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História Garotinhas - O amargo sabor de um fora


Escrita por: MarioNT

Capítulo 11 - O amargo sabor de um fora


11

O amargo sabor de um fora

 

Carlos, enfim, conseguiu se livrar do aperto sufocante de Amanda. Ele pegou a moto do pai, na garagem, e pilotou até a cidade, para a casa de Tainá. Durante o caminho, o vento frio indo de encontro ao seu rosto, ele podia jurar que sombras o seguiam pelas árvores da estrada. Estava paranóico, como Amanda.

            Ele pára em frente à mansão Borges. Ao lado, na antiga casa dos Tomaz, os furgões da imprensa ainda acampavam. A perícia parecia encerrar o trabalho. Não aparentavam ter encontrado pistas suficientes para seguirem com o caso. O assassino mostrava ser muito esperto.

            Mesmo tendo uma chave no bolso da calça, Carlos resolveu tocar a campainha.

            – Já vou! – grita Tainá.

            Ao contrário das outras vezes, o coração do menino não disparou ao escutar a voz da amada.

            Tainá abre a porta. Ainda estava de pijama.

            – Oi, Carlos – ela o olha com curiosidade. Com certeza se perguntava o quê ele fazia ali, por àquela hora da manhã. – Entre – ela se afasta da porta, abrindo espaço.

            – Tainá... – Carlos move as mãos, como se segurasse algum objeto. – Eu... Eu preciso perguntar uma coisa a você.

            – Ok! – a garota se balança para frente e para trás com os pés. – Pode ser enquanto tomamos café? Porque Beatriz, a nossa nova vizinha, está aqui em casa e não para de cozinhar para a gente! Eu até disse que ela não precisava se incomodar, mas acho que é como uma terapia, sabe? Ajuda a relaxar. Acredita que ela fez waffles?

            Tainá tinha que começar a tagarelar. Era um truque para fazer com que Carlos esquecesse o motivo de vir até ali. Ela não devia usar esse método apenas com ele. Não... Ela devia usar com todos! Por isso ninguém em Catolé do Rocha jamais soube nada sobre Tainá Borges, apenas o que ela queria que soubessem.

            – Tudo bem – Carlos continuava rígido, como um soldado de chumbo. Ele não desistiria fácil.

            – Vamos para a cozinha – ela o guia pela casa. – Eu vou acabar engordando nesses dias. Meu uniforme do colégio não vai caber em mim!

            Será bem difícil, pensou Carlos, lembrando da última vez em que Tainá o convenceu a acompanhá-la na aula de pilates.

            Ela pega um prato no armário. Numa frigideira, em cima do balcão, havia uma pilha de waffles, ainda fumegando.

            – Fica melhor com mel – disse Tainá ao pegar dois e jogar melado em cima.

            Ela se senta ao lado do menino, na mesinha lateral da cozinha.

            – Pegue – ela estende um garfo para Carlos.

            Ele o pega, mas não toca na comida. Algo muito estranho se tratando dele.

            – Tainá – Carlos apóia o garfo no prato e expira. – Me conte a verdade.

            – Certo – ela ainda não estava levando a sério a visita dele. – Eu sempre lhe conto.

            – Você sempre soube de Murilo?

            Tainá se vira rápido demais para Carlos, fazendo os ossos do pescoço estralarem. O pedaço que tirara do doce ficou suspenso no ar, entre a mesa e a boca dela, o mel escorrendo pelas laterais do talher.

            – Carlos, soube junto com você e os outros.

            – Mentira! – Carlos soca o vidro da mesa com os nós dos dedos. Tainá se afasta, desperta.

            – O que te faz pensar que eu estou mentindo?

            – Você correu para chamar Fernando assim que soube que Bruna estava com ele. Você agiu como se soubesse do que Murilo fosse capaz!

            – Carlos, Murilo era muito mais velho do que a gente. Fiquei com medo sim.

            – Murilo tinha a mesma idade que os amigos do seu irmão e você sempre andou com eles.

            O menino se levanta da cadeira, mordia o interior das bochechas. Não olhava mais para Tainá, fitava o sofá de couro da sala de visitas.

            – Eu soube de Murilo no dia em que estávamos estudando geografia – Tainá estava virada para a janela, vendo o próprio reflexo pelo vidro. – Eu te mandei embora, lembra? Porque queria ouvir a conversa de Fernando com os amigos dele.

            – Você me beijou naquele dia – Carlos deixa as mãos caírem, como se estivessem mortas. – Foi por isso?

            Ele estava envergonhado. Foi usado pela garota que tanto ama e insiste.

            Tainá estava de cabeça baixa, chorando.

            – Por que você não nos contou? – o garoto chega mais perto. – Não contou a Bruna, pelo menos?

            – Eu queria aquilo só para mim.

            – Claro – ele assenti. – Como tudo a sua volta.

            Carlos sai da cozinha a passos largos. Ele escuta uma cadeira se arrastar pelo piso, o que o faz andar mais rápido – sabia que era Tainá correndo atrás dele.

            Ela o alcança.

            – Você não tem o direito de ficar com raiva de mim! – ela o puxa pela manga da camisa.

            – Bruna quase perdeu tudo por isso – Carlos a encara. – Você me beijou para se livrar de mim. Você me usou, Tainá!

            – Eu era uma criança! – ela aperta o braço dele.

            – Eu também. E, mesmo assim, fui sincero com você.

            Carlos se afasta do toque da mão da garota. Ele via toda a atração, o desejo que sentia fugirem. A dor da verdade era maior... Parecia um trator. Ele chega até a porta.

            – Se você for – Tainá grita. A sua voz tremia –, não volte!

            Ela esperou que Carlos não abrisse a porta, voltasse e tentasse entender.

            Bem, ele deu meia volta, não levantou a cabeça, muito menos foi até a menina. Tirou a chave em seu bolso e a colocou em uma mesinha de madeira, ao lado de um abajur.  

            Tainá o viu saindo. Ela permaneceu no mesmo lugar, pedindo aos céus que Carlos não ligasse a moto. Ela estava mentindo, porque, no fundo, o aceitaria de volta em sua vida.

            Do lado de fora, podia escutar-se o barulho de uma moto soltando fumaça e de pneus cantando na pista.

            Chegou um ponto em que não pôde mais se escutar nada. Apenas os soluços de Tainá. Ela mordia as costas das mãos para não ser ouvida. Estava indo para a área de lazer, onde acontecera a sua festa, noite passada. Nos fundos, de frente para a piscina, estava a sala de jogos de Henrique. Tainá abriu o frigobar e tirou de lá um uísque escocês. Ela deu um primeiro gole. A garganta queimou, mas era melhor aquilo do que ligar para Bruna, ou Clara, pedindo conselhos. Elas não entenderiam. Diriam que ela brincou com Carlos por tempo demais.

            – Ai, Senhor! – Tainá bate na mesa de pôquer, os olhos estavam vermelhos, mas o gosto da bebida parecia ficar mais tolerável cada vez que ingeria mais um pouco.

            Ela já estava no quarto gole, quando o seu celular toca, no bolso de trás de seu short. Era Bruna.

            Tainá tosse, esperava que a sua voz não a entregasse à amiga.

            – Huuum... – ela inspira ao atender o telefone. – Oi, Bruna.

            – Tainá, está ocupada? – Bruna sussurrava do outro lado da linha.

            – Não. Por quê?

            – Estou lendo um site de notícias daqui da cidade e descobri que o velório de Murilo vai ser hoje à tarde.

            Tainá parou. Por isso Bruna estava sussurrando...

            – Quero ir – disse a menina, por fim. – Quero ver enterrarem o corpo dele de vez.

            – Bruna, eu não acho certo...

            – Se você não for – a garota a interrompe –, vou sozinha.

            Tainá pega uma carta de baralho. A rainha de copas. Ela sabia que Bruna estava falando sério.

            – Ok. Me encontre na praça em frente à igreja.

            – Obrigada.  

            Bruna desliga antes que Tainá possa dizer por nada.

            A menina fica olhando a garrafa seca pela metade. Ainda doía saber que Carlos a deixara. Agora, vinha pela cabeça como seria no primeiro dia de aula e nos outros seguintes, nas festas em que se encontrariam, nas aulas que tinham juntos...

            Ela ficou tentada a beber mais um pouco do uísque. Teria que deixar para uma outra hora. Precisava se preparar para um velório.

 



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