas.

Laur: Ah, pq??

Eu: Prof Fromm me chamou pra visitar o campus. Tô em Boston, matei a última aula. Aliás, sou oficialmente boa d pra vcs .

Laur: Bjs! Depois conta como foi. Tô doida pro ano q vem chegar logo, nós 3 em Boston, fazendo facul!!!

Rae está na aula, mas sei que vou receber uma mensagem dela assim que sair. Pego a Linha Vermelha do metrô até Harvard Square. Juro que até a estação aqui cheira bem, diferente das outras, que cheiram a lixo, xixi velho e suor. E o campus é lindo. Minha vontade é abrir os braços e rodar de felicidade.

Segundo o mapa, os dezoito ou mais prédios da faculdade de direito ficam do outro lado do campus. Mas não estou com pressa, então caminho lentamente, admirando os edifícios enormes de tijolo aparente, as dezenas e mais dezenas de árvores com as últimas folhas nos galhos, a vastidão dos gramados — ainda verdes em alguns pontos. É como uma Briar turbinada. Até os estudantes parecem mais inteligentes, mais ricos, mais importantes.

A maioria das alunas está usando o que gosto de chamar de uniforme da menina rica: mocassim da Sperry, calça jeans Rag & Bone e moletom Joie — do tipo que parece saído de uma lata de lixo, mas na verdade custa algumas centenas de dólares. Só sei disso por causa do armário da Laur.

Mas só porque minha saia preta e a camisa branca vieram de uma loja barata não significa que não pertenço a este lugar. Posso não ter tanto dinheiro quanto os outros aqui, mas poria meu cérebro à prova contra qualquer um desses alunos. Abro as portas do Everett, o edifício onde fica a sala da professora Fromm, e me apresento para a recepcionista. Ela anota meu nome num livro de visitas e, em seguida, sinaliza para que eu aguarde um instante.

Não passo nem um minuto sentada na recepção, e um jovem de camisa xadrez azul e branca e gravata azul-escura chega de uma sala lateral que não notei que existia quando entrei.

Oi. Meu nome é Cage .” Ele estende a mão.

Aperto-a automaticamente, sem entender por que está aqui, ao mesmo tempo em que me pergunto por que alguém chamaria o filho de Cage. “Sou  Lexa Woods.

“Ótimo. Bem-vinda à Assistência Jurídica de Harvard. Aqui está nosso formulário de inscrição. Se precisar de alguma ajuda, me avise.”

Ele empurra uma prancheta na minha direção. Passo o olho pelo documento, sem entender por que preciso preencher um formulário para ver a professora Fromm. Solto a caneta da prancheta e começo a escrever meu nome. Então paro. Embora não goste muito de parecer burra, acho melhor perguntar o que é isso. “Isto é para a assistência jurídica gratuita? Porque não…”

Ele me interrompe. “Não se preocupe. É para isso que serve a assistência jurídica. Para os necessitados.” A última palavra vem carregada de condescendência.

Meus cabelos da nuca se eriçam. “Sei disso…”

“Você não lê inglês? Habla español?” Ele arranca a prancheta da minha mão, vira a página e me devolve. O formulário agora está em espanhol.

“Falo inglês”, rosno entre dentes.

“Ah, tá. Posso preencher o formulário, se você não souber ler nem escrever. Tem muita gente com esse tipo de problema aqui. É uma causa de família? Disputa de proprietário com inquilino? Não lidamos com delitos aqui.” Mais uma vez, ele me abre um sorriso condescendente.

“Sou uma aluna”, digo a ele. “Quer dizer, vou ser uma aluna.”

Nós nos encaramos por um momento, enquanto espero a ficha dele cair. Dá para ver o momento em que isso acontece, porque o sujeito branquelo fica ainda mais branco. “Ah. Nossa, pensei…”

Sei o que ele pensou. Deu uma olhada no meu casaco puído e me rotulou como uma pessoa carente que precisa de orientação jurídica de graça. E a parte mais humilhante é que ele não está errado. Se eu precisasse de um advogado, não seria capaz de pagar.

“Algum problema?”, interrompe uma voz nova. Uma mulher girafa surge atrás de Cage, as mãos entrelaçadas nas costas.

“Não, problema nenhum, professora Byrne.” Cage me lança um sorriso contido, mas seus olhos piscam em alerta, como se dissesse para eu não dar com a língua nos dentes.

O sorriso que lhe ofereço em resposta é o mais escancarado possível. “Dale aqui pensou que eu fosse uma cliente, mas na verdade tenho uma reunião com a professora Fromm.”

A professora me examina, inteirando-se rapidamente da situação. Ela pega a prancheta e aponta as escadas com a cabeça. “Segundo andar, primeira porta à esquerda.” Em seguida devolve o formulário para Cage.

“É Cage”, sibila ele, e se afasta de nós, pisando duro.

A professora sacode a cabeça. “Alunos novos”, diz, como quem pede desculpas, antes de caminhar na direção oposta.

Assim que Cage desaparece no corredor, ouço uma voz estridente recebê-lo. “Ai, meu Deus, isso foi demais. Você realmente confundiu aquela menina com uma imigrante de língua espanhola?”

Eu devia sair dali, mas meus pés criaram raízes. A recepcionista me lança um olhar aflito.

“Viu a roupa dela?”, protesta Cage, do corredor. “Parecia uma daquelas indigentes que vêm todo ano pegar roupa na cesta de doações para vítimas de violência doméstica.”

Uma nova voz entra na conversa. “Do que vocês estão rindo?”

“Cage confundiu uma aluna que veio falar com a professora Fromm com uma mendiga.”

Com as bochechas queimando, me volto para a recepcionista. “Vocês têm que fazer alguma coisa com essa acústica.”

Ela dá de ombros. “Se acha que isso é o pior que ouço todo dia, você não vai ter uma surpresa muito boa.”

Que beleza. 

A ideia de continuar aqui já não é mais tão atraente, então subo os degraus dois de cada vez. A sala da professora Fromm fica no último andar. Ela está ao telefone, mas me vê na mesma hora.

“Lexa, entre”, convida, cobrindo o fone com uma das mãos e me chamando com a outra. “Só um minuto.” Para a pessoa no telefone, ela diz: “Tenho que ir. Chegou uma aluna. Não esquece de pegar a roupa na lavanderia”.

A sala está forrada de livros, a maioria deles publicações jurídicas de capa dura verde-oliva com as palavras North Eastern Reporter em letras douradas na lombada.

Sento na cadeira de couro preta diante da mesa e me pergunto como seria estar do outro lado. Significaria que, quando eu chegasse, ninguém nunca mais me confundiria com uma usuária da assistência jurídica.

“Então… Parabéns!” Ela sorri para mim. “Quase contei na outra noite, mas não quis estragar a surpresa.”

“Obrigada. Nem posso dizer como estou emocionada.”

“Seu histórico é impecável, mas…” Ela faz uma pausa, e meu coração dispara descontrolado.

A professora Fromm não pode anular minha aprovação, pode? Depois que recebi a carta, ela não pode mais ser revogada, né?

“Becca falou que você tem dois empregos”, termina ela.

“É, sou garçonete e trabalho no correio.” A professora Gibson sabe exatamente onde trabalho de garçonete, mas me falou que ninguém em Harvard precisava saber, então mantenho isso em segredo. “Pretendo largar os dois trabalhos antes do início das aulas, no outono.”

Isso a deixa feliz.

 “Ótimo. Estava torcendo por isso. Embora não seja mais verdadeiro aquele velho ditado que diz que, se olhar para a esquerda e para a direita, um de vocês três não vai estar aqui no ano que vem, alguns alunos ainda largam o curso depois do primeiro ano. Não quero que você seja um deles. Esse outono, você precisa concentrar sua atenção nos estudos. Espera-se que você absorva mais informações numa noite do que a maioria dos alunos de graduação faz num semestre.

Ela pega dois livros de uma pilha no chão e os desliza sobre a mesa na minha direção. Pelos títulos, um é sobre direito administrativo, o outro, sobre a arte de escrever.

Quando tiver um tempo, e sugiro que arranje, pratique sua escrita. A caneta é sua arma mais forte aqui. Se souber escrever bem, você vai longe. Aqui também está um livro sobre direito administrativo. Um monte de gente se atrapalha com prática regulatória versus lei corporativa e de responsabilidade civil. É bom estar um passo à frente.” Ela dá mais um empurrãozinho nos livros na minha direção. “Obrigada”, digo, com gratidão, recolhendo-os e pousando no colo.

Não se preocupe. Mande um abraço para becca quando voltar para a Briar.” Então é isso. Estou obviamente dispensada.

Obrigada”, repito, sem jeito, e, segurando os livros, levanto.

Matei aula, peguei metrô e encarei um encontro humilhante com um babaca que tem nome de cachorro, para quê? Uma conversa de cinco minutos e duas recomendações de livro?

Quando chego à porta, a professora Fromm me chama de novo.

 “E, Lexa, vou te dar uma dica. Invista um pouco do dinheiro do empréstimo num guarda-roupa novo. Vai te ajudar a se sentir em casa aqui, e o campo de batalha não vai parecer tão desigual. Você deve se vestir para o trabalho que quer, e não para o que tem.” Faço que sim com a cabeça, torcendo para que meu rosto não esteja completamente vermelho. E eu achando que a sessão “Vamos humilhar a Lexa” já tinha terminado.

Caminhando pelo campus, tudo parece ter perdido um pouco do brilho. Desta vez, noto que a maior parte do gramado está marrom e que as árvores estão praticamente peladas e sem folhas. Os alunos parecem todos iguais — ricos e privilegiados.

Quando chego em casa, atiro os livros sobre a cômoda e deito na cama. Tem um pedaço da parede perto da janela onde o gesso rachou e está ficando amarelado. A infiltração existe há tanto tempo que já nem me lembro, mas uma vez comentei sobre isso com minha avó, e a resposta que obtive foi um olhar vazio, então nunca mais toquei no assunto.

Viro de barriga para cima e olho para o teto. O gesso lá em cima também está rachado, e existem umas manchas escuras que sempre me intrigaram. Será que tem um vazamento no telhado?

Sinto uma onda de vergonha tomar conta de mim, mas não sei do que estou envergonhada. Da minha casa feia e dilapidada? Das minhas roupas baratas? De mim em geral?

Deixa pra sentir pena de si mesma mais tarde. Hora de pagar as contas .

Deus. A última coisa que quero fazer agora é sair de uma humilhação e ir para outra, mas não tenho muita escolha. Meu turno no Boots & Chutes começa em uma hora.

Me obrigo a ficar de pé e pego o shortinho e o sutiã que compõem meu uniforme. Só mais dez meses disso, digo a mim mesma, ao vestir a roupa e passar a maquiagem. Calço minhas plataformas de stripper salto quinze, visto meu casaco de lã puído e sigo para a boate de strip. Que, infelizmente, é o único lugar em que me encaixo de verdade.

Sou vulgar. Vivo com gente vulgar. Pertenço a lugares vulgares.

A questão é: será que serei capaz de me livrar do fedor do passado para me encaixar em Harvard?

  Achei que fosse. Mas hoje, honestamente, não sei.



Notas Finais


Olá mores, espero que tenham gostado do capítulo. Diga-me oque pensam. Bjinhossss


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