Sabe, cara... ando tão desmotivado. Eu fiz uma montanha de planos que pra ser realista, vou logo dizendo, não porei em prática nem a metade. Eu tenho esse defeito, o de sonhar demais e deixar pra amanhã, semana que vem, daqui 5 anos. As vezes eu só queria realizar o último plano, que consiste em arrumar a mochila e ir conhecer o mundo, mas para um cara que ainda não sabe o que quer da vida, se é ter uma vida tranquila e estável ou ser um maluco que não se preocupa, essa é uma ideia grande demais, para atitudes pequenas demais.
Estive andando por aí sozinho, debaixo de pontes e no alto de edifícios, filosofando, bolando um novo plano, mas nada me veio à cabeça. Eu não sei se você já teve um momento assim, em que você para e tenta pensar no que fazer da sua vida e percebe que você não tem a menor ideia, nenhuma certeza, só um monte de medos improváveis, dúvidas em excesso e nenhum vestígio de prosperidade ou alegria. Fico pensando no que seria melhor para mim baseado no que já tenho, na minha família, no meu emprego, na minha faculdade, e olhando por esse lado me parece bem claro, quando coloco minhas crenças religiosas, mais ainda! Só que por outro lado eu tenho medo, de que o certo não seja como eu espero, e que no final eu me arrependa das escolhas que deixei de fazer, dos planos que deixei no papel, das viagens que não vou fazer por estar envolvido demais com o trabalho. Do nada vem aquela bad, e eu me perco de novo, olho por um outro lado, fico pensando, e se eu deixar tudo isso, trabalhar como um freelancer, me mudar para longe, não me envolver com ninguém, deixar um pouco de lado esses mandamentos de Deus, e ir curtir, e mal termino a frase e já sinto arrependimento só de dizer. Já me vejo como o cara sentado na esquina com uma mochila velha e uma garrafa de vinho barato, sem falar do bafo de cigarro e concluo que isso não é pra mim. Ainda tenho que dizer, deixar Deus de lado? Isso nem faz sentido na minha cabeça? Pensa comigo, como é possível deixar de lado seu melhor amigo, seu pai, seu amor primeiro? Junte todas essas pessoas em uma só, agora tente abandoná-la. Seria como perder todo o sentido de estar vivo e de fazer alguma coisa boa nessa vida. Posso estar sendo radical demais, mas é esse o tipo de relacionamento que tenho com Ele.
Ah, espere um pouco. Alguém chegou, estão tocando a campainha.
Me levanto do sofá ao qual estava jogado até agora, vou em direção a porta e ao abrir tenho a visão da garota de cabelo encaracolado que cursa medicina. Se lembram dela?
-Júlia ? - A chamo meio confuso. Ela não costuma me visitar. Ela nunca visita ninguém porque está sempre estudando.
-Oi. -Ela sorri e espera eu falar.
-Oi. Tudo bem? O que aconteceu?- Falo preocupado, mas sem notar a saia curta em conjunto à blusa florida e os tênis de skatista. Sim senhoras, nós reparamos em tudo e esquecemos de tudo no segundo seguinte, mas o foco é, ela estava linda.
-Está sim. Eu só queria te ver, já que eu tinha um tempo livre. -Ela pareceu corar?
-Entra. Vou fazer um café pra nós, ou você prefere um suco? - Falo enquanto ela entra e anda até a sala.
-Café está ótimo. Obrigada.
Ela se senta e coloca a bolsa ao lado dela, parece examinar cada canto do meu apartamento. Ainda estou abobalhado no mesmo lugar, porque apesar de ser minha amiga de infância, é a primeira vez que ela vem até a minha casa, depois que saí da casa dos meus pais.
Faço o café e fico olhando disfarçadamente para ela que parece meio incomodada de estar aqui. Levo as duas canecas com café para a sala e entrego uma a ela.
-Não tem aula hoje? -Pergunto.
-Já tive. Estou livre agora a tarde. -Ela pega o café.
-Entendo... Então, planos para hoje? -Falo tentando não deixar a conversa morrer.
-Só pensei em vir aqui, conversar um pouco, revirar sua maravilhosa prateleira de quadrinhos e quem sabe mais tarde, irmos lanchar em algum lugar?
Sorria para ela. -Ideia interessante! Porque não?
Peguei algumas revistas e espalhei sobre a mesa, ela sempre preferiu as da Marvel. Ela folheava e comentava alguma coisa sobre elas enquanto eu estava preso em um Dejavi. Não notei o tempo passar, já eram três da tarde quando estávamos terminando de ver um filme antigo que eu tinha salvo no PC. É tão bom estar perto de alguém que te deixa à vontade, sem pressão, sem segundas intenções, e melhor ainda, alguém que te conhece bem o bastante para saber que HQ's e pipoca não se misturam. Ela tinha guardado as revistas na mesma ordem que eu as tirei, foi um momento mágico pra mim!
-Então, aonde você quer ir? -Eu perguntei.
-Vamos a uma confeitaria, quero comer doces! -Ela falou empolgado, mas não sou muito de doce, então não me animei muito.
-Não precisa fazer essa cara, tem um bistrô lá dentro, você pode comer quantos sanduíches com aquela melequinha, você quiser. -Ela fez uma cara de deboche.
-Melequinha não! Patê, minha cara! Patê! -Rebati enquanto me levantava e ia ao quarto buscar minha carteira.
Eu não esperava ter um dia tão relaxante, nem que ela pudesse espantar tanto a minha solidão. Talvez eu precise visitar minha família mais vezes, me sentir assim mais vezes.
Acabei deixando ela em casa. Dei um abraço demorado e fiz uma dancinha pra um lado e para o outro antes de soltá-la.
-Obrigado pelo dia. Foi muito bom passar um tempo com você. -Disse ainda animado.
-Eu que agradeço. Espero te ver mais vezes. -Ela sorriu e entrou.
Não sei... estou meio animado demais.
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