Quando Mikey recebeu o relatório dos vigias, que estavam no rastro de South, e descobriu que Sanzu foi feito prisioneiro na propriedade da Rokuhara Tandai, o que sobrará de seu escritório no ataque de fúria anterior foi pelos ares. Kokonui precisou driblar os obstáculos dos móveis destruídos para alcançar o Sano e repassar as notícias.
- Eles não pretendem devolver o Sanzu - contou, temeroso. - Acho… Acho que vão matá-lo, Mikey.
O Manjiro mal estava escutando, sua frieza costumeira e sua indiferença cruel haviam desaparecido, deixando apenas o ódio cego e a loucura.
- Vou matar todos eles… - murmurava, em transe. - Vou matar…
- Precisamos ir encontrá-los - Koko dizia, tentando fazer Mikey entender. Aquilo estava o assustando, pois nunca tinha visto o chefe agir descontrolado daquela forma. - Mikey?! Ei, Mikey! - O segurou pelos ombros e olhou fundo em seus olhos. - Está me ouvindo? Se tiver a menor chance de salvarmos o Sanzu, precisamos agir agora. Eu mandei uma unidade para a mansão da Rokuhara Tandai, eles estão escondidos, mas precisamos articular um plano. South quer nos encontrar na antiga Babel em uma hora.
A antiga Babel havia sido uma boate famosa nos subúrbios, mas por causa de um incêndio criminoso o lugar foi completamente interditado e os donos abriram outra em uma região mais rica da cidade. Agora aquele lugar decrépito servia como ponto de negociação entre gangues e não era a primeira vez que a Bonten era convidada a comparecer lá.
- Sanzu não pode estar morto… - Mikey dizia, olhando para Koko como se quisesse que o mesmo confirmasse suas palavras. - Ele não morreria assim, ele nunca me deixaria…
Kokonui abraçou Mikey, e tal gesto surpreendeu a ambos. Ele segurou o chefe pelos braços e disse:
- Sanzu é a criatura mais bizarra que eu já conheci - contou em tom de riso. - Ele não morreria facilmente. Acho que seus sequestradores já devem estar se arrependendo de tê-lo capturado - sorriu. - Você e eu sabemos que ele dá um trabalhão danado. E, se ele já estivesse morto, nós saberíamos. Aqueles merdas fariam questão de mostrar para o submundo inteiro que o mataram. Não, Sanzu deve estar tirando a paciência deles nesse momento.
Koko olhou para Manjiro e continuou:
- Nós precisamos ir até o South e arrancar a cabeça dele. E pra isso preciso que você esteja com a sua no lugar, entendeu?
Mikey assentiu, meio entorpecido. Não poderia se desesperar por horas a fio, precisava acabar com aqueles malditos e salvar Sanzu antes que fosse tarde demais. Ele respirou fundo várias vezes até seu coração parar de querer pular para fora do peito.
- Convoque as divisões e mande que preparem os carros - Mikey ordenou, a voz rouca de ódio e desespero. - Vamos para a antiga Babel.
O caminho até lá era rápido, apesar dos preparativos. Mikey estava no piloto automático e apenas repassava as ordens, expulsando os pensamentos sobre Sanzu para um canto nebuloso de sua mente. Koko o ajudava da melhor forma possível, sempre o vigiando para o caso de seu chefe surtar.
Mas em dado momento Kokonui recebeu uma ligação inesperada e precisou ficar sozinho por um tempo. Quando voltou seu semblante estava determinado, embora sentisse o medo da incerteza se infiltrar em seu coração. Ele achou melhor não contar a Mikey o tinha acabado de fazer, não queria deixar o chefe mais nervoso, por isso só lhe restou torcer para que Sanzu não matasse a pessoa que estava indo ajudá-lo.
Como os homens que Kakucho havia enviado de Kyoto não chegariam a tempo da reunião, grande parte dos membros da Bonten que sabiam manusear armas foram convocados. Até mesmo alguns contadores, funcionários de logísticas e barmans.
Hirose era um deles, assim como seu superior no bar. Ele estava suando de nervoso - apesar de ser apto para usar armas - e tudo o que sabia eram os detalhes da situação em geral.
Tudo de que tinha conhecimento era de que houve uma traição, o vice-presidente havia sido capturado por uma gangue inimiga e o líder da Bonten parecia a beira de um ataque de selvageria dentro do carro.
Hirose estava morrendo de medo do Sano o atacar no banco traseiro, já que parecia ferver de raiva, por sorte Kokonui estava entre eles. Essa era uma das várias situações recentes em sua vida que o faziam surtar internamente por ter acabado em uma gangue. Ele havia sido ameaçado, eletrocutado e convocado para a guerra, as coisas não estavam boas.
- Quando chegarmos lá - disse Koko, lhe chamando a atenção -, quero que se infiltre pelos fundos. Não deixem que te vejam e, se a oportunidade surgir, atire nas cabeças deles.
- Sim, senhor - Hirose respondeu, quase gaguejando.
E, assim como lhe foi ordenado, ele e mais alguns outros desceram dos carros ruas antes da Babel. Ele respirou fundo, aliviado de ter escapado da atmosfera sufocante do veículo. Eles estavam em um grupo de seis pessoas, seus corpos protegidos por coletes à prova de balas e capacetes negros em suas cabeças.
- Vamos - ordenou o líder da unidade.
Hirose baixou o visor do capacete e os seguiu para os fundos do prédio adiante.
As demais unidades obedeceram às ordens de Mikey e se dispersaram em uma estratégia de ataque, invadindo o edifício através de pontos específicos. Koko parou ao lado do Sano na entrada, acompanhado de dez subordinados às suas costas. Mikey analisou o esqueleto da antiga boate, sua tinta rosada estava descascando nas paredes, a rua inteira era um breu e todos os quatro andares do prédio contavam com janelas amplas. E, em cada uma dessas janelas, havia um atirador da Rokuhara Tandai.
Um laser vermelho fazia mira na testa de Mikey, uma clara ameaça de morte. O chefe da Bonten ergueu o queixo em desafio e adentrou a antiga Babel. Kokonui observava todos os seus movimentos, admirado com a letalidade fria que Mikey transmitia. South não sairia dali com vida de jeito nenhum.
Eles o encontraram no bar abandonado da boate, já no primeiro piso. South estava sentado em um banco enferrujado, observando-os se aproximarem, sua pistola prateada reluzia na iluminação baixa e precária do salão. Seus subordinados, cerca de setes homens armados, o zelavam a apenas alguns passos de distância.
Mikey parou na frente dele, com Kokonui bem ao lado, e pôs ambas as mãos no bolso da calça jeans escura. Sua expressão era o auge da indiferença, mas seus olhos brilhavam de ódio ao vislumbrar o sorriso zombeteiro do desgraçado. Ele precisou buscar a calma que não tinha para permanecer parado, quando sua real vontade era matá-lo sem demora. Foda-se os motivos dele, Sanzu estava em apuros por sua culpa, Mikey o dessosaria por isso.
- Você queria minha atenção - disse o Sano, controlando o tom de voz. - É bom que valha o meu tempo.
- Não quer saber como seu cachorrinho está? - O provocou. - Da última vez que eu o vi, Hamma o estava torturando.
Kokonui arregalou os olhos a menção de Shuji Hamma, mas Mikey manteve o semblante neutro - ocultando as ondas de caos dentro de si.
- Sanzu sabe se cuidar - respondeu, torcendo internamente para que isso se provasse verdade.
South soltou um riso nasalado e pôs a arma que segurava em cima do balcão, quando voltou os olhos azuis para Mikey sua expressão era dura como uma pedra.
- Você realmente não sabe o motivo de eu estar atrás de você, não é?
- Se me lembro bem, você prometeu me destruir e me transformar em um cachorro - falou Mikey, o encarando com altivez. - Infelizmente, para você, jamais deixarei que isso aconteça. Não sei quem porra você pensa que é, mas não vai viver pra ver o dia nascer amanhã.
O líder da Rokuhara Tandai estalou a língua no céu da boca e disse:
- Talvez isso refresque a sua memória. - South tirou seu colete à prova de balas e abriu parte da camisa de botão que vestia, exibindo o abdômen suas cicatrizes horríveis. Ele havia sido esfaqueado profundamente. - Te lembra alguma coisa?
Mikey franziu o cenho e o peso de seu corpo pendeu de uma perna para a outra. Ah sim, ele estava lembrando agora. Foi há alguns anos atrás, tempo o suficiente para que Manjiro esquecesse o rosto dele - além do mesmo ter mudado, adquirindo traços maduros - e o nome… South era um apelido para aquele que Mikey acreditava estar morto.
- Terano… - o Sano murmurou, surpreso com a descoberta. Devia ter se certificado melhor acerca da morte dele.
South sorriu, satisfeito por ser finalmente reconhecido.
- Parece que não é apenas o seu bichinho idiota que tem problemas de memória - zombou. - É um sentimento estranho, não é? Dar de cara com os fantasmas do seu passado.
Mikey ficou tenso.
- Devia ter me enterrado melhor, Manjiro.
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