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História Fantasmas do Passado - Visitas


Escrita por: anasanti10

Notas do Autor


Começam os problemas...

Capítulo 3 - Visitas


O serviço do jantar já estava acabando quando um garçom entrou da cozinha indicando que Paola tinha uma visita. Ela olhou no relógio, confusa, pois Fogaça não costumava passar para buscá-la tão cedo; ela achou que ele demoraria mais uma meia hora. O último horário de jantar no Sal era meia hora antes do Arturito, de forma que, por volta das 22h, Fogaça deixava o restaurante e chegava para encontrar Paola quando ela estava atendendo as últimas mesas, e os dois voltavam juntos para casa. A única chance dele estar ali era ter deixado as últimas mesas para serem atendidas apenas por seus cozinheiros, o que era improvável, ou o restaurante ter esvaziado antes da hora de fechar, o que era mais improvável ainda. 

    Enquanto ela lavava levemente as mãos para receber quem quer que fosse, viu que era uma figura feminina que se aproximava. A moça estava vestida de forma impecável, como se estivesse indo para uma reunião da empresa, e Paola não tinha muitos amigos que se vestiam desse jeito. Demorou para reconhecê-la, mas, quando a loira chegou mais perto, um sorriso brotou em seu rosto.

    - Angie! - Ela cumprimentou, sorridente. Angelica havia sido sua cozinheira no Rubayat, a única que falava espanhol, por ser de família argentina. A moça havia passado as primeiras semanas do restaurante gritando traduções do espanhol para o português para que Paola pudesse se comunicar com sua equipe, além de traduzir cardápios, reclamações e elogios dos clientes e, sobretudo, ter sido a primeira pessoa no Brasil com quem Paola teve a real capacidade de conversar. Depois, havia seguido a argentina para o Julia Cocina, onde trabalhou por mais algum tempo, até, inesperadamente, resolver largar a profissão. 

    - Chef Paola! - A moça respondeu, se aproximando de sua ex chef e a abraçando. Paola riu ao se ver sem jeito no abraço, com medo de amarrotar as roupas tão perfeitamente passadas de Angie. 

    - Quem te via com aquele avental cheio de pingos de molho não imaginaria te ver nesse alinhamento todo, hein, mulher? - Ela brincou, se afastando da loira, mas ainda segurando seus braços. Ela tinha enorme prazer em encontrar ex cozinheiros seus e saber por onde andavam, mesmo se não fosse mais dentro de cozinhas. 

    - Nossa, nem me fale. Minhas unhas agora conseguem manter um esmalte por uma semana inteira e o único cheiro que sai do meu cabelo é o de shampoo de morango - Ela sorriu, mostrando dentes incrivelmente brancos. Paola imaginou se ela teria pagado uma fortuna em um clareamento ou abdicado completamente do café, duas opções que pareciam horríveis. 

    - Imagino. E por onde você anda? - Encaminhou a moça até uma das mesas do restaurante, imaginando que era o mínimo que a educação a mandava fazer. Não costumava dedicar mais do que alguns minutos do seu tempo no restaurante fora da cozinha, mas sentia que o terno tão bonito de Angie ficaria impregnado de cheiro de comida se elas permanecessem onde estavam, e a menina podia ter um infarte por isso. Paola não queria ser a culpada. 

    - Eu sou advogada, agora - Ela respondeu, enquanto as duas se sentavam e Paola fazia sinal para que um dos seus garçons trouxesse alguma coisa para a mesa. Logo uma cesta de pães foi colocada no meio das duas. 

    - Sí, puedo ver que estás muito glamurosa - Paola sorriu, fingindo uma explosão com as mãos para ilustrar sua fala. Angie parecia orgulhosa da nova profissão, enquanto alisava de novo e de novo a saia de linho que vestia e se certificava de que nenhum fio de seu cabelo estava arrepiado. 

    - Muito mais glamurosa do que eu era trabalhando em cozinhas, sem dúvidas. 

    - Fico feliz que você está feliz - Paola continuou sorrindo enquanto se servia de pedaços de pão, reparando que a mulher à sua frente nem ao menos os encarava. - Parou de comer também, além de cozinhar? 

    - Oh, não - Angie riu, levantando as mãos em rendição, como que se defendendo. - É que não posso engordar, os ternos são muito justos e mostram qualquer gordura a mais. 

    - Ah… - Respondeu Paola, a expressão de tédio e ironia claramente visível para Angie, que resolveu mudar de assunto. 

    - Eu moro em São Paulo de novo, agora. Arrumei um emprego aqui. 

    - Ah, que ótimo! - Comemorou Paola, com sinceridade dessa vez. Ela gostava de ter amigos por perto, para compensar a família que estava em outro país. - Eu também estou aqui de vez. Não penso mais em voltar para a Argentina, como naquela época. 

    - Sim, eu vi que está morando junto com o chef Fogaça. Admito que tenho inveja de você, Paola, ele é um deus

    - Como você sabe? - Paola surpreendeu a menina com o tom de voz, pois o ciúme estava claro. Ela sabia que não tinha a menor necessidade, mas não gostou nem um pouco de ter o namorado elogiado dessa forma. 

    - Vocês dois são famosos, com esse programa de televisão. Está em todos os lugares. Aliás, nunca achei que você fosse aceitar participar de um reality show sensacionalista desses. Fiquei surpresa. - Angie sorria, mas Paola se incomodava cada vez mais com seu tom, além de se sentir alfinetada com aquela afirmação.  

    - Também não imaginava que você fosse largar a cozinha por unhas e ternos, depois de tanto proclamar seu amor pela carreira. - Ela alfinetou de volta, mas com sua classe de sempre que não deixava transparecer a menor falta de classe. 

    - É, bom, senti que eu tinha mais aptidão para tribunais. Estou feliz - Ela admitiu, fazendo Paola se sentir mal por a ter julgado. Afinal, cada um deveria fazer o que quisesse com sua vida, ela sempre defendia. 

    - Isso é ótimo. Mesmo - Paola sorriu, tentando se redimir. Pareceu funcionar; Angie sorriu de volta de forma calorosa. Poucos minutos depois, a moça anunciou que tinha de se ir para casa terminar de rever alguns processos. Paola sentiu um calafrio só de pensar que seu trabalho poderia ser cuidar dos problemas de outras pessoas além dos dela mesmo. 

    - Aqui está o meu cartão. Me ligue qualquer dia desses que você sentir vontade de conversar em espanhol - A moça brincou, esticando para Paola um pequeno retângulo de papel plastificado, com um pomposo logo de escritório da ponta direita e o nome dela escrito em alto relevo de forma central, com um telefone embaixo.

    - Eu agora tenho uma faladora de espanhol pessoal em casa - Ela sorriu, aceitando o cartão com uma mão e, com a outra, esticando o celular para mostrar a foto de Francesca. Angie comentou o quanto a loirinha era adorável, coisa que Paola já sabia, e se retirou do restaurante com passos rápidos, seus saltos fazendo barulho quando batiam no chão de madeira do salão. As pessoas são realmente muito diferentes umas das outras, Paola pensou consigo mesma. 

 

    De volta à cozinha, Paola espiou o relógio e descobriu que Fogaça poderia chegar a qualquer momento. Ela esfregou as mãos, ansiosa para vê-lo. Tinha passado o dia inteiro pensando na proposta que havia recebido, mas pensara mais ainda na expressão de felicidade do namorado quando ela contara que não aceitaria. Ela nunca imaginou que encontraria o amor romântico de forma tão verdadeira e recíproca, e se sentia tão sortuda que seria impossível querer mudar qualquer detalhe. 

    O mesmo garçom entrou na cozinha, anunciando que havia um homem esperando por ela no estacionamento. Paola sorriu e esticou-se por cima da bancada para pegar suas coisas, tirando o avental ao mesmo tempo. A pressa a fez se enrolar, e seus cozinheiros riram de sua falta de jeito. Gostavam de vê-la tão feliz. Vendo que o garçom ainda estava lá, ela o olhou de forma inquisidora, como se perguntasse se não havia mais nenhuma mesa para ele atender no salão. O jovem, que não devia ter mais do que vinte anos, tinha a expressão um pouco curiosa.

    - Você não acha suspeito? - Ele perguntou, gaguejando um pouco, pois não costumava se direcionar à Paola sem ter algo específico para anunciar. 

    - Suspeito o Fogaça me esperar no estacionamento? É só o que acontece todos los días - Ela riu, já pendurando seu avental e se despedindo de todos com acenos de mão. O garçom tentou alertá-la de que não se trava de Fogaça, mas ela já estava do lado de fora. 

    Paola saiu do restaurante pela porta de trás, como de costume, tendo que dar a volta no restaurante para chegar ao vallet com o qual ela tinha convênio. Caminhou para dentro do local escuro e com cheiro de gasolina com um sorriso no rosto, apertando o casaco contra si enquanto andava. Pretendia abraçar Fogaça por baixo de sua jaqueta de couro, como fazia quando estava com frio, e se aproveitar daquele estilo motoqueiro que ele fazia, pelo menos em dias de frio. 

    Como o local era muito mal iluminado, ela só percebeu que se tratava de outra pessoa quando já estava a apenas alguns metros do homem. Paola começou a achar tudo muito esquisito quando percebeu que ele não usava sua jaqueta usual, e sim um terno. Poucas vezes na vida ela vira o namorado de terno, e imaginou qual seria a ocasião. Teve certeza de que não se tratava de Fogaça, no entanto, quando viu que o homem possuía densos fios de cabelo cor de caramelo acima da cabeça. Ela não teve muito tempo de ponderar quem seria. Ele se virou para ela, sorrindo da forma presunçosa como fazia desde que ela o conhecera, meia dúzia de anos antes. O sorriso que ela mais odiava na vida, e que graças a Deus não tinha sido passado para Francesca. 

    - Hola, Paolita - Ele cumprimentou, dando passos a frente para cumprimentá-la. O sorriso de Paola já tinha morrido há algum tempo, e agora seu sangue encontrava-se congelado nas veias. Ela deu passos atrás, instantaneamente, querendo evitar qualquer tipo de toque. Não o via há mais de três anos, e teria dado tudo para continuar daquele jeito. 

    - O que você quer comigo? - Ela perguntou, fechando mais ainda o casaco em volta de si mesma, na defensiva. 

    - Esqueceu como se fala espanhol? - Ele tirou sarro, recolocando as mãos nos bolsos da calça quando Paola se recusou a cumprimentá-lo. 

    - Não quero ter mais nada a ver com você. Nem a língua. 

    - Oh, mas você tem uma coisa muito importante que tem a ver comigo - Ele respondeu, e Paola desejou com todas as forças que ele não mencionasse sua filha. Mas ele o fez. - Uma menininha que tem o meu cabelo. 

    - A Francesca é minha, só minha. Você nunca foi nada para ela. - Paola já sentia sua voz embargar de mágoa e raiva. Tudo o que ela queria era sair correndo dali e nunca mais ver aquele homem na sua frente. 

    - Não é o que justiça diz. - O homem estava agora apoiado em um dos carros, o pé repousado sobre os faróis, e um cigarro aceso na boca. Ele fazia questão de soltar a fumaça na cara dela, sabendo o quanto ela detestava a substância. 

    - Está me ameaçando? 

    - De forma alguma. Veja, acho que nós começamos a nossa reaproximação da maneira errada. - Ele jogou o cigarro, que tinha acabado de começar, no chão e pisou em cima dele. - Até abro mão de fumar aqui porque sei que você não gosta. 

    - Não tem reaproximação nenhuma. Você me diz o que quer e vai embora, é simples así

    - Aí está o espanhol - Ele piscou, sorrindo, mas não conseguiu arrancar dela nenhuma simpatia. - Eu quero me aproximar da minha filha. 

    - Você o que? - Paola deu ainda mais um passo atrás, sentindo seu coração batendo a mil por hora. Suas mãos suavam frio, e ela não sabia se queria sumir dali ou avançar no homem à sua frente. 

    - Eu vim morar em São Paulo permanentemente, e quero recuperar o tempo perdido com a minha família. 

    - Nós não somos uma família. Eu e Francesca somos uma família. Você não é ninguém. - Ela cuspia as palavras, com tamanha raiva que não sentia há tempos. 

    - Certo. Me expressei mal. Mas quero ser uma família; se não com você, pelo menos com Francesca. Eu tenho esse direito. 

    - Você não tem direito a nada! - Ela explodiu, jogando os braços para o alto e fazendo com que o homem à sua frente levantasse as próprias mãos em sinal de rendição, como reflexo de defesa. - Você me largou sozinha com um bebê num país que não era o meu e onde eu não tinha ninguém. Ainda acha que está em condições de exigir qualquer cosa

    - Paola, eu sei que não fui justo com você - A voz dele era calma e aveludada, como se estivesse falando sobre o chá de domingo, e não sobre o momento mais difícil da vida de Paola que ele próprio havia causado.  - E você não precisa me perdoar. Mas também não é justo que jogue essa mágoa na Francesca e a impeça de ter um pai. 

    - Não fui eu quem impediu a Francesca de ter um pai - Ela quase sussurrou, a voz agora mais amarga do que raivosa. Como ousava aquele homem, que tanto a havia causado problemas, chegar exigindo agora seu direito de conviver com a criança que ela havia criado? E o pior; como ele ousava que seus argumentos fizessem sentido? Será mesmo que impedir que ele visse a menina era egoísmo da parte dela? 

    - Céus, você quer tudo do jeito mais difícil - Ele reclamou, recebendo apenas o olhar severo da outra como resposta. - Eu errei, Paola. Errei e por causa disso minha filha não teve um pai por quatro anos. Mas agora estou aqui e quero que ela tenha um pai a partir de agora. Ela pode ter um pai a partir de agora. Só depende de você. 

    Paola encarou o ex namorado por longos minutos antes de responder. Ela estava consciente das lágrimas que começavam a escorrer por suas bochechas, e se odiou por demonstrar fraqueza. Todos os seus instintos a diziam para mandar aquele homem se danar, mas o que ele falava fazia sentido. Ela não podia impedir que Francesca tivesse a experiência de um pai, experiência que ela mesma não tivera, por uma mágoa própria. Sim, ele falhara com a filha também, mas o perdão de Francesca era algo que a menina mesma tinha que decidir se daria ou não. Paola não poderia recusá-lo por ela. 

    - Vai ter um almoço de família no meu apartamento no sábado - Ela começou, o nó na garganta quase a impedindo de continuar falando. Estava convidando para sua própria casa a pessoa que mais havia lhe causado problemas na vida. E sabia que não tinha outra escolha. Sua frustração poderia ser ouvida da China. - Vou deixar o endereço com a recepcionista do meu restaurante, você passa lá e pega. 

    - Certo. Obrigado - Ele deu um passo em direção à ela, que se afastou instantaneamente. 

    - A nossa relação já acabou há muitos anos, e não tem mais volta. Eu só estou deixando você encontrar a minha filha porque a relação de vocês dois é decisão dela. Mas entre eu e você não cabe mais nada. E eu não quero escutar de você até sábado. 

    Paola viu que ele pensou em protestar, mas desistiu. Ao invés disso, acenou com a cabeça e se retirou, dando a volta em seu corpo inerte e deixando-a sozinha no estacionamento. As lágrimas desciam agora uma atrás da outra, gelando sua bochecha e fazendo com que seus olhos ardessem. A argentina não soube quanto tempo ficou parada lá, encarando o nada e tentando fazer com que seus olhos parassem de produzir água. Provavelmente mais de meia hora. Ela só saiu de seu transe quando ouviu passos atrás de si e, imaginando que ele pudesse ter voltado, se virou bruscamente, assustada. Estivera tentando parar de chorar, mas os soluços vieram com tudo quando viu que era Fogaça que se aproximava. 

    Chorando tanto de alívio quanto de desabafo, colocando para fora tudo o que havia segurado durante a conversa, Paola se jogou nos braços do namorado, finalmente escorregando as mãos para dentro da jaqueta de couro dele e encaixando sua cabeça no conhecido vão entre o pescoço tatuado e rosto do homem. Enquanto ele envolvia suas costas com firmeza, ela puxou com o nariz o máximo do cheiro dele que conseguiu, tentando se sentir segura. 

    - O que aconteceu? - Ele perguntou, preocupado, tentando afastá-la para poder olhá-la nos olhos, mas Paola não deixou, estreitando ainda mais os braços ao redor dele e enterrando o rosto em seu peitoral. Já sentia a camisa do homem molhada de suas lágrimas quando respondeu, a voz abafada pelo tecido e embargada de choro. 

    - O pai da Francesca. O pai da Francesca voltou.


Notas Finais


A vida não é perfeita, né? Nada é perfeito, só a Paola mesmo kk. Me digam se estão gostando! beijoss


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