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História Flor do deserto - Mau julgamento


Escrita por: MrsSociopath

Notas do Autor


Boa leitura pra vcs. Espero que estejam gostando.

Capítulo 7 - Mau julgamento


Emanuelle estava sentada numa cadeira perto do balcão. Molly, numa atitude de compaixão, foi buscar um copo d’água para a doutora. Suas mãos tremiam e lágrimas caiam de seus olhos descontroladamente. Ainda com a voz trêmula, se dirigiu ao Holmes e falou:

— Você invadiu minha casa.

— E você estava mentindo para todo mundo durante todo esse tempo.

— Você não entende.

— Acho que entendo perfeitamente o que temos aqui - disse enquanto caminhava em direção à doutora- você nasceu no Egito, filha de uma brasileira e um egípcio, tem dupla nacionalidade. Foi criada dentro da doutrina do islamismo. Quando atingiu a menarca foi anunciada pelo seu pai no jornal para atrair pretendentes interessados em casar com você. Mas, pouco tempo depois, você desapareceu, aproveitou o conflito que estava acontecendo na Síria naquela época, para fugir como refugiada para o Brasil. Foi criada lá, mudou de nome, fez faculdade de medicina, e passou na prova de especialização aqui na Inglaterra, então veio para cá - nesse momento, Holmes estava de frente para ela, e continuou seu discurso lentamente, como se cada palavra pudesse ferir a jovem- a questão é: o que você veio fazer aqui? simplesmente se especializar ou também se unir ao seus irmãos islâmicos? -dito isso Emanuelle levantou a cabeça para olhar raivosamente para Sherlock que estava a poucos centímetros dela, e continuou seu discurso- eu não ficaria surpreso se, de repente, uma refugiada estivesse de complô com as “células adormecidas” em território britânico, para atrapalhar as investig...

Holmes mal terminou a frase quando Emanuelle levantou da cadeira de súbito e, de forma certeira, deu um forte tapa na cara do Holmes mais novo, que cambaleou uns dois passos para trás, levando a mão ao lado do rosto atingido. Todos assistiam à cena boquiabertos. Então, Emanuelle se aproximou de Holmes até ficar a poucos centímetros dele, e com a voz firme, embora alterada pelo choro, disse num tom em que todos ali puderam ouvir:

— Está certo em tudo senhor Holmes, menos em uma coisa: nunca tive, não tenho e nunca terei a intenção de me juntar à um bando de malucos radicais. Só quero começar de novo a minha vida. Não que seja algo que você, nascido num berço de ouro, vá entender - então a doutora se virou e falou para os outros três que estavam ali- sim, menti para vocês, mas foi necessário...vivi muito tempo no inferno, quando tive a chance de escapar de lá, me agarrei a essa oportunidade sem olhar para trás; e fiz de tudo, desde então, para não ser descoberta, enterrar meu passado. Mas, pelo visto, meus esforços não foram suficientes -ela olhou para Holmes nesse momento, que olhava para o chão, ainda com a mão no rosto.

Um silêncio pairou no ar nos minutos que se seguiram, quando foi a própria Emanuelle que o quebrou:

— Quero que esses malucos sejam detidos tanto quanto vocês. Como eu devo ser a única que vocês conheçam que fala árabe, por motivos óbvios; podem falar comigo se precisarem de ajuda -olhou para o relógio, e continuou- preciso ir embora agora. Também espero que o que vocês souberam sobre mim, fique nessa sala- falou em tom triste.

Tendo dito isso, pegou os seus papéis da mão de Holmes, sem nem sequer olhar para ele. Se despediu deles,e quando ia sair, parou na porta e disse para Watson: “Senhor Watson, soube que sua esposa está se recuperando bem. Eu lembro que lhe dei meu telefone mais cedo, então o que precisar pode falar comigo”,  e então saiu.

***

Essa manhã,  perto do meio dia, uma bomba caseira explodiu no terceiro andar de um shopping center, no centro de Londres. Até agora o número oficial de vítimas não foi divulgado, mas fontes não oficiais indicam mais de 40.

Quem assumiu a autoria do ataque foi o chamado grupo terrorista :Hukm Allah. O governo britânico está tomando providências para erradicar as ações do grupo…”

A televisão estava ligada na rede de noticiário, e era a única iluminação daquela sala. O ambiente era escuro, tinha um leve cheiro de mofo e as cortinas estavam fechadas, deixando passar apenas discretos raios de sol daquele final de dia. Haviam poucos móveis naquele lugar, dentre os quais uma televisão antiga, algumas cadeiras, uma mesa onde uma série de fiações e alguns recipientes com pólvora estavam espalhados. No canto da sala, no chão, haviam sacos empilhados de várias substâncias químicas, dentre as quais Nitrito, Sulfato e Amônia. De frente para a TV havia um homem sentado. Suas feições eram rígidas, o corpo era atlético, envolto num suéter surrado e calças jeans. Seus olhos escuros contemplavam o que estava passando no noticiário, enquanto brincava com seu soco inglês na mão esquerda. Ele olhava para aquilo que estava sendo apresentado como se fosse uma obra de arte, algo digno de ser louvado. “Posso ser considerado um artista,-pensou- Allah me deu esse dom”.

O homem foi interrompido dos seus pensamentos por um telefone que tocou no cômodo ao lado daquele que estava, vinha da cozinha. O outro ocupante mais jovem daquele velho conjunto habitacional na periferia de Londres atendeu o telefone. Algumas palavras foram trocadas e o telefone foi desligado. O jovem saiu da cozinha e falou em árabe com aquele que estava sentado na cadeira:

— Senhor, o Said está morto.

— Para onde ele foi levado?-perguntou o homem, sem tirar os olhos da TV

— Mandaram levá-lo para o St Barts. Uma médica o atendeu, mas ele morreu antes que pudesse dizer qualquer coisa.

— Ela o atendeu ainda vivo?

— Sim, mas não durou muito, morreu logo. Não temos com o que nos preocupar.

— “Não temos com o que nos preocupar”- repetiu vagarosamente o que o jovem disse, se levantando, e caminhou em direção à ele.

— Ninguém vai saber que estamos envolvidos nisso -disse o jovem- vai parecer um crime comum.

— E quanto aos documentos dele? Acharam alguma coisa?

— Nosso contato não achou nada no apartamento, nem no notebook dele. Parece que ele transferiu todos os arquivos para um Pen Drive, ou algo do tipo.

O homem estava frente a frente com o mais jovem. Ao ouvir seu último argumento, remexeu os lábios em um tique nervoso, e em seguida acertou um gancho de esquerda no estômago do mais jovem, enquanto urrava em árabe: ”idiota!!”, ao que esse caiu de joelhos sobre o chão. Então enquanto o jovem tentava recuperar o fôlego,  o mais velho o agarrou pelos cabelos e falou em tom ameaçador:

— Se aquele frouxo falou com essa médica antes de morrer, ou pior, se ele entregou o Pen Drive para ela, estamos acabados, entendeu?! Qualquer pista do nosso envolvimento na morte dele pode ser nosso fim!!

— Vou recuperar o Pen Drive, eu juro!! - respondeu com dificuldade por causa do soco no estômago.

— É bom mesmo -disse puxando a cabeça do jovem para si- caso contrário, o próximo corpo no necrotério será o seu.

Então largou o mais jovem, que agonizou no chão.

***

Eram 7 horas da noite, a emergência estava tranquila, apenas um ou outro paciente chegava, mas nada grave. Faltava apenas meia hora para Emanuelle largar e ir para casa. Sentada em sua sala, sem novos atendimentos, ela repassava mentalmente todos os acontecimentos do dia. O jovem baleado, o atentado, John e Mary… “Mary!!! - lembrou-se Emanuelle- me esqueci de passar na enfermaria para saber como ela está!”. Então a doutora se levantou e saiu de sua sala e foi visitá-la.

Ao entrar no quarto, Emanuelle se deparou com Mary dormindo e John também dormia sentado na cadeira, com a cabeça apoiada no leito de Mary. A mão da esposa estava envolta do pescoço de John,e a mão não engessada dele estava sobre sua cintura. A doutora encostou nas ombreiras da porta, e admirou por um tempo aquela cena com um singelo sorriso no rosto. Silenciosamente pegou o prontuário, deu uma lida rápida. “Ela está se recuperando bem, foi só o susto do trabalho de parto, sem demais danos”  falou a doutora para si mesma. Emanuelle resolveu sair e não atrapalhar o sono dos dois, mas quando ela se virou para sair, ouviu um sussurro:

— Emanuelle? -John tinha acordado, e Mary acabou por despertar também.

— Oi...desculpem, não queria atrapalhá-los, só passei para saber como vocês estão.

— Não, de forma nenhuma querida -respondeu Mary- nós e que temos que te agradecer pelo imenso apoio que você nos deu.

— Não foi nada demais, só fiz o meu trabalho -respondeu com um sorriso tímido- eu dei uma lida no seu prontuário Mary, estou feliz com sua recuperação; e quanto ao seu braço John?

— Está doendo um pouco, mas tomei uns analgésicos e me sinto melhor. O ortopedista disse que foi apenas uma luxação, então ele engessou meu braço e disse que queria me ver de novo em uma semana.

— Entendi. Bom, graças aos céus não houve nada mais grave. E quanto ao bebê?

— A nossa Rosie?-respondeu John- está bem, falei com a pediatra e ela disse que apesar dela ter nascido de oito meses e meio, está forte como um touro e já está dando trabalho para as enfermeiras - o comentário do doutor fez os três ali rirem, ao que continuou-  em breve ela deve estar recebendo alta, da mesma forma que Mary, então poderemos ir para casa.

— Excelente - respondeu a doutora.

Emanuelle olhou o relógio, era quase oito horas da noite, faltava pouco para ela largar. Então disse:

— Bom, vou ter que ir agora. Se precisarem de mim, já sabem.

A doutora acenou com a cabeça, e quando estava prestes a sair do quarto, John disse:

— Olha, desculpe o que houve lá embaixo hoje. O meu amigo é um tanto excêntrico às vezes, e se mete na vida dos outros sem ser convidado. Mas ele é a pessoa mais capacitada para cuidar dessa questão.

A doutora aquiesceu com a cabeça e mordeu os lábios. Não queria levantar aquele assunto de novo. Então, sorrindo tristemente, falou: Até a próxima sr e sra Watson. Dito isso, saiu.

Emanuelle entrou novamente em sua sala, para buscar sua pasta que tinha ficado na mesa, e encontrou Marcus mexendo em sua impressora; ao que, vendo que foi pego de surpresa, falou:

— Ah, oi Manu..minha impressora deu problema, espero que não se importe que eu esteja usando a sua.

— Ah...ok, sem problemas, é bom avisar ao pessoal da recepção.

— Certo - respondeu ele.

Emanuelle deu a volta onde Marcus estava, então pegou sua pasta de cima da mesa, guardou seu jaleco na bolsa, e ia saindo da sala quando Marcus perguntou:

— Já está indo?

— Sim, sim. Já são oito horas. Largamos de oito, não?- Marcus olhou para o relógio e disse:

— Nossa, o tempo voa! Nem vi que estava na hora de ir pra casa.

— Acontece - disse a doutora, enquanto abria a porta, e antes que pudesse sair, Marcus disse:

— Manu, você quer carona para casa? Acho que à essa hora a rua vai estar meio deserta, principalmente depois do atentado de hoje -Emanuelle fez uma cara de negação, ao que Marcus protestou- Ora vamos, é só uma carona, não estou chamando você para jantar.

A doutora pensou um pouco. De fato, a rua estaria bem deserta, e pegar metrô nessas circunstâncias não era muito bom; principalmente quando você levava algo no bolso que poderia significar o fim do ” Hukm Allah”. Emanuelle então disse:

— Certo...eu aceito a carona, mas só dessa vez hein.

— Ótimo, mas você vai ter que me ensinar o caminho. Eu não sei onde você mora- riu o doutor.

— Ensino sim.

— Certo, espere só eu entregar essa ficha, volto logo- dito isso, Marcus saiu da sala e dentro de cinco minutos ele voltou- Vamos?

Dito isso, Marcus e Emanuelle seguiram em direção ao estacionamento

 do hospital, a temperatura tinha caído bastante, Emanuelle sentiu a brisa gelada envolvê-la ao sair do saguão, o que fez seu corpo estremecer. Dada a partida no carro, saíram do St Barts rumo ao 221b.

***

A lareira estava acesa, e as labaredas dançavam entre si, enquanto deixavam o ambiente aquecido. De frente para ela, sentado em sua velha poltrona de couro, estava Sherlock, envolto em seu roupão azulado de dormir, dedilhando o seu violino. Vez por outra tocava uma melodia triste, enquanto olhava fixamente para as labaredas. Seu olhos refletiam a cor das chamas, e seu olhar estava distante, estava mergulhado em seus pensamentos. Do lado dele, numa mesinha de centro, estavam alguns papéis que ele conseguiu com lestrade quando saiu do hospital: a cópia do prontuário do falecido membro do grupo terrorista,  os dados impressos do banco de dados da polícia, como também o relato de um dos policiais que o levaram para a emergência. Havia também a impressão de algumas fotos da tatuagem dentro da boca do defunto, tiradas do próprio celular do detetive, já que a perícia não estava envolvida.

Sherlock levantou-se, guardou seu violino, sentou-se novamente na poltrona e pegou os documentos. Leu de um por um, começando pelo relato de um dos policiais.

Policial James Harper.

“Eu e o policial Trevor Scott estávamos em ronda, perto do Parque Olímpico Rainha Elizabeth por volta das onze horas e vinte minutos. As ruas estavam vazias. Então ouvimos alguns disparos e seguimos em direção à eles. Quando cruzamos a esquina vimos um civil ensanguentado correndo em nossa direção pedindo ajuda. Recolhemos a vítima e o levamos para o Hospital St Bartholomews, para receber o atendimento. Perguntamos ao civil o que aconteceu, ao que este referiu ter sido vítima de uma tentativa de assalto, sendo atingido pelos disparos enquanto corria do assaltante.”

Sherlock pegou um mapa em sua estante cheia de livros, estendeu-o no chão e sentou-se  com as pernas cruzadas e colocou o notebook do seu lado. Analisou o local onde o policial relatou ouvir os disparos. Percebeu algo: pela rota, o hospital mais perto de onde eles socorreram a vítima era o St Leonard’s, não o St Bart’s. “Interessante”, falou para si mesmo.

Em seguida leu a ficha do falecido:

Said Aleikho, 26 anos, nascido na Jordânia. Migrou para a Inglaterra aos 2 anos de idade com os pais. A mãe foi morta quando tinha 6 anos, vítima de um assalto. Formado em engenharia química em Havard, trabalhou numa pequena indústria de fertilizantes na região industrial da Inglaterra durante alguns meses, a chamada “Powerful Fertilizer”, sendo demitido por acusação de roubo. Desde então passou a vender sanduíches numa minivan, perto da Biblioteca Britânica.

Abaixo do relatório estava o endereço da residência do jovem.

Sherlock circulou no mapa a região onde ficava a indústria em questão, e pesquisou sobre ela no computador. Descobriu que a pequena empresa faliu há oito meses, seu dono morreu no fogo cruzado entre bandidos e polícia durante uma perseguição policial. Como o dono não tinha filhos, ninguém assumiu e a microempresa faliu e fechou as portas.

Sherlock colocou os papéis de volta na mesa, dobrou o mapa colocando-o em cima da mesa também. Levantou-se do chão, pegou seu violino e começou a tocá-lo de frente para a janela, quando algo atraiu sua atenção: um carro parou em frente ao 221b, e um casal conversava dentro dele.



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