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História Ele vai voltar? - Isso é um adeus.


Escrita por: yAnja

Notas do Autor


Diferente dos últimos capítulos esse aqui está mais curto.. Bom, de fato teria mais coisas a adicionar, mas preferi deixar para o próximo capítulo.

Obrigado há MaybeSecret, xsunx e Smile_Sugary por terem surgido nos comentários do último capítulo, fiquei meio chocada de saber que havia pessoas acompanhando ainda, então de verdade, muito obrigado meninas ♡
E Tatalaka, você é demais meu xuxu ♡ obrigada também por não desistir dessa fanfic que frita seus miolos com esses suspenses kk

Sem mais delongas, boa leitura pessoal!
E desculpem pelas lágrimas que vou lhes causar, he. Byebye.

Capítulo 40 - Isso é um adeus.


“Eu nunca disse que eu deitaria e esperaria para sempre,
Se eu morresse estaríamos juntos agora,
Eu não posso simplesmente esquecê-la...
No fim do mundo ou na última coisa que vejo,
você nunca está voltando para casa.
E todas as coisas que você nunca me disse,
E todos os sorrisos que vão sempre me assombrar,
Nunca voltará para casa,
Eu poderia? Eu deveria?
E todas as feridas que me deixarão cicatrizes,
Por todos fantasmas que nunca vão.”
The Ghost Of You. – My Chemical Romance.

***

– KENTIN’S POV. –

[...]

23 de novembro. – Na manhã seguinte. – Quarta-feira. – Necrotério do centro da cidade. – 6h10min.

Relembrar de certos momentos às vezes são fundamentais. Eu me recordo bem do dia em que eu e Castiel ficamos toda madrugada atrás de Lilith sem ter ideia de seu paradeiro, no início do dia a encontramos no porão da escola, aquilo sem dúvidas foi um grande alívio, mas estranhamente ela estava diferente, dissera que não falaria mais comigo e que nossa reconciliação fora um erro da parte dela. Lilith ficou fria da noite pro dia, e por hora eu tinha acreditado realmente no arrependimento dela, dias depois Castiel me contara que alguém tinha a ameaçado e por esse motivo ela fez o que fez. Pela segunda vez nos entendemos e então desse dia em diante ficamos inseparáveis, tudo pareceu certo e nada nos atrapalhava de maneira alguma. Coisas e motivos que pareciam nos separar simplesmente sumiram e desde então tudo pareceu um belo sonho...

Até ontem.

Nesta madrugada, foi a segunda noite em que eu e Castiel viramos acordados, com detalhes diferentes. De certo modo, mesmo sem correr e girar a cidade atrás da morena, as horas foram milhões de vezes mais torturantes. Agatha conseguiu parar de chorar só quando o dia amanheceu, Castiel ligou para quase todos nossos colegas mais próximos perguntando se algum deles havia visto ou falado com Lilith, ele não contou sobre a possibilidade de suicídio, pois podia espalhar um falso rumor à toa. Isso era o que esperávamos que aconteceria. Era o que desejávamos.

Não consegui e nem tentei fechar os olhos por um segundo que fosse, pois não deveria, não poderia e nem merecia descansar. De fato não liguei para isso, eu teria todo tempo do mundo para descansar mais tarde. Mas não hoje, não agora. Não sem saber o que tinha acontecido com Lilith.

Porém, agora mais que nunca, jamais senti tanto pavor interno, um enorme receio crescia dentro de mim enquanto eu via a porta cinza pouco espaço à frente, sabendo que do outro lado daquela sala havia cadáveres e que um deles poderia ser ela...

Eu e Castiel nos entreolhamos impacientes lado a lado, Agatha estava sendo abraçada pelos ombros por Joshua, o mesmo achou que seria melhor que nos acompanhasse até aqui, o que foi bom, Agatha parecia melhor na presença dele. Não tinha o visto em nenhuma outra ocasião além dessa, quisera que tivesse o conhecido em um momento melhor.

Os passos que ressoavam em ecos pelo corredor iluminado fizeram-se presentes quando um homem de meia idade venho andando em nossas direções usando um jaleco branco, o bolso da vestimenta indicava que seu nome era “Stephen”.

Nós quatro levantamos ao mesmo tempo, agitados.

— Senhores. — acenou em um movimento de cabeça para nós três e se direcionou para Agatha. — Senhora.

Todos acenamos de volta sem ter coragem de dizer alguma coisa, então o homem apenas voltou a pronunciar-se:

— Preciso que apenas o familiar mais próximo me acompanhe para fazer a identificação do corpo. — anunciou.

Agatha deu um passo à frente temerosa.

— Gostaria que os dois rapazes entrassem junto comigo. — pediu unindo as mãos. — Eles são tão próximos quanto eu de Lilith. — contou.

O legista olhou para mim e para Castiel nos analisando por um momento.

— Certo, mas terei que pedir que mantenham a calma não importando as circunstâncias, imagino como seja difícil, no entanto temos que manter ordem por aqui. — avisou arqueando ambas sobrancelhas em nossa direção esperando por uma aceitação.

Eu e o ruivo concordamos no mesmo instante.

Stephen destrancou a porta acinzentada para entrarmos.

— Você vai ficar bem? — perguntou Joshua à Agatha com um tom de preocupação. — Não quer que eu entre também?

— Tudo bem, ter muita gente ali dentro não seria... bom. — abaixou os olhos. — Obrigado por vir de qualquer forma. — agradeceu com um meio sorriso triste nos lábios.

Joshua acenou com uma leve sacudida de cabeça, afirmando.

— Vou esperar aqui então. — sorriu de volta, tentando apaziguar a tristeza dela.

Presenciar uma situação daquelas que deveria ser mais tranquilizadora só piorou tudo no meu subconsciente, alertando ainda mais que o que acontecia ali era apavorante.

— Prontos? — indagou o legista já dentro da sala esterilizada, segurando a maçaneta da porta.

— Sim. — disse Agatha.

Silêncio. Os únicos sons eram dos passos de nós três adentrando a sala um atrás do outro. Agatha foi na frente, Castiel logo após e eu entrei por último.

A primeira sensação ao por meus pés naquela sala foi medo. O local era mais frio que o lado exterior, provavelmente refrigerado para conservar os corpos em início de sua putrefação. Quase completamente vazio, no teto as luzes completamente brancas de led iluminavam cada espaço da sala, que cheirava a desinfetante, cloro e... formol? Não sabia distinguir direito, a cabeça já estava em um turbilhão de pensamentos desconexos sem sentido aparente. O lugar de paredes brancas se assemelhava a um consultório médico ou uma farmácia, o que na realidade estava longe de ser. Era composto apenas por um lado repleto de portas metalizadas aonde dentro jaziam os corpos isolados aos olhos nus e o outro lado haviam pranchetas penduradas com papéis de informações e atestados de óbitos dos falecidos. Cada abertura de metal quadrada continha identificações dos cadáveres com seus respectivos nomes à frente, alguns não tinham nada escrito, provavelmente espaços inocupados.

Vaguei meus orbes descontroladamente procurando o nome dela em uma daquelas portas, mas estava tão inquieto que nem sequer conseguia enxergar com clareza os nomes em consequência da devastação interna. Pavor. O legista fechou a porta, deixando apenas Joshua para trás. Inconscientemente meu coração começou a bombear mais rápido e a garganta ligeiramente a secar. Como de um dia pro outro vim parar dentro de um necrotério? Nada daquilo podia ou devia ser real.

Talvez ambos eu e Lilith tivéssemos caído no sono na minha cama após beber quase toda garrafa de vinho, perdemos o horário da escola e nada tinha realmente acontecido. Escondidos em minha casa, eu ainda estaria com ela em meus braços dormindo, perdemos o horário da escola e não chegaríamos a tempo para a prova de química. Qualquer coisa envolvendo Lysandre, beijo roubado, declarações, traição, mentiras e suicídios faziam parte de um mero pesadelo da minha mente por conta do álcool que não fez sua digestão corretamente e agora embaralhava minha consciência. Lilith logo me acordaria afagando meus cabelos com seus dedos finos e delicados, dizendo que dormimos demais e iriamos nos dar mal caso meus pais nos pegassem ali. Eu estaria com preguiça, sorriria ao ver os olhos delas levemente inchados por ter acabado de acordar – eles sempre ficavam assim pela manhã – e então diria para não se preocupar, e pediria ‘só mais cinco minutinhos’ para ela ficar... apenas mais um pouco comigo.

— A porta dela é esta daqui. — Stephen avisou, apontando para a região central da sala onde havia uma porta que batia na altura de nossos quadris.

Então eu acordei de meus devaneios ilusórios, percebendo que tudo era real demais, e que lá estava a identificação que antes meus olhos não encontraram, em uma impressão semelhante a de máquinas de escrever antigas estava o nome dela grafadas em letras maiúsculas.

“LILITH WEYLAND PARKER”.

O homem pegou luvas brancas de látex, pondo-as avidamente em suas mãos, pescou uma das pranchetas na parede, provavelmente contendo os detalhes da autópsia de Lilith – não, definitivamente era de um corpo qualquer que foi confundido com o dela – e se pôs ao lado da porta que antes apontara.

— Vou abrir, tudo bem? — indagou com tranquilidade, entendendo caso um de nós pedíssemos mais alguns minutos para digerir a situação.

Ninguém pronunciou nada, como se afirmasse que ele podia continuar com o procedimento. Eu queria dizer para que ele aguardasse mais um pouco, mas meu corpo estava em completo choque, apenas olhando o nome dela naquela porta aonde possivelmente estaria seu corpo desfalecido. O legista destravou a porta de metal com um som seco e ecoante de “clack”, abrindo-a. De certa forma eu sentia pressa para ver o que havia ali dentro ao mesmo tempo em que não queria saber de forma nenhuma quem estava ali. Afinal, definitivamente não podia ser ela.

Ele nos encarou por breves segundos eternos, esperando alguma reação. Nenhuma. Prontificou-se a puxar o tipo de maca deslizante contida dentro daquele cubículo escuro, colocando-o completamente para fora. Acima da maca havia um tecido de plástico branco que cobria completamente o corpo abaixo, exceto as solas dos pés empalidecidos da pessoa eram visíveis. Pés de mulher. Ao tornozelo um barbante era amarrado com um papel retangular de identificação junto com um pequeno sino que tilintou no mesmo segundo que a maca tinha parado de se mover. Engoli em seco ao reparar que na parte de cima aonde deveria ser a cabeça o plástico branco parcamente translúcido possuía uma poça vermelha na região interior. Sem dúvidas, sangue. Tranquei a respiração no mesmo instante.

— Vocês estão bem? — questionou o homem percebendo o silêncio em excesso.

— Prossiga. — foi Castiel quem verbalizou, tentando soar firme.

Stephan concordou brevemente pondo a mão na ponta lateral superior do plástico que cobria o cadáver, puxou para baixo trazendo até um pouco abaixo dos joelhos da... da...

— Meu Deus. — ofegou Agatha colocando ambas mãos no rosto, respirou fundo, e abaixou-as para analisar o corpo novamente.

Minha cabeça pesou formando uma pressão na dianteira, parecia que o oxigênio faltara no cérebro e pulmões, pois eu simplesmente esqueci como se fazia para respirar.

O corpo feminino, nem muito robusto nem muito magro era completamente pálido, quase puxando para um tom acinzentado. A altura física chegava a ser quase como a minha... Os braços estavam desnudos e com alguns hematomas arroxeados espalhados por eles. O cabelo era escuro, completamente enegrecidos e compridos, no entanto os nós nos fios eram visíveis juntamente com o tom opaco em que se tornara. A garota vestia uma camisa vermelha de ombro caído, estampado na frente uma caveira com uma rosa presa na boca. Eu reconheci na hora. Castiel também reconheceu, até porquê, a camiseta era a dele... Era a que ele tinha dado para ela. As mãos... Os dedos finos e pálidos pela falta de circulação de sangue tinham leves raspões de alanhados, mas o que mais me chamava a atenção era o anel prateado com a tira central em uma cor claríssima de róseo. O anel que eu havia comprado.

Nada era tão terrível assim, comparado com a bola gelada e lamacenta de concreto que pesava no fundo do meu estômago do que no momento que eu fitei o rosto dela.

Ela.

Lilith.

A poça de sangue seco vista por baixo do plástico antes sendo explicada sem precisar pensar muito o porquê.

Desfigurado.

Não haviam olhos verde-escuros, não haviam bochechas levemente carnudas e nem lábios rosados. Não havia sequer um rosto.

Irreconhecível.

Era como se um relógio gigantesco ecoasse em um ‘tic tac’ lento no fundo da minha mente. E eu podia jurar que meu coração pararia. Ou apenas meu âmago desejasse que ele parasse.

Assustador.

Agatha voltou a cobrir o rosto com as mãos, começando a soluçar entre seus dedos. Castiel permaneceu emudecido. Já eu estático, imóvel, estacado como se raízes prendessem meus pés ao chão.

— Eu compreendo como deve ser terrível ter que ver uma cena dessas, e suponho que pela expressão de vocês a identificação esteja clara de que realmente é ela... — Stephen falava. — Mesmo assim, eu preciso do consentimento- — sua fala se tornou distante enquanto meus olhos não desviavam do corpo exposto logo à frente.

Um zunido atrapalhou o fundo dos meus ouvidos como se tivessem sido tapados, deixando todo som meio abafado. Consegui processar a voz soluçante de Agatha falando para o legista: “Sim. É ela.”

Mesmo com o pavor cruzando cada pequeno espaço do meu corpo, eu não conseguia deixar de olhar para o cabeça. O que deveria ser um rosto, estava transformado em um grande buraco fundo, o sangue seco estancado pela falta de circulação, parte do crânio embranquecido e cérebro expostos, mandíbula entortada e para dentro. Não tive nenhum tipo de ânsia, muito menos nojo. A única coisa que senti foi desolação. Sem chão.

Minha visão antes inquieta e eufórica agora fitava apenas aquele único ponto amedrontador, pouco a pouco a cena fora embaçando, transformando-se em um borrão desfocado acompanhado com o eco do meu coração batendo e soando até o interior dos meus tímpanos e cérebro.

Tu-dum, tu-dum, tu-dum.

“Ken?”

Tu-dum, Tu-dum... Tu-dum;

“Kentin?”

Tu-dum... Tu-dum...

“Kentin? Está me ouvindo?”

Tu-dum...

“Respira! Não esquece do que você me prometeu ontem. Você tem que ser forte.”

Tu-d...

“Kentin!!”

“Você precisa respirar!”

...

“Acorda, cara!”

“Kentin!!!”

A visão anteriormente turva agora escureceu juntamente com o automático da minha mão subindo até meu rosto e dois passos cambaleantes para trás. Não senti dor na face, mas entendi muito bem que Castiel tinha inserido um soco no meu rosto. O ar entrou automaticamente para dentro dos pulmões como uma máquina com as engrenagens voltando a funcionar após uma pane. A tontura era gritante mas lentamente voltei a enxergar. Agatha, Castiel, Stephen e até mesmo Joshua agora me encaravam espantados pelo meu quase desmaio.

— Levem ele lá para fora. Ele precisa sentar. — ordenou Stephen.

O corpo havia sido novamente zelado dentro daquele negócio escuro, frio e pequeno.

Não. — neguei de imediato, a voz saindo em um único fio sonoro.

— Kentin, vamos lá pra fora. — Castiel começou a puxar meu braço.

— De jeito nenhum! — neguei novamente, tentando puxar meu braço sem sucesso. — Eu quero saber... — respirei fundo, sentindo o peito queimar. Percebi que Castiel segurava meu braço firmemente esperando que eu caísse a qualquer momento. — O que o legista tem a dizer sobre... — engoli a pouca saliva que arranhava o fundo da minha garganta como areia. — A autópsia da Lilith.

Stephen entreabriu a boca surpreso com minha capacidade de verbalizar algo entendível.

— Certo. — concordou por fim. — Bom... — pigarreou, nitidamente desconfortável. — Eu fiz todas as análises possíveis, há fratura em um dos braços, isso explica os hematomas. Também contém algumas esfoliações e outros arroxeados pelo corpo indicando baques na hora da... Colisão. — explicou. — Interiormente, não há vestígios de drogas, álcool, veneno ou qualquer outra substância. — visualizou a prancheta para ter certeza que não esquecia de nenhum detalhe. — A altura da ponte entre a pedreira logo abaixo está em torno de 30 metros de espaço, isso resume o motivo do rosto quase completamente desfigurado. Quando o corpo foi encontrado pelos policiais a face estava sobreposta em uma rocha, como o impacto foi forte por conta da queda isso exemplifica o porquê da profundidade do... Ferimento. — tentou usar a melhor palavra possível para direcionar sobre a cratera horrenda aonde deveria ser inicialmente um rosto. — Tudo indica e coincide que a causa da morte foi suicídio.

— Basta. — pontuou Castiel friamente, ainda sem me soltar, por precaução.

— ... — olhei para baixo, respirando devagar, agora sentindo o peito gelar com certa dificuldade.

— Mais alguma coisa? — Joshua perguntou firme, abraçando Agatha pela cintura. A mesma afundava o rosto em seu peito, tentando conter o choro incessável.

— Acredito que seja apenas isso. Em todo caso, uma coleta do sangue foi enviada ontem mesmo para o hospital central aqui de perto. Para ter certeza de que se trata da jovem será feito um exame de DNA para comprovar. — disse por fim.

— Tudo bem. — Joshua acenou, parecendo ser o único que conseguia falar direito por ali agora. Apertou mais a rosada contra si, amparando-a. — Nós vamos ir ao hospital agora mesmo.

— Eu lamento pela perda de vocês. — Stephen disse olhando para todos nós quatro com a testa franzida em pêsame.

— Lamentamos também. — disse Joshua, começando a guiar Agatha para fora daquela bendita sala.

Castiel começou a me puxar também, e desta vez eu não consegui revidar, meu corpo inteiro encontrava-se amolecido e dormente. Apenas deixei-me ser arrastado para fora dali, esperando nunca mais precisar voltar.

Agora tudo era mais claro do que nunca.

A culpa era toda minha.

Eu matei Lilith.

– CASTIEL’S POV. –

— Vamos para o hospital, eu dirijo. — dizia o homem de cabelos curtos castanho-claros, aparentemente namorado de Agatha.

Eu puxava Kentin pela manga de sua jaqueta pelo corredor daquele local, o mesmo nem sequer piscava, parecia em completo estado de choque.

— Eu vou para casa. — disse Kentin, de repente em meio ao trajeto.

— Você não vai ver o resultado do exame de DNA? — eu perguntei.

Ele não estava dando bandeira branca agora, não é? Ele não podia abandonar o barco, não quando ainda houvesse 0,01% de chance da Lilith estar viva mesmo que tudo estivesse contra essa probabilidade.

— Não. — negou simplesmente.

Parei bruscamente no mesmo instante, fazendo Kentin parar juntamente, quase colidindo seu corpo no meu.

Agatha parou com Joshua, e os dois nos olharam.

— Vão indo na frente. — eu disse. — Preciso conversar com ele. — avisei.

Sem dizer mais nada, Joshua começou a levar Agatha para fora do lugar, dobrando o final do corredor. Assim que ambos sumiram, comecei a falar:

— Não pense em aceitar o que quer que esteja acontecendo aqui. — fui direto.

— Não estou pensando nada. Estou fazendo. — respondeu apático.

— Kentin. — respirei fundo, sentindo minhas mãos tremerem. Não tinha raiva, estava tão assustado quando ele afinal. — Você tem que ser firme.

— É? E você acha que isso é possível? — indagou retoricamente, mesmo que seus olhos olhassem para mim dava para ver que ele não me via.

— É difícil, eu sei. — coloquei minha mão no ombro do mesmo. — Mas você tem que aguentar.

Kentin continuou com os orbes paralisados, apenas divagando. A bochecha dele estava vermelha e levemente inchada pelo esporro que antes tive que dar para acordá-lo do transe em que se encontrava.

— Você não notou alguma coisa estranha? — questionei, algo no fundo da minha mente apitava, avisando que algo estava errado. — Eu sei que tudo indica que é mesmo ela. — era impossível sequer mencionar o nome dela. — A roupa, a estatura do corpo, os cabelos. — citei. — Mas tinha algo incomum, não acha? Eu sinto isso.

— Incomum? — perguntou. — Incomum? — repetiu, arreganhando a arcada dentária. — Como o quê?! — ele ergueu os braços, tirando força de algum canto e me empurrando com brutalidade. — Como o rosto da minha namorada completamente destroçado?! — aumentou a voz, praticamente gritando. — Isso com certeza foi incomum!!

Me afastei quase caindo para trás, arregalei os olhos surpreso com seu surto repentino me encostando na parede do corredor afoito. Ele trocou de zero a mil instantaneamente, como a explosão de uma bomba relógio.

— Eu não vou ir em hospital nenhum! — dizia. — Eu já vi o suficiente! — afirmou freneticamente. — Lilith morreu. — sua voz abrangeu em total secura. — Minha Lilith morreu. Eu matei ela. — pontuou, os olhos ficando vermelhos, as veias dos glóbulos aparecendo junto com o nervo da sua testa que pulsava em relevo, pura raiva, dor, culpa.

— Ela pode estar viva. — contrariei tentando manter a esperança. Não podia aceitar que minha melhor amiga... Que minha irmã realmente se fora. — A gente tem que ter certeza antes de qualquer cois-

— A única certeza que eu tenho agora que todos nós que conhecemos a Lilith temos um enterro para ir amanhã! — exclamou em pura fúria, empurrando mais uma vez meus ombros, desta vez fazendo com que minhas costas batessem contra a parede.

Pisquei atordoado, nunca imaginei que o veria daquele jeito, tão incontrolável. E eu não sentia vontade de revidar, era claro como água que aquela atitude só demonstrava toda sua dor da recente perda. Não havia motivos para revidar, não mais.

O garoto me encarou mais alguns instantes, esperando que eu tentasse machucá-lo, entretanto eu continuei parado apenas o fitando em exasperação. Pela primeira vez na vida, eu o entendi. Entendi seu surto, entendi seus motivos, suas ações. Seu desespero.

De fato, eu também me sentia despedaçado com a cena na sala, com as possibilidades grotescas. Realmente, estava doendo, mas no olhar do Kentin, era mais que somente dor, algo que eu nem sequer conseguia imaginar o grau de infelicidade que se instalara em seu ser. Comprimi os olhos tristemente, deixando um suspiro pesado sair por meus lábios.

— Não. — negou irritado. — Nem pense em me olhar assim! — apontou o dedo pra mim ao mesmo tempo que lágrimas começaram a escorrer por seu rosto empalidecido pelo recente choque em conjunto com o ataque de pânico.

— Assim como? — questionei, sem intender.

— Assim! — acusou. — Como se eu fosse um filhote leproso perdido no meio da rua! — guinchou alegando. — Não preciso de compaixão. — afirmou gélido.

— Eu- — fui tentar falar, mas novamente ele me interrompeu.

— Nós vemos no velório, Castiel. — falou por fim, dando-me as costas e rumando embora dali.

Fiquei imóvel, sem nem sequer me prestar a olhá-lo sumir do local.

— Merda, Kentin. — resmunguei, fechando as mãos que insistiam em tremular constantemente.

Por mais que ele achasse, era meramente impossível que fosse verdade, apesar de tudo. Mesmo que tudo estivesse mostrando que ela tinha mesmo se suicidado, essa não era a Lilith que eu conhecia. Ela podia ser tudo, menos fraca. Lilith não devia. Não poderia. Não fez, definitivamente não. Eu me recusaria a acreditar nisso até não haver mais motivos para contrariar sua morte. Tinha de haver uma falha nisso tudo, um mínimo erro. Não podia aceitar.

Fechei os olhos com força, evitando deixar me levar pelos sentimentos ruins que borbulhavam meu peito.

— Você está bem?

Abri meus olhos, olhando novamente o corredor. Era o legista chamado Stephen.

— Não. — respondi seco. Que pergunta idiota.

— Hm, precisa de mais alguma coisa? — indagou complacente, percebendo que eu estava sozinho ali.

Reprimi os lábios, contendo tudo dentro de mim. Eu não poderia explodir. Não desta vez.

Como um flash de luz, lembrei de um detalhe. Kentin teria que me agradecer mais tarde por isso.

— Na verdade, preciso de um favor seu. — sai de perto da parede me aproximando do homem.

— O que seria? — franziu o cenho, confuso.

— Eu sei que vai parecer estranho, mas é muito importante.

— Prossiga.

— Eu preciso que você me entregue a anel que estava com ela. — pedi da melhor forma possível, querendo o convencer o quanto antes.

— Apenas os familiares podem pegar os objetos da falecida. — ele disse com um ar triste.

— Eu... — engoli em seco, piscando algumas vezes, não me importando do olhar penoso que ele me lançava. — Por favor. — implorei.

— Eu não posso. Regras são regras. — sorriu suavemente, tentando ser flexível à situação.

— Estou pedindo, por favor. Somente o anel. — pedi novamente. — O namorado dela vai querer ele de volta. — assegurei. — Era o garoto que estava conosco antes e quase desmaiou. — expliquei suplicante.

Stephen enviesou o olhar, ponderando por um instante.

— Certo. Mas só o anel. — censurou.

— Só o anel. — concordei.

Não me importava que a camiseta que dei à Lilith ficasse para trás, se aquele fosse mesmo o corpo dela, queria que realmente ficasse aonde estava então. O que importava era apenas e somente àquele anel. Minha intuição dizia que ele não podia ficar aonde estava, sei que Kentin iria querer ficar com essa lembrança dela.

É, ele realmente teria que me agradecer mais tarde.

[...]

No hospital do centro da cidade. – Ainda pela manhã. – 8h14min.

Aparentemente Kentin tinha ido para casa. Tentei ligar para o número do mesmo mas todas as chamadas foram ignoradas. Eu só esperava para que ele não tivesse feito nenhuma besteira. Talvez ele precisasse apenas esfriar a cabeça.

Eu, Agatha e Joshua esperávamos em silêncio dentro da sala de espera do hospital. Uma enfermeira de cara murcha mal-educada com cabelos escuros em um coque e olhos azuis pediu para que aguardássemos ali. Ela disse que os exames foram todos apurados e que um renomado “Dr. Chavalier” tinha tomado dianteira em especial no caso do exame de DNA já que o próprio tinha tratado de Lilith na última vez que viera aqui. Ou seja, quando Lilith machucara o pulso na janela de seu quarto.

Agatha comentara brevemente que ele se chamava Viktor ou algo assim.

O pulso. — comentei comigo mesmo refletindo nesse detalhe, andando de um lado ao outro pela sala, ao contrário dos outros dois eu não conseguia me manter sentado mais nenhum segundo sequer.

Antes que eu pudesse refletir sobre os acontecidos no dia em que Lilith se machucara, o médico chegou na porta da sala de espera atraindo todos os olhares.

— Agatha Razel Parker? — chamou o homem de cabelos escuros, vagando o olhar pela sala.

Lembrei do rosto dele de imediato, era mesmo o doutor que entrara na sala em que Lilith estava e pediu que todos se retirassem para ele dar seu diagnóstico naquele dia.

Quando Agatha foi se pronunciar eu ergui minha mão a impedindo.

— Deixa que eu vou. — falei firmemente. Ela não merecia passar por mais essa.

Entristecida ela acenou e voltou a acomodar-se ao lado de Joshua. Sem dizer mais nada, fui em direção ao médico, que apenas deu um maneando com a cabeça em comprimento, ele se virou começando a caminhar pelo corredor largo do hospital, guiando-me até sua sala médica.

— Pode se sentar. — disse assim que entramos no consultório.

— Estou bem, não precisa. — fui curto. — Vamos direto ao ponto. — pedi sem rodeios.

— Tudo bem. — concordou com um sorriso ladeado, compreensível. Ele pegou um envelope de cima de sua mesa e abriu-o, os olhos âmbares correram pelas linhas do papel que retirara de dentro do pacote.

— Então? — perguntei impaciente.

— De acordo com os resultados, para o exame de DNA indica que o sangue coletado realmente pertence a Lilith Weyland Parker. — informou de forma completamente profissional. — Eu lamento. É positivo. — afirmou por fim.

Por um momento eu jurei ter visto a sala rodopiar diante dos meus olhos, apoiei minha mão na cadeira em frente à mesa do médico.

— Você tem certeza disso? — perguntei, tentando me manter lucido.

— Sinto muito. Eu mesmo fiz os exames. — abaixou os olhos, descontente por ter que dar a péssima notícia.

O sangue era realmente da Lilith. Aquele corpo era mesmo o dela. Não haviam mais dúvidas, como vou recusar acreditar em um exame médico? O que diabos eu poderia fazer agora?

— Você quer que eu traga um copo d’água? — perguntou Viktor preocupado.

— Não, não. — neguei repetidas vezes movimentando a cabeça. — Era só isso?

— Sim...

— Ok. — concordei, começando a me virar para ir embora, quando eu ia cruzar a porta para sair do local, parei novamente e olhei-o de esguelha. — Me responda uma coisa.

— Pois não? — ergueu ambas sobrancelhas.

— Porque você fez questão de cuidar do exame da Lilith? — perguntei entortando o pescoço em curiosidade.

— Isso é simples. — sorriu suavemente. — Fui eu quem cuidei dela quando ela feriu o pulso há algumas semanas atrás, ela foi uma paciente extremamente simpática, me senti um pouco na responsabilidade depois do acontecido. — justificou-se. — É realmente trágico que tenha acontecido isso. — lamentou-se.

— É. — enruguei a testa, olhando-o melhor. — Realmente. — atenuei, saindo daquela sala em seguida sem fazer esforço nenhum para me despedir.

Arrastei meus pés pelo corredor, não compreendendo a mistura torturante de sensações. Por um instante algo me dizia para desconfiar dele, alguma coisa dentro de mim não admitia de jeito nenhum em acreditar em tudo aquilo. A maldita negação que não me abandonava.

Lilith... O que foi que você fez? Pensei agonizado não querendo processar que ela estava realmente morta.

Ao retornar a sala de espera, Agatha e Joshua notaram minha presença no mesmo instante. A rosada pôs-se de pé seguida juntamente pelo outro. Os olhos delas brilhavam na minha direção, a última gota de esperança dissolvendo-se junto com a expressão fúnebre. Balancei meu rosto em positivo, afirmando que o DNA dera positivo.

— Minha sobrinha... — murmurou. — Minha querida sobrinha. — sua voz tremeu chorosa. — Não acredito que isso pôde acontecer. — disse sôfrega, sendo acolhida novamente nos braços do namorado, voltando a chorar em prantos.

Abaixei meus olhos fitando meus tênis escarlates, dessa vez simplesmente não aguentando mais nenhum segundo daquele dia. Meus globos começaram a arder e enfim me permiti deixar que as malditas lágrimas rolassem por meu rosto, não ligando por demonstrar fraqueza.

Não havia mais nada que eu pudesse fazer. Só restava aceitar o quanto antes para o sofrimento não ser ainda mais agudo. Aguentar na pele os dias seguintes que viriam e evitar que coisas piores viessem a acontecer.


Notas Finais


Música do Capítulo:
(The Ghost Of You - My Chemical Romance.): https://youtu.be/uCUpvTMis-Y

Então pessoal, o que acharam? >< fui muito cruel? Hehe.
Alguém mata esse Viktor pelo amor de Deusss k


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