13 anos atrás
- Corram! - Gritou o garotinho assustado.
- Ele é louco, vamos! - Chamou outro, cujos olhos estavam roxos.
Ambos estavam machucados e amedrontados, tentando salvar desesperadamente seus outros dois amigos que estavam sendo brutalmente espancados por um jovem Sanzu de 12 anos de idade.
O Haruchiyo sufocava um deles no chão, com o joelho espremido contra o seu pescoço, enquanto socava repetidamente o rosto do outro. As crianças choravam, mas Sanzu não se comovia, apenas aumentava a força dos golpes e sorria - mesmo que sua boca, tendo sido cortada dias atrás, sangrasse no processo.
Ele estava se divertindo muito descontando sua raiva naqueles garotos no meio da rua.
- Sanzu! - Gritou uma voz de intervenção.
Sanzu parou abruptamente e afrouxou o aperto contra os garotos que conseguiram se desvencilhar e fugir. Irritado, ele virou-se para Mikey e perguntou:
- Por que me interrompeu?! Agora aqueles idiotas fugiram!
Manjiro Sano, em seus tenros 11 aninhos, acertou um chute na cabeça de Sanzu.
- Eu já mandei você parar de caçar briga na rua sem motivo, isso vai prejudicar a Toman. - Mikey franziu o cenho, a expressão tão séria o fazia parecer anos mais velho. - Você vai atrair uma fama ruim pra gente.
Naquela época a gangue, Toman, era apenas um grupo de crianças encrenqueiras. E nenhuma delas havia imaginado ou previsto a grande proporção que aquilo iria tomar ao longo dos anos, nem quantas pessoas importantes morreriam.
- Foda-se a Toman! - Berrou, massageando a região da cabeça onde Mikey lhe acertou o chute. - Takeome me deu uma surra e mandou que eu não voltasse pra casa até amanhã! Eu só quero bater em alguma coisa, droga!
Mikey estava ciente da relação conflituosa que Sanzu tinha com o irmão mais velho que o via como uma escória. Não fazia muito tempo que haviam se conhecido, apesar disso Haruchiyo sempre foi muito transparente com ele sobre como sua vida era pautada no desprezo e na violência.
Todos odiavam Sanzu e não entendiam porque Mikey insistia em tê-lo na gangue. Também não compreendiam o motivo de se entenderem tão bem, andando juntos pela cidade como se tivessem feito isso desde que nasceram.
Embora no início não houvesse sido assim.
O Sano havia o conhecido há pouco mais de quinze dias, em um conflito pequeno na saída da escola. Haruchiyo o havia atacado com um canivete depois de Mikey ter tirado uma brincadeira idiota consigo - da qual nenhum dos dois se lembrava mais -, e Manjiro revidou cortando a boca de Sanzu com esse mesmo canivete, após vencê-lo com um chute que quase o fez desmaiar.
Mikey se sentiu um pouco culpado com a situação ao ver o garoto sangrando, com aquele machucado horrível na boca, e o levou ao hospital. Ele achou que, após ajudá-lo, Sanzu o odiaria pelo resto da vida. Mas o improvável aconteceu, o Haruchiyo passou a admirá-lo como uma figura de força que deveria ser idolatrada e seguida. E, de alguma maneira estranha e inexplicável, eles gostavam da presença um do outro.
Não demorou para Sanzu se tornar obcecado por ele, e Mikey passou a apreciar toda a atenção que estava recebendo.
O único problema que os dois tinham residia no comportamento descontrolado que Haruchiyo exibia na maior parte do tempo, coisa que afastava as outras pessoas - gerando medo, receio e raiva. Mikey nunca sentiu isso com Sanzu, na verdade, assim que percebeu que o motivo de seu novo amigo surtar constantemente eram os abusos recorrentes de seu irmão mais velho e - muito provavelmente - seus vários transtornos de personalidade, tornou-se mais fácil lidar com ele.
- Venha, se levante. - Mikey ordenou, assistindo Sanzu se erguer do chão e limpar as roupas sujas de poeira.
O Haruchiyo olhou para ele com desdém e tentou sorrir, mas os pontos em sua boca ameaçaram abrir, então ele desistiu. Sangue escorreu por seu queixo nos locais em que a cicatrização não estava concluída, deixando um gosto ferroso na língua de Sanzu quando ele lambeu os ferimentos.
Mikey ergueu uma mão para limpar o sangue, sentindo o olhar de Sanzu seguir seus movimentos, e disse:
- Você é um idiota, vamos precisar fazer curativos.
E assim ele o levou até sua casa, aproveitando que estariam sozinhos - visto que sua família também não gostava muito de Sanzu -, e sentaram-se na varanda com o kit de primeiros socorros.
Ali, bem no horário do pôr-do-sol, onde a luz alaranjada banhava o rosto e os cabelos loiros de Mikey, o Haruchiyo não era capaz de entender porque gostava tanto dele. Sanzu simplesmente queria ficar em sua companhia e não se sentir mais tão sozinho e odiado, ele desejou como um tolo que aquele momento durasse para sempre.
Entretanto, Mikey logo terminou os curativos em sua boca e foi guardar o kit de primeiros socorros, deixando Sanzu solitário de novo. Porém, antes que ele começasse a se desesperar para segui-lo, Manjiro retornou com as mãos cheias de doces e sorriu.
- Vem comigo. - Falou o Sano depois de entregar metade das guloseimas para Sanzu.
Mikey o escondeu em seu quarto e disse:
- Você pode dormir aqui hoje. Mas não faça barulho ou vão descobrir e te expulsar.
Haruchiyo acenou positivamente, agradecendo.
- Amanhã você volta pra sua casa.
Sanzu fez uma careta só de imaginar tal situação e falou baixinho:
- Eu não quero voltar.
- Eu sei, mas não posso deixar você escondido aqui para sempre.
- Mas eu quero ficar com você, Mikey. - Seus olhos brilharam com lágrimas que Sanzu lutava para conter.
A expressão de Mikey era de tristeza, ele também queria que seu amigo ficasse, mas sua família nunca permitiria isso. Subitamente, a imaginação infantil e o anseio o fizeram ter uma ideia.
- Sanzu. - Abriu um sorriso largo. - Quando nós crescermos vamos morar juntos em uma casa incrível!
- É mesmo?!
- Sim, e ninguém vai separar a gente. Vamos poder fazer o que quisermos - olhou para o Haruchiyo, e seu sorriso tornou-se esperançoso e triste ao mesmo tempo, - e ninguém vai odiar você. Ficaremos juntos para sempre!
- Você promete, Mikey?! - Apesar da dor dos machucados, Sanzu sorriu abertamente.
- Sim. - Ergueu o dedo mindinho. - É uma promessa.
Sanzu entrelaçou o próprio mindinho no de Mikey e eles selaram a promessa. Todavia, esses eventos aconteceram antes da Toman se tornar famosa, antes de Manjiro deixar Sanzu de lado em prol de outras amizades e antes de ambos se tornarem pessoas desastrosas.
Aquela promessa foi esquecida e deixada de lado. Era um delírio no final das contas, algo impossível. Sanzu parou de acreditar nela assim que Mikey se apaixonou por Takemichi e o jogou para o escanteio de sua vida, o tratando igual, ou pior, que todas as outras pessoas que já havia conhecido - com exceção de sua irmã mais nova.
Ambos se tornaram extremamente egoístas e, com isso, aquele sonho bobo de infância acabou por morrer.
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