História Emotion - (Mileven) - Capítulo único

Eleven fechou seus olhos lentamente, sentindo o aroma suave das flores a sua volta lhe embriagar aos poucos.

Tinha ambos seus pés enterrados na grama. Uma de suas mãos segurava uma flor ao qual ela não fazia ideia de como se chamava, e sua outra mão estava bem acomodada envolvida à de Mike.

Dois anos haviam se passado desde que tudo havia acontecido. Ela havia mudado e ele de certa forma também, não foram mudanças muito significativas, porém acabavam por fazer uma certa diferença. Uma das coisas que evoluíra bem durante aquele período, fora seu vocabulário, tanto Mike quanto seus amigos, sempre lhe presenteavam com vários e vários livros, o que ajudou e muito para aquela conquista.

Mike estava deitado de barriga para cima. Usava uma bonita camiseta branca de tecido leve. Eleven tinha de confessar que sentia muita saudade em lhe ver vestindo aquelas camisetas listradas um tanto quanto bregas que sempre usava. Ele tinha seus olhos fechados, talvez estivesse tirando uma soneca rápida.

Ainda com os olhos fixos na face do garoto, inclinou-se suavemente para trás, deixando com que seu corpo se acomodasse aos poucos no gramado.
Sua mente voou longe, mais especificamente para o departamento de energia. Algumas sequelas ainda lhe faziam questão de lembrar a tudo que havia vivido naquele lugar. As lembranças não eram muito boas, passara todo aquele período nas sombras, com medo e impotente, porém ainda conseguia sentir um pouco de falta de seu papa. Mesmo não querendo admitir, ele fora a primeira pessoa que amara na vida, afinal de contas, ele a fez acreditar que ele realmente era seu pai, então de certo modo, ele sempre seria seu pai.

Lembrava-se perfeitamente de cada dia em que passou fome ou que fora dormir chorando com medo de voltar para a sala escura. Um momento em que se pegava pensando muito, era o dia em que a trancaram no tanque de privação sensorial e o único modo que tivera para escapar fora abrindo aquele portal. Eles haviam deixado ela para trás, ela poderia ter morrido, sei pai havia a abandonado naquela imensidão negra. Ao menos aquela situação havia lhe trazido algo realmente bom para ela, fora naquela mesma noite que conhecera Mike.

Fechou seus olhos ostentando um sorriso tímido em seus lábios, sentia muito prazer em relembrar aquela cena, o momento em que seus olhos se encontraram e logo depois da discussão de certa forma divertida entre os meninos, sobre sua estadia ali.

Seus olhos se conectaram. A luz da lanterna parecia não incomodar tanto seus olhos quanto a agonia que sentia e nem tão pouco o formigamento dentro de si.

- Está perdida? - Mike perguntou, aproximando-se lentamente.
Ela assentiu.

- O que faz aqui nessa chuva? - Questionou Dustin.

- Por que ela não diz nada? - Lucas virou-se para os meninos, intrigado.

- Venha conosco, ok? Vamos lhe dar abrigo - Mike tentou sorrir. Eleven balançou sua cabeça negativamente.

- Como assim "venha conosco?" você está maluco Mike? - Lucas o puxou pelo braço.

- Hey, não podemos deixar ela aqui.

- Ela não parece querer ir - Disse Dustin ainda vidrado na garota.

- Sim, porque estão assustando ela.

- Nós? Encontramos uma garota no meio de uma tempestade justamente na floresta das trevas e somos nós que estamos assustando ela? - Lucas parecia decepcionado com o amigo, já Mike o ignorou, virando-se novamente para ela.

- Venha comigo, tudo bem? Não vamos te machucar. Quando a chuva acabar, você poderá ir embora se quiser.

Ela encarou um a um, intrigada.

- Somos todos amigos - Os labios de Mike se compriram em um sorriso convidativo - Enfim, você vem? - Estendeu sua mão para ela. Eleven a pegou.

Mike não entendia o porquê, só sentia que devia ajudá-la. Seria desumano deixar a garota andando sozinha aquela hora, ainda mais justamente no local onde seu amigo desaparecera anteriormente.

Ninguém ousou dizer nenhuma palavra durante todo o percurso, todos estavam muito nervosos. Felizmente, a casa de Mike não ficava tão longe e logo haviam chegado. Ao chegar, Eleven foi diretamente para o sofá, onde se sentou. Já os meninos se colocaram a sua frente, observando-a.

- Hm, pegue - Mike retirou seu casaco, estendendo-o para ela - Vai ajudar a não sentir tanto frio.

Receosa, ela o pegou e cautelosamente o vestiu em si.

- Tem o número de telefone dos seus pais? - Mike a questionou.

- Cadê seu cabelo? Você tem câncer? - Agora era Dustin quem perguntava. Ela o encarou.

- Fugiu de casa? - Perguntou Lucas.

- Está com problemas? - Questionou Mike.

- Isso é sangue? - Aproximou-se lentamente dela, apontando para macha, até Mike lhe dar um tapa em sua mão.

- Parem! Estão assustando-a! - Disse Mike alterado.

- Ela está me assustando!

- Aposto que é surda - Dustin aguardou alguns instantes, dando uma palma no ar em seguida. Ela recuou - Não é surda.

- Certo, já chega. Ela está assustada e com frio.

Ele virou-se caminhando até o seu cesto de roupas, onde pegara um conjunto de roupas secas que usara no dia anterior e correu até ela.

- Aqui, estão limpas. Está bem? – Os garotos a observaram pegar as mudas de roupas e levar até seu rosto, sentindo seu cheiro.

Então do nada, ela simplesmente levantou-se, inclinou-se para baixo pegando as bordas da grande camiseta que usava e gesticulou levantá-las, porém instantaneamente Mike inclinou-se para ela, a tempo de impedir pressionando sua mão novamente para baixo.

- Não! Não! Não! – Lucas gritava enquanto tapava seus olhos, virando-se para o lado oposto ao de El.

- Ai, meu Deus! Ai, meu Deus! Ai, meu Deus! – Dustin repetia diversas em voz alta.

- Está vendo lá? É o banheiro. Privacidade. Entende? – Eles se entreolharam por alguns segundos até ela assentir em concordância.

Deixando com que a garota caminhasse a frente, vendo que ela já estava adentro do banheiro, inclinou-se para frente tomando a maçaneta em mãos, pronto para fechar a porta. No entanto, ela a segurou, impedindo-o.

- Não quer a porta fechada?

- Não.

- Então sabe falar.

- Certo, bem... que tal deixarmos a porta... – Puxou-a suavemente vendo-a acompanhar com seus olhos os seus movimentos – Assim? É melhor?

- Sim – Mike sorriu para ela, virando-se novamente para o interior do porão, onde encontrou os garotos.

- Isso é uma loucura – Disse Dustin.

- Pelo menos ela fala – Respondeu Mike.

- Ela disse "não" e "sim". Sua irmã de três anos fala mais – Disse Lucas.

- Ela quase ficou pelada – Disse Dustin.

- Tem algo errado com ela. Tipo na cabeça – Falou Lucas.

- Ela simplesmente fez... – Dustin encenou a cena de anteriormente, onde a garota quase levantara sua camiseta, deixando acidentalmente seu boné cair.

- Aposto que escapou de Pennhurst – Deduziu Lucas.

- De onde? – Mike perguntou.

- O hospício no condado de Kerley – Lucas disse explicativo.

- Tem muitos parentes lá? – Perguntou Dustin satírico sorrindo.

- Vá se catar – Respondeu Lucas – Sério, pensem bem. Isso explicaria a cabeça raspada e por que ela é maluca.

- Por que ela fez... – Novamente Dustin encenou gesticulando retirar sua camiseta, como a garota fizera a pouco.

- Ela é uma fugitiva. Provavelmente louca. – Insistiu Lucas.

- Como Michael Myers – Complementou Dustin.

- Exato! – Lucas confirmou um tanto eufórico – Não devíamos tê-la trazido.

- Queria deixa-la na tempestade? – Perguntou Mike indignado.

- Sim, fomos procurar Will, não outro problema – Respondeu Lucas.

- Devíamos contar pra sua mãe – Sugeriu Dustin.

- Concordo – Disse Lucas.

- Está doido? – Mike perguntou alterado, como se não acreditasse realmente no que estava ouvindo.

- Por que é loucura? – Perguntou Lucas.

- Porque não devíamos ter saído, lembram? – Disse Mike.

- E daí?

- Se eu contar pra minha mãe e ela contar pra sua e pra sua – Virou-se para Dustin.

- Cara – Disse Dustin

- Nossas casas virarão Alcatraz – Disse Lucas abaixando o tom de sua voz.

- Exato. Nunca acharemos o Will – Dustin virou-se para Lucas, novamente gesticulando retirar uma camiseta imaginária – Certo, o plano é o seguinte. Ela dorme aqui esta noite.

- Vai deixar uma menina...

- Ouça! – Mike respondeu cortante – De manhã, ela dá a volta na casa escondida, vai à porta da frente e toca a campainha. Minha mãe vai atender e saberá o que fazer, ela vai manda-la de volta para Pennhurst. Nós nos safaremos. Amanhã à noite, nós saímos de volta e desta vez, acharemos Will.

Eleven a assistia toda cena pela brecha da porta. De um certo modo era engraçado. Seus olhos permaneciam fixos no garoto de cabelos escuros, ele estava a defendendo de um certo modo, mesmo sem a conhecer e isto a deixara tocada de uma certa forma.
Ao ver que já estava pronta e que eles já não debatiam por conta de sua estadia ali, ela finalmente saíra do banheiro caminhando lentamente até eles.

- Hey Mike, estamos indo para casa, está ficando tarde – Disse Dustin vendo que a garota estava se aproximando.

- É, estou indo para casa também.

- Ah, tudo bem. Querem que eu os acompanhe até a porta? – Mike os questionou. Os dois instantaneamente encararam a menina um pouco atrás do amigo.

- Não, não se preocupe. Fique aqui e cuide dela – Disse Dustin.

- É, fique de olho nela.

- Tudo bem então. Até amanhã.

- Até.

Os dois caminharam receosamente até as escadas, parando para os observá-los.

- Aqui não tem exatamente uma cama confortável – Mike sorriu para ela – No entanto, podemos tentar fazer algo improvisado que não a incomode tanto, o que acha?

Ela assentiu, o observando. Mike olhou a sua volta buscando detectar um lugar onde pudesse criar uma cama ou algo do tipo. Podia quase imaginar uma lâmpada sobre sua cabeça quando avistara a mesa no centro do porão.

Correu até lá carregando duas cadeiras abaixo de seus braços, pegou um cobertor em seus cestos de roupa e o jogou sobre toda a construção. Eleven o observava indo para lá e para cá. Ele estava sendo realmente bom para ela, iria tentar fazer o que podia para que aquele garoto não tivesse o mesmo destino de Benny.

- Entre aqui, vamos ver como fica, ok? – Ela o encarou arqueando uma de suas sobrancelhas – Hey, pode vir, é seguro.

Receosamente ela caminhou até a armada, agachando-se aos poucos, até notar que já estava totalmente dentro da barraca.

- É confortável? – Mike perguntou. Ela apenas balançou sua cabeça em desdém – Hmm, acho que tenho algo que possa melhorar um pouco.

Mike correu até o canto do porão, revirando algumas antigas tralhas.

Dustin deu um pequeno tapa de leve em Lucas, lembrando-o que deviam ir logo embora. Lucas apenas assentiu, subindo as escadas. Quase no topo, parou novamente para observá-los.

- Tome. É meu saco de dormir – Mike agachou-se entregando para ela.

- Acha mesmo que ela é maluca? – Perguntou Dustin para Lucas.

- Eu não iria querê-la na minha casa. – Respondeu o garoto contrariado, voltando a subir as escadas. Dustin o seguiu, dando uma última olhada nos dois.

- Doideira. – Após isso, virou-se para os degraus subindo-os e partiu.

- Ei, não perguntei o seu nome – Disse Mike.

Eleven lembrou-se de como havia sido com Benny, ele fizera a mesma pergunta. Decidira ser um pouco mais objetiva com o garoto, afinal de contas, devia isto à ele.

Um pouco tímida, levantou de forma suave a borda da manga do casaco que vestia, deixando a marca de seu pulso à mostra.

- É de verdade? – Ele se inclinou para tocá-la, admirado. No entanto, a garota recuou. Os dois sustentaram uma troca de olhares por alguns instantes – Desculpe, nunca vi uma criança tatuada antes. O que significa? Eleven?

A garota ainda o encarava assustada, receosamente apontou para si mesma com seu indicar.

- É seu nome? – Ela assentiu em concordância – Eleven. Certo. Hm, meu nome é Mike, apelido de Michael, talvez a chamemos de ‘El’ para encurtar Eleven.

Ela voltou a assentir.

- Está bem. Boa noite, El.

- Boa noite, Mike.

Ele ajudou a descer o lençol, em seguida levantou-se, seguindo para as escadas. Permaneceu estático por alguns segundos observando a cabana improvisada que fizera para a garota.

Já dentro da barraca, El deitava ainda assustada, lembrava-se do que havia passo durante todo o dia, desde a abertura do portal, sua fuga, a morte de Benny e agora seu encontro com Mike. O dia não havia sido exatamente muito bom, esperava que daquele dia em diante algo mudasse e algo lhe dizia, que era Mike que lhe proporcionaria essa mudança.

Eram aproximadamente 3 horas da madrugada. Mike descia as escadas envolto ao seu cobertor indo diretamente a cabana que montara mais cedo para menina. Cautelosamente, puxou a coberta para cima, a fim de observá-la.

Sua mãe iria matá-lo caso descobrisse que trouxera uma garota para sua casa sem sua permissão. No entanto, desde o primeiro momento em que seus olhos se cruzaram na floresta das trevas, sentia algo como curiosidade sobre ela, estava intrigado.

Eleven, foi assim que ela disse se chamar. Até seu nome era diferente. Ele sorriu.

Não achava que ela era uma garota ruim de forma alguma, podia sentir isso de algum jeito, ela só parecia realmente muito assustada, isso o fazia se questionar com o que.

- Mike? – Perguntou sonolenta, sua voz saíra mais baixa do que gostaria.

- Não se preocupe. Só queria ter certeza que estava tudo bem – Seus lábios se comprimiram num sorriso suave. Ela o observava fixamente.

- Obrigada.

- Ah, tudo bem não se preocupe. Bem, irei deixa-la descansar agora, deve ter tido um dia e tanto.
Amanhã de manhã trarei seu café e iremos conversar um pouco, okay?
- Ok.

Lembrava-se do bonito sorriso que ele esboçara para ela naquele momento antes de partir, recordava também do que Benny havia dito, que ficava bem sorrindo, bom, aparentemente Mike também ficava muito bem.

Ei, El, no que está pensando? – Mike a questionou, observando-a diretamente.

- Em tudo que você me deu.

- Como assim?

- Depois que comecei a ler estes livros que você e pessoal me dão, lá sempre falam dessa coisa toda de encontrar o amor e algumas pessoas demoram bastante pra isso, no nosso caso não foi assim.

- É, eu sei – As bochechas de Mike tomaram para si a tonalidade avermelhada. Ele as vezes odiava a si mesmo por se envergonhar tão facilmente com que a garota dizia.

- Pra mim amor era o que eu sentia pelo meu pai, na verdade, ainda o amo, mesmo com tudo que ele fez pra mim, não consigo odiá-lo, só que com você eu descobri novas emoções sabe? Sentimentos. Acho que pude senti-los desde o primeiro momento em que o vi, só não entendia muito bem o que era.

- É tão bonito ver você se expressando bem deste jeito, antes você mal falava, sinto saudade de lhe ensinar algumas coisas.

- Eu agradeço muito à você por isso, Mike. Não só por isso, mas por tudo que fez e faz por mim, toda vez que me pego triste pensando em tudo que passei e passamos, você está lá e me faz esquecer, e você geralmente nem precisa fazer muito.

Ele levou o enlace formado em suas mãos até os lábios. Beijando de forma delicada cada dedo seu.

- Você também abriu um novo mundo pra mim, essas coisas de sentimentos, bom, sempre pensei que não fossem pra mim e você simplesmente apareceu e fez isso despertar aqui dentro aos poucos, até que quando me dei por mim, já estava apaixonado por você. Fico muito feliz mesmo em saber que consigo ajudar você, porque você salvou minha vida Eleven, mais de uma vez e não só por isso também, quando amamos uma pessoa, gostamos de proporcionar o bem pra elas, certo?

Eleven sorriu.

- Certo.

Seus olhos se fecharam novamente. Podia senti-lo se remexer acomodando-se ao seu lado. Poucas palavras, muitas ações e reações, era assim que se baseava o seu relacionamento com Mike.

O cara de sapo e a esquisitona, o quão exclusivo isso soava ser? Ao menos de uma coisa tinha certeza. Ela o amaria por muitos janeiros a janeiros ainda.