História Estranho - Sentimento estranho

✩ Sentimento estranho ✩

-"Vamos Ga Eun, você não pode ficar faltando aula desse jeito! Suas provas vão chegar e você nem mesmo ouviu o professor! O que você vai fazer? Em?"- Reclamava enquanto balançava a menina na cama, mesmo se levantasse agora estaria atrasada, mas não podia continuar pagando os materiais e uniforme pra ela simplesmente não ir pra escola. Quando não tinha dinheiro pra nada direito. 

-"Aish oppa! Me deixa em paz! Eu quero dormir! Preciso ficar bonita pelo menos!"- Falou na sua voz dengosa. Enquanto se cobria com o lençol. Suspirei mordendo o lábio inferior. Eu tinha que suportar, Ga Eun teve uma vida difícil, sem seus pais pra ajudarem ela a ser uma boa menina. Se eu não ajudasse ela, quem faria isso? Baguncei meu cabelo devagar tentando me acalmar pra poder conversar da melhor forma possível. Não podia deixar o destino da minha irmãzinha ser igual o meu, trabalhando naquela loja chata, sem ao menos ter oportunidade de estudar mais. 

-"Ga Eun... Você precisa estudar! Por favor! Eu quero que você seja alguém na sua vida, que tenha coisas boas do jeito que gosta e faça viagens pra vários países. Quero que você seja mais feliz que eu... Por favor?"- Pedi baixinho, quase implorando. Queria atingir alguma coisa nela, nem que fosse a pena. Tudo isso que perdi, tudo isso que fiz, tudo isso tinha um motivo... Certo? O fato de estar agora sem meus pais, sem meus amigos, sem minha vó, sozinho com Ga Eun nessa casa... Sofrendo todos os dias pra sustentar a gente e manter a casa limpa e arrumada. Sem fazer nada por mim... Isso tudo valeria pena no final... Certo? 

-"Oppa... Eu não quero ser mais feliz que você oppa... Conheci um cara... Ele vai se apaixonar por mim de algum jeito ele vai... Cuidar de mim..."- Ela falou se escondendo de baixo do cobertor.

-"Ga Eun... Quero que namore por amor... Não por dinheiro. Ga Eun... O oppa está aqui por você, certo? Certo? Eu posso te ajudar, vamos nos esforçar juntos... Por favor..."- Implorei tirando o lençol dela. A menina com um sorriso fácil e aparência bonita olhou com os olhos tristes que carregava desde criança. Desde que nossos pais morreram. Mesmo quando ela sorria ou estava dizendo coisas alegres, seus olhos sempre foram tristes. 

Levantou a contragosto e se arrumou rapidamente, coloquei seu material na mochila, um lanche e algum dinheiro pra ela sobreviver durante o dia. A garota sempre reclamava que a comida da escola era ruim. Sorri beijando sua testa antes que ela finalmente saísse. Quando a porta fechou e minha menina estava indo pelo caminho certo, pelo menos por hoje, consegui relaxar um pouco. Sentando no sofá meio duro que herdamos de nossa vó. 

Olhei ao redor. Era fácil me deixar levar pelas coisas boas que aconteciam no Block Buster, quando tudo que eu sonhei estava lá. Pessoas que eram livres e sem preocupações, se esforçando naturalmente por sonhos já alcançados. Felizes e plenos. Era muito bom passar um dia longe da verdade da minha vida e longe das coisas que precisava fazer pra ser feliz, já que não nasci do jeito que eles nasceram, mesmo que me sentisse parte, não podia me enganar, não era. Sabia disso tudo, o difícil agora era engolir tudo de bom que vivia naquele lugar, conseguir me contentar com isso e seguir a vida monótona e sem graça de sempre. Como acostumar ao silêncio de novo, quando seus ouvidos ouviram tanto barulho por um dia? Me perguntava. Suspirei.

Me recompus rapidamente colocando um dos meus cantores favoritos pra cantar pra mim. Queria arrumar a casa e começar a procurar um novo trabalho. A loja de conveniência não me dava dinheiro suficiente pra manter Ga Eun feliz. Logo terminei meus afazeres, gastando algumas horas nisso. E fui até a lanhouse do lado de casa, gastando um real por uma hora de pesquisas na Internet. Tinha que fazer valer a pena. Rapidamente preenchia os dados de vagas que cabiam a mim. Anotava telefones e endereços. para poder encontrar um trabalho não mediria esforços. Depois de muitas anotações me dei por satisfeito, poderia sair, mas ainda tinha dez minutos e seria dinheiro gasto a toa, por isso decidi colocar magos do inverno no Google. Nada apareceu, além de algumas fadas mitológicas estranhas. Então pesquisei sobre o Block Buster, as primeiras matérias falavam sobre a experiência das pessoas no circo. Eles pareciam ser bem conhecidos de alguma forma. Tinham até alguns vídeos tremidos que fizeram das apresentações. Mas percebi que eles em momento algum investiram em marketing oficial o que tinha foi feito por pessoas aleatórias. Rolando um pouco a pesquisa percebi que tinha uma matéria com uma grande foto de Zico e Jaehyo se beijando. 

“Os representantes de turma são gays?”

Meus olhos arregalaram em surpresa. Que diabos aquilo significava? O Zico e o Jaehyo eram um casal? Cliquei em cima da matéria curioso, mas um aviso brilhou na tela.

“Tempo de navegação expirado.” 

Suspirei xingando. Porquê logo agora? Levantei pegando meu papel e gritando um "obrigada", por cima do ombro. Saindo da Lanhouse senti o vento frio atingindo-me e bagunçando meu cabelo. Mordi o pirulito que estava comendo e arranquei o cabo com um pouco de força, guardando-o no bolso do meu casaco velho. O que deveria fazer, quando me sentia tão estranho a respeito de tudo na minha vida? Suspirei e dei tapas no meu próprio rosto tentando me recompor. Tinha poucas horas antes de ter que ir pro meu trabalho e tinha que aproveita-las bem para arranjar logo um trabalho novo.

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Fiz o sinal da cruz, pedindo aos céus que dona Mah não estivesse com muita raiva de mim. Encarei a loja de conveniência engolindo em seco. Meus pés doíam de tanto que andei a pé de um lado para o outro. Tinha que enfrenta-la depois de um dia cheio de frustrações por não conseguir em segundo emprego. Empurrei a porta de vidro, fazendo o pequeno sino anunciar minha entrada.

-"Lee Taeil?"- Chamou a senhora assim que escutou o sino soar.

-"Sim?"-Respondi prontamente correndo até a parte de trás da loja, onde ela costumava ficar. 

Tive que escutar um longo sermão e levei uma grande advertência, se me atrasasse ou faltasse de novo estaria demitido. Depois disso a noite correu como sempre, silenciosa e chata. Estava tentando arrumar os pacotes de salgadinhos por data de fabricação quando o sino soou. Virei imediatamente vendo apenas um cabelo roxo arrumado num topete, pois o resto estava escondido pela estante a minha frente. Sorri grande e andei desviando da estante. Era ele mesmo. 

-"O que faz por aqui?"- Perguntei com um pacote de salgadinhos na mão e um sorriso na boca.

-"Vim te ver... Você não foi hoje no circo... Pensei em te acompanhar até em casa."- Falou meio envergonhado. Ele não estava tão solto como ontem, talvez por causa da vergonha? Olhei meu relógio já passava das 11. Realmente precisava ir pra casa.

-"Oh! Claro, vou avisar a dona Mah e já volto!"- Gritei. Meu coração pulava dentro do peito só de ver ele e as preocupações que encheram minha mente o dia inteiro, simplesmente esvaziaram aos poucos por enxergar o seu sorriso. Era como se ele preenchesse minha mente. Um amigo realmente importante.

Avisei a senhora e recebi mais um sermão sobre chegar cedo amanhã. Depois voltei ao encontro de Pyo. Sorrindo grande e olhando pra cima para conseguir enxerga-lo. 

-"Yu Kwon está esperando lá fora..."- Ele falou apontando para a porta, olhei e vi o moço ruivo muito bem encostado numa árvore. Com uma das suas grandes jaquetas de frio e um cigarro entre os dedos longos, cheios de anéis prateados. Nunca me cansava de achar Kwon realmente encantador, mesmo que se vestisse de forma tão gótica. 

-"Ele também veio...?"- Perguntei de forma retorica enquanto observava-o de longe.

-"É que ele queria falar com você... Vamos?"- Pediu sorrindo, concordei fazendo que sim com a cabeça e nós andamos até encontrarmos o ruivo. 

-"Taeilie, tudo bem?"- Disse o ruivo depois de soltar a fumaça do cigarro e apaga-lo no tronco da árvore onde estava encostado.

-"Sim, estou ótimo... O Pyo disse que você queria falar comigo..."- Falei. Sempre fui naturalmente curioso, coisas simples me deixavam num estado completo de curiosidade. 

-"Bem... Sim, É que amanhã é o dia que a primavera começa... E bem... Coisas muito legais acontecem a meia noite. Como eu sei que você gosta de ouvir nossas histórias e saber de coisas interessantes, pensei em te chamar pra dormir no Block Buster hoje e ver com os próprios olhos..."- Convidou sorrindo. Só de imaginar comecei a ficar extremamente agradecido por terem pensado em mim. Realmente odiaria perder algo como isso. 

-"E-Eu realmente posso ir?"- Perguntei juntando as mãos, tinha certeza que meus olhos estavam brilhando. Meu coração batia forte pedindo pra que corresse pro Block Buster e vivesse lá pra sempre. Esquecesse as dificuldades e as pessoas que não se importavam comigo, queria viver uma vida simples e boêmia como a deles. Sorrindo todos os dias e fazendo coisas interessantes. Queria fingir que fazia parte de tudo aquilo, nem que fosse por mais uma noite. 

-"Claro pequeno!"- Pyo disse bagunçando meu cabelo. Olhei pra ele, pelo menos por mais uma noite. Não teria problemas, certo?

-"Vamos?"- Yu Kwon chamou já começando a andar de um jeito elegante na direção do circo e Pyo começou a segui-lo me puxando pela mão. Ele pegava minha mão tão facilmente. Desvencilhei de seu toque e levantei o celular, indicando que faria uma ligação e logo continuaria a andar a seu lado. Ele assentiu positivamente e correu um pouco pra andar ao lado de Yu Kwon. 

-"Ga Eun?"- Falei quando finalmente a garota atendeu o telefone, dava pra escutar o barulho alto da TV do outro lado da linha.

-"Taeil oppa? Onde você está? Traga macarrão quando estiver vindo pra casa!"- Pediu.

-"Escuta, eu vou dormir na casa de uns amigos hoje, tudo bem? Você pode comer kimchi e lámen só por hoje?"- Pedi, rezando mentalmente que aceitasse. 

-"Dormir na casa de amigos? Você não tem amigos oppa!"- A menina gritou do outro lado do telefone e afastei o aparelho do meu ouvido pra não ficar surdo.

-"Claro que tenho amigos Ga Eun!"-Respondi meio alto, fazendo Pyo olhar pra trás. Tive que sorrir pra demonstrar que estava tudo bem.

-"Por acaso vai se encontrar com aquele palhaço de novo? Você deveria me chamar quando encontra eles oppa! Você sabe como eu amo o Block Buster! Isso não é justo!"- Gritou a menina do outro lado da linha telefônica. 

-"Aish Ga Eun... Deixe eu fazer uma coisa por mim, pelo menos uma vez... Ta bom? Voltarei de manhã pra fazer um almoço gostoso e você pode levar pra escola! Não seja mimada! O oppa te ama. Até amanhã!"- Falei rápido com uma voz magoada. Queria tanto aproveitar essa oportunidade, mas a vida continuava me arrastando pra realidade. Esperei sua resposta, mas a garota apenas desligou o telefone na minha cara. Travei o celular guardando-o no bolso novamente. Ela me perdoaria de manhã, certo? Era tão ruim assim querer ter alguns amigos? Senti meu coração apertar. Olhei pra frente, Pyo começou a andar na minha direção. Era melhor explicar que não poderia ir. Que ficaria pra outra hora. Tinha que dizer pra ele. Tinha que dizer que a gente se veria outra hora. 

-"Vamos?"- Sua voz grave e gentil perguntou estendo a mão pra mim. Engoli em seco, olhando sua mão por alguns segundos. Respirei fundo e estendi a minha apertando e começando a andar lado a lado com ele. Quando chegamos perto de Yu Kwon soltei sua mão e nós três andamos juntos enquanto papeávamos.

Só por uma noite, vou me preocupar apenas comigo.

O caminho até o circo chegou num segundo enquanto escutava Pyo falar alegremente sobre o espetáculo de hoje e como as pessoas estavam animadas. Sorri escutando cada palavra que saia da sua boca, era bom que aos poucos ele estava voltando a se sentir confortável comigo apesar da vergonha. Quando chegamos ao Block Buster todos estavam reunidos em volta de uma fogueira enorme comendo marshmallow, como num daqueles filmes americanos. Fui recepcionado por Dragão que começou a cheirar o meu pé e latir na minha direção. Todos me deram boa noite e sentei num dos troncos de madeira ao redor da fogueira. Do meu lado esquerdo estava Pyo e do direito Yu Kwon. O resto dos integrantes do Circo estavam espalhados sentados nos troncos. 

-"Taeilie, Yu Kwon teve a ideia de mostrar a você como é a transição de uma estação pra outra... por isso estamos aqui hoje!"- Falou sorridente Zico, entregando um galho com um marshmallow na ponta. 

-"Mas não pense que ele sente algo por você, ele é apenas gentil demais!"- Gritou Minhyuk que estava do lado de Yu Kwon, todos riram da besteira do loiro. 

-"Não seja ridículo!"- Reclamou Pyo jogando um galho no outro.

-"Ya! Você está louco! Dragão ataque!"- Comandou o loiro já irritado. Era incrível a facilidade que ele tinha em se irritar. Ri junto com todo mundo, aprendi a não ter medo dele, afinal assim como era fácil irrita-lo era fácil acalma-lo.

-"Aish! Já chega disso, vocês sabem que o Kwon tem várias coisas pra explicar hoje pro Taeil e ficam de rixa? Aish! Pyo leve o Taeil até a sua tenda e empreste uma roupa pra ele, depois nós vamos comer. Vão logo, ele deve estar se sentindo sujo com essa roupa que passou o dia no trabalho!"- Yu Kwon falou reclamando com o namorado. Meu rosto ficou meio vermelho ao saber que dormiria no mesmo quarto que Pyo, mas não tinha problema nenhum, certo? Nós somos amigos afinal! 

Andei junto com ele até a tenda. Logo me mostrou um pijama enorme que devia ser dele. A estampa era incrivelmente infantil, cheia de desenhos de animes. Sorri olhando com cuidado. 

-"Esse pijama é antigo! Deve caber em você por que está pequeno em mim!"- Ele explicou parecendo chateado pelo jeito que olhei a estampa.

-"Ah entendi. Eu realmente gosto de Naruto também!"- Sorri. Na verdade quem amava Naruto era Ga Eun, mas o maior não precisava saber disso.

-"Serio? Você é realmente especial Taeil..."- O moço de cabelo roxo falou sorrindo e seus olhos brilhavam um pouco. Meu rosto começou a esquentar por causa das palavras dele e me senti meio intimidado pelo seu olhar. Levantando da cama ficou de frente pra mim, ainda encarando-me. Passou seus dedos pelo meu cabelo com cuidado, deixando uma sensação estranha com seu toque. Fazendo meu coração bater rápido. Seu rosto começou a se aproximar do meu lentamente. Não, isso não pode acontecer. Não pode, não. 

-"Onde é o banheiro? Preciso de um banho e trocar de roupa! Haha! Sabe como é... Passei o dia com essa roupa, deve estar fedendo."- Falei levantando o pijama de um jeito que o impedisse de se aproximar mais. Pyo deu um passo pra trás me olhando confuso e apontou pra uma cabine azul. Segui até lá correndo. Deixando o outro pra trás. Entrei na cabine suspirando e sentindo o sangue juntar no meu rosto. Balancei a cabeça algumas vezes olhando no espelho.

-"Vocês são amigos Lee Taeil! Amigos!"- Falei pra mim mesmo.