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História Engrenagens - Único


Escrita por: BabyK

Notas do Autor


Cá estou eu novamente postando a fic, mesmo depois de ter deixado como "anônimo" :')
Acredito que todas as vezes que eu decidir participar da fest, eu vou acabar deixando anônimo.
Alguém chegou a imaginar que essa aqui era minha? :~

Faço questão de ressaltar que não é um dos meus melhores trabalhos, mas escrevi com carinho. Foi gostoso escrever algo mais suave <3 Espero que gostem!
Tem duas palavras com * nelas. O significado, para quem não souber, está nas notas finais! õ/

E agradeço à Cora Lins por ter enviado o plot <3

edit: eu não sei porque, mas o ss cagou na formatação de texto da fic.
Vou tirar uma horinha do dia pra reajustas essa bosta ainda, mas por enquanto, vai ficar assim --'

Sem mais delongas!!
Boa leitura <3

Capítulo 1 - Único


Fanfic / Fanfiction Engrenagens - Único

Sentado no chão, com as pernas cruzadas, de frente às gavetas do branco guarda-roupa, Jonghyun escutava o barulho dos pingos da chuva mansa contra o piso da sacada do quarto; contra o vidro da janela; contra seus próprios pensamentos a cada gaveta de memórias que abria.

Não era uma atmosfera mórbida. Muito pelo contrário. A chuva calma e persistente fazia a trilha sonora perfeita para as ondas de nostalgia que se chocavam contra ele. E Jonghyun realizava aquela tarefa como se tivesse todo o tempo do mundo aos seus pés; sem um pingo de pressa, por mais irônico que pudesse parecer.

Abriu cuidadosamente outra gaveta, evitando que fizesse barulho, num movimento suave. Passou os olhos por cada item, tomando seu tempo para buscar, no fundo dos arquivos de sua memória, a presença de cada um deles em sua vida. O rosto que se manteve tão sério nos últimos anos deixou escapar uma breve arqueada no canto dos lábios. Não deveria esboçar a sugestão de um sorriso – não naquele momento –, mas o pequeno ímã de pelúcia de uma adorável vaquinha bege no canto da gaveta trouxe lembranças.

Lembranças felizes.

 

Foi em uma das vezes em que foram ao parque de diversões. Kibum havia chegado à iminência de colocar os pulmões para fora depois de tanto gritar na montanha-russa em que Jonghyun o convenceu de ir, depois de muita insistência. E para se redimir com o mais novo que segurava seu braço com força e abafava soluços desesperados em seu ombro, Jonghyun sugeriu um simples tiro ao alvo – talvez assim conseguisse acalmá-lo. Mesmo com as mãos trêmulas, Kibum fora capaz de acertar um dos vários alvos. Jonghyun soube que estava tudo bem quando Kibum sorriu, embora fraco, quando recebeu o pequeno chaveiro em mãos.

 

Jonghyun acariciou o objeto, demorando-se em sentir a maciez do material sob seu polegar. Não sabia dizer porquê Kibum não o jogou fora.

 

No outro canto da gaveta, estava seu relógio de pulso.

 

“Pegue suas coisas” Kibum havia dito com a mesma voz fraca e trêmula que insistia em permanecer em sua garganta fazia dias, enquanto tomava uma xícara de café – ou pelo menos tentava –, assim que Jonghyun entrou pela porta da sala; e Jonghyun apenas assentiu uma única vez em resposta, sem proferir uma única palavra, e rumou direto para o quarto. Mas o mais velho debateu por um momento se aquele relógio estava realmente incluso na sua lista de pertences.

Devolveu o ímã de pelúcia para a gaveta e enroscou a pulseira do relógio nos dedos, analisando o design calmamente.

Liso, sem muitos detalhes, era como Jonghyun gostava de seu relógio. Exatamente como o que segurava: uma auréola dourada, lisa, levemente fosca por fora; a pulseira sem detalhes; e os números dourados por dentro eram romanos em um fundo branco. E se fosse honesto consigo mesmo, aquele era seu preferido.

Foi no seu aniversário que Kibum dera o relógio a ele.

Fazia três semanas que Jonghyun havia perdido o velho acessório pela rua, e o tempo vago que lhe restava quando não estava trabalhando, preferia gastar em casa, descansando, vendo algum filme, ou com Kibum, a ir a alguma relojoaria.

E o mais novo sempre gostou de surpresas, por isso, fez questão de tampar os olhos do mais velho com as mãos e fazê-lo tatear o presente dentro de uma pequena caixa durante um jantar a luz de velas, até que ele descobrisse o que era.

O mais velho lembrava muito bem do que fizeram depois do jantar.

Pousou o relógio em seu colo, fitou o teto e soltou um pesado suspiro, levando as mãos para trás do corpo e depositando seu peso nelas. Como se o teto branco fosse uma tela de projeção, Jonghyun via com clareza suas lembranças passarem diante de seus olhos. Preciosa fora a época em que se beijavam com sorrisos e risadas nos lábios, e mal conseguiam manter as mãos longe um do outro, como se fossem ímãs de polos diferentes atraindo-se à menor distância.

Pensando assim, era até assustador saber que aquela noite aconteceu já fazia quase quatro anos. E que estavam juntos há quase seis.

Estiveram.

 

Agora, – ao que tudo indicava – não mais.

 

Jonghyun estaria mentindo se dissesse que terminar seu relacionamento com o mais novo nunca lhe passou pela cabeça. Mas então ele se lembrava das boas memórias que tinham juntos. Lembrava-se dos altos e baixos que passaram juntos; das lágrimas que um já derramou pelo outro; das surpresas e presentes sem nenhuma ocasião importante; das quietas noites que passaram se olhando nos olhos e conversando sem nunca realmente proferir uma palavra. E rapidamente Jonghyun desistia da ideia porque Kibum valia a pena demais.

Ironicamente, quem tomou a atitude de por um fim naquele relacionamento fora o mais novo.

 

Foi aí que a primeira sensação de arrependimento apareceu.

Baixou os olhos para o relógio em seu colo novamente. Jonghyun podia contar nos dedos as vezes em que ele surpreendeu o mais novo com algum presente. Talvez devesse ter cuidado de Kibum com mais carinho. Alimentado essa sensação de felicidade e satisfação com uma singela lembrancinha vez ou outra.

Suspirou.

Aquela vez em que foram ao parque, fora Kibum quem deu a ideia. Como tantas outras vezes.

 

Mas era cômodo.

Kibum sempre fora o mais explosivo e radiante dos dois. Jonghyun nunca sentiu a necessidade de se esforçar para surpreendê-lo, porque Kibum já fazia isso por ambos. Mas agora, olhando para trás, que mal faria se Jonghyun tivesse se esforçado um pouco mais? Que mal faria ter sido um pouco mais caloroso com o mais novo e sido motivo da aparição das covinhas de quando ele sorria mais vezes? Certamente não sentiria o peso da culpa de ‘não ter tentado o suficiente’ que sentia agora.

Por outro lado, a ideia de que ele mesmo não valia a pena o corroía.

Jonghyun desistiu de todas as vezes que essa ideia lhe assombrou a mente. Mas Kibum cedeu a isso. Ele não valia tanto a pena quanto Kibum? Ou teria ele desgastado o mais novo, mais do que o mais novo desgastou a ele?

 

Curvou o corpo para frente e encostou a testa em uma das gavetas, fitando o chão.

Ele se lembrava das vezes em que dizia “Eu te amo” para Kibum com toda a sinceridade de seu coração, e as maçãs do rosto do mais novo se tornavam rubras de súbito. Kibum raramente respondia, mas o canto do sorriso que ficava à mostra toda vez que ele virava o rosto de vergonha sempre fora resposta o suficiente para aquela confissão.

 

 

Mas durante esses seis anos, em algum lugar do caminho, ‘Eu te amo’ s e sorrisos deixaram de serem suficientes.

 

De algum modo, os ímãs não mais se atraíam, e, vagarosamente, começaram a se repelir.

 

Uma ou outra briga em um relacionamento é comum, e talvez até saudável por fazer ambas as partes se lembrarem de que ambos têm sentimentos, e que são fáceis de serem magoados. Mas de modo algum isso era algo que deveria ter se tornado rotineiro.

 

E, naquele exato momento, sentado no chão do que estava para se tornar seu antigo quarto, Jonghyun não conseguia se lembrar de nenhuma discussão que tiveram.

Era irônico, e talvez até engraçado de um jeito masoquista, mas à sua cabeça apenas lhe vinha sorrisos e sons de risadas; os raros momentos em que Kibum sentia coragem para olhá-lo nos olhos e responder “Eu te amo” com a voz acanhada, rosto corado e cabelo desarrumado sobre o travesseiro da cama; as poucas vezes em que Jonghyun se aventurava em sua pequena ousadia e beijava Kibum em frente a todos na porta do cinema, deixando o mais novo de olhos arregalados pela súbita demonstração de afeto.

Jonghyun sabia que ambos haviam desgastado algo que fora construído com carinho. Sabia que uma hora o fio que ainda os unia acabaria por se romper, mas no fundo de seu coração, ainda existia a pequena esperança de que algum milagre aconteceria e eles voltariam a ser o casal que ambos eram quando começaram a namorar.

 

Jonghyun fitou a palma das mãos com o cenho franzido. Parecia que estavam atadas.

Tinha a vaga sensação de poder para remendar todos os rasgos daquele relacionamento, mas em verdade, ele, sozinho, era impotente.

 

Quando foi que tudo começou a dar errado?

 

E estilhaçando a cortina de vidro feita de memórias que o separava do presente naquele momento, soou um vago e longínquo soluço vindo da cozinha. Tão baixo e abafado que se Jonghyun não estivesse quieto feito uma estátua, teria passado despercebido com facilidade.

Com o coração acelerado, o mais velho fez questão de prender a respiração, atento a qualquer outro barulho.

Dois minutos em silêncio. Nem mais um único pio fora ouvido.

 

Mas Jonghyun conhecia Kibum bem demais. E não importava quantas brigas tiveram, cada simples soluço do mais novo eram, e sempre seriam, agulhas em seus ouvidos, que lhe perfuravam o corpo e sempre encontravam um jeito de atingir seu coração.

Jonghyun apenas o amava demais.

 

A passos leves, o mais velho caminhou até a porta do quarto, deixando a ponta dos dedos percorrerem a superfície porosa de madeira branca do guarda-roupa pelo percurso. Parou ali, em conflito consigo mesmo, temeroso de invadir o cômodo onde Kibum se encontrava e desencadear mais uma das várias brigas que já tiveram, mas, ao mesmo tempo, preocupado com o estado emocional do outro. Sua decisão rapidamente fora feita quando outro soluço abafado chegou a seus ouvidos.

Jonghyun suspirou fundo, fechando os olhos por um momento, antes de rumar para a cozinha e encontrar o mais novo de costas para ele, debruçado sobre a pia, cabisbaixo. Uma das mãos estava em sua boca para evitar que qualquer som transbordasse seus lábios, mas os pequenos solavancos que seu corpo fazia denunciavam o choro contido.

 

Jonghyun deu o primeiro passo em direção ao mais novo, mas parou por ali mesmo. Sentia seu coração pesado pela imagem de Kibum naquele estado, mas não tinha certeza se consolá-lo seria prudente de se fazer, afinal, aquele seria o último dia que passariam ‘juntos’. Jonghyun não sabia se tinha esse direito. Não sabia se Kibum se esquivaria ao seu toque.

A mão do mais velho caída ao lado do corpo ansiava por tocar o mais novo, mas Jonghyun não conseguia nem confiar em si mesmo para agir da maneira correta. Ele sempre fora péssimo com gestos, embora sempre tivesse a melhor das intenções.

Foi quando Kibum virou-se para ele, com os olhos levemente inchados pelo choro fresco, o cabelo bagunçado com alguns fios grudados ao rosto de bochechas coradas, nariz avermelhado, e lábios úmidos, enquanto passava a manga de sua camisa sobre uma das bochechas molhadas, que Jonghyun perdeu todo e qualquer controle de seus pensamentos. Kibum fazia-o descarrilhar do mundo feito um trem de metal pesado que caía do precipício por pura e espontânea vontade.

-Você... – Jonghyun via como os lábios do mais novo tremiam. A voz trêmula e fraca saindo dali. Kibum soluçou, passando a manga da roupa novamente pelo rosto, recuperando como podia sua pose séria. Preferiu então fitar o chão, a fitar seu futuro ex-namorado – Já terminou? – Perguntou num sussurro, abraçando-se e mordendo os lábios por dentro quando novas lágrimas ameaçaram aparecer em seu campo de visão.

Kibum estava tão focado em não chorar na frente de Jonghyun que não reparou quando não obteve resposta. Ficou surpreso quando dois pés pararam a sua frente. Ergueu os olhos de cenho franzido, pronto para questionar o que Jonghyun estava fazendo, quando sentiu o toque caloroso do outro em sua bochecha, tentando enxugar o que ainda restava das lágrimas.

-Jonghyun – Kibum alertou-o severamente quando fora puxado em direção ao peitoral do mais velho, embora ainda usasse um tom de voz baixo. Kibum manteve-se imóvel em seu lugar – O que você tá fazen-

-Ssshhh... – Jonghyun sussurrou, puxando outra vez o mais novo contra si, e obtendo sucesso dessa vez, mesmo que Kibum tivesse colocado a mão a frente de seu corpo em certa relutância.

O rosto de Kibum fora guiado com cautela até a curva do pescoço de Jonghyun.

-Jonghyun, para... – Kibum pediu. A voz abafada pelo rosto ainda estar escondida no pescoço do outro, mas também porque suas emoções estavam ao limite de transbordarem.

Jonghyun não parou.

Não por desrespeitar a opinião do outro, mas porque ele conhecia Kibum bem demais. E o mais novo era péssimo com palavras.

-Sssshh... – Jonghyun repetiu o sussurro, levando uma das mãos até os cabelos castanhos sedosos do mais novo, e enrolando as pontas dos dedos em pequenas mechas num calmo carinho; a outra mão abraçou a magra cintura, desenhando círculos e formas abstratas em suas costas. Jonghyun apoiou o queixo sobre a cabeça de Kibum – Ssshh... – Ele repetiu, fechando os olhos e concentrando-se nos pequenos soluços que brotavam aos poucos na curva de seu pescoço; nas pequenas lágrimas que, uma a uma, começaram a molhar sua roupa; no calor do corpo alheio que, mesmo a contragosto – ou talvez nem tanto –, enroscou os dedos no pano de sua camisa e agarrou-se a si.

 

 

 

Kibum jamais quis deixar Jonghyun.

 

Bem, talvez quisesse nos breves minutos depois de uma briga aqui ou ali, mas rapidamente essa ideia também era descartada, porque Jonghyun valia muito a pena, tal qual acontecia com o mais velho.

 

Mas... Como diz o velho ditado: “A corda sempre vai se romper do lado mais fraco”.

 

Dos dois, infelizmente, fora Kibum que chegou ao seu limite primeiro.

 

-Por que você é assim? – Kibum choramingou abafado contra o pescoço do mais velho, deferindo um breve soco em seu peito, e, claro, assustando Jonghyun, o qual franziu o cenho, completamente aturdido.

-Assim como?

Kibum deferiu outros socos, soluçando abafado, com o rosto ainda escondido no pescoço do outro.

-Seis anos pra me abraçar desse jeito e você faz isso agora! – Deu outro soco – Eu te odeio tanto... – A reclamação saiu num tom mais agudo e choroso, ao mesmo em tempo que Kibum puxava o pano da roupa de Jonghyun com mais força.

-Por que você sempre fala essas coisas? – Jonghyun retrucou na mesma hora, afastando seu rosto para tentar olhar Kibum nos olhos – Por que você sempre mente desse jeito, Kibum?

-O quê? Virou adivinho agora pra saber quando eu tô mentindo?

-Kibum... – Jonghyun suspirou – Eu sei que você tá mentindo. Se me odiasse, você não teria chorado tanto por minha causa. Eu conheço você melhor do que qualquer um e... – Bufou – Ainda assim, parece que às vezes eu não te conheço.

 

Jonghyun tinha, sim, uma parcela de culpa no que a relação deles se transformou, e ele sabia e reconhecia isso, mas não significava que ele deveria aceitar calado quando o próprio Kibum também carregava a outra parcela da culpa.

 

 

-Não! – Kibum empurrou Jonghyun para trás – Você não conhece! Urgh! – Levou as mãos os cabelos castanhos e os puxou com raiva; ofegante – Jonghyun, eu tô cansado disso.

-Cansado do quê, Kibum?! – Jonghyun gesticulou as a mãos pelo ar – Eu ainda não sei do que você tá falando! Você nunca me conta nada!!

O mais novo grunhiu – talvez de raiva, talvez de desespero, ou talvez até os dois juntos – correndo os dedos pelo cabelo, mas acabou por esconder o rosto atrás das mãos porque já não se sentia mais no controle de suas emoções. Queria chorar de raiva; queria chorar de tristeza; queria estapear Jonghyun até que sua raiva passasse, mas ao mesmo tempo também queria que Jonghyun o abraçasse.

O mais velho, por sua vez, também não se encontrava muito melhor. Estava cansado de tudo aquilo, mas teimosia e persistência o impulsionavam até que obtivesse uma resposta daquilo tudo que finalmente deixasse sua alma em paz. Esfregou o rosto com as mãos e suspirou fundo, caminhando até Kibum e segurando seus ombros.

-Kibum, conversa comigo – Jonghyun pediu, deixando os próximos segundos em silêncio na espera de uma resposta – Conversa comigo! Eu não consigo adivinhar tudo o que se passa na tua cabeça, Bum. Me ajuda! Você não conversa comigo, Bum. Não me diz o que tá acontecendo. Você nunca diz! C o n v e r s a comigo, Kibum, pelo amor de Deus!

-De que adianta eu conversar com você se você sempre é indiferente a tudo?! – Kibum explodiu, com a voz quase gritando, novamente afastando Jonghyun de perto de si.

-Eu sou indiferente?! – Jonghyun arregalou os olhos com o cenho franzido; sua expressão enraivecida, respondendo sério e com a voz o mesmo tom – A única pessoa nessa relação que diz ‘eu te amo’ sou eu, e eu ainda sou indiferente?! – Jonghyun apontou o indicador de maneira acusatória para o mais novo – O indiferente é você! Dá pra contar numa mão quantas vezes você já me respondeu!!

-E dá pra contar em três dedos todas as vezes que você me beijou em público!! – Agora, Kibum realmente gritou, gesticulando nervosamente e com lágrimas escorrendo dos cílios, mesmo contra sua vontade.

-Não é verdade... – Jonghyun amansou a voz de súbito ao responder.

-É. E você sabe! – Kibum fora quem apontou o indicador dessa vez – Se você tinha vergonha de mim em público deveria ter acabado com isso antes, Jonghyun! Eu... – O mais novo soluçou. Correu uma as mãos pelos cabelos, passando os olhos pela cozinha e sorrindo amargamente – ... Me sentia tão idiota grudado no seu braço e você não se dava ao trabalho nem de olhar pra mim... Um monte de casal passando rindo do nosso lado e só eu, o idiota, insistindo nas mãos dadas... Quando se fosse por você, a gente andava com dois palmos de distância um do outro, com as mãos no bolso como se a gente fosse... Eu sei lá, dois caras de uma gangue qualquer.

Uma breve risada amarga soou.

-Eu não acredito que isso é engraçado pra voc-

-E você tem noção de como eu me sentia toda vez que a gente assistia àqueles filmes de romance no cinema? – Jonghyun o cortou, e sem dar espaço para respostas, continuou – Todo maldito filme de romance tem a porcaria da frase “eu te amo”, e toda vez que alguma droga de personagem falava isso eu olhava pra você achando que uma vez... Uma única vez... Você fosse olhar pra mim e dizer a mesma coisa. Eu sempre achei... Que esse tipo de coisa fosse fácil de falar pra quem a gente ama... Mas você simplesmente não fala... – A frase terminou num sussurro – Eu... Sei que você não me odeia... Mas eu realmente me pergunto se você me ama...

-Eu a- E Kibum, tão rápido quanto começou aquela frase, foi para pará-la. Mordeu os lábios, cobriu a boca com uma das mãos e girou o rosto corado para o lado.

-Tá vendo? – Declarou o mais velho.

Kibum mordeu os lábios com mais força. Desta vez, ofendido.

-E que direito você tem de falar isso? – O mais novo retrucou – Você diz que me ama inúmeras vezes, mas não faz mais nada além disso. Parecem... Palavras vazias... – Kibum levantou os olhos para o mais velho – Eu não consigo sobreviver só de palavras, Jjong. Eu... Aguentei até aqui achando que só isso fosse ser o suficiente, mas não é...

-E eu não consigo sobreviver só de gestos, Bum. Não dá pra ficar esperando meu aniversário todo ano só pra escutar isso como um... Um presente, um prêmio, e não porque você quer.

 Kibum não respondeu. Limitou-se em morder os lábios e girar o rosto em vergonha mais uma vez, enquanto Jonghyun suspirou profundamente, bagunçando os cabelos e, por fim, pousando as duas mãos na nuca e olhando fixamente para o mais novo.

-Kibummie – E o notável apelido fê-lo ganhar a atenção do mais novo instantaneamente – Como foi que a gente chegou nesse ponto? – Já não mais gritavam. A maior parte das frustrações de ambos havia passado e, aparentemente, a conversa havia amansado finalmente – Não era assim quando a gente se conheceu...

Kibum suspirou, coçando a nuca, pensativo, e baixando os olhos para o piso da cozinha. Ele também não sabia responder aquela pergunta.

 

Talvez Jonghyun tenha errado em não alertar o mais novo o suficiente.

Talvez Kibum tenha alertado o mais velho de menos.

Mas, de fato, o problema era comunicação.

 

-Eu... – Kibum começou – Eu não sei...

-A gente não pode... Conversar... ? – Jonghyun sugeriu com a voz acanhada – Apropriadamente. Sem... Brigas, sem gritos. Só... Conversar. Eu não quero que a gente termine assim...

 

Kibum passou os dentes pelo lábio inferior, sentindo-o tremular com a nova e súbita vontade de chorar. Entretanto, o mais novo assentiu ansiosamente.

 

E lá estava novamente.

Jonghyun falando demais e Kibum de menos.

Jonghyun expressando de menos e Kibum demais.

 

-Vem – Jonghyun estendeu a mão direita em direção ao mais novo, já girando o corpo na intenção de ir para fora da cozinha.

Kibum franziu o cenho, mas aceitou o indireto convite para seguir o outro mesmo assim. E foi perceptível a mudança de atmosfera, embora sutil, quando Jonghyun fechou seus dedos sobre a mão do menor. Era algo... Que havia se tornado incomum entre o casal nos últimos meses.

-Aonde?

Jonghyun deu de ombros.

-Eu sei lá. Eu imaginei algum lugar confortável pra conversar. Cama, sofá. Não a cadeira da cozinha. Parece tão... Formal – Ele terminou a sentença num tom incerto. Esperava que Kibum visse sentido naquele raciocínio. E, para sua surpresa, o mais novo não perguntou mais. Simplesmente aceitou e seguiu Jonghyun para o cômodo mais perto da cozinha. Este, ironicamente, sendo o quarto de ambos.

 

Pararam na porta de mãos dadas, sentindo o constrangimento subir pela ponta dos dedos gradativamente. Jonghyun deu um sorriso acanhado em direção ao mais novo. Escorregou os dedos do aperto que segurava a mão do (ex)namorado e caminhou com insegurança até o lado direito da cama – seu lado. Sentou-se ali com um suspiro nervoso, esfregando a palma das mãos e fitando o céu nublado pela janela do quarto. Ergueu os olhos lentamente para o teto e, por fim, deitou-se ali mesmo; cabeça repousada no centro da cama e metade das pernas para fora.

Kibum esfregou um dos braços com a mão, incerto quanto ao que fazer, mas acabou cedendo mais uma vez. De fato, o ambiente aquecido de lençóis macios era mais aconchegante que as duras e gélidas cadeiras da cozinha. Ainda um pouco relutante, sentou-se na beirada da cama oposta à Jonghyun, e imitou o gesto de deitar-se ali.

 

Permaneceram em silêncio, apenas escutando o barulho da chuva que teimava em fazer a trilha sonora daquele dia.

Kibum estava ficando ansioso com a ausência de palavras, brincando com a ponta dos dedos entrelaçados em seu colo e deslocando os olhos de um canto a outro pelo teto. Inconscientemente, seu pé direito começou a bater repetidas vezes contra o chão. Ele não conseguia romper o silêncio sozinho.

 

-Você se lembra de quando a gente se conheceu?

Kibum assustou-se com a súbita e incomum pergunta. Girou o rosto como pôde, conseguindo um breve vislumbre do rosto do outro.

-Quê? – Riu abafado, quase num deboche – Vai dizer que você não lembra, e agora, dentre todos os momentos, quer que eu conte como foi?

O que saiu na intenção de ser uma leve bronca acabou num tom mais áspero do que esperava.

Jonghyun suspirou, contando até cinco mentalmente e ignorando a pequena grosseria do mais novo. Já estava acostumado. Kibum era realmente péssimo com palavras.

-Você sabe que eu me lembro – Respondeu calmamente – Tô perguntando de você.

Kibum mordeu os lábios no mesmo instante, logicamente envergonhado das palavras rudes que falara sem pensar, mas seu orgulho era grande o suficiente para que o impedisse de se desculpar.

Preferiu fingir que aquele momento não aconteceu, e simplesmente fitou o teto branco, vasculhando os vários fragmentos de memória em sua cabeça.

Ele se lembrava daquela tarde tão enublada que mais parecia começo de noite. Lembrava-se da chuva pesada que começou a cair de repente. Mais ou menos parecida com a tarde em que testemunhavam naquele momento.

Levou o pulso direito por cima da testa, em uma pose relativamente relaxante.

-Eu tava em frente à lanchonete do bloco 3Q – Kibum respondeu – Tinha acabado de sair da aula de cerâmica e precisava ir ao bloco da coordenação do curso, mas fiquei ilhado por causa da chuva. Eu fui o último a sair e não tinha ninguém pra eu dividir o guarda-chuva. Quer dizer... Eu achei que tivesse não ninguém.

Kibum sorriu minimamente com a lembrança, e Jonghyun, mesmo sem ver o rosto outro, espelhou-o num sorriso deveras doce.

-Você me cutucou do nada, simplesmente me deu seu guarda-chuva, botou a touca da jaqueta na cabeça e saiu correndo debaixo de chuva.

Jonghyun abafou uma pequena e discreta risada com a mão.

-Você ficou bravo aquele dia – Jonghyun continuou – Lembro de escutar você gritando, sacudindo o guarda-chuva na minha direção e perguntando “Yah! Como eu faço pra devolver isso depois?!”.

-E mais do que rápido você respondeu pra te encontrar no dia seguinte na mesma lanchonete, no mesmo horário. E antes que eu percebesse, eu fui arrastado pra um Guerilla Date* com você – Kibum concluiu, revirando os olhos brevemente ao se lembrar do quão fácil ele se deixou levar pela lábia do mais velho aquele dia – Sabe, foi muita sorte aquele dia, porque geralmente eu não ligo de tomar chuva.

Jonghyun abriu um sorriso esperto de canto.

-Eu sei – Ele respondeu – Você só não tomou chuva aquele dia por causa dos papéis de monitoria.

 

Kibum franziu o cenho.

-Espera um minutinho – O mais novo declarou, apoiando-se nos cotovelos e girando o rosto como podia na direção do mais velho – Eu não falei que os papéis eram da monitoria. E eu não me lembro de ter conversado sobre isso com você sequer uma única vez.

-Ahn... – Jonghyun comprimiu os lábios.

-Kim Jonghyun – Kibum alertou-o – O que você nunca me contou?

-Eu... Posso ou não ter visto uma postagem sua da chuva no instragram reclamando “Adivinha só quem vai ficar ilhado porque não pode molhar os papéis da monitoria nessa chuva?”, ou algo do tipo...

-Pera. Pera. Perdão?! – Kibum finalmente sentou-se na cama, piscando os olhos várias vezes e olhando desconfiado e levemente surpreso para Jonghyun – Você me seguia no instagram antes de falar comigo?

-Eu... Posso ou não ter stalkeado seu instagram de leve naquela época...

-Jonghyun – Kibum declarou com a voz gélida séria, indicando para que ele continuasse.

-E você pode ou não ter sido meu crush antes mesmo da gente se falar, e eu posso ou não ter ficado até mais tarde aquele dia só pra te entregar o guarda-chuva...

Kibum respirou fundo, enroscando o lençol da cama entre os dedos. Fechou os olhos.

-Por que nunca me contou antes?

-Como eu ia contar que eu tinha uma paixonite por você e que a gente só se falou porque eu te stalkeava todo dia no instagram?!

-E porque contar isso agora, Jonghyun? A gente não... Eu... – Kibum bufou, jogando-se de volta na cama e cobrindo o rosto com os braços, soltando um pesado suspiro.

O mais novo estava incrédulo, e talvez até um pouco chateado. De todos os dias juntos, Jonghyun simplesmente escolhera aquele a dedo para abalar seu emocional com confissões e gestos. Kibum choraria de nervoso se aquele momento permitisse.

-Porque... Eu queria que acreditasse que todas as vezes que eu disse que te amo foram verdade. Desde aquela época da faculdade. Desde a primeira vez que eu disse... Parece um soco na boca do estômago toda vez que você não acredita.

Kibum riu abafado, esfregando o rosto com as mãos, mas o tom manhoso da voz denunciava facilmente que, muito provavelmente, ele já estava lacrimejando de novo.

-Acreditar em você, Jonghyun? – O mais novo fungou – Como? Eu quero acreditar em você, mas não dá... – Riu amargamente – Qual foi a última vez que a gente deu as mãos de um jeito tão natural, Jjong? Quando a gente sai, eu preciso pedir pra você estender a mão, porque daí eu posso segurar ela. No começo você se preocupava mais comigo. E eu não sei se foi culpa minha, mas você parou. Você sempre foi sério, mas agora? Eu não consigo ver todo o carinho que eu dou de volta pra mim – Kibum fungou alto dessa vez.

Levou as mãos ao rosto, apertando os olhos para que nenhuma lágrima escapasse.

-Eu sinto falta... – Esforçou-se para que cada palavra saísse o mais nítido possível, apesar dos lábios trêmulos – Eu sinto falta de você me abraçando, pegando na minha mão. Eu queria você me beijando em público pra todo mundo ver e saber que você não tem vergonha de mim. Meu Deus, eu sinto até falta daqueles tapinhas malditos que você dava na minha bunda quando a gente tava na cozinha – Mesmo a contragosto, acabou rindo com a lembrança – Droga, Jonghyun!

Jonghyun apertou os olhos com força. Lá estava Kibum chorando de novo, e, mais uma vez, ele era o motivo. Suspirou pesado antes de se deitar de lado e pousar uma das mãos sobre a cabeça do mais novo, acariciando os cabelos gentilmente na esperança de acalmá-lo pelo menos um pouco.

-Eu... Sempre tive muito medo de te perder nos primeiros anos... – Jonghyun sussurrou, roçando a ponta dos dedos no couro cabeludo do mais novo – Você vivia recebendo spotted** de gente interessada em você na página da faculdade... Devo ter dobrado de cuidado pra não te perder. Depois que a faculdade acabou... Acho que comecei a me sentir mais cômodo...

Kibum riu ironicamente.

-Você acha?

-Mas a sua dor não é diferente da minha. Eu daria tudo pra escutar você respondendo “Eu te amo” pra mim quando a gente sai pra trabalhar. Eu sinto falta de você me elogiando. De dizer que gosta de estar comigo ou qualquer coisa assim. Você não precisa ficar esperando carinho, Bum. Me pede um abraço. Me pede um beijo. Eu sou muito idiota com demonstração de afeto. Você sabe disso... Não é como se eu não quisesse...

-E de quê adianta eu ficar pedindo Jonghyun??

-E de quê adianta eu ficar implorando pra você dizer que me ama??

Kibum mordeu o lábio inferior com força.

-Eu... Sinto que eu vou parecer um idiota se eu falar isso – Murmurou o mais novo – Mas... Parece que eu vou perder o jogo se eu falar... Você sabe...

-Jogo?

-É... Na minha cabeça parece que eu ainda sou um estudante de faculdade, só que você é um professor, tipo aqueles filmes americanos, sabe? Parece que se eu falar... – Kibum suspirou, finalmente retirando as mãos do rosto e olhando para o mais velho – Você simplesmente vai perder o interesse. Você fala dos spotteds que eu recebia, mas as pessoas só não mandavam pra você também, porque sempre pareceu maduro demais. É... Como se eu tivesse medo que você não me respondesse se eu falasse. Que eu fosse imaturo demais. E eu fiquei tão aliviado nas vezes em que eu falei que chega a ser assustador – Sorriu tristonho – E eu sei que é imaturidade minha de pensar isso, eu sei! Mas...!! – Queria dizer muita coisa ainda, mas nenhuma delas ele sabia se devia. Sentia-se um peso para o mais velho. Tinha certeza que estava honrando o posto de mais novo e sendo imaturo; idiota. Sabia que se estivesse no lugar de Jonghyun, provavelmente já teria jogado a toalha.

-Ssshh... – Jonghyun levou a outra mão até o rosto do mais novo, impedindo com o dedão que uma nova lágrima escorresse. Tamanho fora o alívio do mais velho quando Kibum cobriu sua mão com a própria no mesmo instante que sentira o toque, aconchegando-se para mais perto do calor – Bum... – Jonghyun sussurrou alto o bastante para que ganhasse a atenção do mais novo – Vamos fazer um trato? – E diante dos olhos atentos do mais novo, Jonghyun continuou – Eu prometo te abraçar mais. Prometo te beijar mais. Prometo te surpreender em público. Prometo que eu vou me esforçar ao máximo pra demonstrar pra você todos os dias que eu te amo – O mais velho arqueou as sobrancelhas, esperando uma resposta do mais novo.

-Eu... Eu prometo que vou tentar me expressar mais. Prometo conversar. Prometo falar o que eu gosto, o que não gosto, o que eu quero... Prometo dizer... – Kibum respirou fundo, umedecendo os lábios antes de continuar – Prometo dizer que eu... Que eu te amo mais vezes e com todo meu coração... – Passou com rapidez as costas das mãos sobre os olhos.

Jonghyun não conseguiu conter o sorriso torto que nasceu quando escutou aquela frase. Estendeu o dedo mindinho na direção do mais novo.

-Jura juradinho?

E Kibum deixou escapar uma breve, porém espontânea, risada com o gesto.

-Isso é tão infantil – O mais novo respondeu com um sorriso – Por que isso de repente?

Jonghyun deu de ombros.

-É mais bonito quando sorri – Kibum ainda corava facilmente quando Jonghyun o elogiava. O mais velho balançou o dedo mindinho, arqueando as sobrancelhas, indicando que ainda esperava uma resposta do mais novo.

Kibum mordeu os lábios, mas balançou a cabeça vigorosamente em afirmação, enroscando seu dedo mindinho com o do mais velho.

-Então... Você quer continuar namorando comigo?

 

Oh, claro. Kibum precisava se policiar agora e tentar se expressar mais com palavras.

-Quero – Assentiu mais uma vez – Eu quero.

 

 

 

 

 

Já fazia um tempo que Jonghyun não o cobria de beijos daquela forma.

Talvez ali, naquele exato momento, foi quando Kibum começou a perceber que responder às juras de amor que recebia do namorado não o faria se afastar ou perder o interesse. Muito pelo contrário. Faria se prender a si cada vez mais.

Talvez ali, naquele momento, foi quando Jonghyun aprendeu a lição que amor não se sustenta apenas com palavras. E que afeição é uma via de mão-dupla: é tão bom dar, quanto receber.

Talvez aos poucos percebessem que tudo o que um precisava era o incentivo certo do outro.

 

 

Relacionamentos perfeitos não existem.

Mas existe tentar.

 

Afinal, uma máquina só funciona quando suas engrenagens se encaixam.

Quem sabe as deles não tenham voltado a se encaixar...

 


Notas Finais


*Guerilla Date - É quando alguém propositalmente estende a duração de uma tarefa cooperativa com uma garota ou garoto que se goste, na intenção de tornar aquilo um encontro.
**Spotted - É uma página de facebook de faculdade, onde geralmente estudantes mandam “spotteds”, que nada mais é que comentários anônimos dos mais variados tipos, geralmente sendo estes cantadas, mas podem chegar até pedir por ajuda para doação de animais ou achar itens perdidos.


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