Iana não possui muitas memórias do pai, pois ele se foi quando ela tinha quatro anos, mas ela lembrava bem de como sua mãe e seu irmão mais velho se esforçavam para manter a família bem, assim como fazem até hoje; de todos na casa, Iana foi a que teve a melhor chance de estudar direito, seu irmão se sacrificou logo cedo, trabalhando, para ajudar a mãe a fornecer educação para a menininha. Então, por ver o esforço constante deles, Iana se sentia incomodada de não ter um trabalho também e apenas estudar, por isso ela sempre foi muito gentil com eles e sempre disposta a ajudar, desde bem pequena.
- Deixa eu ajudar você no trabalho, maninho! Você constrói casas, né? – Disse Iana, determinada.
- Há há há! Conta outra Iana, você só tem sete anos, não tem força para isso não. – Disse o irmão, rindo e beliscando o nariz de Iana. – Pode deixar isso comigo, vai estudar que assim você me ajuda mais!
- Como? Isso não faz sentido, você e a mamãe dizem a mesma coisa... – Disse Iana, emburrada.
- Por exemplo: você já é bem inteligente para a idade, então aposto que vai se formar sem problemas e, quando isso acontecer, vai para a faculdade que quiser e poderá trabalhar! – Disse o irmão. – Entendeu?
- Hum...acho que sim, então se eu estudar bastante vou poder trabalhar e ajudar você e a mamãe!? – Disse Iana, sorrindo.
- É...tipo isso. – Disse o irmão, sem graça.
A menina também adorava visitar a mãe no hospital, onde ela passava mais tempo do que em casa, Iana brincava e conversava com as pacientes, crianças, e acabava auxiliando e muito sua mãe; depois de passar dia após dia, até as férias de cada ano, dentro do hospital, Iana decidiu que adoraria fazer aquilo para o resto da vida, como profissão.
- Mas já decidiu isso? Há há há há! Iana, você é uma menininha muito apressada. – Disse a mãe, sorrindo gentilmente.
- Tenho certeza que estou certa! Quero ser médica como você, quero ajudar essas crianças e, de quebra, vou ajudar você e o irmão! – Disse Iana, confiante.
- Bom, você vai ter bastante tempo para amadurecer essa ideia, mas se for mesmo seguir essa carreira...pense bem antes de escolher minha área. – Disse a mãe, suspirando. – Ela não é fácil Iana.
- Ué, por que? As crianças estão sempre sorrindo, você cuida delas e brinca... – Disse Iana, confusa.
- Essas crianças estão em uma situação grave, a maioria tem poucas chances de sair desse lugar um dia, outras não tem família...então, em meio a tantas coisas ruins, minha função é dar esperança e ficar com elas até partirem. – Explicou a mulher. – Essa parte final é muito triste...
Iana ficou muito abalada com essa revelação, ela não fazia ideia do peso que aquelas crianças carregavam e, ainda assim, conseguiam sorrir e discutir planos para o futuro.
- Eles...sabem disso? – Perguntou Iana.
- Claro, todos eles sabem. – Disse a mãe.
- Então...como eles conseguem!? Se sabem que podem não sair daqui... Por que conseguem sorrir e pensar em um futuro? – Disse Iana, com os olhos marejados, tristemente.
- Iana...você tem um coração de ouro, sabia? – Disse a mulher, surpresa ao ver a filha chorar, limpando as lágrimas do rosto da pequena. – Eles têm esperança de que podem sair daqui, mesmo contra todas as possibilidades, eles escolheram acreditar e aproveitar a vida que tem com um sorriso no rosto. Meu trabalho aqui é ajuda-los nisso, haja o que houver.
- Puxa...mamãe, você é incrível demais... – Disse Iana, parando o choro, encantada.
- Sou, é? Há há há! Aposto que você será melhor do que eu, seja lá qual for o caminho que vai escolher. – Disse a mãe, rindo baixinho.
Quando Iana fez onze anos, as despesas da casa começaram a apertar mais e exigiu mais esforço do seu irmão e de sua mãe, naquela idade Iana não fazia birra para ajuda-los mais, ela havia se decidido se dedicar nos estudos e, assim que possível, entrar na faculdade de medicina e começar a trabalhar. Nesse ano, porém, em um certo dia na escola, Iana foi chamada pela diretora e informada que sua mãe havia ligado.
- Ela disse que seu irmão sofreu um acidente, ele está no hospital onde ela trabalha e pediu permissão para que eu te liberasse. – Informou a diretora.
- M-meu irmão!? Como!? – Disse Iana, chocada.
- Ela não me passou detalhes, melhor ir logo. – Disse a diretora.
Iana saiu correndo da escola, muito preocupada, chegando no hospital ofegante e logo perguntando sobre sua família; quando as enfermeiras informaram a sala correta, a menina correu até lá e encontrou sua mãe conversando com um doutor.
- Mamãe! O que...houve...como o meu irmão!? – Disse Iana, exausta de tanto correr.
- O médico que o atendeu me contou agora. Parece que ele sofreu um acidente no trabalho, carregou mais peso do que deveria e, por isso, torceu feio o pé, machucando a perna também. – Disse a mãe, com o semblante preocupado. – Ele vai ter de passar por uma cirurgia agora, mas vai ficar tudo bem, não é nada grave.
- Ah não... – Disse Iana, sentindo os olhos se encherem de lágrimas.
- Filha...vem aqui, não chore, seu irmão vai ficar bem. – Disse a mãe, abraçando a menina.
Depois de algumas horas de espera, o médico retornou informando que a cirurgia foi um sucesso e que, agora, o irmão de Iana precisaria apenas de repouso por alguns dias; as duas moças foram visitar o rapaz na cama, que estava com a perna direita imobilizada, ele sorria sapeca enquanto a mãe lhe dava uma bronca, Iana não conseguia parar de olhar para a perna ferida do irmão, pronta para chorar de novo.
- Se...eu estivesse trabalhando também...você não teria se esforçado tanto... – Disse Iana, muito triste. – Desculpa maninho...
- Que...? Do que você tá falando Iana? Nada disso é culpa sua, eu é quem fui um idiota! – Disse o irmão.
- Isso não tem nada a ver com você trabalhar ou não, Iana, já falamos disso. – Disse a mãe, séria.
- Mas...isso não é justo... Você e o maninho trabalham tanto por mim...e eu...não faço nada por vocês... – Disse Iana, chorando de novo. – Queria poder...ajudar mais...
O irmão e a mãe de Iana se entreolharam, preocupados com a pequena, mas logo sorriram.
- Sua intenção é das melhores, maninha, mas não se preocupe tanto e nem se culpe por essas coisas! Faz parte da vida isso aqui, se fosse fácil, não seria tão legal! – Disse o irmão.
- Maninho idiota... – Disse Iana, emburrada.
- Hã!? – Disse o irmão, confuso.
- Há há há há! Obrigada querida, você estudando e sorrindo já nos ajuda demais, falo sério, se não fosse por você nos apoiando...acho que teríamos desistido antes. – Disse a mãe, acariciando o rosto da filha. – Como uma família, temos de ser fortes para superar momentos como esse, juntos.
- É...? – Disse Iana, parando de chorar. – Com essa besteira do maninho...vai embora o dinheiro do mês todo.
- Você estava toda legal comigo até dois minutos atrás! – Disse o irmão, nervoso. – Sua mercenária...
- Pois é...há há há..., mas é o que eu disse: superar juntos! – Disse a mãe, sem graça. – Já passamos por momentos piores.
- Hum...eu...vou estudar bastante e passar logo no vestibular, assim não vou deixar vocês dois na mão...e poderei ajudar ainda mais gente. – Disse Iana, decidida. – É o que vou fazer!
- Lá vem a apressada de novo... – Disse o irmão, suspirando e sorrindo.
- Só não se esforce demais Iana, não é o fim do mundo afinal... – Disse a mãe.
- Vocês não me ouvem quando peço isso, então por que eu iria ouvir? Há há há! – Brincou Iana, sorrindo. – Relaxem, vai dar tudo certo pra mim, logo vão ganhar ajuda extra!
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