História Euforia - Único.

"Há um oásis verde no deserto

A princípio, dentro de mim

Estou tão feliz que não consigospirar

Meu entorno está ficando cada vez mais transparente"

— Vamos, Jungkook. Já estamos atrasados

— dizia Namjoon, enquanto distribuía algumas batidinhas em seus tênis, na tentativa de se livrar da poeira acumulada neles.

Era início de primavera e, consequentemente, as atividades escolares haviam voltado à ativa. As cerejeiras haviam florecido e estavam lotadas de pétalas rosadas, que vez ou outra se soltavam dos galhos das árvores e, arrastadas pela brisa suave que era produzida pelos ventos da estação, dançavam graciosamente no ar. Até mesmo os passarinhos pareciam estar mais animados, entoando seus cânticos por onde passavam. O dia possuía uma atmosfera boa, o céu estava colorido por um azul-celeste muito bonito e enfeitado pelas nuvens branquinhas, que mais se pareciam com enormes chumaços de algodão, desfazendo-se aos poucos, enquanto se moviam na imensidão do firmamento.

Não era apenas coincidência o fato da primavera carregar o título de "estação do amor". Esse era o destino dela, uma vez que, quando chegava, as coisas pareciam se tornar mais apaixonantes do que eram durante as outras três estações.

— Já estou indo — disse o mais novo, enquanto terminava de amarrar os cadarços dos tênis surrados.

— Você demora demais. — O rosto do Kim contorceu-se em uma pequena careta de desgosto, enquanto reclamava da enrolação de seu dongsaeng.

Jungkook apenas mostrou a língua para o melhor amigo e levantou-se do chão, onde estava sentado, arrumando a mochila nas costas e sorrindo logo em seguida, ao receber um soquinho em seu ombro esquerdo. Os dois garotos então iniciaram sua caminhada até o ponto de ônibus, entre risadas, empurrões e conversas descontraídas. Vez ou outra, o mais novo acabava perdendo sua linha de raciocínio quando parava para apreciar as adoráveis covinhas de seu hyung, o que rendia risos envergonhados ao Namjoon e mais empurrões no ombro do Jeon.

Ambos os meninos possuíam um laço de amizade muito intenso, visto que haviam se conhecido quando ainda frequentavam o jardim de infância e, desde então, não se separaram mais. Entretanto, com o passar dos anos, o apreço que sentiam um pelo outro tornou-se algo mais intenso que antes. Havia uma certa necessidade de sentir um ao outro com toques singelos, de escutar as vozes, de sentir que estavam próximos, mesmo quando não podiam estar juntos fisicamente. Os corações pulsavam mais rápido com qualquer mínima ação vinda de um deles. Era inevitável sentirem-se aquecidos pelo sentimento resultante da sementinha de amor que germinara entre eles.

— Eu disse que iríamos nos atrasar. — Namjoon cruzou os braços em chateação, enquanto observava o ônibus amarelo virar em uma esquina relativamente distante de onde estavam.

Jungkook sentou-se na calçada e se pôs a massagear o tornozelo dolorido, pois havia dado um mau jeito na articulação quando o mais velho o puxara pela camisa, obrigando-o a correr atrás do transporte escolar pela rua. Resmungou algumas palavras que o amigo não conseguiu entender, enquanto buscava amenizar a dor que sentia naquela região de seu corpo. Pelo menos não havia torcido o tornozelo como no verão do ano passado, onde seu hyung o fizera tropeçar no meio do pequeno parque do bairro onde moravam, enquanto corriam um atrás do outro sem finalidade alguma, apenas porque estavam no tédio e queriam fazer algo. Aquele havia sido um belo momento, presenciado por meia dúzia de idosos e algumas crianças fofoqueiras, que certamente contaram sobre a cena para os amiguinhos.

Namjoon sentiu-se mal ao ver que o amigo tinha se machucado durante o trajeto, não podia evitar ser protetor com seu saeng, que sempre lhe parecia tão pequeno e indefeso. Ele arrumou sua mochila na parte da frente de seu corpo e fez sinal para que o Jeon subisse em suas costas, iria carregá-lo daquele jeito até a escola se preciso fosse, porque não queria que a situação de seu tornozelo piorasse. Jungkook não era bobo, sabia que o melhor amigo jamais o levaria nas costas sob outras circunstâncias, então logo abraçou o pescoço do maior por trás e teve seu corpo retirado do chão. Sentiu o perfume doce do mais velho lhe invadir as narinas e, inconscientemente, aproximou o rosto do pescoço dele. O Kim sentiu-se arrepiar quando a respiração do amigo entrou em contato com sua pele, contudo, tentou ignorar aquilo ao máximo e retomou seus passos em direção à instituição de ensino onde estudavam.

Jungkook descansou sua cabeça no ombro esquerdo de Namjoon e fechou os olhos, apreciando aquele momento. Sentia-se imensamente feliz de estar ali, dividindo-o com o melhor amigo, por mais que as circunstâncias não fossem tão boas. Secretamente, desejava ficar ali para sempre, abraçado ao seu hyung. Estar apaixonado por ele lhe causava este tipo de efeito.

"Mesmo se o fundo do oceano arenoso se dividir em dois
Mesmo se alguém sacudir este mundo
Nunca solte minha mão
Por favor, não acorde desse sonho"

— Eu te disse para não ficar fazendo graça, enquanto segurava o sorvete. — Namjoon relembrava de suas palavras, as quais dissera momentos antes da bola com sabor de baunilha escapar do cone de casquinha, que Jungkook tinha em mãos, e atingir o gramado.

A primavera já estava acabando, a "estação do amor" logo daria adeus e abriria espaço para o verão. As nuvens já não preenchiam mais o céu como antes e os dias já estavam mais quentes, anunciando que a partida da época das flores se encontrava muito próxima. Ambos os garotos estavam no parque que, dentre todos os outros lugares disponíveis, era o favorito deles. Encontravam-se sentados na grama, aproveitando o frescor da sombra de uma Aroeira.

— Aqui. Fique com o meu. — O Kim ofereceu seu sorvete de chocolate para o amigo, logo depois de soltar um suspiro cansado. Ele não tinha dinheiro para comprar outro, porque gastara toda a sua mesada em jogos da Steam e créditos para o seu celular, que não duraram tanto, porque logo Jungkook "queimou-os", roteando a internet do aparelho para poder assistir vídeos no YouTube e jogar Pokémon Go.

Namjoon possuía o costume de sempre dividir tudo o que tinha com seu dongsaeng, sem nunca esperar receber algo em troca. Não se importava com aquilo, apenas gostava de fazer seu amigo feliz.

Jungkook, por sua vez, aceitou de bom grado o que lhe estava sendo oferecido, mas depois pensou melhor sobre tudo aquilo e decidiu que a situação não estava sendo justa para seu melhor amigo.

— Isso não está certo — disse o mais novo, ganhando um olhar confuso de seu hyung. — Assim você vai ficar sem nada. Nós deveríamos dividir — concluiu, por fim.

Namjoon sorriu com a preocupação do garoto e passou sua mão sobre o cabelo castanho-escuro, bagunçando-os. Achava adorável a maneira como o Jeon se preocupava com ele, mesmo que aqueles momentos fossem um tanto quanto raros de se acontecer. O Kim apertou as bochechas de seu dongsaeng, tendo cuidado para não machucá-lo e riu da careta de desgosto que se formara no rosto do menino.

— Pare com isso! — reclamou o menor, enquanto tentava se livrar das mãos que ainda o apertavam. Não gostava nem um pouco quando as pessoas faziam aquele tipo de coisa consigo.

— Eu não quero o sorvete, não se preocupe — declarou o Kim, enfim deixando o amigo em paz e com as bochechas avermelhadas pela pressão que seus dedos aplicaram naquela região.

— É claro que quer.

Jungkook empurrou o sorvete no rosto de Namjoon, que tentava se esquivar daquele doce a todo custo.

— Não, não quero.

— Sim, você quer!

— Não quero, não.

— Quer sim! — indagou o menor, conseguindo melar com a massa doce e gelada não só os lábios do amigo, como também metade de seu rosto.

O garoto riu da maneira como as bochechas de Namjoon ficaram tomadas pela cor marrom do sorvete e os pequeninos pedaços de chocolate que compunham o doce, era engraçado ver seu hyung todo sujo daquela maneira. Entretanto, o Kim também não deixou "barata" aquela situação, puxou para si a camiseta branca, a qual seu dongsaeng estava vestido, e utilizou-a para limpar o rosto em meio às reclamações do Jeon, que se debatia, tentando escapar.

Mais tarde, quando toda a confusão já havia se encerrado e nenhum dos dois estava mais chateado com o outro, os meninos se deitaram sob a sombra da Aroeira, passando a observar as poucas nuvens que ainda enfeitavam o céu. O Jeon olhava para os formatos engraçados que lhe faziam lembrar de certas figuras, quando sentiu o melhor amigo segurar sua mão. Virou a cabeça para encará-lo e, ao encontrá-lo sorrindo, foi inevitável repetir o ato e cutucar as covinhas das quais tanto gostava, fazendo com que o sorriso do mais velho ocupasse um espaço ainda maior entre seus lábios finos e vermelhinhos.

Jungkook fechou os olhos quando viu Namjoon se aproximar de si; e o coração palpitou em seu peito quando sentiu o beijo carinhoso que o garoto deixara em sua testa, provocando-lhe um sentimento de felicidade plena. Quando voltou a abrir os olhos e encontrou as orbes escuras de seu hyung, Jungkook abriu um sorriso doce, como sempre fazia ao olhar para o amigo.

Jeon não precisava de muito para ser feliz, apenas bastava que o Kim estivesse com ele, mesmo que não se falassem ou que não fizessem nada. Não eram necessárias palavras para aqueles dois, porque certamente nenhuma delas jamais seria capaz de expressar, com perfeição, os sentimentos implícitos em cada olhar, gesto ou sorriso trocados entre eles. 

"Pegue minhas mãos agora
Você é a causa da minha euforia
Quando estou com você eu estou em utopia"