História Contrato - Fillie - Visível e exposto

Cinco dias antes

Já é tarde, Sadie foi embora e eu tenho que ir também. Estalo os dedos das mãos e decido ir atrás de Finn, mas não sem antes ter certeza do motivo por trás do sumiço de Mary Jolivet. Ela desapareu e presumo que deva estar dormindo, cansada da viagem. Minha teoria foi confirmada assim que fui para a ala oeste e ri ao encontrar o cômodo todo escuro, as portas abertas, a mala grande de rodinhas ao lado da cama e uma Majo dormindo profundamente (lê-se desmaiada) sobre a roupa de cama, ainda vestindo as roupas do aeroporto. Fechei a estrutura de madeira com cuidado, mesmo sabendo que não a acordaria caso houvesse algum ruído alto.

Era a vez de procurar Wolfhard e não demorou muito para que acontecesse. Encontrei-o no jardim dos fundos. Há muito eu não pisava ali. Ele ficou aqui fora esse tempo todo? 

Estava tão imerso em seus pensamentos que não percebeu minha presença. Respirei um pouco do ar floral e me aproximei. 

– Ei, Finn. – Seus olhos ainda vermelhos encontraram os meus. – Está escurecendo, preciso ir. – Balançou a cabeça olhando através de meu rosto e duvido que tenha prestado alguma atenção no que falei.

Parecia estar em transe. Senti vontade de tocar seus cachos e acariciá-lo em uma tentativa de o acalmar mas desisti no meio do caminho. 

– Boa noite. – Ele assentiu outra vez, foi quase engraçado. 

Eu sabia que Finn ficaria em choque, não esperava menos. Esperava mais: um surto, talvez.

Bem, ele surtou, só que não da maneira que imaginei.

Comecei a atravessar o gramado de volta para a casa e como se tivesse acontecido um delay, ouvi-o chamar meu nome. 

– Millie, espere. – Parei de andar e girei os calcanhares.

– Por favor, fique aqui essa noite. Precisamos conversar, mas não consigo fazer isso hoje. 

– Finn, está tudo bem, eu realmente entendo, você precisa digerir, é um processo e

– Por favor. – Repetiu me cortando. 

Fiz um muxoxo, ponderando. Olhei para seu semblante aturdido e não tive outra resposta. 

– Certo. Tudo bem. 

– Obrigado. – Deu um passo a frente e a palma de sua mão envolveu a lateral do meu rosto. Estava fria devido a temperatura amena do lado de fora. Deixou um beijo suave, quase imperceptível, em minha bochecha e saiu. 

Eu não quis jantar e acho que mais ninguém o fez também. Apenas desci na cozinha para cumprimentar Thity e dizer que sentia saudades daquela senhora fofa e a vi preparando uma bandeja de cristal que já sabia que era para mim. Conversei com ela por poucos minutos e subi de volta para o meu quarto, deveras vazio. Havia, como o esperado, alguns pertences já empacotados. Minhas roupas de fato não estavam mais lá, tenho algumas peças no apartamento de Noah, na mala que levei, e a grande maioria está, é claro, no quarto ao lado. Um pijama e uma troca de roupas estava perfeitamente dobrada sobre a escrivaninha. Ainda havia toalhas no armário em meu antigo banheiro e tomei um banho longo antes ir dormir. 

– Posso entrar? – Olhei para a direção da voz encontrando-o parado na porta.

– Claro. – Abaixei o exemplar de Anne de Green Gables que peguei no meio da noite, quando ainda não havia conseguido dormir.

Ele entrou no quarto, e estava diferente. Não sei se apenas minha interpretação se amplificou ontem depois do episódio todo de quando descobriu ou se ele estava se deixando ser... visível.

Esperei pacientemente enquanto vinha e se sentava junto a mim. Ele lambeu o lábio antes de iniciar a conversa e reprimi um suspiro.

Ele está mais bonito que o normal ou eu quem estou louca? 

– Antes de mais nada, tenho que agradecê-la por ontem; por tudo o que disse. Você conseguiu me desvendar, me deixou escancarado e completamente exposto até para mim mesmo. Me fez enxergar a realidade que estava na minha frente, além de ter descoberto o que eu estava fazendo... – Ele fez uma pausa. – Mills.. não posso mentir e dizer que estou pronto para isso, porque não estou. Nunca fez parte dos meus planos, nem dos mais longínquos. Nunca foi uma possibilidade, até acontecer.

– Sei disso, Finn. Você sempre deixou claro quais eram as suas perspectivas, nunca me iludiu com nada. Não entrei nesse jogo porque quis mas permaneci nele por vontade própria.

– Não faz ideia do quanto me doía saber que eu não poderia suprir as suas expectativas e o seu sonho. 

– Meu sonho é você. – O sorriso que moldou seus lábios rosados não chegou aos olhos.

– Nós dois sabemos que não é verdade, docinho. – Pisquei forte com o antigo apelido. – Entendo que teve receio de me contar durante todo esse tempo e a razão pelo qual o teve, mas eu nunca, jamais, deixaria você sozinha em uma situação como essa. 

– Sei disso também. 

– O seu medo era outro. – Desviei o olhar por um instante e pus um fio inexiste de cabelo para trás da orelha. Ele me pegou; de novo. – Me desculpe, Mills. 

– Eu entendo. Não quero que faça nada contra a sua vontade. 

– Tenho certeza absoluta sim, e por Deus, é isso que me mata. O mundo não merece você, Millie Bobby Brown. – Sete meses atrás, voltar a ter esse sobrenome era tudo o que eu mais almejava. Hoje ouví-lo parte mais um pedaço do meu coração. Ele continuava falando:

– Eu não estou fazendo nada contra a minha vontade agora e não farei depois. Volte para cá. 

– O quê?

– Volte a morar aqui. 

E foi assim que voltei para a mansão.

E foi como se eu nunca tivesse saído. 

Exceto é claro pelo detalhe de que não voltamos a ser um casal. - O que não foi uma pauta muito relevante para a mãe de Finn, visto que pareceu uma menina ao ver-me na sala de estar pouco antes do almoço e começou dar pulinhos. Eu a amo.