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História Frankenstain - PAUSADA POR FALTA DE TEMPO - Primavera de 1870


Escrita por: Si1mari11ion

Notas do Autor


Acho que agora sim eu devo procurar um médico psiquiatra...
Tenham uma boa leitura :)

Capítulo 58 - Primavera de 1870


Às vezes ruir é a única saída.

Após a implosão tudo vira pó, poeira pelo chão, então, e somente então, entendemos que restaurar ruínas é bem mais difícil que sacudir a poeira e começar de novo.

Não podia fazer nada, qualquer coisa que fizesse iria apenas piorar, então se obrigou a aceitar o fato.

Acompanhou o mais novo até o quartel, aquele era o dia de sua partida e não podia evitar.

¬ Non faça essa cara. — pediu o ruivo enquanto escondia o cabelo. – Parece que está velando um corpo e non me acompanhado até o trabalho.

¬ Prefiro não comentar. — respondeu desviando o olhar.

Ficou fazendo carinho em seu velho e corajoso companheiro de viagens, apenas esperando o tempo passar enquanto o silencio reinava supremo.

¬ Isso non precisa ser um “adeus”, Milo.

¬ Sinto como se fosse o “fim”. — volveu.

¬ Está sendo dramático. — revidou. – Vai mesmo me mandar Diamond?

¬ Melhor um cavalo velho, conhecido e fiel do que um novo, desconhecido e infiel. — respondeu. – E eu bem queria estar sendo dramático.

O mais novo apenas suspirou, aquela situação estava saindo pior que o imaginado.

Apanhou os reios do cavalo baio e fez um pequeno carinho no animal, era bom ter ao menos alguém que pudesse realmente confiar ao seu lado.

¬ Vou cuidar bem dele. — mirou o mais velho.

¬ E ele de você. — respondeu ainda com o rosto virado e expressão triste. – Quando você voltar estarei bem aqui.

¬ Non prometa o que non irá cumprir. — rebateu.

¬ E você não duvide de mim.

O silencio reinou mais uma vez.

Ainda era cedo, somente o padeiro e alguns militares estavam acordados àquela hora. As ruas ainda estavam vazias e uma pequena nevoa borrava a visão da manhã nublada.

¬ Se pudesse mudar alguma coisa em toda sua vida, o que mudaria? — perguntou baixando a cabeça.

¬ Essa é uma pergunta difícil. — ergueu o rosto de leve. – Acho que eu escolheria ter morrido afogado no rio caudaloso em que meu criador me atirou, logo após eu nascer.

¬ Porque diz isso? — voltou a mirá-lo na mesma hora.

¬ Assim eu não teria conhecido ninguém do Santuário. — respondeu. – Assim eu não teria conhecido você. Assim eu não teria o colocado em risco. E assim eu não teria que vê-lo chorar, entretanto, também jamais o veria rir. Minha existência é um erro crasso.

¬ Sua existência é uma benção. — corrigiu ríspido. – Sem você meu bisavô Radamanthys teria feito coisas piores. Sem você meus avôs jamais teriam sobrevivido à Revolução. Sem você meu pai jamais teria nascido e, por conseqüência, eu também. Sem você só Deus sabe quantos homens bons estariam mortos e quantos homens ruins estariam vivos. Sem você este mundo non seria mundo.

Soltou um riso anasalado.

¬ Odeio não valer nada e ao mesmo tempo fazer tanta diferença. — comentou pondo as mãos no bolso. – Mas, ainda sim, repito o que eu disse. Dessa vez, vou estar te esperando quando voltar, exatamente como você fazia comigo e sem me importar com o tempo que leve.

¬ Eu já disse que non é um “adeus”. — não gostava daquele clima.

¬ Eu sei. — respondeu. – É apenas um “até logo”. Então... Talvez me veja algumas vezes, ajudando pessoas a fugir dos campos ou quem sabe correndo de um lado pro outro das linhas atrás de Espectros... Peço apenas que se cuide e... Adeus, Camus.

Estendeu-lhe a mão em forma de trégua, ao menos aquele último toque, aquilo lhe bastava.

Mas, para sua surpresa, sentiu e viu o ruivo prensar os lábios contra os seus, um breve beijo, mensageiro de todos os sentimentos. Depois disso se afastou e fez mais um carinho em Diamond.

¬ Até logo, Milo.

Os nós eram grandes e sufocantes, mas ainda possíveis de calar.

Ambos então deram as costas ao mesmo tempo e cada qual seguiu seu caminho, estando tão perto e ainda sim permanecendo tão longe.

Parou de andar e deu uma última olhada para trás, vendo o mais novo sumir com o cavalo dentro do edifício.

¬ Até...

Ninguém nunca sabe quando um simples “até logo” poderá ser, na verdade, um adeus. E, honestamente, preferia que fosse apenas um simples “até logo” mesmo.

Agora entendia porque dizem que o Amor e a Dor são amigos. Você primeiro se embebeda de amor e logo está se embebedando de dor, seja pelo amor ter acabado ou por ter sido arrancado de você.

Você sempre vai se embebedar de amor antes de se embebedar de dor.

Mas a Vida é tão irreverente ao sofrimento que ela continua, mesmo que as pessoas se afoguem em dor ou pereçam sem nome em pântanos mortos.

Ela continua sem olhar pra trás, sempre acompanhada pela Morte, sua melhor amiga.

¬ MILO!! MILO!!

Fazia quase três meses que se sentia morto.

Tinha noticias de que Camus estava bem, já tendo participado de três combates vitoriosos, entretanto, isso não aliviava seu desespero.

Sabia que ele tinha enfrentado algumas das novas armas e tinha as contornado com genialidade, tanto que ganhou algumas condecorações. Também sabia que a arma que Manigold lhe mostrara tempos atrás, quando a guerra começou, ainda estava sendo fabricada. E também sabia que o Major mandado para comandar as unidades era Surt Eikthinyr, um homem cada vez mais perturbado pelas recusas de Camus ao que diziam suas fontes.

Ter noção de tudo isso não o ajudava em nada.

Mas não tinha apenas essas preocupações.

Era a ponte de ligação entre Santuário e Descendentes, tinha inúmeras responsabilidades e uma delas vinha berrando a cavalo.

¬ Ibirajá! — conseguiu frear o cavalo do menino ao se por a frente do mesmo. – O que houve?! Problemas na fronteira de novo?! Qual direção e vila, rapaz?!

¬ Não! — negava aflito ao desmontar. – Armas novas chegaram! Armas chegaram!

Pela primeira vez sentiu o que seria o Vazio.

Um espaço sem fim que o envolve e consome enquanto você cai infinitamente em direção ao nada.

¬ Pegue seus irmãos e venham comigo agora!

E mais uma vez a guerra mostrava sua verdadeira face.

Brutal e cruel. Malévola e infantil.

Mal desconfiava do destino que aguardava na esquina da vida, mal sabia como o encararia de fato.

¬ Capitão. — chamaram. – Seu cavalo está dando muito trabalho, ninguém consegue acalmá-lo.

¬ Estou indo. — suspirou e se levantou de sua mesinha de fronte.

Passou pelas agitações normais de um acampamento e logo mais estava onde guardavam os cavalos, vendo o enorme corcel branco se agitar e afastar os tratadores.

¬ Wow! Wow! — os tratadores tentavam contê-lo. – Calma, Garoto! Calma!

O cavalo empinava, dava coices no ar e corria em círculos ou de um lado para outro tentando escapar daquela confusão; era evidente o desconforto do animal naquele ambiente.

¬ Diamond! — juntou-se aos tratadores. – Non faça assim. Tenha calma.

O cavalo começou a trotar agitado quando o viu, parando de dar coices e empinar sobre as patas traseiras. Nunca machucaria o ruivo.

¬ Isso... — se aproximou devagar e conseguiu apanhar seu arreio. – Vamos para baia, vamos? Você precisa descansar... Non precisa se agitar... Está tudo bem, você já enfrentou coisas piores que eu sei... Vem...

Guiou o animal até o canto que lhe era destinado, o prendeu ali e fez carinho em seu focinho, sabia que ele estava assustado por não ser habituado a um ambiente tão agitado.

¬ Esse animal é muito rebelde apesar de velho. — reclamou um tratador. – Devia trocá-lo, senhor. Não tem como confiar em um animal tão volátil.

¬ Trouxe Diamond de minha casa, ele é um de meus animais. — respondeu ainda dando atenção ao gigante. – O quero bem tratado, assim como os outros cavalos.

O tratador engoliu seco e se afastou ao passo que outra figura se aproximava do ruivo.

¬ Nada mal. Nada mal mesmo. — teve que se virar e saudar o recém chegado. – Sem formalidades, Camus, elas não são necessárias agora. Mas, por mais que seu animal seja admirável, ainda é velho e duvido muito que chegue aos pés do meu Asgard.

¬ Tem certeza, Surt? — revidou com um leve sorriso. – Diamond tem mais potencial do que pensa e é bem mais astuto, sem contar que, pelo que me lembro, ele ultrapassou seu amado Asgard no último exercício de ataque.

O major revirou os olhos e o chamou para ir consigo, soltou um leve riso e foi logo atrás do amigo e superior comandante.

¬ Você anda muito engraçadinho, Camus.

¬ Penso apenas que precisamos de um pouco de alivio às vezes. — respondeu.

¬ Mas agora não podemos ter alivio. — volveu paciente. – Tudo indica que o próximo embate vai ser uma repetição histórica, logo o primeiro ataque é decisivo. Mandei que todos os cavalos estejam nas melhores condições para amanhã bem cedo.

Entraram na tenda pertencente ao major e se arrumaram nas cadeiras disponíveis da melhor maneira possível. O ruivo alaranjado apanhou seu violino e começou a afiná-lo enquanto davam continuidade à conversa.

¬ Partiremos às 4 da manhã. — explicou. – Iremos com a 9°, 11° e 12° Cavalaria, as demais ficaram para defender o posto. Quero que você mande uma tropa na frente, quero que verifiquem tudo e é uma ordem. E nada pode estar polido, medalhas, fivelas, botões, nada. O brilho pode denunciar nossa posição.

¬ Como queira. — tomou o violino do amigo e arriscou de tocar algumas notas. – Algo mais?

¬ Apenas o prazer de sua companhia, meu amigo. — respondeu. – E você toca muito bem.

¬ Meu avô tinha um criado que tocava violoncelo. — contou. – Ele me ensinou alguns acordes.

¬ Vejo que foi excelente aluno. — sorriu charmoso. – Algo mais que esconde de mim?

¬ Nada mais do que mereça saber, Surt. — devolveu o sorriso com uma gota de acides.

¬ Porque sempre tão grosseiro? — perguntou com leve magoa.

¬ Non estou sendo grosseiro.

Ariscou mais alguns acordes que acabaram se misturando com o som dos cavalos e logo mais o som de seus cascos marchando na terra fofa da manhã.

Seu alvo era 18° Divisão Prussiana, que no momento estava acampada a três milhas a oeste da estrada de Alsácia-Lorena. Os espiões informaram que eles estavam bem à vontade, ergueram barracas e acenderam fogueiras, além de que montaram algumas mesas de jogos para se distrair.

Alertou seu superior quanto a isso. Uma guarnição jamais fica desprotegida em campo aberto, porém, foi ignorado. Certamente, a glória da vitória era bem mais atrativa que o conselho amigo.

Se vencessem aquela divisão, podiam passar por detrás das linhas e atacar os exércitos restantes espalhados por toda fronteira.

E mesmo a divisão tendo o dobro de homens, a cavalaria sempre teve vantagem sobre as guarnições, eles contavam com o elemento surpresa e essa vantagem natural.

¬ Senhores! — o amigo estava a frente discursando, já começando errado em sua opinião. – É uma honra lutar ao lado de vocês! Façam o Kaiser se arrepender do dia em que ousou cruzar espadas conosco! Orgulhem-se de si mesmos! Orgulhem-se de seu Imperador! Orgulhem-se de seu país! E orgulhem-se de todos os colegas mortos! Sejam bravos, temam à Deus e honrem o nosso Imperador!

¬ SEJAM BRAVOS!! TEMAM A DEUS!! E HONREM O NOSSO IMPERADOR!! — bramiram em resposta.

Logo esgueiravam-se por entre a vegetação alta e os campos de trigo farto, logo mais estavam montados e com as espadas erguidas.

A poucos metros homens descansavam, faziam a barda, comiam e jogavam, apenas esperavam ordens e rezavam para viver o suficiente para ver um amanhã.

O som dos cascos era abafado pela grama e trigo amassado, mas logo a terra se tornou nua e o bater de cascos se transformou no rugir de trovões.

¬ CAVALARIA!! — urrou o cozinheiro prussiano.

A cena que se seguiu foi a de homens correndo. Um atropelando o outro, caindo encima de tendas ou por sobre mesas, alguns de farda completa e outros de calça e suspensório, metade de barba feita e a outra metade não feita ou feita pela metade.

Aquilo se tornou o caos.

Os urros que se seguiram acompanhados dos trovejantes cascos fizeram o caos multiplicar, a confusão aumentar e o sangue jorrar livremente.

Laminas de espadas e baionetas cortavam ar e carne enquanto os cavalos corriam e pulavam sem obstáculos, o som era parecido com os sons de um açougue, inclusive os gritos desesperados de dor.

Tiros prussianos eram dados sem atingir um alvo e corpos caiam com a mesma cadencia de cartuchos perdidos em tiros direcionados ao nada.

Os soldados seguiram desesperados para um pequeno bosque, onde saltaram por detrás de algumas proteções e sumiram de vista enquanto a cavalaria avançava impiedosa.

Logo o som de tiros e o brilho de explosões foram vistos por detrás daquelas barricadas improvisadas, mas eram tiros diferentes, mais rápidos e eficientes.

Os cavalos começaram a saltar sobre a cabeça dos soldados sem seus cavaleiros e o anjo negro ria em deleite com o trabalho que teria aquele dia.

¬ VOCÊ!! — gritaram em francês. – ACHOU MESMO QUE DEIXARÍAMOS UMA GUARNIÇÃO EM CAMPO ABERTO DESPROTEGIDA?!! OLHE PARA SI MESMO!! QUEM PENSA QUE É?!!

Aquele tom de voz era a decepção de um major para com outro, não de um prussiano para com um francês.

Um cavalo branco se afastava na bruma, tal qual o corcel de uma Valkiria enquanto o Major Eikthinyr aceitava seu erro e se rendia miserável ao inimigo, que dele jamais teria piedade.

¬ VAMOS LOGO!!

¬ MILO ESPERA!! — gritou o mais novo.

Exigia o máximo do cavalo que pegou emprestado.

O animal bufava agoniado por ar e o loiro bufava desesperado por chegar.

Não demorou muito até o cheiro pútrido de carne e pólvora invadir o seu nariz, turvando seus sentidos com o cantarolar da morte e gargalhar lúgubre dos abutres e corvos.

Ainda não vira nenhum corpo, mas conseguia ouvir as lamúrias das almas penadas e condenadas, crentes de que ainda viviam e guerreavam.

¬ AJUDA!!

Conhecia aquela voz.

Parou o cavalo na mesma hora, quase fazendo o animal cair e desmontou o mais depressa possível. A bruma ocultava quem gritara, mas aos poucos pode ver um vulto de homem e outro de um cavalo manco.

Os jovens indígenas logo o alcançaram e também desmontaram, apanhado suas armas para caso fosse uma armadilha.

Aos poucos o vulto foi se definindo e os presentes foram relaxando a postura defensiva, ao mesmo tempo em que exasperavam-se.

¬ Kagaho! — a índia largou tudo e correu até o homem, o abraçando com força. – Matriarca vai ficar feliz! Estou feliz! Muito feliz! Gigante do Céu não me deu sonhos sobre você, mas nunca me fez perder a esperança! Estou feliz, feliz!

¬ Selinsa... — a abraçou de volta, percebendo o quanto seu silencio fez mal. – Desculpe... Só assim eu pude ajudar na guerra sem matar...

O cavalo que acompanhava o cigano continuou andando até Milo, sua pata dianteira esquerda sangrava com o tiro de uma Guntling Prussiana. O animal bufou e caio pra frente, apoiando-se nos joelhos dianteiros e então caindo com o resto do corpo.

No lombo, uma cabeleira ruiva balançava morbidamente conforme o animal mancava e caia para frente.

¬ CAMUS!!

Jogou-se ao lado do cavalo e apanhou o ruivo antes que sua perna fosse esmagada pelo peso do animal, agora sendo socorrido pelos dois rapazes.

O ruivo respirava com dificuldade, sua camisa estava da mesma cor do cabelo escarlate e com três buracos profundos. Seus olhos estavam começando a perder o brilho e a força era quase nula.

¬ Camus... — sentia o mundo ruir. – Camus... Meu amor... Não... Não...

O ruivo agarrou suas roupas na hora que o reconheceu, demorando um pouco para perceber quem realmente estava ali, sua respiração era cada vez mais ruidosa e desesperada.

¬ Milo... Milo... — segurou sua mão e a levou até o peito. – Som...

¬ Não! — a visão estava turva e a voz embargada. – Não! Por favor... Athena, por favor... Não Camus... Não me deixa... Camus...

Gemendo de dor, concentrou todas as suas faculdades e todas as suas forças. A tarefa que tinha diante de si, sabia, iria exigir todos os segundos de vida que lhe restavam.

Agarrou-se com mais força ainda, sentindo o olhar transbordar e gotas com cheiro de ferro pingaram em seu rosto. Ouviu um som que pensava ser seu, mas compreendeu pouco depois que era um soluço do loiro.

Sua visão estava cada vez mais turva, logo não teria mais tempo de nada.

¬ Você lembra... Milo?... — lutava por ar e força de falar. – Você lembra... Scorpius?... Você lembra... A canção do coração?...

¬ Camus... Não é hora disso... — respondeu aflito. – Por favor... Não é agora que devemos ouvir...

Puxou o loiro com a força que lhe restava, roubando um beijo apaixonado e assim calando suas contestações, era um teimoso irremediável.

¬ Mergulhado na escuridão... Quase impossível acordar de um sonho assim... Eu fico sem rumo... — desviou todas as forças para um ato tão simples quanto falar. – Enquanto a chuva cai no fim do mundo... No arrependimento, na memória... Isso me trás... Desejos... Que non realizei...

Precisou tomar ar, sua visão cada vez mais escura, podendo ver parcialmente o loiro travar uma batalha interna.

A dor que sentia era indescritível, e agora tinha a estranheza de conhecer a música falada lhe invadindo juntamente de um calor anormal. Era como se o coração entrasse em combustão e batesse ainda mais rápido para tentar fugir inutilmente das chamas.

O soluço foi sua rendição, segurou o ruivo com mais força ainda e decidiu ajudá-lo a terminar aquela simples tarefa, afinal, seu peito e o dele tinham a mesma música.

¬ Para proteger alguém que amo, eu preciso de força... — tentava falar sem se render a dor. – E sem perder a fé eu não vou fraquejar... Eu aceito o que vier... No futuro eu sei que vou... Brilhar!...

Forçou-se a acompanhar o mais velho, sentindo o coração bater como nunca antes, parecendo queimar de dentro para fora.

¬ Sei que a coragem non vai me deixar!... Enquanto estendo as mãos pra ti, a noite cai... Quando eu precisei você me salvou... Agora é minha vez, eu vou seguindo com a força do amor!... — o ruivo acabou engasgando e tossindo sangue.

Liberavam um calor tão grande que era como estar bem próximo de uma fogueira alta, sentindo o calor das chamas lamberem a face. Mas aquele não era um calor ardido, era um calor bom, lembrando o calor de um abraço.

O cigano, um pouco mais distante, conseguia ver o que realmente estava acontecendo por conta de seu Dom.

Eles não pareciam queimar, eles realmente queimavam.

O cosmo os envolvia e era partilhado como fogo crepitando, vindo diretamente do peito, pulsavam com o ritmo de corações dançando.

O loiro acolheu o mais novo em seu abraço com mais conforto, o ajeitando e ajudando a tossir o sangue que o afogava; fazia carinho em seus cabelos e costas.

¬ Quando estrelas deixam de brilhar... E as sombras do passado vêm nos atormentar... Não fique com medo... — estalou um beijo na testa cada vez mais alva.

Sua visão não mais existia, logo seria sua voz.

Precisava se apressar, então se forçou mais uma vez enquanto chorava por dores que nem entendia direito, só sabia que estavam ali e eram assustadoramente fortes.

¬ Os caminhos que se cruzam vão... Juntos pela eternidade e formam... Laços fortes que non são fáceis de quebrar... — o cheiro ferroso de sangue e suor invadia-lhe, talhando na alma uma lembrança ainda mais forte. – A certeza de non te perder só me enche de força... Eu sei que a minha fé non vai me abandonar... Mesmo se alguém me derrubar... Saiba que vou me levantar do chão!... As estrelas podem até cair do céu... As cicatrizes que eu carrego nada são... Nossos sonhos vão se unir agora... Nessa promessa que eu te fiz... Eu vou continuar lutando...

Tossiu mais um bom tanto de sangue, suas roupas já empapadas pelo líquido escarlate e as do mais velho começando a se manchar.

Tantas bandeiras carregavam em si o sangue de seu povo da mesma maneira, por manchas. Diziam ser uma forma de homenagear o povo, mas aquela não seria apenas uma forma de mostrar que a bandeira, que aquele governo, só pode ser erguido com sangue e morte?

Se for assim, todas as bandeiras deveriam ser pretas também, todo vermelho do sangue tem uma parte igual e proporcional do preto da morte.

¬ E você pode ter certeza que eu vou te proteger... — estalou mais um beijo na testa alva, estimulando-o a continuar. – Eu aceito o que vier... Vamos juntos pro amanhã e depois do amanhecer brilhar!...

¬ Sei que a coragem non vai me deixar... — segurava a mão em seu peito com a força de uma criança assustada. – Enquanto eu estendo as mãos pra ti, a noite cai... Quando eu precisei você me salvou... Agora é minha vez, eu vou seguindo com a força do amor... Da coragem... E da fé!....

A pele pálida, banhada pela lua parecia reluzir como um cristal. O peito subindo e descendo veloz, desesperado por ar. O cabelo e sangue em iguais tons destacavam a beleza restante.

Tinha medo de tocar e começar a se desfazer.

¬ A promessa... Lembra dela?... — sentia a voz cada vez mais fraca, não sabia nem mesmo se ainda estava engolindo saliva ou sangue. – Você cantava a promessa... Era para eu dormir... Lembra?...

Todos aqueles anos de músicas de ninar, nada mais eram do que uma promessa milenar.

A diferença é que ela estava apenas sendo cantada e não citada.

¬ Lembro... — beijou seu rosto. – Eu lembro...

¬ Quero... Mais uma... Promessa... — pediu cada vez mais fraco. – Pode?...

Sentiu um bolo se formar na garganta.

Balançou a cabeça tentando afastar pensamentos descabidos e achares bobos, além de sentimentos sufocantes que poderiam ter sua atenção em outro momento.

¬ Se for para te proteger,

Não há nada a lamentar...

Porque tomarei qualquer dor

Se for apenas pra te cuidar...

Sempre sorridente estarei

Para o calor do abraço permanecer...

Secarei as lagrimas a cair,

Nada deixarei te machucar...

Porque saiba apenas meu amor

Que ao teu lado...

Eternamente...

Ficarei...

Os olhos abertos e foscos.

Não se movia ou piscava, mesmo que de forma lenta. Mãos flácidas, sem cor e sem vida.

Nenhuma respiração movimentava os lábios ligeiramente abertos.

Oscilando e chorando sobre a forma imóvel, agarrava as mãos ainda quentes nas suas. Exceto pela estranha imobilidade e o sangue que ainda escorria, poderia estar dormindo.

O urro animalesco preencheu a noite e trouxe às mentes dos ouvintes as memórias de lendas antigas sobre espíritos vingativos e bestas sanguinárias, mal desconfiavam que aquele fosse o urro de um animal ferido.

Não existe triunfo sem perda, não há vitória sem sofrimento, não há liberdade sem sacrifício.

Não há amor sem dor.


Notas Finais


Acho que alguns já desconfiavam dessa morte ou pensavam que alguém ia aparecer pra salvar o dia, mas ainda acho que exista quem tenha se assustado com essa morte.
JUSTO ESSA!!
Também sei que vai ter gente querendo me matar, então já vou providenciar minha armadura porque a coisa talvez fique feia XP
Curiosidade do dia:
~ A fic não teria um universo diferente, digamos assim, inicialmente ele iria funcionar puramente com o esquema de Anjos e Demônios, seguindo algumas histórias bíblicas e com o contesto embasado na fé católica. Mas eu achei que iria ficar estranho, se não anormal e talvez iria passar a ideia que eu fosse Papa-Ostia (vive na Igreja e, se bobear, é coroinha) ~
Vou sumir por um tempinho, mas não eternamente, show?
Espero que tenham gostado :)
Até a próxima. Bjs. L ;3


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