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História Era uma quinta-feira. Lembro-me de que chovia. - Lembro-me de que chovia.


Escrita por: Endora_

Capítulo 1 - Lembro-me de que chovia.


Fanfic / Fanfiction Era uma quinta-feira. Lembro-me de que chovia. - Lembro-me de que chovia.

Era uma quinta-feira. Lembro-me de que chovia. O padre, em sua alinhada batina preta, lia um salmo, segurando a bíblia com as duas mãos, ambas trêmulas, pela idade e pela dor.

Agnes foi uma pessoa muito querida por todos. Nosso velho padre, aos 96 anos, havia acompanhado de perto a vida de Agnes do início ao fim.

Num de seus primeiros meses de vida, batizara a pequena Aggie. Havia casado seus pais também. Aquele bebê recém batizado cresceu, e se tornou uma mulher belíssima. Logo encontrou um amor, e decidiu se unir a ele. O padre James, na época ao 73 anos, realizara o casamento.

Logo veio Anthony, um filho muito desejado. Segurei-o no meu colo, enquanto este mesmo padre lhe molhou a cabeça, na tarde de seu batismo.

O padre James não esperava que fosse viver para sepultar Agnes, que aos 48 anos, partia tão repentinamente, pegando a todos nós de surpresa.

Anthony estava inconsolável. Chorava de joelhos na grama molhada. Pobre garoto. O pai falecera durante o primeiro ano de sua vida, e agora perdia também a mãe, arrancada dele de uma forma tão brusca…

Ele era quem estava conduzindo o Austin 1953. Era noite, e também chovia. Eles voltavam do aniversário de uma amiga. Agnes morreu na hora.

Eu o observava de maneira tão absorta, que não parecia haver mais nada nem ninguém ali. Apenas eu, ele, a chuva, e a sepultura aberta no chão.

Depois de inumada Agnes, quando todos já iam embora, eu, por alguma razão, não tinha vontade de sair dali. Continuei parada, de pé sobre os saltos que faziam doer meus calcanhares. A mão acolhedoramente aquecida de Celine segurou a minha, puxando-me gentilmente.

— Mãe, vamos?

— Não… não, vá você, querida. — Disse, antes de virar meu rosto para encará-la. — Vá com sua tia Aretha, amanhã eu te busco. — Beijei-lhe o rosto e repeti: — Vá, meu bem.

Ela retribuiu o beijo e se ausentou correndo, para alcançar minha irmã que já se afastava.

Anthony agora já não chorava mais. Apenas encarava as flores, a pequena lápide de mármore e a terra revolvida. Aproximei-me dele e me agachei sem dizer nada. Segurei sua mão. Ele me abraçou e chorou no meu peito, como uma criança. Por fim, parou. Já não haviam mais lágrimas para verter.

— Meu querido, ela não ia gostar de te ver assim. Vamos, saia da chuva. Vamos embora.

— Não. Eu quero ficar aqui com ela.

— Você não vê que ela não está mais aí? Aonde quer que vá, ela estará com você. Não precisa ficar aqui para estar perto dela. — Me levantei, segurando sua mão e insisti: — Vamos lá, meu garotinho.

Ele se pôs de pé, e caminhamos até o meu carro, lado a lado. Permanecemos em silêncio até chegarmos à minha casa. Lá, lhe ofereci um lanche, mas ele não aceitou. Me perguntou apenas se eu podia acender a lareira, e de pronto o fiz. Então, ele se sentou no tapete, perto do fogo, e ali ficou, por horas, taciturno, num estado de quase catatonia.

À volta dele parecia haver uma barreira tão intransponível que não fui capaz sequer de tentar dirigir-lhe a palavra. As roupas, molhadas pela chuva, secaram no corpo. Mais tarde, ao ver que ele dormia, lhe trouxe uma coberta, e me recolhi também.

O dia amanheceu quente, o Sol de verão brilhava pleno, num céu perfeitamente limpo, e a sensação que pairava no ar, era a de que não havia nada diferente.

Saí do meu quarto usando um peignoir de renda e seda, o cabelo solto e os pés descalços.

Encontrei Anthony de pé na sala, lendo a folha que fora escrita até o meio, ainda presa à minha máquina de escrever.

— Gosta? — Perguntei, ele se assustou.

— Me desculpe. — Cruzei os braços e sorri.

— Não há problema algum. Se escrevo livros, é para serem lidos. Você gosta?

— É muito bom, sim.

— Obrigada.

Um silêncio se seguiu, ele me olhava fixamente. Fiquei sem jeito, pedi licença e fui até a cozinha. Preparei ovos mexidos e café para o desjejum. Comemos juntos em silêncio.

— Me assusta a ideia de ter de voltar para aquela casa vazia. Gostaria de nunca mais ter de pisar lá. — Largou-se no sofá e pôs os pés no assento, ainda com os sapatos.

Em outra situação, eu certamente o repreenderia pela falta de modos, mas dadas as circunstâncias, relevei. Sentei-me no braço do sofá e acendi um cigarro.

— Bem, se você quiser… — Fiz uma pausa, me recostei, lânguida, no encosto do sofá, o cotovelo sobre o mesmo. Apoiei a cabeça na mão e soprei a fumaça em direção ao teto. Recomecei: — Se quiser, pode ficar aqui comigo até se sentir preparado. O que acharia disso?

— Eu iria adorar. — Dei um meio sorriso e fiquei quieta. Ele pôs a mão em meu joelho, e alisou-me a coxa devagarinho. Estranhei, e ele provavelmente percebeu:

— Estava curioso sobre o tecido… — Parou, e tentou explicar-se. — Qual o nome dessa cor?

— Salmão.

— Ah, sim… e o nome do pano?

— É seda.

— Hum...

Não acreditei, mas preferi ignorar o que estava pensando. Ele tocou o tecido novamente, claramente fingia interesse, desta vez na barra da camisola. Tentou me tocar novamente, agora no tornozelo. Curioso sobre o tecido…

Levantei-me e saí da sala, tranquei-me no quarto e lá permaneci até ouvir a buzina do carro de minha irmã.


Notas Finais


Vou brincar de misteriosa e não vou dizer em que época se passa a história. Notem os detalhes e descubram sozinhos <3

Um beijo.


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