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História Fast. It Takes a Long Time. - O fim do inverno.


Escrita por: TIBMatt

Notas do Autor


Agradeço ao apoio de todos até então, o final se aproxima cada vez mais e me pergunto se conseguirei concluir o que propus. Espero que tenham a paciência para me acompanhar até o final.
Deixo também o recado de que é ótimo ler aos comentários deixados, então não se esqueça de comentar o que achou, seja uma crítica negativa ou não.

Capítulo 6 - O fim do inverno.


Fanfic / Fanfiction Fast. It Takes a Long Time. - O fim do inverno.

Eu nunca sei muito bem onde está minha mente, se ela está em uma realidade desejada ou em sã consciência. Na verdade, naquele mesmo momento, eu também não tinha a mínima ideia de qual dos dois era o verdadeiro cenário.

A boca de Butters Stotch estava quente, muito quente, e de repente senti que já era verão, não inverno. Meu corpo fervia como costuma fazer nas tardes de junho. Por um milésimo de segundos desejei me despir ali mesmo, tanto para receber contra meu corpo o ar gelado de inverno como também para fazer outras coisas com Stotch. Mas minha mente já estava nublada, e em instantes não conseguia pensar em mais nada.

Imagino que finalmente tenha descoberto o que é perder a noção de tempo, eu não sei quantos segundos foram, mas foi excelente.

Sua língua roçava contra a minha, e o seu corpo também. Os dedos dele eram gelados porque deixou de usar as luvas para comer os salgadinhos, eles seguravam meu rosto contra o seu e eram o único sinal de que aquilo era real, a minha mente estava sã.

Isso é real, pensei, é real mesmo. Era estão real que eu não soube como reagir, os fogos explodiam e eram barulhentos demais, os corpos de outras pessoas se chocavam com os nossos e era movimentado demais, todos poderiam estar nos olhando e era pressão demais, o beijo era sensacional e... prazeroso demais. Havia excesso em tudo ao redor.

Eu o desejei, quis o beijar de volta, mas as nossos lábios já não estavam entrelaçados, ele tinha voltado à praia, me deixou sozinho no mar.

Quando olhei ao redor minha visão estava turva, mas nenhum olhar parecia direcionado a nós dois, não somos o centro do universo.

Os lábios que antes me beijavam agora sorriam e gritavam eufóricos junto à multidão. O início daquele ano foi, sem dúvidas, o mais estranho até então.






Ao acordar no chão na primeira manhã do ano minhas costas doíam, por um momento agradeci Cartman por não ter levado as bebidas, tenho total consciência de que minha mente estaria quebrada em pedaços por conta de uma ressaca caso houvesse bebido álcool. Havíamos dormido na casa do Cartman, cinco garotos amontoados entre colchões e cobertas. Karen estava dormindo junto à Sra. Cartman, e eu tinha total certeza de que as costas dela estariam bem melhores do que as minhas quando acordasse.

Olhei ao redor e tudo o que conseguia ver eram lençóis e roupas jogadas para todos os lados. Stan e Kyle dormiam em um amontoado de roupas — sujas, arrisco dizer — enquanto Cartman usufruía de sua cama, Butters dormia em seus pés, parecia muito pequeno daquela forma.

Estava quente quando me desfiz das cobertas, o aquecedor da casa de Cartman parecia ser o suficiente para não nos deixar com hipotermia. Na verdade, tudo na casa de Cartman parecia o suficiente. Não haviam rachaduras em suas paredes, e nenhum vento gelado entrava para nos incomodar. O seu teto também era livre de defeitos, tudo em sua vida parecia ser. Às vezes, eu odeio Eric Cartman.

Quando me levantei fiz um grande esforço para não pisar no lixo ao chão, havíamos terminado a festa ali mesmo. Saí do quarto; saí do reino de Eric Cartman; saí de uma disputa não tão unilateral sobre quem tem mais glória, não adiantaria lutar, ele venceria.

Meu estômago fazia sons esquisitos, talvez ele estivesse tão mal quanto o meu cérebro aparentava.

Tudo parecia meio mal, deslocado ou insuficiênte. Minha entranhas e intestino ainda não conseguiam lidar muito bem com toda aquela merda que havia comido na noite anterior; parte de minha mente ainda só pensava nos lábios quentes de Butters; eu sentia que poderia morrer por não ter um cigarro entre os lábios.

Por um irônico e ridículo contraste, a cozinha dos Cartman é incrível. Há várias caixas de ceral e um amontoado de frutas à espera de serem devoradas, eles também possuem uma torradeira. Uma torradeira. Há torradas quentes e cheias de geleia pelas manhãs. Às vezes eu odeio Eric Cartman. Caralho, e como odeio.

Eu estava esperando o café ficar pronto na cafeteira — porra, eles têm até isso —, sem a fútil preocupação de quão invasivo e mal educado eu poderiam estar sendo.

Brincava com pequenas bananas sobre a mesa, como uma criança que consegue ver beleza em frutas, ou qualquer coisa que não seja tão morto ao ponto de ser preto. Acabei deixando uma banana cair por conta do susto que levei quando Stanley adentrou na cozinha e abriu a geladeira, pegando o leite e o cereal no armário.

Não sei muito bem se devo comentar a variedade de ceral dos Cartman ou o quanto meu coração batia aceleradamente por conta do susto:

— Bom dia. — Foram as primeiras palavras a saírem de sua boca, e sei que não foram sinceras, o humor em seu tom de voz era terrível.

— Bom dia, vai querer café? — Enfim peguei a pequena banana no chão. Ela ainda não era preta, era atrativa.

— Você colocou vodca nesse café? — Ele perguntou enquanto colocava o ceral na tigela. Pos mais do que poderia caber, ao ponto de transbordar quando ele adicionou o leite.

— Não?! — Me perdi na distração de ver a bagunça feita à mesa.

— Então do que adianta o café?

Stan foi em frente, se deliciou daquilo que deixou transbordar segundos atrás.

A cafeteira anunciou o fim do preparo e entregou um café agradável, naquela manhã voltei a comer as torradas com geleia que não comia há séculos:

— Feliz ano novo, né? — Stan se pronunciou enquanto eu fazia a degustação da geleia.

— Pois é. — Quando o olhei, ele não parecia muito entusiasmado com a conversa.

Stan Marsh nunca faz questão de começar conversas em situações tensas e desagradáveis — ainda que esta não fosse uma, a surpresa tomou parte de meu cérebro — outra parte ainda pensava em Butters —, me fazendo ter uma expressão estranha no rosto:

— Vocês estão saindo? — Naquele momento a geleia ganhou um gosto totalmente diferente.

Vocês? — E o café pareceu um pouco estranho.

— Você e o Butters. — Ata.

Não estamos. — Okay?

— Vocês não estavam... Você sabe, — Pude sentir a vergonha que sua voz emitia. — se beijando ontem à noite?

— Você viu? — Alguém iria ver.

— Eu ficaria surpreso se tivesse sido o único. De qualquer forma, eu apenas estava curioso sobre isso.

Fiquei em silêncio por alguns segundos, o que pareceu uma resposta simples demais, ridícula demais. Eu não queria dar uma resposta à Stan, porque de fato não parecia necessário, mas acho que precisei responder em alto e bom som para mim mesmo:

— Não estamos saindo.

Foram palavras fáceis de serem ditas, de verdade, mas de repente elas pareceram ridículas demais. Stan tão pouco se importou, ainda comia o ceral enquanto emanava o desejo de que apenas álcool poderia fazer sua mente voltar a rodar no momento. Álcool, e talvez outras coisas:

— E você e o Kyle? — Foi somente então que Stan pareceu dar um descanso para seu café da manhã, me olhou como se eu fosse um estrangeiro que pouco conhecimento tem da língua inguesa e nunca sabe muito bem pedir um táxi sem ajuda. Eu não sabia sobre quem estava caçoando quem. — Estão saindo?

Ele levou com certo tempo para responder, e antes de dizer qualquer coisa, provou mais uma colher de seu cereal:

— Somos melhores amigos. — Seu rosto estava cético, mas levemente ruborizado.

— Claro que são. — Então voltei a tragar o café.

Conversamos mais um pouco, sobre qualquer tipo coisa. Até que a Sra. Cartman foi até a cozinha e se juntou a nós.

Parte de minha mente já não estava preocupada se havia um cigarro entre meu lábios, apenas se fazia perguntas bobas — todas sobre Butters Stotch — que não valem serem ditas.

Ele tinha fudido com tudo, não em um sentido ruim, mas agora a minha mente apenas não parava, apenas porque não falamos nada sobre aquilo na noite anterior.

Eu apenas queria saber se ele de fato me achava alguém maduro, não escuro, alguém atrativo. Foi a primeira vez que eu me preocupei se era semelhante à uma banana ou não.




Saí da casa dos Cartman antes de Karen ou Butters acordarem, o relógio já marcava nove horas e eles continuavam a usufruir dos lençóis bem lavados da Sra. Cartman. Às vezes haviam pequenas manchas de geleia ou chocolate, resultados diretos das nossas noites madrugadas assistindo aos filmes ruins de diretores péssimos, mas sempre tinham cheiro de lavanda.

Precisava da minha carteira, e mesmo que eu não tivesse encontrado ontem, valia a procura.

Quando cheguei em casa percebi que aquela ainda era a minha casa, de nada se difundia do que era no dia anterior, ainda tinham as coisas que odeio; o mesmo cheiro; a mesma bagunça contida por Butters; as mesmas rachaduras; os mesmo buracos; novos buracos; o mesmo carpete fudido; o mesmo barulho emitido pelo aquecedor. Era tudo igual, completamente detestável.

De meu estômago ao cérebro subiu o arrependimento, a culpa e a angústia de ter levado Karen para aquele buraco. Eu gostaria de estar com ela sempre, odiava a ideia de que os Tucker a conheçam mais do que eu, mas eu odeio muito mais a ideia de que ela fique naquele fim de mundo.

Minha casa jamais seria semelhante à uma banana atrativa.

Minha busca por um um conjunto de coro falso e acabado — também conhecido como minha carteira — começou e levou algum tempo, não estava nem mesmo no buraco escroto que Kevin havia deixado no sofá.

São só vinte dólares, pensei, vinte dólares, cacete. Mas eram vinte dólares que eu sei que precisaria.

Procurava pelos vasos rachados quando ouvi uma voz grunhindo atrás de mim:

— Aí... — Um gemido esquisito de dor.

Quando olhei para trás vi ela, da mesma forma que sempre está, acabada. Massageava sua mão contra o braço, havia batido na cômoda, era impossível não notar a sua nítida embriaguez.

Ela sorriu pra mim como costumava fazer quando eu era mais novo, quando ele gritava comigo ou com Karen, sorria por culpa e o puro sentimento de incapacidade. Algumas vezes parece que ela sorri desta forma o tempo todo, uma constante culpa por uma constante insatisfação que ela me deixou.

Eu a odeio de diferentes formas e sei que nenhuma delas é uma forma saudável.

Se existem aqueles que dirão que uma mãe jamais poderia odiar o seu filho, existirão aqueles que dirão que um filho jamais poderia odiar sua mãe, mas eu a quero tão, tão longe:

— Oi... — Sua voz era tão baixa, parecia que ela tinha medo de mim. A ideia de que minha própria mãe me tema, por mais podre que seja, é prazerosa. Deus, eu sou tão nojento. — Você acordou tarde hoje. Onde está o seu amigo?

— Ele já saiu. — Minha garganta pareceu mais seca. De certo modo, eu também a temia.

— Nem sequer o vi.

— É, ele some sem avisar... — Continuei a dar atenção aos vasos, estavam tão rachados quanto a casa, tão exaustos quanto eu estava daquela conversa.

— Está procurando alguma coisa? — Ela continuava lá, droga.

— Não.

— O que é?

— Não é nada.

A brincadeira de ignorar continuou, não havia porque olha-lá. E, ainda que eu pensasse assim, ela parecia discordar por completo. Eu conseguia sentir seus olhos contra as minhas costas, o seu cheiro de cigarro barato e bebida velha adentravam em minhas narinas e chegavam ao meu pulmão, eu quis vomitar e terminar de arruinar o que era aquele lugar:

Kenny. — Ela sussurrou com uma voz doce, talvez a mais doce que já tenha saído daqueles lábios rachados. Ignorei. — Hey, Kenny...

Novamente.

Talvez ela tenha medo de mim, mesmo que seja minúsculo e irrelevante, mas eu a temo muito. Era muito pesado estar ali, sentia como se ela enfim fosse pegar em minha mão e me levar até o abismo que adorava.

Evitei olhar, de verdade, juro que evitei. Contra o vaso à frente me prendi, o segurei com toda a força para ter certeza que ela não me tiraria dali de forma alguma, mas ela enfim me tocou.

Suas mãos rachadas e velhas deslizavam contra minha jaqueta, a aliança revestida por ouro falso e que sequer chegaria a custar 30 dólares, jamais jogada ao lixo ou deixada de lado, produzia um som incômodo quando roçada contra a jaqueta.

Congelei, da mesma forma que um saco de ervilhas:

— Eu achei isso na sua calça...

Soltei o vaso por um impulso, virando para ela. Estava em sua mão, a carteira. A carteira. Em sua mão. Em sua mão estava a minha carteira. A porra da minha carteira. Poderia ter sofrido uma overdose de emoções ali mesmo, deixado transbordar por minha boca xingamentos e espuma, como ocorre quando cachorros sofrem de raiva.

Rapidamente peguei ela de sua mão, quando drogada, ela sequer possui reflexo:

— Por que você pegou? — Estava tão furioso, e ela transbordava tanta calma.

Ela se tornou melancólica demais com o tempo. Talvez ele fosse a única coisa que não a fizesse se sentir entorpecida, e já que ele se foi, ela vive nessa bolha cheira de alucinógenos.

Ao menos custava manter essa bolha longe de mim? Caralho!

Repeti, enfim:

— Por que você a pegou? Estava na minha calça, não estava?

— Estava na sua calça.

— E aonde a minha calça estava? — Caralho.

— No chão. — Caralho.

Caralho.

Caralho.

Caralho.

Enfiei a mão no bolso, bem fundo, senti que o rasguei e lamentei por Butters pois sabia que ele seria aquele que costurária.

Larguei o vaso, a minha consciência e o medo ali. Corri para fora de casa o mais rápido possível. São só vinte dólares, pensei, vinte dólares. Mas foram os vinte dólares que quase me sufocaram até a morte.

Fora de casa, exposto ao vento congelante do Colorado, meu corpo fervia. Eu poderia ter um choque térmico.

Rapidamente retirei a caixa de cigarros do bolso de meu casaco, acompanhado pelo esqueiro. Levei segundos que pareceram uma eternidade até enfim conseguir acender o cigarro, e puxei uma tragada o mais rápido possível.

Calma.

O meu cérebro se enchia de nicotina novamente.

Está tudo bem.

O pulmão era revestido pela fumaça.

Está tudo bem agora.

A fumaça se esvaía pelas narinas e a boca.

É só ter calma.

E desaparecia dançante ao vento.

Não precisa entrar em pânico.

Era prazeroso.

Ela não está aqui.

Era bonito.

Ele não está aqui.

Era podre.

Você consegue.

Tudo era podre.

Não tem nada a temer.

Principalmente eu.

Você é corajoso.

Um hipócrita.

Vai superar.

Um hipócrita que odeia a mãe fumante.

E ser alguém melhor.

Mas que ao final do dia enxerta nicotina no próprio cérebro e fumaça no próprio pulmão.

Você será alguém melhor.


Contra a neve branca joguei o cigarro que a manchou, agora a neve pura dividia espaço com as cinzas que representam maus presságios. Kenny McCormick, aquele que estragou tudo, até mesmo a marca do inverno.

Kenny McCormick, a pior de todas as bananas.








O primeiro dia do ano. A primeira segunda-feira do ano. O primeiro dia de trabalho do ano.

Tudo estava como deveria estar, as pessoas trabalhavam como costumam trabalhar.

Do caixa pude atender perturbados, doentes, adolescente pedantes por camisinhas — framboesa era o sabor favorito —, idosos, todo o tipo de gente que entra uma farmácia.

Minha mente latejava por conta do estresse e eu devo ter pego umas três cartelas de calmante, um dia, talvez, eu pagasse por elas, mas eu apenas não o faria hoje.

Desejei estar no lago, sentado à neve do velho tronco de árvore, apreciando ao vazio preenchido pela neve que espantou aos patos, peixes e as flores. Eu desejei respirar.

Talvez minha vida seja isso, uma constante busca por oxigênio, o oxigênio que me foi tirado sem eu sequer perceber e que agora faz falta de mais, traz efeitos colaterais insuportáveis.

Estava pronto para enfiar goela abaixo mais um calmante — eles pareciam não funcionar —, quando meu celular vibrou. Era o Butters. Ah. O Butters. Graças à Deus. Butters. Era ele. Era ele, oh céus.

Olhei ao redor, a farmácia estava vazia. Me agachei abaixo do caixa. Ele ainda existia, e de forma ridícula eu costumava esquecer isso algumas vezes. Eu me senti respirar, meus pulmões enfim estavam preenchidos por algo que não fosse tóxico.

Manteiga: Você abandonou Karen e eu >:(

Meu estômago revirou e um sorriso preencheu meu rosto. Voltei a lembrar de tudo o que aconteceu ontem e senti minhas bochechas queimarem, deveriam estar torradas como biscoitos mal feitos.

Morto-vivo: Acordei tarde e precisava trabalhar :/. Pode levar ela para a casa dos Tucker por mim? :3

Meu rosto ainda fervia quando sua resposta chegou.

Manteiga: Não, você virá conosco. Vamos te buscar no trabalho hoje ;)

Morto-vivo: Obrigado

Manteiga: Até >√<

Morto-vivo: Até.

Eu ainda estava estressado, mas a outra parte de meu cérebro estava bem.

Eu não sei muito bem porque Butters Stotch tem a tendência de me acalmar, e quão menos sei porque minhas bochechas ganharam a mania de ficar coradas. Nunca ocorria antes — não na presença dele. Beijar Butters sempre foi uma ideia, e só ideia, nunca veio ao lado efêmero da vida, e agora que aconteceu meu corpo não sabe reagir a isso.

Desejar e ter — ainda que eu não o tenha — são coisas completamente distintas, aprender a lidar com as duas podem ser uma novidade à alguém como eu que apenas almejou durante boa parte da vida.

Não o amo, e sei que ele não me ama. Mas ao menos quero tê-lo, e queria que ele tivesse a mim já que não tem mais ninguém.

Ao final das cinco o céu já estava escuro e não nos oferecia apenas algumas estrelas, o principal drama do inverno é que o dia começa tarde demais e termina muito cedo.

Butters e Karen estavam sentados na calçada enfrente a farmácia, sentados sobre a neve que eu não direi porque não era o meu turno. Contavam os carros enquanto riam de coisas que não me incluíam, deveriam ter passado o dia juntos e aquilo não me assustava. Temia que Karen ficasse com qualquer um que não tivesse o sobrenome Tucker ou não fosse Butters Stotch.

Quando saí não pude decidir entre ficar com vergonha por Butters ou retribuir o abraço recebido de Karen, fiz os dois, porque é isso que deveríamos fazer em momentos de indecisão, provar todas as opções:

— Você está gelada. —Anunciei enquanto apertava suas bochechas avermelhadas e congeladas.

— É porque estamos te esperando há uns vinte minutos. — Karen fazia caretas engraçadas, impossível não rir. — Trouxemos café para você.

— Com bastante açúcar. — Butters acrescentou. Seu rosto também estava avermelhado, mas nunca soube dizer se era pela temperatura ou pelos mesmos motivos que eu.

— Meu favorito. — Sorri. Eram as melhores pessoas que eu conhecia.

Encarar Butters era vergonhoso demais, então boa parte da viagem foi o meu foco na conversa descontraída com Karen, ele parecia apenas escutar enquanto, ao mesmo tempo, estava submerso em seus próprios pensamentos e ideias. Me perguntei se eu fazia parte delas, se me beijar foi uma ideia tão velha quanto a minha.

Karen falava sobre como os biscoitos da Sra. Tucker eram deliciosos e o quanto eu deveria prová-los, dizia que no natal ela recebeu um estojo de maquiagem do Craig — o que foi a maior surpresa da noite e a coisa mais engraçada que eu já havia ouvido sobre Craig Tucker. Trícia era uma ótima companheira de quarto e o Sr. Tucker parecia engraçado toda vez que pedia para que Tweek e Craig deixassem a porta do quarto aberta. Ela parecia satisfeita e eu também estava, em partes.

Quando chegamos na casa dos Tucker Karen me deu um longo abraço, e eu retribuí. A Sra. Tucker nos olhou como se aquilo fosse a coisa mais linda do mundo, com o mesmo olhar de pais que vêem seus filhos falar ou andar pela mesma vez. Ao final do abraço, sussurrou em meu ouvido:

— Eu sei que você não tomou banho hoje, mas tome quando chegar em casa.

Aquilo foi esquisito, engraçado e perturbador. Butters e eu nos despedimos de Karen e da Sra. Tucker, seu sorriso era sempre amigável e reconfortante.

Quando a porta dos Tucker se fechou entrei em pânico quase instantaneamente, agora éramos nós, e somente nós. Conversamos por mensagem, nada além disso, não sabia como começar uma conversa com ele única e especificamente porque era ele.

Já beijei muitas pessoas antes, de várias formas e em diversas situações, mas essa era simplesmente inusitada demais. Eu já estava perdido em meu próprio mundo de desespero e incerteza quando ele iniciou a conversa:

— Deveríamos passar mais tempo com a Karen, ela é divertida. — Ele parecia sincero.

— Você me beijou ontem. — Mas apenas queria o cortar.

— Ah, pois é... — Seu tom de voz abaixou dramaticamente, com todo o esforço que consegui para olhar ao lado pude notar que suas bochechas agora estavam ainda mais ruborizadas. — Eu beijei.

— Foi... Inusitado. — Kenny McCormick e o baixo senso do ridículo que não percebe o quão idiota é usar inusitado em uma conversa. Senti Butters Stotch encolhendo contra sim enquanto mergulhava no seu poço de vergonha. — Não quer dizer que foi ruim!

Entrei em pânico:

— Porque não foi!

Completo pânico:

— Na verdade, foi bom!

Sem qualquer sensação de sanidade:

— Bom até demais, eu...

Tá legal! — Pronunciou, com uma voz aguda. Ele era semelhante à uma framboesa, fofo demais. — Eu já entendi...

Isso era idiota, tosco, vergonhoso e completamente semelhante à uma comédia romântica adolescente ruim e clichê, o ápice dessa cena seria um dos dois fazendo um convite ao baile de formatura:

— Desculpa, — Retomei. — eu apenas sinto que precisamos falar sobre isso.

— Eu gosto de você. — Respondeu, rapidamente. — Isso não quer dizer que eu queira que você seja meu namorado nem nada do tipo, mas se é sobre isso que você quer conversar, então saiba que eu gosto de você... E eu gosto muito.

Fiquei sem fôlego e até mesmo palavras por alguns segundos, quando enfim consegui forças para dizer algo, quase sussurrei:

— Desde quando?

— Eu não sei... Mas eu já pensei em te beijar um milhão de vezes, bem antes de morarmos juntos! — Enfim senti que ele estava tão excitado quanto eu.

Sorri, sorri mesmo, para o mundo e para mim mesmo, porque eu o entendia e compartilhava a mesma situação:

— Você pensava, é? — Disse enquanto ria. Meu rosto ainda ardia em chamas, mas agora era melhor.

— É, um pouco... — Um milhão de vezes.

Bateu suas expectativas? Gostou? Eu também queria te beijar. Acho que deveríamos nos pegar mais um pouco. Você tem uma cintura expendida.

Eram muitas perguntas e nenhum consenso sobre qual fazer:

— Eu também gosto de você. — Então não perguntei, afirmei. — Penso em beijar você há uns dois anos. Talvez não seja proporcional ao período em que passei a gostar de você, mas acho que também já tive milhares desses pensamentos.

Ambos ficamos em um silêncio cheio de constrangimento e que também transbordava sentimentos estranho e dúvidas pertinentes. O que ele gosta em mim? Por que gosta de mim? Se fossemos namorar adotariamos um gato ou cachorro? Perguntas pertinentes, de fato:

— Isso não é um perdido de namoro, né? — Butters questionou enquanto abaixava a cabeça e chutava à neve.

— Eu... Não sei muito bem. — Senti que precisava acrescentar alguma coisa antes de cair em meus próprios medos ou deixá-lo afundar nos dele. — Já somos quase isso.

Ele riu, e depois olhou para mim. Seus olhos estavam vivos, vivos de verdade, nada semelhante ou comparado com o que tem sido há meses:

— O quê? — Então eu também ri.

— Quero dizer, nós dormimos na mesma cama... Você faz o meu café.

— Você vai me buscar no meu trabalho, e compra os sabonetes de lavanda. — Acrescentou.

— Você até mesmo usa as minhas roupas. — Ambos estávamos rindo.

— Eu gosto quando você compra o leite, mesmo que deixemos ele estragar porque mal o bebemos. — Pronunciou com uma voz suave, sinto que ele estava tão feliz quanto eu.

— E eu gosto de como você sempre sorri no fim do expediente, mesmo estando exausto.

— Adoro como você xinga o Cartman.

— Amo como você é atencioso em relação aos outros, e como os seus biscoitos são melhores do que os da Sra. Tucker.

— Eles são? — Ele ria desesperadamente.

— Eu não faço ideia, nunca os provei. — E eu também.

Precisamos de algum tempo para enfim conter as risadas, e quando percebemos já havia começado a nevar novamente. Butters pegou minha mão, podia sentir o calor que suas luvas transmitiam. Ele olhava para o chão, com as bochechas mais vermelhas do que acreditei que fosse possível:

— Eu gosto de você, Kenny. — Meu coração parou.

— Eu também gosto de você, Butters. — Eu de fato era uma banana atrativa.


Notas Finais


A ideia era que os capítulos do final da estação fossem mais curtos, mas este se comparou à média comum. Vale dizer que o inverno estadunidense só acaba por volta de fevereiro.
Depois de tudo, o inverno costuma representar a melancolia e tristeza, suponho que o queremos longe (menos eu, porque o inverno e o clima gélido são a minha paixão. Extinção ao verão.)
Não esqueça de deixar seu comentário. ~ 🍁


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