1. Spirit Fanfics >
  2. Cidade dos anjos >
  3. Rituais

História Cidade dos anjos - Rituais


Escrita por: Meliorismo

Notas do Autor


PAZ

Capítulo 8 - Rituais


A roupa que Sehun usava fora uma das poucas coisas que Chanyeol não tivera o prazer de apontar uma arma pra alguém e sair sem pagar nada. Havia comprado, passado na lavanderia, engomado e tudo o mais. Com as medidas que tirou na fita métrica que achou embaixo do banco do carro, arranjou a calça perfeita. Preta, de corte reto, lhe caiu bem.

Como se alguma coisa não caísse bem em Sehun.

O ajudou a vestir a camisa branca e sem nenhuma dobra inconveniente. Alisou o tecido para que ele encontrasse o seu lugar e colocou as pontas pra dentro da calça antes de pôr o cinto. Sehun não dizia uma palavra sequer, e aquilo havia se tornado um ritual antes mesmo que um dos dois notasse. Calçou os sapatos.

Chanyeol levou a máquina de barbear e aparou os cabelos que já se espetavam para todos os lados, o ajudou a se barbear. Sehun estava apresentável, depois de um mês saindo de madrugada e andando até onde ele não começava a chorar. Os pés de Chanyeol doíam, mas ele não ligava.

Um dia, o levou até o aeroporto de carro.

Sehun estava bagunçado e vermelho, estava calor. O carro de Chanyeol era vermelho, e tinha cheiro de aromatizante de morango, mas como a capota estava aberta, não era nada que os fizesse vomitar ou coisa do tipo. Um avião estava subindo, e Sehun se sentiu estranhamente ansioso.

“Você consegue entrar lá?”

“Não sei, não quero.” Respondeu, simplista. Chanyeol deu de ombros e manobrou o carro.

“Ok, vamos tomar uma coca.”

Sehun sabia o que aquilo significava. As cocas que Chanyeol comprava, sempre eram batizadas, e tinham mais gosto de vodka do que qualquer outra coisa. Ele bebia metade de uma garrafa de três litros, e começava a chorar antes de querer transar feito um louco. E depois, o silêncio. Antigamente, era agradável quando som nenhum perturbava a paz de ambos. Hoje, era desesperador.

Estavam dentro do carro, já que uma chuva havia começado do nada, daquelas violentas e sem sentido. Sehun estava com um pouco de medo de um raio os atingir, quando Chanyeol encostou o carro em um lugar meio afastado de tudo e entornou o restante da garrafa. Uma música triste tocava no rádio, e Sehun sentiu vontade de desligá-lo.

Ele era tão bonito. Chanyeol não sabia se eram seus olhos, o que diabos tinha nele, mas Sehun era uma daquelas coisas que você quer ficar observando pra sempre. Ele estava meio encolhido no banco do carona, com uma camisa escrito waifus são melhores que namoradas, e Chanyeol se lembrou que a primeira vez que sentiu vontade de beijá-lo, foi quando dera aquela camisa. Ele gargalhou tanto que começou a ficar sem ar, e foi uma cena engraçada, até que ele se apoiou em Chanyeol e seus rostos estavam tão perto, mas era como se não fosse nada de mais.

Pra Chanyeol era.

Começou a chorar.

"Chanyeol-ah." Sehun nuca sabia o que fazer naqueles casos. Chanyeol apenas alcançou sua mão e a apertou tão forte que ele sentiu como se fosse quebrar em mil pedaços.

"Quanto é a sua herança?"

"Eu não sei.  Quando estiver morando na minha casa com trinta dias completos, o contador vai fazer tudo e me passar."

"Seja quanto for, Sehun." A voz dele era grave, então estava tremendo. Sehun não lhe negou um abraço quando ele sentou em cima do freio de mão.  "Eu pago em dobro se você ficar."

"Mas eu nem sei de quanto estamos falando. "

"Eu disse que não importa. " Chanyeol levantou parte da camisa e limpou o rosto. Sehun parecia preocupado quando as testas deles se chocaram devagar, e as respirações acabaram se misturando. "Nem que eu precise roubar um banco todo dia, não importa. Só... Fica. "

Sehun não era um completo insensível. É claro que aquilo o machucava, Chanyeol que sempre fora tão sorridente e bobo, tentando tirar sua camisa enquanto chorava a ponto de soluçar. O beijou com força, arranhando sua nuca, e ele conseguiu sentir o salgado leve das lágrimas com álcool.

Não sabia dizer bem quando ficou completamente nu dentro do carro abafado e o som insuportável da chuva se chocando contra o vidro.

Chanyeol não era nada amável ou delicado, mesmo com aquela devoção de escorria pelos seus olhos. Sehun sabia que ia ficar cheio de marcas, mas tudo bem. Quando ele voltou para o banco do motorista, já vestindo a camisa folgada demais, socou o volante com força e gritou. Mesmo que entendesse que Sehun nada dizia por um respeito aos seus sentimentos, era sufocante a ponto de querer morrer.

“Eu disse que ia voltar, Chanyeol.”

“Não, você não vai. Eu sei que não vai. E não adianta mais nada, nem eu voltaria, porra! E agora, eu vou ser obrigado a lembrar de você todo dia, Sehun. Você nunca, nunca mesmo vai saber o que é isso, porque você nunca vai amar ninguém. Ninguém nunca vai amar você como eu tô te amando agora mesmo.”

Sehun não disse mais nada.

A panela de macarrão fez um estrondo na pia quando ela virou. Chanyeol estava sorrindo, mas o clima entre eles não estava bom desde o dia da chuva, era de um peso esmagador. A roupa de Sehun já não estava tão engomada e seus cabelos tão arrumados, já que a velha entrara em surto, passando suas mãos em  todos os lugares do neto que podia alcançar. Tinham quase certeza de que  os vizinhos também a ouviam chorar.

Ele explicou quando Chanyeol os deu algum espaço que precisava ir. Que havia arrumado o quarto, e tudo estava em seu devido lugar. Que a amava, e iria lhe ajudar no que fosse preciso antes de buscá-la, coisa de um mês ou dois. Ela segurou forte nas mãos pálidas e prometeu que ia esperar, para logo depois desviar o olhar para a porta, onde Chanyeol estava.

“Quem é ele, querido?”

Sehun não soube responder.

“Ele é aquele garoto ruim, não é? Quando nos mudamos, ele vinha aqui todos os dias, mas parou do nada, achei que ele tivesse desistido de você.”

“Não, vovó. Ele não desistiu.”

 

 

Kyungsoo observava fixamente aquela escova de dentes no seu banheiro, e não sabia direito o que sentir, mas basicamente, era como se tivessem invadido a sua casa. Aquela era mais uma das coisas que Yifan deve ter deixado pela metade, para que Kyungsoo entendesse como bem quisesse, mesmo que ele tenha dito que era apenas aquela noite. Não tinha o direito de julgá-lo por um simples ato, não depois do que viveram horas atrás.

 Yifan o amou. E aquilo fora tão diferente e assustador que Kyungsoo mal sabia onde pôr as mãos quando Yifan perguntou onde ele gostava de ser tocado. Ninguém nunca fizera aquilo consigo, contando que suas experiências sexuais se resumiam a um Jongin bêbado e frio.

“Eu não sou uma adolescente virgem, Yifan.” Seus cabelos estavam esparramados na fronha com motivos de guerra nas estrelas, e ele estava nu e meio duro. Não conseguia olhar aquele homem tão grande e gentil entre suas pernas, lhe encarando com uma devoção absurda.

“Você está tão desacostumado com gentilezas, que não sabe como reagir às coisas, Soo.” E ele falou sorrindo, com suas gengivas salientes escapando dos lábios. “Eu vou beijar e tocar você até descobrir.”

E o fez.

E fora intenso, visceral. Kyungsoo se deu conta de que nunca havia feito amor, quando as lágrimas que escorriam sem que ele pudesse controlar, não eram de dor. Yifan segurou sua mão forte enquanto tomavam uma ducha morna, e depois deixou que Kyungsoo se ajeitasse na cama como bem quisesse, para depois abraçá-lo.

“Yifan?”

“Hm?”

“Por que eu?”

“Porque nada, nada no mundo consegue ser melhor que você.”

Kyungsoo crispou os lábios, e fechou os olhos com força antes de virar e ficar de frente com Yifan na cama. Tirando o dia em que todo aquele furacão se instalou ali, ele parecia estranhamente inabalável, num verdadeiro paraíso terreno, e Kyungsoo tinha quase certeza de que era por sua causa.

“Existem muitas coisas no mundo melhores do que eu.”

“Mas nada que me interesse de verdade.” Yifan remexeu no cabelo molhado dele, com sua mão enorme e pálida. “Deveria ter secado o cabelo, quando levantar, vai ser bem mais difícil arrumar.”

“Eu te amo.” E depois de seis encontros, uma quase transa, uma transa, quatro maços de cigarros divididos, uma amizade indo pelo buraco e algumas músicas fazendo mais sentido do que faziam antigamente, Kyungsoo chegou àquela conclusão, e ela parecia mais certa do que todas as outras que tivera em vida. Yifan estava meio estático, mas antes de beijá-lo outra vez, disse que o amava também, e era inexplicavelmente bom falar o que sentia e não receber o silêncio como resposta.

Quando Kyungsoo decidiu que era melhor dormir, já que precisava acordar cedo pra abrir o cybercafé e preparar alguma coisa para cantar no bar a noite, ouviu batidas na porta, três, exatamente. Jongin adorava ímpares. Kyungsoo fingiu não ouvir, mas Yifan já estava de pé, vestindo a camisa jogada no criado-mudo.

Antigamente, aquilo se tornara tão rotineiro que o porteiro nem sequer avisava quando ele estava subindo, já que Jongin não ligava muito pra horários e etiqueta. Ele aparecia quando sentia vontade, e hoje não seria diferente.

“Deveria ter ligado antes.” Yifan disse, assim que abriu a porta e se deparou com o olhar assustado de Jongin.

“Yifan, deixa eu resolver isso.” Kyungsoo apareceu, vestindo as roupas amassadas ainda. Yifan nada disse, apenas voltou para o quarto e se trancou. Mesmo que Kyungsoo o tenha convidado para entrar, Jongin não o fez.

“Eu sou um problema agora. Você só vai me resolver aqui.”

“Você sentiu minha falta? Ninguém quis transar contigo nesse tempo?”

Jongin estava naquele casaco.

“Desculpa.”

“Eu não estou com raiva de você, Jongin, só... Não apareça tão tarde.” Jongin respirou fundo e entrou, sentando no sofá enquanto Kyungsoo foi até a cozinha, tentar reaquecer resto de café da cafeteira.  Logo ele estava de volta, com a caneca favorita de Jongin fumegando, enquanto tomava uma lata de coca. Kyungsoo odiava café, mas ele estava sempre feito para o caso de Jongin resolver aparecer do nada. “Aconteceu alguma coisa?”

“Eu só senti sua falta, pra caralho.”

“Também senti a sua.” O espaço entre eles se tornou curto demais quando Jongin afastou no sofá. Kyungsoo não tentou impedi-lo quando ele lhe beijou com gosto de café amargo. Esperou aquilo passar para lhe abraçar forte e deixar o silêncio perdurar até Jongin dormir apoiado em si. Ele estava bêbado, e Kyungsoo sujo. Yifan estava no quarto, e ele ali, tentando levantar sem acordá-lo, em vão.

“Fica aqui até amanhecer?”

 

“É melhor você ir agora.”  Sehun não sabia se aquele era o jeito de Chanyeol lidar com as coisas, ou o que mais fosse, mas era incômodo saber que todo aquele rancor era apenas seu, então esticou o corpo todo para abraçá-lo forte, e mesmo que não esperasse resposta, Chanyeol  retribuiu. “Você vai mesmo voltar, não é?”

“ Vou, eu vou voltar.”

“Vamos tirar as malas.” Chanyeol desfez o abraço e pulou para o banco traseiro, tirando uma das malas enquanto Sehun tirava a outra. Quando estavam de frente um pro outro de novo, Sehun viu que Chanyeol estava de rosto inchado, e resolveu pensar que a culpa não era sua.

Chanyeol o beijou.

E todas de repente os olhavam, murmuravam e até gritavam, mas aquilo fizera Sehun enfim chorar. Chanyeol tocou seu rosto devagar e sussurrou um até logo, e Sehun entrou no aeroporto, arrastando suas malas num carrinho de alumínio. Quando olhou para fora, ele estava parado lá, no mesmo lugar, não havia se mexido nem um centímetro. Haviam tantas, tantas pessoas ali. Tantas que sentia suas mãos suando frio. Um segurança notando que ele não estava bem, se aproximou e ofereceu ajuda, o levando até o check in. Chanyeol havia cuidado de tudo, e aquilo lhe deixava ainda mais nervoso. O passaporte era falso, e ele mesmo havia hackeado o site de passagens e se encaixado ali.

“Está se sentindo bem, senhor?”

“Sim, eu só nunca viajei antes.”

“Fique calmo, por favor, está tudo bem.”

Então Sehun ouviu alguém gritar. E de repente, Chanyeol estava correndo pelo aeroporto, com um par de seguranças atrás dele. Quando o olhar deles se encontrou por um milagre, ele correu até lá, estava suado e tremendo, mas mesmo assim, sorria.

“Eu só precisava dizer que te amo, Sehun. Eu te amo muito.”

Então os seguranças o alcançaram, e com todo aquele teatro o jogaram no chão. Chanyeol nem choramingou, não era como se não estivesse acostumado com aquela violência. Pediram desculpas para Sehun, enquanto as pessoas falavam dele por todo o aeroporto. Chanyeol foi deixado ao lado do seu carro com o rosto um pouco arranhado, e sem saber se havia feito a coisa certa em deixá-lo mesmo ir. 

 


Notas Finais




Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...