História Dimitri the Barbarian. - Capítulo 23

Sinto meus olhos pesados. Estava com a sensação de ter levado mais uma das surras de meu pai. O corpo dolorido e fraco. As únicas iluminações do quarto eram uma tocha prestes a se apagar e luz que transparecia da fresta da janela. Respiro fundo sentindo meu corpo molhado de suor. O ranger da porta delata a entrada de alguém. Olho com a visão ainda desfocada em direção à sombra do pequeno corpo tão conhecido por mim, seu ventre já dava claros indícios que o provável futuro chefe estaria ali.
Ela ascendeu uma nova tocha no quarto, substituindo a anterior. Quando ela se virou, pude ver seu rosto cansado e sua nova feição de surpresa. Lágrimas brotaram de seus olhos enquanto vinha a passos apressados em minha direção. Tentei me sentar, mesmo com o corpo teimando para se movimentar. Rose se jogou em meus braços, murmurando meu nome e algo mais que não consegui compreender. Seu aperto beirava o desespero, como se eu pudesse sumir de algum jeito de seus braços.
Apenas tentei confortá-la, não se tinha muito mais que fazer. Eu me recordo claramente daquela noite até o momento que pedi para ela ir atrás de minha mãe, mas era o suficiente para compreender toda angustia que dei a minha amada.
-Há quanto tempo estive dormindo?- questiono com a garganta arranhando quando ela parece um pouco mais calma.
-Quase toda a noite mais longa do ano.- diz com uma risada seca entre soluços e um sorriso brota em mim involuntariamente.
-E como vocês estão?- toco a sua barriga depois de colocar uma mexa de cabelo solto atrás de sua orelha.
-Eu que deveria fazer essa pergunta!- exclama afagando meu rosto com as duas mãos.
-Você descansou?- insisto e a vejo suspirar se dando por vencida.
-Tirei um cochilo. Mas e você? Como se sente?
-Melhor que antes, tenho certeza.- ela apenas revira os olhos ainda inchados. -Por que não se deita e descansa?
Ela retira apenas a túnica e se deita ao meu lado de voltada para o teto. Apoio minha cabeça em sua barriga e envolvo meus braços em sua cintura. Suas mãos passeiam pelo meu cabelo úmido, é a melhor sensação de todas.
-Estou tão aliviada de você estar melhor.- ela sussurra em desabafo. -Não queriam que eu ficasse aqui com você. Não até você ficar me chamando e ninguém conseguir te acalmar depois que Natasha trouxe o antídoto...
-Por que não deixaram? E o que a Tasha tem haver com isso?- pergunto levantando a cabeça para olhá-la.
-Bem, ela ainda está aí. Acabou dormindo como os outros. Ela veio com um antídoto e que precisava falar com você quando acordasse...- ela comenta ultima parte com uma careta no rosto.
-Que estranho. Mas é incompreensível que tenham te impedido de ficar comigo.- resmungo.
-Sua mãe e suas irmãs me acharam alteradas demais...- diz revirando os olhos.
-Rose!- tento censurá-la acabo sorrindo condescendente, mas sua feição está fechada. -O que foi?
-Eu não paro de pensar se também planejaram o mesmo pra mim ou porque eu não te impedi de comer aquilo...
-Não foi culpa sua e nem pense essas besteiras.- a interrompi de imediato.
-Dimitri, aquelas ervas no peixe estavam me deixando enjoada...- começou seus protestos.
-O que foi bom. Eu não me perdoaria se fizessem algo com vocês.- falo antes de beijar seu ventre e solto o pensamento que pairava minha mente. -Acho que ele já está te protegendo desde a barriga...
-Como você pode ter tanta certeza? E se for uma menina?- pergunta enxugando algumas lágrimas que acabou soltando.
-Eu não tenho certeza, mas sei que vou amar o que vier.- e isso foi o bastante para ela chorar pra valer. Eu odiava fazê-la chorar, mas era visível o sorriso. Seu choro era emoção, uma felicidade que preenchia o peito.
-Eu amo você.- ela sussurrou.
-Eu também amo você.- respondi em meio a um abraço aconchegante acabamos dormindo.
[...]
Quando acordei novamente, eu não me sentia bem o bastante para voltar ao trabalho. Minha mãe havia entrado no quarto constatar como eu estava e lhe pedi para que organizassem um banho para mim. Rose continuava dormindo quando eu me vestia após a higiene. Ela devia estar bastante cansada, eu mal consigo imaginar o que ela pode ter passado.
Decido descer e me alimentar como minha mãe indicou, e como a mesma me alertou, Tasha ainda estava lá a minha espera. Toda aquela situação era estranha, mas ela havia salvado minha vida.
-Dimitri, eu realmente preciso conversar com você.- diz a jovem enquanto minha mãe me serve.
-Fique a vontade para dizer. Vai querer comer alguma coisa também?
-Não, mas o que preciso contar é especificamente a você.- respondeu pedindo desculpas com o olhar para minha mãe.
-Então, o que seria?- questiono assim que ficamos a sós.
-Aquele veneno foi proposital, seu tio e Victor começaram a armar tudo isso.- ela começa a dizer partes de minhas suspeitas. -Nathan fez o trabalho sujo, mas o veneno específico de um local distante foi trazido por Victor...
-Certo, mas o que você tem haver com tudo isso?- questiono a parte mais intrigante até o momento.
-Bem,- ela olhou para as próprias mãos um tanto corada. -eu acabei me aproximando do Ambrose... Ele é maravilhoso...- ela suspira antes de continuar. -Mas ele era fiel a Victor por ser sozinho no mundo. Ambrose é um homem bom Dimitri, nunca pensou que eles jogariam tão sujo com você. A situação dele é complicada, ele seria morto na primeira chance se entregasse os planos deles. Por isso me pediu para trazer o antídoto e falar com você.
-E o que ele quer em troca?- pergunto, pois sinceramente há um motivo aparente.
-Ele não disse especificamente, mas com toda certeza irá querer ficar quando tudo acabar...
-Isso tudo parece simples demais.- penso alto. Ele iria trair os seus aliados, o que não faria comigo? A dúvida em acreditar é enorme.
-Talvez. Mas você sabe que eles vão aprontar mais. Eles estão furiosos, e seu tio principalmente por aprovar Adrian se casar com uma escrava.
-Que o próprio filho poderia muito bem tirar esse título.- murmuro.
-Merda, Dimitri!- ela começa a se exaltar. -Ambrose está se arriscando e tentando ajudar você.
-Por que eu confiaria nele?- questiono incisivo.
-Você acha que eu me daria o trabalho de vir aqui só pra te prejudicar? Uma hora dessas, você e sua mulher já podiam estar mortos.- ela joga na minha cara. -Não acredita em mim?
-Pelo que te conheço, acredito. Mas não nele.- respondo depois de ponderar.
-Eu dou a minha palavra por ele.
-E por que tudo isso?- Tasha empalidece a minha frente e tudo faz sentido. -Então vocês dois...
-Não interessa.- me interrompe com o rosto rosado. -Vai aceitar a ajuda ou não?- me pressiona. Que chances mais eu teria? Seria bom demais para ser verdade ter um informante no meio deles. E o fato deles planejarem algo contra a Rose me enraivece. Eu preciso pensar no que me dará a melhor posição para contra-atacar. Algo maior está em jogo, todo o meu povo está em perigo.
-Vou.- falo decidido. -Se no fim de tudo isso sairmos ilesos, ele poderá ficar.
-Obrigada Dimitri!- diz antes de sair tentando conter um sorriso em seu rosto.
Suspirei em frustração, já não se tinha muito para fazer. Minha mãe retorna quando estou pra terminar a refeição.
-O que aconteceu?- pergunta me analisando.
-Eu posso estar com o tesouro na mão ou afundando uma langskip.- respondo frustrado.
-Por quê?- ela me incentiva.
-Você deve ter uma ideia que meu tio está querendo aprontar comigo. Ele e Victor se juntaram, e possa ser que eu tenha um informante ou alguém para me enganar. Tasha deu a palavra dela, mas não se realmente posso confiar nisso tudo.
-Quer jogar as runas?
-Seria bom...- respondo ainda confuso. Ela me estende um saco com as runas e retiro apenas uma. Os dois lados lisos da pedra. -Runa do destino.- falo desanimado.
-O que tiver de ser, será.- ela complementa.
-O que eu faço?- olho para ela como se eu ainda fosse um garotinho.
-O que você respondeu para Tasha?- ela me questiona com doçura.
-Que aceitaria a ajuda.
-Então confie em si mesmo e honre sua palavra.- responde acariciando minha mão em cima da mesa. -Não é atoa que você é o chefe, meu filho.
-Obrigado mãe.- respondo soltando um sorriso enquanto beijo sua mão atada a minha.
-Já disse que estou feliz por você estar bem?- pergunta sorrindo.
-Já.
[...]
-Que lugar é esse? E por que estamos aqui?- Rose me questiona curiosa. Estamos entrando em um antigo armazém próximo de casa, o qual eu usava para trabalhos manuais.
-Eu andei os últimos tempos trabalhando nessa surpresa.- respondo tirando um antigo lençol de cima do berço de madeira. Eu consegui terminá-lo como havia planejado antes do solstício para entregar a Rose, mas os planos daquela noite não terminaram tão bem assim. Então aproveitei os últimos dias para me recuperar e aproveitar mais a minha família.
-É lindo Dimitri...- ela fala lentamente cobrindo a boca com as mãos. Seus olhos cintilavam a meia luz que entrava pela porta aberta, alternando entre mim e o berço. Uma estrutura com altura razoável de madeira escura que segurava o local que o nosso filho ficaria em forma de uma embarcação.
-Eu fiz pensando como tudo começou entre nós. Por pior que tenha sido, mas por conta de uma viagem numa langskip.- comento a abraçando e em resposta, rebo um tapa no peito.
-Você vai me fazer chorar de novo.- diz ela com um sorriso e os olhos marejados.
-Só se for de alegria.- argumento encostando minha testa na sua.
-Você é um marido maravilhoso.- ela afirma.
-Tem certeza?- pergunto em tom de brincadeira.
-Tanto quanto que você será um ótimo pai.- diz verdadeiramente. Ela acreditava piamente em mim, mas minha insegurança quanto à paternidade era crescente. Por sorte, ela não me deu muito mais tempo para pensar. Esse é um momento de alegria, e não serei eu tirar esse sorriso lindo dela.