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História Guerra e Paz - Capítulo LXXVIII O amor de Peixes -


Escrita por: KimonohiTsuki e JonhJason

Notas do Autor


Eu fiquei com peso na consciência sobre o último capítulo, o enfrentamento de Camus e Erictôrio era enunciado há algum tempo, porém como a finalização desse momento acabou acontecendo justo no dia que fomos sacrificar nossa cachorrinha, acabou ficando menor do que eu queria.

Sim, nenhum dos dois, seja pelo despreparo de Camus ou o veneno de Erictônio, conseguiriam lutar por muito tempo, mas ainda assim eu queria ter feito uma luta um pouquinho maior.

Em compensação a isso então, trago para vocês esse episódio 78, o maior da estória até agora! Espero que gostem!

Capítulo 79 - Capítulo LXXVIII O amor de Peixes -


Fanfic / Fanfiction Guerra e Paz - Capítulo LXXVIII O amor de Peixes -

Capítulo LXXVIII – O amor de Peixes -

Antes do retorno de Ikki, Muh e Piada, e da luta de Camus e Erictônio, terremotos e uma intensa ventania assolavam Rodorio.

Asterion de Elfo, Estrela Terrestre da Humildade, Mist de Dullahan, Estrela Terrestre das Sombras e Verônica de Nasu, Estrela Celeste da Contemplação eram os responsáveis de tais fenômenos.

Verônica, que como humano atendia pelo nome de Chris, estava agachado no chão, com ambas as mãos abertas sobre as pedras frias, de olhos fechados, concentrando e canalizando seu cosmo, criando assim um terremoto de poucas proporções, mas que facilmente derrubaria um homem adulto que insistisse em caminhar por muito tempo.

A rua, com seu céu aberto e com menor risco de escombros desabassem, não era uma opção de refúgio, porque Mist usava suas antigas técnicas de cavaleiro para criar intensas ventanias que forçavam as pessoas a se abrigarem, ao mesmo tempo que condensava, como em um redemoinho, o miasma ao redor dos três, o que, devido a ação de Chronos, ironicamente, garantia ainda mais que não fossem localizados.  

Ainda assim, ignorante a esse  detalhe, o recém espectro de Elfo mantinha sua estrita guarda, analisando a mente de qualquer um que se aproximava. Em mentes mais fracas, com o auxílio de sua sobrepeliz, inclusive conseguia convencê-las a se afastar, que soava mais como uma vontade repentina, um sexto sentido, na cabeça de suas vítimas, do que uma manipulação real.   

- Já consegui reunir a maior parte do miasma – Informou Dullahan a Chris, que estava no controle da missão. – Porém uma parte se deslocou para próximo do cemitério do Santuário e as saídas do vilarejo.

- O miasma é a essência da morte, ser atraído para o cemitério é seu rumo mais natural – Respondeu Verônica, sem abrir seus olhos ou deixar sua ação – O problema é que, segunda as plantas que Daidalos me mostrou antes de vocês chegarem ao salão do trono, plantas as quais foram feitas com base no que o próprio general presenciou através do espelho negro sob a visão de Lune, o que me dá a certeza que são bem precisas, os Partenon são as maiores estruturas do Santuário, até maiores do que o salão do Grande Mestre ou os aposentos de Athena. Levando-se em conta o que me disseram sobre a população do santuário ter triplicado nas últimas duas décadas, e as cosmo energias que sentimos são apenas a metade disso, podemos concluir que os demais são apenas aprendizes, e o único lugar que comportaria tantos seriam esses Partenons, que estão prestes a sucumbir ao miasma.

- Ou seja, uma catástrofe iminente – Seguiu a linha de raciocínio Mist, franzindo a expressão, seguindo com suas ventanias – As crianças suportariam ser expostas a isso?

- Dificilmente, apenas aqueles bem resolvidos com seus medos e incertezas, principalmente aqueles que envolvem a morte, conseguem ser imunes ao miasma. Algumas podem até não ser afetadas, mas a maioria não deve possuir tanto controle sobre suas próprias emoções, afinal, são apenas crianças – Seguiu Nasu – E se o miasma, que é claramente algo pertencente ao submundo, for o responsável por um massacre assim, a guerra entre os cavaleiros e os espectros reacenderia como nunca.

- Porém o miasma está agindo assim por influência de Chronos! – Envolveu-se na discussão Asterion, mantendo sua vigia – O mundo dos mortos nada tem a ver com isso! Estamos aqui ajudando, não estamos?

- E por estarmos afastando o miasma de Rodorio, que ele foi ao cemitério do Santuário. – Concluiu Verônica – Indiretamente é nossa culpa, e eu não descarto a possibilidade de que Chronos esperava que fizéssemos exatamente isso: Não interceder diretamente no santuário, mas atuar em Rodorio e tentar concentrar o miasma. Vocês podem não ter percebido, mas eu que estou há milênios no submundo, posso dizer claramente que há algo diferente nesse miasma que estamos reunindo, Chronos deve tê-lo modificado com seu cosmo, pois ele não está respondendo a nós como deveria, o que levou a esse afastamento até o santuário e seu cemitério. Estou impressionado, ele pensou em tudo, nos mínimos detalhes.

- E vamos simplesmente ficar aqui fazendo EXATAMENTE o que ele espera que façamos? – Exaltou-se Elfo.

- Se permitirmos que Rodorio sucumba ao Miasma, haverão centenas de mortos, almas desorientadas e perdidas, podemos até tentar coletá-las, mas fazê-lo sem sermos descobertos é quase impossível, Chronos teria a vantagem. – Completou Verônica.

- Em outras palavras, estamos encurralados, se salvamos as almas de Rodorio, ele pode levar a morte os aprendizes e usar suas almas, se deixamos o vilarejo, ele teria a oportunidade de apodrecer tanto as almas civis quanto as dos aprendizes. – Seguiu o raciocínio Mist com um suspiro. – É uma situação complicada.

Porém em contrapartida ao que era dito, Verônica sorriu ardilosamente.

- Chronos sempre atua igual, subjuga seus adversários através do tempo. O tempo que levará para o miasma atingir o Partenon, e as consequências que isso terá ao longo das horas, o sofrimento e a angustia parcelada em minutos, é assim que suas estratégias funcionam. Porém esse tempo também nos dá brechas para atuar, encontrarmos por nós mesmos o Tempo Oportuno para agir. – Sentenciou abrindo seus olhos – Essa é a fraqueza desse deus, os segundos da oportunidade, os milésimos de uma boa ideia. Por isso ele fez o que fez com meu pobre companheiro de templo. Pobre Kairos~. Porém onde quero chegar é: Chronos aguarda que o miasma faça seu trabalho atingindo os aprendizes e cause o caos, afinal, a excelência suprema da Guerra consiste em destruir a resistência do inimigo sem lutar. O que temos que fazer agora é seguir nossas ordens aqui em Rodorio, como ele espera que façamos, enquanto, por outro lado, atuaremos completamente fora das expectativas dele, com uma ação inesperada e oportunista. Quando formos atacar, temos que cair como um raio!

- Faz sentido – Concordou Mist, embora Asterion parecia ainda ter suas dúvidas – É uma boa linha, e acho que já li algo parecido num livro de estratégias...

- Aaah sim, Sun Tzu* de Libra era um sujeitinho ardiloso, se eu tivesse escrito o que ele escreveu em minha primeira vida, teria sido mais lembrado historicamente do que ele e Maquiável juntos! Meu erro foi apostar apenas nos ensinamentos oratórios, e meus incapazes alunos não tiveram a decência de anotar minhas ideias! Definitivamente não tive a mesma sorte que meu amigo Sócrates e seus aprendizes.

- Espera um pouco ai! Você conheceu Sócrates?! – Exaltou-se de vez Elfo, saindo completamente de sua posição de vigília.

- Mas é claro! – Afirmou, mostrando-se levemente ofendido – Eu era um professor de estratégia na antiga Grécia, até que eu cometi suicídio enforcando-me numa árvore, pelo desgosto que o caminhar da Polis me outorgava, e até por isso não pude prosseguir para os Elísios, tive que pagar por minha pena, e na época Hades estava buscando almas capazes para servi-lo, mesmo que fossem suicidas, ladrões, prostitutas, ou o que tinha de pior no mundo, ele nos aceitava, porque sabia que aqueles que haviam estado no fundo do poço melhor poderiam lhe dizer como a humanidade realmente funcionava. Se tínhamos valor e lealdade, ele nos recrutava. Se não estou enganado, eu fui o terceiro a me “alistar”, por assim dizer.

- Terceiro?! E quem foi o primeiro?! – Seguiu exaltado Asterion.

- Mefisto, que se apresentou por vontade própria a Hades. Já eu cheguei com Caronte, pouco depois vieram Aiacos, Radamanthys e Minos, mas a diferença entre nossa chegada é tão mínima, que não posso dizer que isso é muito relevante para nós, porém para os deuses gêmeos sim significava alguma coisa, e justamente por eu ser um dos primeiros e por mais tempo conhecer Hades e o submundo, que eles me ofertaram a posição como seu servo pessoal.  Confesso que foi traição de minha parte, mas minha alma já estava muito corrompida a essa altura. – Então seu olhar se desviou para o topo de uma casa – E você, Cavaleiro, o que acha da minha história?

Mist e Asterion se exaltaram, virando-se para a mesma direção que Verônica, vendo como Máscara da Morte os observava descaradamente, semi-deitado no telhado, com o cotovelo sobre as telhas e o rosto apoiado nas costas de sua mão.

- Desde quando você está aí?! – Quis saber Elfo.

- Asterion, seu idiota, você se desconcentrou de sua função! – Irritou-se Mist, porém sem deixar de criar suas ventanias.

- Naaah, eu senti quando vocês chegaram, reconheceria um espectro mesmo em outro planeta, mas eu confesso que foi difícil encontrá-los no meio desse miasma estranho, ainda mais com a proteção desse daí. – Apontou para o telepata – Mas o velho Mist tem razão, você se desconcentrou e deixou uma pista boa o suficiente para eu seguir e conseguir pegar o final da história. Muito boa por sinal, eu até me acomodei melhor para ouvir, daria um folhetim de segunda – Dito isso,  sentou-se depois saltar do telhado e cair graciosamente no chão – Mas estou curioso – Voltou-se a Vêronica – Como sabia aonde eu estava? Até aquele cabeça quente do Ikki não sentiu eu me aproximando da última vez que esteve aqui*.

Quanto a isso, o francês sorriu com picardia.

- Eu reconheceria um cavaleiro de câncer mesmo em outro planeta.

Máscara da Morte se limitou a rir pelo comentário.

- Poiis então meu belo cavaleiro – Seguiu Verônica com charme, piscando sedutoramente, mesmo que em momento algum parasse seus tremores de terra. – Você ter nos encontrado é ou não um problema?

- Isso depende – Respondeu o italiano com um sorriso ladeado, caminhando normalmente apesar da estabilidade da terra e o vento que ondulava seus cabelos curtos, e não dando importância ao fato de que Asterion agilmente se posicionou mais à frente de Mist e Verônica, assumindo postura ofensiva, claramente dizendo que atacaria se fosse necessário. – O que vocês estão fazendo exatamente?

- Aaaah, amor, é uma looonga história, tem certeza que quer saber?

O mais velho deu de ombros.

- Ainda temos tempo – E com isso simplesmente se jogou no chão, em pose de lótus, esperando calmamente, próximo ao espectro.

Elfo hesitou, mas com um gesto afirmativo de cabeça, Nasu pediu que ele relaxasse, e voltasse a sua posição anterior, impedindo que mais alguém se aproximasse.

- Por onde quer que eu comece, meu bem? – Questionou com uma piscadela.

- Vamos do começo. O que aconteceu entre Shun e Athena no Castelo de Heinsteim? Ainda estamos no escuro por aqui, o que não é nem de longe um bom sinal.

Quanto a isso, o francês suspirou dramaticamente.

- Pois, exatamente...O que houve foi-

Porém as palavras morreram em sua boca quando uma intensa explosão sacudiu ainda mais Rodorio, proveniente do santuário.

- Esse cosmo...É sem dúvida de Muh de Áries – Analisou seriamente Mist – Embora não pareça em nada com o cosmo calmo e neutro que conheci*

Asterion também tinha a mesma impressão, mas mantinha-se quieto para não falhar novamente em sua barreira telepática.

- Eu não sei quanto a Áries, mas esse segundo cosmo... – Seguiu Verônica, interessado, enquanto Máscara da Morte franzia a expressão com ligeira apreensão. -... Manigold já reencarnou?

- Já – Foi a resposta direta de câncer – Mas ele é apenas uma criança de dez anos, então não se aproxime dele. – Terminou em tom ríspido de aviso.

O espectro fez um muxoxo descontente.

- Eu posso ser muitas coisas Câncer, mas pedofilo não é uma delas, eu posso esperar, sou alguém paciente~

- Fique. Longe. – Um arrepio correu a espinha de Mist e Asterion pelo claro tom de ameaça, cosmo ameaçador e um suave brilho psicopático nos olhos do cavaleiro, porém Nasu não se imutou.

- Claramente você está preocupado com o pequeno Gold, não sabe disfarçar Cancerzinho. Então vou te dizer uma coisa para acalmar seu coraçãozinho, mesmo sendo um cavaleiro de Câncer, tão ligado a morte e aos mortos, você também tem suas limitações, todo esse ambiente de miasma alterado que Chronos criou pode te confundir, mas eu posso dizer com toda a certeza que um seikishiki foi aberto segundos antes do impacto da explosão. Então o garoto está bem.

A postura do mais velho suavizou-se, porém, sua expressão seguia franzida.

-  E eu deveria confiar em você?

- Não, confie nesse menino, se ele é metade do magnifico que era em sua anterior vida, está sã e salvo. – Então levou uma das mãos, antes no chão, para seus cabelos, lançando-o para trás – Ninguém que me matou com tanta graça pode ser morto tão facilmente, mesmo sendo uma criança.

 - Fala como se você fosse grande coisa – Provocou com ironia.

Mas ao invés de irritar-se, Verônica sorriu mais.

- Mon chéri, amor próprio é tudo – Então voltou ambas as mãos ao chão, a igual que Mist, sem jamais deter seu labor – Agora, quanto ao que houve no castelo...

E se pôs a explicar calmamente o desentendimento entre ambas as divindades humanas, ocorrido horas atrás.

-.-.-.-

Enquanto Byaku de Necromante deixava a ala hospitalar B para dirigir-se até a A, onde Minos estava com Arthur, a expressão de Athena seguia contraída, pela grande grosseria que o espectro havia lhe demonstrado.

Porém, lançando um olhar lateral a Seiya, deixou isso de lado, haviam coisas mais importantes a serem tratadas.

Então algo lhe ocorreu, enchendo seu coração de preocupação, vendo um relógio de bronze colgado na parede.

- Onde está June? A festa no outro salão já terminou, eu pedi para que ela me ligasse quando isso acontecesse para que ela não voltasse para nossos aposentos sozinha. – Declarou aflita, não via sua querida secretária há quase duas horas.

- Senhorita Athena – Finalmente Suikyo deu um passo adiante – Enquanto nos separamos, eu ouvi alguns criados do castelo dizendo que a senhorita June se encontrou com o Imperador do submundo e ambos se envolveram numa discussão.

Imediatamente a expressão de inquietação da deusa aumentou, levando a mão ao coração.  Sentindo-se culpada por ter deixado a jovem desprotegida, mas em meio a todas as emoções das últimas horas, sem querer isso acabou passando para segundo plano.

- No entanto – Seguiu o cavaleiro de prata – Pelo que ouvi, ela está bem, mas o imperador se retirou ao submundo.

- Pobre June – Lamentou a deusa com pesar - Deve estar arrasada...Precisamos achá-la! As palavras de “criados” de Shun não me dão qualquer segurança. 

Suikyo nada mais argumentou, o “criado” em questão que havia lhe revelado essas coisas era Minos, mas confessar isso não aliviaria a deusa, todo o contrário. Ao menos referir-se ao seu meio irmão como um simples membro da criadagem, trazia um pequeno prazer perverso ao seu ser, ajudando a acalmar-se e evitar de enfrentar a deusa, Saga tinha razão, isso só pioraria tudo.

- Minha deusa – Foi a vez de Saga tomar a frente, sabendo que a divindade não escutaria Shiryu, que Suikyo estava em completo desacordo com ela, Seiya não parecia disposto a falar nada e que Suite dificilmente contradiria Athena, restava a ele tentar diplomar e direcionar as ações sobre o que fazer a seguir.

Querendo ou não, sua experiência como Grande Mestre seria de alguma ajuda como mediador.

- Saga – Ela deu sinal positivo para que continuasse.

- Eu entrei em contato, telepaticamente, com meu irmão, e ele me confirmou a versão de Dohko. As partes inferiores do santuário estão sendo tomadas, aparentemente, pelo mesmo miasma que, conforme nos foi contado quando ressuscitamos, conseguiu controlar Marin há mais de vinte anos. – Explicou calmamente, mas com gravidade – Conforme meu irmão me explicou, nesse momento ele, Shura e Julian estão lutando com Ban, Ichi e Nachi que perderam completamente o controle sobre si mesmos. Além disso, Aioria, Muh, Piada Mortal, Camus, e agora Máscara da Morte, Afrodite, Hayata, Irekuha e Hyoga estão desaparecidos.

- Hyoga? – Repetiu a deusa, apertando com ainda mais apreensão seu peito.

- Meu mestre desapareceu? – Seguiu Suite com preocupação.

- Pode ser que o Miasma esteja atuando de modo a dificultar a identificação do cosmo e comunicação – Completou Suikyo com conhecimento de causa – Então não significa necessariamente que os desaparecidos estejam...- hesitou – Muito feridos.

Athena confirmou, minimamente mais aliviada, sentindo como a amazona de Pégaso colocava a mão sobre seu ombro em modo de apoio, agradecida, levou a outra mão para agarrar a da jovem.

- Entendo.

- E infelizmente, como já deve saber – Seguiu Gêmeos com pesar – Milo e Kiki estão mortos.

A deusa confirmou com a cabeça, com tristeza, então voltou-se a Taça.

- Suikyo, você esteve com Soleil, não esteve? – O ex espectro engoliu em seco, pensando se deveria responder ou não – Tudo bem, eu não vou te condenar por isso.

- Sim, minha deusa.

- Ele já sabe o que aconteceu?

- Infelizmente sim.

Ela confirmou com a cabeça.

- Eu ainda custo em acreditar que Soleil era um espectro esse tempo todo – Interrompeu novamente a amazona – Mas independente disso, pobrezinho, tinha um verdadeiro amor pelo senhor Milo, qualquer um podia ver isso, era como se fosse seu tio.

- Acredito que ele foi sincero quando rogou por Milo, então quando tudo acabar, permitirei que ele participe do enterro, mas essa será a última vez que ele retornará ao santuário.  – Declarou a divindade, Suite olhou com tristeza para a decisão de sua deusa, mas nada disse.

Mais atrás, Shiryu suspirava internamente, uma vez que não se metia no diálogo, sua deusa parecia muito mais acessível, quase recordando aquela devota Athena de mais de vinte anos atrás. Teria que confiar em que Suikyo, Suite e Saga continuariam a saber como lidar com essa nova faceta de Saori sem sua ajuda. 

Nesse momento, uma voz ecoou na mente de todos.

“...-Peço perdão pela demora, estou indo imediatamente para a Alemanha para trazê-los de volta ao santuário.” – Soava a voz solene de Shion.

“-Mestre, o senhor está bem?!” – Incapaz de se conter Aiacos questionou, uma vez que soube, através de Shiryu, que algo havia deixado o lemuriano inconsciente.

“...Estou bem, não se preocupe Sui, conversaremos melhor quando eu chegar” – Respondeu individualmente em tom muito mais suave e gentil.

Isso fez um grande alivio tomar o coração do ex espectro, tinha tanto apreço por Dohko e Shion por tudo que haviam feito por ele e seu irmão, quanto Soleil tinha por Milo e Camus, por isso, testemunhar a dor do capricorniano ao ter perdido alguém tão importante de forma tão abrupta, o fez temer que pudesse passar algo assim com seus mestres também.

Já seria doloroso o suficiente perder seu irmão, quando a hora chegasse.

- Precisamos imediatamente encontrar June – A voz de Saori tornou a soar depois dessa interrupção – Seiya, você consegue se levantar?

Não houve qualquer resposta do sagitariano, mesmo depois que Suite se separou de sua deusa, permitindo que esta chacoalhasse suavemente o ombro de seu pai.

Simplesmente parecia que o dourado havia dormido de olhos abertos.

- Eu não entendo, Suite, você me disse que ele estava bem, e conversando, mas parece que ele voltou ao estado que estava quando a Espada de Hades o atingiu – Voltou-se aflita a Amazona – Tem certeza que aquele espectro não fez nada para ele?

- Tenho minha deusa – Confirmou a jovem com tristeza – Eu estava conversando com meu pai, pouco antes da senhora ou de Fausto entrar, eu comentei que estava preocupada com o vilarejo de Rodorio e com minha tia Seika, e desde então ele ficou assim... Me perdoe, mas eu não acho que possamos tirar meu pai daqui agora, mesmo sendo um espectro, as palavras daquele médico têm fundamento, pode ser muito perigoso para ele e até causar efeitos colaterais.

- Eu concordo com Suite, minha deusa – Seguiu  Aiacos – É muito arriscado.

- O melhor, no momento, é que Seiya permaneça aqui – Seguiu Saga.

Shiryu absteve-se de comentar, mesmo que estivesse a favor, sua atenção, na verdade, havia se desviado para outro lado. Devido aos seus sentidos extremamente aguçados, foi capaz de sentir um movimento peculiar do outro lado da porta, um som escorregadio e grosseiro, porém baixo demais para qualquer outro escutar.

  - Não podemos simplesmente deixar Seiya para trás! – Exasperou-se Saori, passando suavemente a mão sobre o rosto de seu antigo protetor.

- Eu ficarei com ele – Imediatamente a amazona se prontificou – E buscarei pela senhorita June.

- Quanto a isso eu discordo – Gêmeos tornou a se intrometer – Pégaso sempre foi nosso grande trunfo, não seria sábio guerrearmos com os únicos Pégaso que possuímos presos aqui. Seria uma baixa muito grande. Eu ficarei.

- Saga, você também seria um desfalque importante – Seguiu Suikyo – Talvez seja melhor eu-

- Não – Cortou o geminiano, observando com gravidade todos os presentes, com exceção de Shiryu. – Sinceramente, é humilhante para um cavaleiro de ouro como eu confessar isso, mas eu tenho medo de retornar ao santuário nas condições que ele está agora.

- O que quer dizer Saga – Questionou Athena, franzindo a expressão.

- Eu não quero parecer covarde minha deusa – Seguiu, baixando a cabeça – Porém se o miasma tem a capacidade de atingir nossa mente e influenciar nossas ações ou até mesmo nos tirar o autocontrole, acredito que seja mais seguro para todos se eu permanecer longe disso. Por isso, creio ser melhor que seja eu aquele a ficar com Seiya e a senhorita June.

Um silêncio incomodo se formou após esses dizeres, sob a compreensão do que as palavras de gêmeos significavam, trazendo à tona o tabu da batalha do santuário e como a insanidade do cavaleiro da terceira casa podia chegar a ser devastadora.

-...Eu – Hesitou a deusa – Entendo Saga. Agradeço pela sua preocupação acima de seu orgulho, porém, mesmo você não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, como poderia buscar June e cuidar de Seiya?

Novamente a conversa foi interrompida, dessa vez por Shiryu, que embora não tenha dito nada, deu alguns passos para o lado, chamando a atenção de todos pelo repentino movimento, mas antes que qualquer pergunta fosse feita questionando a ação, a porta do cômodo se abriu, deixando claro que Libra já sabia que alguém iria entrar, e para tanto, liberou a passagem.

A figura era alta, rosto sereno, mesmo que mostrasse clara preocupação, seus olhos eram rosados e seu cabelo até o ombro, de cor lilás.

- Sorento! – Exclamou Athena ao vê-la.

- Com vossa licença senhorita – Inclinou-se em respeito o Marina, falando em seu tom suave característico – Eu gostaria de saber qual o estado de Seiya, e se vocês precisam de alguma ajuda de nossa parte, ainda estamos nos reorganizando, nossas escamas foram muito danificadas no ataque da mansão, porém como aliados, precisamos nos ajudar mesmo fora do campo de batalha.

- Aah, Sorento, você não poderia aparecer em melhor momento – Declarou aliviada Athena – Precisamos encontrar uma companheira nossa, June, mas estamos partindo para o santuário agora...   

Enquanto Saori explicava a situação ao Marina, Saga, Suikyo e Suite foram ajudar Seiya a se deitar, os três observando interessados, de canto de olho, o recém-chegado em momento tão oportuno.

Por sua vez, Shiryu franzia a expressão com desconfiança, porém nada disse.

-.-.-

Alguns minutos se passaram até que Sorento estava ciente de toda a situação.

- Entendo -  Declarou apoiado contra a parede depois de ouvir os dizeres de Athena – Infelizmente não possuímos nada que possa impedir o miasma, mas talvez os ventos de Bian possam ajudar a afastá-los. – Ponderou calmamente – Mas o melhor seria se houvesse uma forma de condensar o Miasma ao invés de simplesmente afastá-lo. Porém penso que apenas um espectro seria capaz de fazer isso, ou talvez o próprio imperador.

- Não contamos com nenhuma dessas opções – Colocou a deusa com firmeza.

- Sim, eu entendo – Confirmou com a cabeça – Precisamos encontrar uma alternativa para isso.

- E a caixa de Pandora? – De modo repentino Saga se envolveu na discussão. – Me refiro a original.

- A verdadeira está perdida há milênios. – Respondeu Athena – Provavelmente em algum lugar do submundo.

Quando as atenções estavam em Athena e Saga, Shiryu não pôde deixar de notar que Sorento franzia a expressão com a menção do mitológico item, mesmo que talvez fosse pela simples presença de Saga em sua conversa, como se tratava do irmão gêmeo de Kanon, não faltavam razões para Sirene se incomodar em interagir com o mais velho.

- Sim, creio ser impossível encontrarmos, em um momento tão delicado, algo desse tipo. Porém, se ainda existe, provavelmente deve estar no submundo. – Contrapôs o Marina, sem se dar o trabalho de encarar o cavaleiro de gêmeos.

Saga manteve a postura, apesar do claro desprezo que logo associou as atitudes de seu irmão contra Poseidon. Não sabia exatamente porque tinha tocado no assunto, era como se algo em seu interior o tivesse instigado a fazê-lo, mas agora que trouxe o assunto à luz, teria que ir com ele até o fim, mesmo que o tema evocasse péssimas lembranças.

- Segundo a lenda diz, depois que foi aberta por Pandora, Zeus a deu a Hermes, e lhe ordenou que a entregasse para um de seus filhos, que jamais fosse capaz de abri-la novamente. – Começou por contar, com uma sensação amarga na boca.

- Isso não diminuiu muito nossas opções – Disse Sorento, enfim se voltando a Gêmeos com uma expressão de frieza.       

- Eu sei que são muitos os mitos de filhos de Zeus, mas há uma lenda na terceira casa que muito se assemelha a essa. – Seguiu o cavaleiro – Hermes é o deus que abençoa e rege o signo de Gêmeos. Ele nos deu o dom da linguagem idiomática, mas também nos deu um presente, que foi passado de Póllux e Castor até a mim e Kanon. Uma pequena caixinha, do tamanho da palma de uma mão. Em grego arcaico nela está escrito “Vós que tendes esta caixa, somente heis de abri-la quando não desejai abri-la. Quando não querei abri-la. Quando não necessitai abri-la. Álgido coração, vós conseguireis soltar a Esperança se não a esperai, e o poder maior que as divindades, submergirá o mundo. A terceira era.”

Ao fim de suas palavras, todos o observavam como suma atenção.

- Como você conseguiu decorar tudo isso? – Comentou Sorento, incapaz de conter a impressão que isso lhe causava.

O geminiano deu de ombros.

- Eu passei muitos anos tentando entender o que isso significava e como poderia abri-la para... – Engoliu em seco – Como várias gerações antes de mim fizeram o mesmo. Porém Hermes fez exatamente o que Zeus queria, nem Póllux, nem nenhum de nós teve sucesso em obter esse tal poder. Cheguei à conclusão que só poderia abri-la quem o fizesse espontaneamente, sem esperar nada por isso, como quem cumpre um pedido, o desejo de outra pessoa, mas não qualquer pessoa, alguém de “Álgido coração”. Nos antigos códex deixados por Póllux, o mesmo havia vigiado e escrito muito sobre Erisictão de Aquário* o que me fez pensar que essa seria a solução para abrir a caixa, Aquário. – Saga respirou fundo, mostrando clara decepção consigo mesmo – Eu usei de controle neural, como uma versão fraca do meu satã imperial, inúmeras vezes em Camus quando era uma criança para que ele tentasse abri-la para mim, mas quando parecia que ele estava conseguindo, ele acordava desse controle graças a sua força de vontade. Mesmo que não se lembrasse do que tinha acontecido, em seu subconsciente começou a nascer, mais forte que nos demais, a desconfiança para comigo, por isso decidi afastá-lo do santuário para treinar aprendizes quando pude, mesmo com tão tenra idade.

Todos olhavam entre surpresos e horrorizados, mesmo Shiryu, que nunca tinha escutado tal confissão, mas com isso conseguia compreender um pouco mais as ações de Aquário durante a batalha das doze casas.

- Enquanto Camus estava longe, eu consegui convencer a mim mesmo que aquilo era uma insanidade, que não havia nada dentro daquela caixa e aos poucos fui me esquecendo dela, me obrigando a esquecer. Porém eu lembro que os mitos diziam que a Caixa de Pandora poderia liberar um grande poder, como também conter um grande poder, por essa razão esse é o nome que damos as urnas de nossas armaduras. Se conseguíssemos abrir essa caixa, poderíamos conter o Miasma, talvez até mesmo Chronos.

- Poderíamos ter tentado usar isso contra Hades.– Ponderou Athena, deixando seu estupor – teríamos evitado muito da Guerra Santa.

- Seria completamente inútil, minha deusa- Negou o geminiano sem erguer a face – Eu pensei sobre isso, mas não teria utilidade, a própria Pandora pertence ao submundo, ela conseguiria abrir sua própria caixa sem qualquer problema, libertando Hades novamente.

Nenhum dos dois tocou o tema de fazer isso com Poseidon, para não reiniciar um conflito, uma vez que um marina estava presente.

- Mas nada nos garante que Shun ainda mantenha Pandora – Concluiu Saori com um sorriso – Pode funcionar.

Gêmeos levantou o rosto, surpreso.

- Não, minha deusa, não acredito que isso seja-

- É impossível abrir a Caixa de Pandora sem sua chave – Intrometeu-se bruscamente Sorento, num tom muito mais rude e exasperado do que seria esperado de sua pessoa – Alguém que sofreu com todos os males do mundo, presentes na caixa, como Pandora, apenas seria capaz de romper o selo que Hermes e Zeus impuseram, mas somente o sangue de Pandora ou a chave original poderiam abri-la.

- Como sabe de tudo isso? – Shiryu atreveu-se a perguntar, também se recuperando da confissão de Saga.

-... Eu – Hesitou – Muito li sobre as antigas lendas, é verdade que não conhecia sobre essa segunda parte que o cavaleiro de gêmeos mencionou, mas sei que a caixa foi trancada para que não voltasse a ser mal utilizada.

- Não há garantia que seja a caixa real, não me vale a mal Saga – Em resposta o geminiano apenas negou com a cabeça - Não podemos levar isso como nosso plano principal, Senhora Athena, como senhor Sorento disse, ainda precisaríamos da chave– Intercedeu Suite calmamente.

A deusa virgem suspirou longamente.

- Tem razão Suite, mas por um minuto eu pude vislumbrar um brilho de esperança, afinal, foi o que restou dentro da caixa, não é? – Comentou ela sorrindo para sua amazona. – Ainda assim, obrigada Saga pela sua sugestão, deve ter sido difícil confessar sobre isso.

O mais velho se limitou a confirmar com a cabeça, sentindo a garganta seca e um arrependimento de ter mencionado tal assunto, mas a confissão parecia simplesmente ter saltado de sua boca.

Por outro lado, Suikyo possuía uma expressão distante e indecifrável, seu coração batendo dolorosamente em seu peito, enquanto sentia um contraditório alívio sobre o plano de aprisionar o imperador na caixa de pandora ter sido descartado.

Ao menos, por enquanto, duvidava que sua deusa esqueceria isso tão facilmente.

-.-.-       

Shion assim que chegou a entrada do castelo, foi recebido por ninguém menos que Minos de Griffon, que havia se dirigido ao primeiro grande salão do castelo para se reunir com os demais espectros em sua busca por Hécate. Ao sentir a presença do cavaleiro nos jardins, foi imediatamente à sua presença.

Ao vê-lo, o lemuriano franziu a expressão.

- Shion de Áries – Declarou o juiz abrindo as enormes portas de carvalho e dando passagem para o ex cavaleiro – É uma honra recebê-lo, se não me falha a memória, a última vez que esteve aqui foi quando seu velho mestre morreu para selar Hypnos numa réplica fajuta da caixa de Pandora. – Colocou com grande ironia e provocação.

Em resposta, apesar das péssimas lembranças que aquele lugar realmente trazia, o ex Grande Mestre se limitou a sorrir de lado.

- Alguém deve ter te contado essa parte, porque que eu me lembre, Albafica já tinha te matado a essa altura da Guerra. – Respondeu em tom educado, o que em efeito oposto apenas intensificou o deboche de suas palavras.

Foram segundos inteiros de olhares frios e desafiantes, até que Minos ergueu sua mão direita, para chamar a atenção dos espectros reunidos um pouco mais atrás, e que observavam tudo expectantes de um confronto iminente. - Myu, Sylphid, levem ele até os aposentos de Athena, e certifiquem-se que eles deixem esse Castelo o quanto antes.

- Sim senhor! – Responderam ambos se aproximando, mesmo Sylphid não hesitou em obedecer, mesmo sempre tendo feito parte do exército de Radamanthys, Minos era o único juiz e comandante agora.

- Obrigado pela hospitalidade.

Sem trocar qualquer outra palavra com o norueguês, o antigo Grande Mestre se deixou conduzir.

-.-

-Muito bem Athena,  eu dou minha palavra que encontrarei essa ex Amazona chamada June e a deixarei em segurança – Declarou o Marina, saindo do quarto.

- Obrigada novamente Sorento.

Dito isso, ele fez um último cumprimento em respeito e fechou a porta as suas costas.

Não precisou andar muitos passos pelo corredor quando duas figuras, vindo de um salão lateral se juntaram a ele.

- Como foi, Prometeu? – Questionou a jovem ruiva. Queen.

- Eles não desconfiaram de você? – Seguiu o alto homem moreno, de compridos cabelos. Gordon.

Deixando suas preocupações sobre a caixa de Pandora de lado, o titã disfarçado se permitiu sorrir.

- Athena não, e isso é o que importa, enganar deuses sempre foi minha especialidade, além disso, eu já havia me passado por esse músico na Mansão de Poseidon, então foi muito fácil – Alerdou com um sorriso galante, que se destacou ainda mais estando com aparência cavalheiresca de Sorento.

- Sim, você é realmente muito bom em roubar identidades – Elogiou a jovem enrolando uma mecha de cabelo em seu dedo indicador – Nem Satevis de Serket, faria algo tão convincente.

- Obrigado senhorita, você é muito gentil – Respondeu cortesmente voltando ao personagem e lançando uma piscadela para a mais jovem.

Em contrapartida, Gordon revirou os olhos, cruzando os braços contrariado. 

Em meio ao caminho, porém, o grupo se deparou com outro trio que vinha da direção oposta. Shion, Myu e Sylphid vinham em direção aos aposentos da deusa.

Ambos os grupos pararam em meio ao corredor, Shion estava claramente incomodado em ser guiado por dois espectros, porém isso passou para segundo plano quando ficou frente ao Marina e dois outros espectros.

- Você deve ser Shion, o antigo Grande Mestre do Santuário – Prometeu se aproximou com cortesia, esticando a mão, enquanto o outro o encarava de cima a baixo com desconfiança – Eu sou Sorento de Sirene, é um grande-

- Não, você não é. – A resposta brusca surpreendeu o titã e os demais espectros, mesmo os que acompanhavam o lemuriano sabiam da real identidade do suposto servo de Poseidon. – Você não tem, nem de longe, a aura que um Marina possui.

Porém, apesar dos prognósticos, o titã não perdeu a pose.

- Você fala como se fosse um especialista.

- Talvez eu seja – Contrastou.

Os servos do submundo já estavam aflitos com o desenvolver do peculiar encontro, porém Prometeu parecia apenas estar se divertindo.

- Interessante. Pois bem, senhor Shion, talvez o senhor tenha razão, ainda assim não sou inimigo, sou apenas um aliado prestando meus serviços de substituição para alguns amigos ocupados – Deu alguns passos para a frente, até ficar lado a lado com o ariano – Mas eu sei muito bem reconhecer um mentiroso, também está escrito nos seus olhos que você está escondendo algo importante.

Quanto a isso Shion se desconcertou, mas Prometeu seguia sorrindo.

- Sabe, você me lembra alguém que um veeelho conhecido me descreveu uma vez. - Aproveitando-se do estupor, tomou a mão do lemuriano, forçando-o a cumprimentá-lo. – Boa sorte com sua encenação, senhor Shion!

Desse modo simplesmente saiu caminhando, deixando para trás um lemuriano um tanto aturdido. Por sua vez, Gordon e Queen trocaram olhares confusos com Myu e Sylphid, antes de continuarem seguindo o cantarolante titã.

-.-.-.-    

- Ainda que seja assim, quando voltarmos Saga, quero que você me mostre essa caixa – Seguia Athena do lado de dentro do quarto.

- Sim...Minha deusa - Confirmou Gêmeos tentando ocultar sua insegurança.

-...Eu vou esperar o mestre lá fora, com licença – Sentenciou Suikyo de cabeça baixa.

- Tenha cuidado – Foi a resposta simples da divindade e começou a falar com Suite novamente sobre Seiya.

- Eu irei lavar meu rosto, se não se importar Athena – Saga também pediu licença e com um aceno de cabeça Saori deu-lhe permissão.

A Pégaso lançou um olhar rápido ao geminiano, um tanto preocupada vendo como ele abria e fechava a porta do banheiro, abalado.

- Pobre senhor Saga, deve ser difícil carregar um passado desses nas costas – Comentava ela.

Shiryu ponderou em seu lugar por alguns instantes, até que decidiu seguir o cavaleiro de prata.

O encontrou apoiado contra a parede, ambas as mãos cobrindo o rosto, num claro sinal de exaspero,

- Suikyo.

O menor sobressaltou-se ao ser chamado mesmo em tom tão suave, mas não mudou de posição.

Em contra partida, Shiryu sorriu com carinho, caminhando e encostando-se ao lado do ex espectro.

- Sabe – Continuou – Mesmo com o passar dos anos, você não mudou, quando está nervoso, ansioso ou preocupado, você se afasta, como fez quando se tornou cavaleiro de prata, lembra?

-….Sim – Foi sua resposta sufocada.

- ....- Dragão levou a mão ao ombro do mais novo e continuou, dessa vez, numa conversa mental.

“-Está preocupado com essa história da caixa de Pandora? Ou melhor, está preocupado com o Imperador?”

Aiacos destapou o rosto devagar mostrando seu semblante aflito.

“...-Por favor, não me mal interprete... Eu só, eu só...”- Engoliu em seco, sem saber como continuar.

“-Te notei muito distante depois que você deixou Soleil. Associei que era pela ...- As palavras, mesmo mentalmente, soavam ásperas em sua cabeça - Por causa da morte dos nossos companheiros. De certo modo, eu me surpreendi que você resolveu voltar para nós, porém, ainda pode mudar de ideia e voltar.”

- Não é isso! – Exaltou-se, falando em alta voz, para então envergonhar-se, respirar fundo e continuar.

“ ...– Eu não quero voltar, mas acontece que antes de deixar Soleil, encontrei-me com Minos, e ele me disse algo que eu não posso ignorar. “

“-E o que seria?” – Perguntou interessado.

Foram segundos inteiros até que Suikyo de Taça começou a confessar.  

 “...- Ele acredita que Shun seja, em suma, uma parte da alma do senhor Hades que foi dividida por Hécate e os deuses gêmeos depois da primeira Guerra Santa contra Athena. Desde esse acontecimento, notamos que o imperador estava diferente, parecia...vazio ” – Confessou de uma única vez – “Minos garantiu que Shun guarda muito das características que o senhor Hades possuía no princípio dos tempos e que parecem ter se perdido. Eu sei que os cavaleiros tem uma visão sumamente maligna do senhor dos mortos, mas...” – Mordeu o lábio inferior – “...Mas Senhor Hades era...”

“-Um deus justo e neutro, acima de tudo” – Seguiu Shiryu, impressionando Aiacos, que voltou-se desconcertado para o ex Grande Mestre “-Chamado de Eubuleu, aquele que dá bons conselhos, um deus que evitava o conflito a todo custo, sem casos de milhares de amantes, sem histórias de vingança egoístas, comparado com os outros deuses do Olimpo, Hades mais parecia um velho ermitão focado apenas em sua “pequena” ermida.” - Ao ver o completo desconcerto de Aiacos, acrescentou - “Eu li todo o material que existia do submundo, no santuário, a grande maioria estava carregada de ódio e más impressões, frutos da guerra, mas ironicamente, o Grande Mestre que sucedeu Sólon de Áries, foi um canceriano que teve o bom senso de reunir e guardar, como seu antecessor, os antigos escritos e impressões sobre Hades e mesmo Poseidon antes das Guerras Santas. Poseidon sempre foi essa figura tempestiva, imprudente e passional, porém o Hades diverge muito, do que era para o que passou a ser, então sim Suikyo, eu concordo com Minos. Meus estudos também me fizeram chegar a essa mesma impressão, Shun se parece muito mais com a figura relatada nesses antigos mitos, do que o próprio Hades.”

“...-Mas se isso...Isso for verdade, mesmo que sob outra identidade, o senhor Hades não estaria morto, não teria sido destruído como todos pensávamos, o “novo” senhor do submundo, nada mais seria que um título vazio. Sempre houve e sempre haverá apenas um imperador das trevas” – Concluiu Suikyo com assombro.

“-Você pode ver por esse lado, mas eu ressaltaria que, mesmo sendo a mesma alma, à essa altura, Shun já desenvolveu a própria personalidade.” – Foi a resposta do chinês. “-Mas conhecendo-o, duvido que qualquer espectro acharia as mudanças negativas. É verdade que ele se tornou muito mais severo, manipulador e frio, mas sinceramente, meu eu de vinte anos atrás, também não acreditaria no que o eu de hoje já foi capaz de fazer às costas de Athena. Então não estou em posição de julgar suas mudanças”

“...- A questão é, tendo mudado ou não, em essência, Shun é Hades.” Completou o raciocínio o ex juiz, sua expressão mostrando completa consternação “ Uma coisa é que eu dê as costas a uma pessoa que julga ser digna do trono que Hades criou com seu próprio sangue, e outra muito diferente, é eu dar as costas ao deus que dediquei minha alma e todas as minhas reencarnações por milênios. Que eu esteja dando as costas ao próprio senhor Hades...É...”

Suas palavras morreram, fechou os olhos com força, e com suas mãos abraçou os próprios ombros.

“...- Me perdoe Grande Mestre, me perdoe, por favor, mas ao mesmo tempo que eu me sinto um traidor, da mais suja espécie ao meu senhor Hades, eu também me sinto sujo e ingrato de dizer tais palavras ao senhor, depois de tudo que fizeram por mim e meu irmão, eu não deveria duvidar, mas eu...Eu não consigo simplesmente ficar quieto e indiferente sabendo que Athena planeja selar de forma definitiva, nem que seja apenas uma parte da alma, do senhor Hades!”

Voltou-se diretamente ao grande mestre, revelando uma expressão extremamente agoniada, seus olhos estavam inchados, mesmo que não estivesse chorando.

Esperava todo o tipo de reação do libriano frente ao seu desabafo, menos a que recebeu.

Shiryu o segurou por ambos os ombros, como quando era criança, e sorriu.

- Tenha calma, nosso pior inimigo sempre será nós mesmos, nossos medos, desconfianças e cobrança. Guarde suas preocupações para quando ficar mais velho, você só tem vinte anos. – Disse em alto e bom tom.

- M-mas eu... – Desconcertou-se frente ao gesto, piscando sem entender.

“-Suikyo, ainda me considera o Grande Mestre apesar de tudo?” – Perguntou com simpleza.

“...- Mas é claro!” – Exaltou-se.

“-Então te darei uma última ordem. Avise Minos sobre essa caixa de Pandora, que o submundo se prepare para o caso dessa situação acontecer.” – Frente a expressão espantada de Aiacos, acrescentou - “-Acima de tudo, Shun é meu irmão, então, por favor, faça isso por mim. Você não está traindo nenhum dos lados, se apenas seguiu a ordem do Grande Mestre, certo?”

Suikyo piscou, comovido, uma única lágrima percorrendo sua face.

- Obrigado, Grande Mestre...

Não houve tempo de recuperar a compostura, pois quando Shion presenciou a cena de seu discípulo enxugando seu próprio rosto, apressou-se a encontrar a dupla, deixando os espectros que o guiavam atônitos com a repentina corrida.

Cumprimentando o recém chegado sutilmente, Shiryu voltou ao quarto para avisar a todos da chegada, deixando o lemuriano a sós com o cavaleiro de prata, agindo muito mais como um pai preocupado, do que um mestre rígido.

-.-.-.-.-    

Enquanto Shiryu e Suikyo conversavam, Saga jogava água gelada contra seu próprio rosto, vendo-a escorrer por sua face pálida através do espelho.

Seus pensamentos vagavam sobre o que havia revelado a Athena e os outros. A caixa de Pandora de gêmeos era um assunto espinhoso, que por anos tentou se convencer que não passava de histórias e boatos ocos, fantasias sobre uma caixa emperrada que jamais se abriu.

Afinal, haviam outras caixas assim no santuário, além das urnas, que também eram chamadas de “caixas de Pandora”. Hakurei, irmão gêmeo de Sage, um dos antigos Grandes Mestres, até mesmo tinha usado uma delas para selar Hypnos e Thanatos, mas a caixa foi facilmente aberta por Pandora depois.

Que garantia tinha de que aquela não era o mitológico item, que cumpriu sua função e desapareceu do mundo.

- ...Não existe isso de caixa “original”, eu tenho que me retratar a Athena... – Sussurrou para si mesmo, buscando uma toalha.  

-    A caixa de Pandora contém Élpis dentro dela, a deusa da esperança. Se for aberto e não tiver nada dentro, é porque não é a caixa real, simples assim meu pequeno Adônis geminiano – Descendo a toalha que enxugava sua face, Saga encarou com choque e horror como seu reflexo no espelho conversava consigo, com um sorriso ladeado que roçava o sedutor. - Você continua tão lindo quanto sua primeira reencarnação, sabia?

-.-.-.-

Sob as orientações de Dohko, Albafica e Jabu guiavam Shunrei até a casa de Afrodite e Ersa. Todo o trajeto pelas doze casas foi silencioso. Trocaram poucas palavras com Aldebaran, que ainda buscava sinais de Muh e Piada nos destroços da casa de Áries, e seguiram pelo caminho mais longo até Rodorio.

Albafica, apesar de sempre quieto e centrado, não pôde deixar de notar que o escorpiano parecia decididamente distante, o que era um péssimo detalhe numa missão de escolta.

- ...Senhor Jabu – Chamou com respeito, mas foi completamente ignorado. - ...Senhor?

- Por Zeus – Resmungou depois de alguns segundos – Eu mal fiz quarenta ainda, não me chame de senhor.

- Jabu – Seguiu em seu tom frisante – Preste atenção no caminho, por favor, estamos numa missão importante.

- Siim, claro! – Exclamou com sarcasmo evidente – Milo e Kiki morreram, e ao invés de estarmos lá ajudando na guerra, estamos AQUI, escoltando.

Os passos atrás de si se detiveram, exigindo que ambos fizessem o mesmo, Shunrei estava parada, de cabeça baixa, e semblante triste.

-... Eu lamento ser um peso num momento tão difícil.

Antes que o japonês pudesse responder, o pisciano lhe lançou um olhar de puro reprove, voltando-se para a chinesa com um tom suave.

- Você não é um peso de forma alguma Mama*, você é tão importante para o santuário quanto o Grande Mestre, exatamente por isso que, se algo te acontecer, todos se sentiriam aflitos, porque você foi a mãe que muitos não tiveram por aqui. Chronos é um inimigo sujo, não há dúvida de que seria capaz de feri-la apenas para nos atingir.  

A chinesa sorriu muito brevemente com seu semblante pálido quase enfermo, desde o sumiço de seu filho mais velho, ela se mostrava muito fragilizada.

Vendo-a de canto de olho, Unicórnio suspirou longamente, para então virar-se e ficar frente a frente com ela, para então inclinar o corpo em noventa graus, num pedido japonês de desculpas.

- Me perdoe pelo que eu disse Senhora Shunrei – Respondeu em tom morto – Eu não quis dizer isso, eu só...- Mordeu o lábio inferior com força – Estou nervoso com tudo que aconteceu... Eu não consigo entender, simplesmente não consigo compreender como Milo e Kiki puderam perder para o inimigo!

Apertou seus punhos com força, lágrimas de frustração acumuladas em suas íris, sem cair.

- Há vinte anos eu venho tentando me redimir pelo dia que perdi a chance de ser seu discipulo, eu treinei incansavelmente para ter o nível de um cavaleiro de ouro, e agora ele... Eu sou o único no santuário capaz de herdar a armadura de escorpião, mas eu não posso aceitar desse modo! Sem a aprovação dele não faria sentido! – Então as primeiras lágrimas surgiram, escassas apesar do aperto que carregava – E Kiki...Aquele maldito do Kiki! Nossas lutas estavam 110 vitórias para ele e 80 para mim, não posso simplesmente aceitar a derrota desse jeito!

Duas suaves mãos envolveram as maçãs de seu rosto, sutilmente guiando sua face para cima, Shunrei chorava silenciosamente, mas seu sorriso era amoroso e compreensivo.

- Eu sei, eu acompanhei Kiki crescendo nesse santuário, e sem Milo jamais teríamos conseguido concretizar o Partenon, trabalhamos muitos anos juntos e...- Ela respirou fundo - ...O Santuário simplesmente não será o mesmo sem eles, todos que estão caindo nessa batalha, serão cicatrizes que levaremos para o resto de nossas vidas.

Jabu confirmou com a cabeça, e assim que aquelas suaves mãos o soltaram, levou grosseiramente a manga de suas roupas até os olhos e os esfregou para ocultar qualquer marca de hesitação.

- Realmente me desculpe pelo que disse senhora Shunrei, você definitivamente não é um peso para ninguém aqui – Confessou, desviando o olhar.

- Tudo bem, obrigada por suas palavras. Você também pode me chamar de Mama, se quiser – Disse ela com um sorriso mais vivido que antes, isso, porém, fez o outro ruborizar-se sem graça – Eu gosto que me chamem assim.

- Definitivamente eu estou muito velho para isso! – Exclamou dando as costas constrangido, e seguindo o caminho estreito de paralelepípedos até Rodorio.

 - A passionalidade dos escorpianos é verdadeiramente peculiar – Comentou intrigado Albafica, vendo como seu companheiro se afastava a passos pesados – Se não me engano, Jabu estava entre os dez com a personalidade que mais diverge entre a tempestiva e emotiva do santuário, segundo Soleil.

Escorpião parou bruscamente, virando-se lentamente.

- O quê?! – Disse em cômico choque – Eu não acredito que aquele pivete fez lista disso também!

- Mas é claro que fez.

- Como assim “Claro”?! Que tema mais absurdo para uma lista! – E com um urro de frustração, voltou a olhar para frente – Isso não importa agora, vamos continuar! Já demoramos demais aqui!

-.-.-

Sem mais transtornos, o grupo chegou a casa-loja em Rodorio, sendo atendidos por Seika, que ainda possuía olhos inchados e vermelhos, não era difícil deduzir a razão. Kiki. Que era para a pisciana como um filho também. Nenhum dos dois cavaleiros tiveram coragem de mencionar que Muh havia desaparecido, Shunrei também nada disse, enquanto abraçava comovida a amiga.

Albafica tinha esperanças que o ariano estivesse vivo, afinal, Piada tinha desaparecido com ele, e conhecia o suficiente seu pseudoprimo como para saber que sempre tinha uma carta na manga em suas ações, por várias vezes era mais astuto que sua idade dava crédito.

- Rivera – Albafica, que acabou entrando na casa, enquanto Jabu esperava do lado de fora, encaminhou-se para o ariano albino de apenas seis anos, que estava sentado no grande sofá vermelho do cômodo, vendo sua mãe com expressão emburrada.

- Mamãe, nem ninguém me conta o que aconteceu – Resmungou, cruzando os braços – Mamãe chorou muito depois que o tio Afrodite falou algo para ela, eu também quero saber o que é!

O Pisciano sentiu um ligeiro aperto em seu coração, não tinha certeza se o garotinho já sabia o que significava a morte, se não, saberia da pior forma.

- Você ainda é muito novo Rivera, por isso que-

- Meu pai tinha sete quando se tornou cavaleiro de ouro! – Refutou, ainda emburrado – Eu já tenho seis!

- Mas sequer sabe usar telecinese – Espetou severamente sem poder evitar. Ironicamente, nenhum membro de sua família era conhecido por ser exatamente suave -   Você já deveria saber que não podemos nos comparar com os guerreiros do passado. Eles viveram em tempos eminentes de guerra, eram formados prematuramente e sem qualquer base psicossocial, mesmo que você já fosse capaz aos sete anos, o Grande Mestre jamais permitiria que você assumisse uma armadura antes de ter recebido, no mínimo, toda a educação básica.

O pequeno ariano de olhos esbranquiçados abriu a boca para revidar, seus olhos chorosos, mas tornou a fechá-la, quando viu o olhar aflito de sua mãe e o preocupado de Shunrei, que haviam interrompido o abraço por causa do sermão.

- Perdoe-me por chamar a atenção do seu filho assim, Senhora Seika – Disse respeitosamente Peixes, voltando-se para as duas.

- Tudo bem, todos estamos tensos com o que está acontecendo – Disse ela compreensiva. – Seus pais estão lá no fundo, no armazém.

- Eu irei falar com eles, obrigado – E inclinando-se ligeiramente, foi até o local mencionado.

-.-.-.- 

-...Não seria mais garantido Shunrei permanecer no salão do Grande Mestre? Esse não é o lugar mais seguro do santuário? – Questionava, sentada em um banco circular de bancada, uma mulher de curtos cabelo e aparência masculina, que muito destoava com a gigante barriga de oito meses que esbanjava.

-...Isso depende muito – Respondia Afrodite.

O ex cavaleiro estava encostado numa enorme banca de madeira que cruzava toda a sala retangular, sobre si, inúmeros vasos com os mais variados tipos de flores mais sensíveis, que não podiam ficar completamente ao relento, dentre todas, se destacava uma pequena árvore, quase um bonsai, de tronco completamente retorcido e folhagem escura, próximo de suas raízes saíam pequenas flores, parecidas com espigas de milho abertas, porém de cor branca, com pontas roxas.

Embaixo da bancada, haviam sacos de terra, esterco e folhagens, o que deixava o ambiente com um suave cheiro de decomposição natural.

- Como depende? – Questionou a grávida com rosto franzido – É no décimo terceiro templo que Athena sempre foi protegida, não?

- Sim, mas de nada adianta as doze casas quando o inimigo é um cavaleiro – Rebateu o pisciano – Saga não teve qualquer dificuldade em chegar ao decimo terceiro templo, vinte e quatro anos atrás, passando-se por Shion, e teria conseguido completar a execução se não fosse por Aiolos. E a essa altura é óbvio que há um traidor entre nós, o que faz do templo do Grande Mestre um local perigoso. Porém, há também outra hipótese para a repentina locomoção de Shunrei. 

- E qual seria? - Questionou interessada a japonesa.

- As ações do próprio Grande Mestre, e provavelmente as de Dohko.  Ações que, mesmo visando um bem maior, provavelmente serão vistas como traição. Sinceramente, pelo que percebi, não duvido que ambos terão que passar pelo julgamento que eles mesmo estipularam no Santuário.

- Mesmo que Athena organizasse um julgamento, nunca que ela iria envolver Shunrei nisso – Vetou a possibilidade completamente – Eu sei que ela se afastou muito do santuário nos últimos anos, mas esperar que ela faça algo assim já é demais.

- Esse não é o ponto – Negou o sueco – Shiryu está se preparando para a própria execução. Seja por resultado de seu julgamento, seja pelas ações do traidor. Você ficaria impressionada com o número de vezes que o líder do santuário foi morto por traidores, isso quando ele não é o próprio. Basicamente, ele não apenas quer proteger Shunrei, como também quer afastá-la e poupá-la disso.

- Ela é corajosa o suficiente para tentar impedir se algo assim acontecesse – Seguiu o raciocínio a jovem – Mas, afinal, o que o Grande Mestre fez de tão grave?

Afrodite parou alguns segundos, não apenas ouvindo passos como sentindo a aproximação de seu filho, mesmo assim, prosseguiu.

- Além de tomar decisões e atitudes às costas de Athena nos últimos anos, existe o fator Shoryu. – Disse calmamente, percebendo a parada brusca na caminhada do corredor.

- Você não acredita mesmo que aquele menino possa ser o traidor, não é? – Ofendeu-se Ersa negando com a cabeça – Ora! Por favor Afrodite! Ele cresceu com o nosso Alba e com os outros, eles brincavam e corriam por nossa sala antes mesmo de saber dar o primeiro soco! Apesar de preguiçoso, Sho sempre foi um exemplo no santuário. Ele, Julian e Suite são os pilares da atual geração, mesmo eu sei disso. Não apenas porque foram os primeiros a conseguir suas armaduras, mas porque são os melhores e mais habilidosos entre todos de sua geração. A pequena Suite só não conseguiu sua armadura dourada até agora por causa de seu mestre imbecil. Enfim, Sho deve ter suas razões para abandonar o santuário numa hora dessas.  

- Sim, eu sei disso muito bem. Em nenhum momento passou por minha cabeça que ele fosse realmente um traidor. Porém, o menino já é considerado desertor, todos temos ordens de prendê-lo ou matá-lo caso o encontrarmos, uma vez que ele desobedeceu a ordens expressas tanto do Grande Mestre quanto de Athena ao “desaparecer”, mas a verdade é que ele esteve entre nós esse tempo todo, sem duvidas sob ordens de seu pai. Observando cada um de nossos movimentos, em busca do verdadeiro traidor. Ele eventualmente o encontrará, mas duvido que Athena perdoará o uso de método tão pouco ortodoxo baseado em mentiras. Porém, é como diz o velho ditado. Para enganar seus inimigos, engane também seus amigos.  

Então lançou um olhar severo para a entrada do cômodo.

- Albafica, por um acaso nós te educamos para ouvir conversas atrás das portas?

Pôde sentir o cosmo do menor contrair-se, segundos depois, a porta se abriu e rapidamente quem estava do outro lado pegou com os dedos uma rosa vermelha lançada em direção ao seu coração, por seu próprio pai.

- Eu sinto muito pai, mas...É verdade isso sobre Shoryu? Você o viu? Ele está bem?

O cavaleiro adentrou a passos lentos, atento para qualquer novo ataque do mais velho pela sua falta de respeito, a armadura do décimo segundo templo ressoando a cada andar de seu portador. O cabelo do jovem mestiço caía às suas costas, mais liso e comprido que o de seu pai, sua expressão era expectante e aflitiva.

- Veja só! Como ele fica bonito de armadura – Comentou sua mãe, fazendo menção de levantar do banco com certa dificuldade, mas seu marido agilmente foi ao seu lado ajudá-la. – Não irei me cansar de ver isso!

- Mas a cerimônia oficial só irá acontecer na primavera, então eu ainda sou o cavaleiro de Peixes. – Mencionou severamente, encarando seu filho que baixava o rosto – E levando-se em conta sua atitude de agora a pouco, e o fato de que não foi capaz de perceber por conta própria que um de seus melhores amigos esteve escondido no santuário esse tempo todo, acredito que eu deva continuar a sê-lo.

- Ah, cala a boca, Dite – Resmungou Ersa, soltando-se grosseiramente de seu marido e dando-lhe uma cotovelada na costela – Você já está velho para isso – Então voltou-se para seu garoto – Você conhece seu pai, é o jeito dele de dizer que está preocupado. Todos no santuário sabem que você tinha plenas capacidades de herdar essa armadura aos quinze, seu pai que fica postergando isso.

Albafica lançou um olhar de inocência inquisidora ao seu pai, que se constrangeu ao instante.

- Eu apenas não quero ter um sucessor fraco, a décima segunda casa tem uma reputação a manter! – Defendeu-se – Como mestre dele, se eu achar que ele não está pronto, ele não está!

- Tudo bem na descida até aqui, meu bem? – Perguntou a jovem ignorando completamente os reclamos de seu marido, que cruzou os braços e resmungou algo em sueco.  

- Sim, não tivemos qualquer dificuldade – Explicou calmamente – Mas...Sobre Shoryu...

- Nós o vimos, e sim, ele está bem, como eu disse, está buscando o verdadeiro traidor – Respondeu a contragosto o mais velho, enquanto Ersa puxava um celular do bolso e tirava uma foto de seu filho.

-...Entendo – Sua expressão era de alívio – Izo estava tão preocupado...

- Mas não compete a você dizer isso a ninguém, mesmo ao outro filho de Shiryu.

- Se é o desejo do Grande Mestre, eu não irei me meter – Respondeu prontamente – Tenho certeza que Izo irá entender quando tudo se esclarecer.

- Para onde você irá agora, Alba? – Questionou sua mãe observando seu garoto, com uma expressão grave –Independente de tudo, lembre-se que antes de um cavaleiro de Athena, você é meu filho, certo?

- Hã....

- Certo? – Repetiu ela, estreitando o olhar ameaçante.

- Sim, claro...!

Afrodite revirou os olhos, mas não pôde conter um pequeno sorriso.

- E leve contigo a katana que seu avó te comprou.

Quanto a isso o sueco voltou a exaltar-se.

- De novo com essa história de Katana?! Os cavaleiros de Athena não usam armas!

- Como eu acabei de dizer, antes de cavaleiro ele é meu filho, e os Takumaru são uma família de samurais!

 - Ehem – Interrompeu o mais novo, antes que a discussão ficasse pior – Me desculpem, mas eu tenho que ir agora, seguir as ordens do senhor Dohko.

- Pode nos contar suas ordens? – Seguiu Ersa, interrompendo a discussão.

- Sim. Senhor Dohko me pediu que patrulhasse Rodorio. Mesmo que meu pai e Máscara já estejam aqui, ele teve a impressão de sentir energias estranhas vindas daqui. Meu dever é defender o vilarejo a todo custo se algo tentar atacá-lo.

Não havia dúvidas em Afrodite de que essas “estranhas energias” eram os cosmos camuflados dos espectros que Ângelo havia sentido antes, afinal, o velho Libra havia vigiado o selo dos espectros por mais de duzentos anos, era uma questão de tempo até que conseguisse identificá-los.

Porém não foi exatamente isso que chamou a atenção do mais velho, seu coração pulou uma batida com as palavras de seu filho, uma lembrança imediatamente surcando sua mente sem que pudesse evitar.

“- A alma do meu antecessor de peixes? – Dizia, parado em meio a um imenso campo bruto, onde as primeiras flores começavam a nascer sob os raios de sol suaves.

- ...Exatamente – Dizia a voz ecoante de um ser feito de bruma, Shun, o Imperador do submundo, estava agachado em sua forma espectral, apreciando os pequenos brotos – Na verdade, vós dois pertenceis a mesma alma, que um dia foi Narciso de Peixe, porém com o passar dos séculos, como Máscara já deve ter lhe dito, suas almas se desgastaram e algumas acabaram se rompendo, dando origem a outras. Você e Albafica, Máscara e Manigold são as provas vivas disso, mas também há o caso de Dégel e Krest, embora a alma deles conseguiu se reagrupar em Camus, mas são poucas as vezes que isso acontece, em geral, as almas divididas se distanciam e ganham sua própria identidade.

- E por que exatamente você quer que eu receba meu antecessor como, meu filho? - Questionou com desconfiança – Isso, por acaso, está incluso na divida que Máscara fez contigo?

- Não – Foi direto, levantando-se e encarando o mais velho – O acordo que fiz com Máscara pela passagem da alma de sua mãe aos Elísios, e por sua irmã, acordo o qual tu aceitaste pagar com ele, não iria tão longe. Sua ajuda aqui, e os vinte anos de trabalho como coletor de almas por parte dele, são mais do que suficientes para mim. 

- Então por que eu iria aceitar ser pai de uma antiga parte da minha própria alma? – Questionou franzindo a expressão.

- O filho que Ersa espera sequer tem um mês, então ainda não lhe foi encaminhada uma alma. Por isso, eu te dou tempo para pensar a respeito. – Voltou-se para o horizonte – Albafica foi um forte e excepcional cavaleiro de Peixes, gostaria que sua alma tivesse uma nova oportunidade, com uma família que desse tudo que ele precisa, afinal, ele foi morto brutalmente enquanto defendia Rodorio do ataque de Minos. De certo modo eu me sinto responsável por isso...”

Não prestou a mínima atenção em como Ersa havia ganho a batalha e agora amarrava a Katana, que estava guardada naquele armazém, nas costas de seu contrariado filho. Seu coração ainda batia apertado e incerto, enquanto seus sentidos apitavam desnorteados. Só uma coisa registrava sua mente com clareza.

Na outra vida, Albafica havia morrido naquele vilarejo, defendendo-o com todo seu sangue.

Engoliu em seco, ligeiramente trêmulo.

- Não – Disse lívido, apertando os punhos com força para tentar se acalmar. Seu tom imediatamente chamou a atenção dos outros dois.

- O que foi, pai? – Perguntou estranhando seu filho, enquanto Ersa franzia a expressão.

- Você não vai ficar aqui em Rodorio, eu farei a patrulha em seu lugar. Ao invés disso, você deve ir ajudar Kanon, Shura e Julian, eu tenho uma raiz que cuidará daqueles inúteis de bronze em instantes – Despistou.

- Mas... – Tentou argumentar o mais novo.

- Eu não quero ouvir negações – Declarou com firmeza, erguendo a face pálida – Dohko, agora, apenas é o substituto de Shiryu, não é o Grande Mestre nem o seu mestre, eu sou, além de seu pai. Então eu exijo que siga o que EU digo. Vá para a área da velha oliveira enquanto eu me encarrego de Rodorio. Me entendeu? 

Albafica mostrava-se absolutamente surpreso, virou-se para sua mãe, tentando compreender o que havia acontecido para essa súbita mudança de atitude. Ersa encarou seu marido por alguns segundos, para então voltar-se ao seu filho.

- Faça isso, você sabe como é seu pai.

O jovem mostrou-se perplexo, olhando de um para o outro. Nunca foi do tipo de desobedecer ordens, não era como Piada.

-...Pai, o senhor Dohko... – Tentou.

- Eu falarei com ele. – Foi a resposta seca e simples do sueco, dando as costas para o menor, mexendo no bonsai retorcido.

Peixes sentia-se completamente impotente, como uma criança que não tinha o direito de opinar sobre o destino que seus pais desejavam para ela, baixou o rosto, contrariado, porém não se permitiu dizer nada mais, como sua educação regrava.

 - Leve com você raízes de Asfodelo – Seguia o floricultor – Não existe sonífero mais potente na terra, só as sementes são capazes de acordar quem as ingere. Adormecerá o organismo deles de tal forma que pareceram mortos, será impossível controlá-los assim.

- Sim, senhor – Respondeu cabisbaixo, enquanto seu pai se aproximava com os itens mencionados na mão, uma raiz escura e uma semente verde. O menor estava a ponto de retirar sua armadura, quando a outra mão de Afrodite o impediu.

- Vá de armadura, eu posso me virar sozinho. – Franzindo suavemente o rosto, o garoto concordou com um aceno – E também leve isso – Colocou a mão no bolso e de lá tirou três sementes pretas – Não confunda as sementes, se os cavaleiros de bronze comerem essas, morrerão imediatamente.

Albafica ergueu a sobrancelha surpreso.

- E o que eu devo fazer com isso? E o que são? – Atreveu-se a perguntar.

- Sementes de romã, mas você pode dizer que estão envenenadas. Apenas leve-as contigo, dê para qualquer um que possa estar sofrendo com o miasma para carregá-las consigo também.

Pelo tom de seu pai, o mais jovem percebeu que as explicações acabariam aí.

- ...Estou indo então – Porém algo lhe ocorreu - ...Só há um problema, pai, Jabu está na porta, ele foi enviado para patrulhar Rodorio comigo...

O mais jovem sabia de antemão que o antigo cavaleiro sequer dirigia a palavra ao Unicórnio, por razões que remetiam há antes de seu nascimento, um tema que Afrodite nunca se importou de tocar por considerar completamente irrelevante.

- Bem – Declarou o sueco com uma careta – Suponho que terei que conformar-me com essa péssima escolha.

Com isso Ersa se despediu mais demoradamente de seu filho, o abraçando e dedicando-lhe palavras de força e carinho em japonês, e então o mais novo partiu, deixando o casal à sós novamente.

- O que deu em você? – Foi a pergunta direta de sua esposa, vendo como seu marido apoiava as mãos na bancada, encarando a árvore retorcida.

- Você tem razão.

- Sobre o quê?

- Antes de um cavaleiro de Athena, ele é nosso filho – Disse levando ambas as mãos ao rosto e esfregando-as – Eu sempre defendi uma justiça absoluta, sempre acreditei que a ordem e a paz devem se impor a qualquer custo. – Ersa aproximava-se devagar às suas costas – Eu não me importava de sacrificar a vida de outras pessoas para isso, para atingir um ideal perfeito. Eu não me importava de dar minha vida por essa crença, mesmo sendo visto como traidor, no passado eu morri convicto de que o mundo era regido pela lei do mais forte, e os mais fracos deveriam perecer, e ainda creio em muito disso, mas...- Suas mãos escorregaram, revelando seus belos olhos e sua pinta sob o olho esquerdo – Antes, eu não tinha nada a arriscar, nada que me instigasse a permanecer vivo, minha vida e as dos demais era uma válida moeda de troca, porque não tinham valor...Porém agora...

Uma risada de ironia soou de sua boca, enquanto sentia os dedos firmes de sua esposa em seu ombro direito.

- ... O décimo segundo cavaleiro deve ser implacável, indolente, a última fortaleza do santuário, mas ao contrário de Shiryu, eu não consigo simplesmente lançar meu próprio filho na linha de fogo, como se isso não fosse nada...– Seus braços caíram ao lado de seu corpo – Você é a mãe dele – Seguiu com um sorriso irônico – Como pode parecer tão calma numa situação dessas?

- Porque eu confio nas habilidades dele.

- Eu também confio! – Defendeu-se virando-se e ficando frente a frente com sua mulher, sendo separados pelo ventre inchado. -Não tenho qualquer duvida de que ele é um dos cavaleiros mais fortes desse santuário, ele até mesmo me superou há alguns anos.

- E por que não diz isso para ele, ao invés de insistir que ele não tem o que é necessário para ser um cavaleiro de ouro. – Questionou ela firmemente.

- Porque a arrogância é o pior male que acomete a elite dourada – Decretou taxativo – Eu subestimei Shun e olhe agora como eu....- Suas palavras morreram em sua garganta, fazendo Ersa franzir a expressão, mas ele logo emendou - ...Como eu estava errado, aquele cavaleiro foi capaz de me matar com uma habilidade que ainda me assombra. Eu não quero que ele seja arrogante como eu, ou como qualquer um de nossos companheiros, quero que ele sempre pondere sobre seus inimigos, e sempre dê tudo de si, independente de quem sejam seus adversários.

- Eu entendo Dite, você não apenas criou um filho, criou também um guerreiro – Afirmou a jovem, levando a mão a maçã do rosto contrária – Eu também entendo sua preocupação, mas você não pode deixar isso te cegar, Albafica não é como você, na verdade, vocês são pessoas completamente diferentes. Criados e educados de forma completamente diferentes. Ele não é um soldado apenas esperando a hora de morrer, ele é um guerreiro que luta para viver o dia seguinte.

-  Todos de sua geração são assim. Possuem esse desejo de viver – Comentou ele, permitindo-se fechar os olhos pelo carinho – Eu sei que somos diferentes, ele é muito mais ponderado do que eu jamais fui, mas eu não posso deixar de pensar que eu não sei o que faria se perdesse qualquer um de vocês...Porque todos são a minha razão de viver, fazem parte do que eu sou hoje, até mesmo o idiota do Ângelo e o inconsequente do Piada...Então...

Suas seguintes palavras foram caladas com um beijo, guiado por Ersa, suave a princípio, mas que aos poucos foi se tornando demandante, desesperado, enquanto a jovem pressionava com seu abdome gravido o corpo de seu marido contra a bancada.

Separaram-se mais cedo do que gostariam, com ambos puxando ar.

-...Sua barriga, ela aperta meus pulmões assim, sabia? – Disse com um suave sorriso, mais leve, indicando a manjedoura dos gêmeos que em breve viriam ao mundo.

-  Jamais reclame da barriga de uma mulher, independentemente da situação! – Exclamou ela, fingindo irritação, para tornar a beijá-lo, dessa vez empurrando-o ainda mais fazendo-o sorrir em meio ao gesto, que mesmo em tão agoniante situação soava-lhe tão cômico.

- ...Eu te amo – Confessou ele, ainda de olhos fechados e arfante como ela – De um modo que chega a parecer idiota, vindo de alguém como eu... Mas sabe que não deveríamos estar nos beijando assim – Decretou abrindo suas orbes – Eu não tomei os remédios hoje que livram de toxinas meu corpo, pode ser peri-

-Oh, cale a boca, contanto que eu não morda sua língua estarei bem. Não me tente a fazer isso! – E trocaram caricias mais uma vez.

-.-.-.-

Alguns minutos mais tarde, o casal voltou para a sala, Albafica já não se encontrava e Seika servia um chá.

- Ah, Ersa, espero que não se incomode, eu preparei um chá para ajudar Shunrei a se acalmar – Informou a pequena pisciana, de pé, segurando um bule tradicional japonês.

-Sem problemas, desculpem a demora – Respondeu aproximando-se – Como você está Shunrei?

Afrodite observou a cena, enquanto sua esposa amistosamente conversava com a esposa do Grande Mestre, enquanto a esposa de Muh servia chá, essa cena em nada soava a guerra, muito menos as que o santuário já havia enfrentado.

Há vinte anos, se alguém do futuro lhe dissesse que viveria um momento assim, claramente responderia que ele estava louco, com isso, em silêncio caminhou até o corredor que dava para a entrada da loja.

- Dite – Ersa o chamou, quando estava por sumir por trás da quina da parede, olhou para ela, notando como tinha um sorriso travesso em seus lábios. – Continuaremos de onde paramos quando você voltar.

Rivera, que estava chateado no sofá tomando seu chá não deu atenção à frase, Seika não pareceu se importar ou assumir qualquer coisa enquanto servia chá numa xícara vazia para a dona da casa, Shunrei, por outro lado, ruborizou-se violentamente por trás de sua porcelana.

Afrodite ficou parado na entrada do corredor alguns segundos, sem graça e sem reação, para então começar a enrolar seu cabelo e formar um coque, para logo em seguida soltá-lo, desviando do olhar da japonesa e encarando simplesmente o chão, disfarçadamente.

-...Eu...Até mais tarde – E deu as costas rapidamente sob as risadas da enfermeira.

-.-.-

- Ah finalmente! Eu estava esperando há quase meia hora – Resmungou Jabu assim que Afrodite saiu da casa, porém o pisciano simplesmente passou reto por ele – Eii! Albafica disse que íamos trabalhar juntos, então-

- Não. Definitivamente eu jamais trabalharia com alguém como você – Disse em tom firme, estando de costas para o mais novo – Estaria desonrando Narciso se fizesse isso – O escorpiano estava a ponto de abrir a boca para protestar, quando Peixes acrescentou, ríspido – Atreva-se a maldizer Narciso na minha presença e a casa de Escorpião definitivamente ficará sem sucessor.

Essas palavras pesaram para o japonês que desviou o olhar.

- Eu apenas ia dizer que a ventania e os tremores pararam – Respondeu em tom contido – Mas eu estou com um mal pressentimento com essa calmaria, quer dizer, ninguém saiu na rua ainda para avaliar os estragos ou coisa parecida, é como se a vila estivesse vazia.

O sueco seguiu parado em seu lugar, processando a informação e o que ela poderia significar, até que repentinamente correu em direção a loja vizinha.

- Fique aí! – Gritou grosseiramente a Jabu, e sem qualquer preambulo derrubou a porta da casa com um chute, o que era mais seguro que atravessá-la com uma de suas rosas e correr o risco de envenenar alguém.

Assim que adentrou, ouviu um choro baixo, porém ao ingressar na sala, tal som passou a segundo plano.

Em meio ao salão, havia uma estatua de uma mulher idosa que parecia olhar espantada para o chão, enquanto tentava afastar algo com sua muleta.

-...Senhora Kyría...  – Reconheceu a velha parteira, que havia ido a Rodorio apenas para visitar sua neta, sentiu um aperto no peito por isso, porém não havia mais nada que pudesse ser feito agora.

Lembrou-se imediatamente do aviso de Daidalos sobre Medusa, e como Chronos dificilmente usaria o poder de seus olhos, usando-se de outros artifícios menos arriscados para o seu lado, ainda assim, fechou os olhos e aguçou seus sentidos.

- Eu sinto muito...- Disse ao passar pela estátua, sentindo-se impotente por isso ter acontecido justamente do seu lado.

Chronos havia se aproveitado de que a população havia se recolhido, e os havia atacado em suas próprias casas, tal conclusão fez uma sensação de ódio crescer em seu interior, nem mesmo Saga em seus maiores delírios teria tal requinte de crueldade.

“Ersa” – Disse mentalmente à sua esposa, mesmo que ela fosse incapaz de responder, ainda era capaz de receber um contato telepático “Arme todas as armadilhas que eu deixei preparadas, tome um antidoto por precaução, e dê para os outros também conforme havíamos combinado”.

Enquanto dizia isso, caminhava lentamente pelos corredores da casa, ocultando-se sempre atrás de paredes e vigas, como se fosse uma entrada policial em um covil, atento a qualquer som e ruído, com sua rosa branca posicionada em mãos, seguia a direção do choro.

“Máscara” – Chamou, na esperança que seu amigo pudesse ouvi-lo. Sabia que ele estava em Rodorio, mas pelo cosmo não sabia precisar aonde. No entanto, a tamanha convivência que usufruíram nas últimas décadas era tal, que podia encontrá-lo, mesmo sem o cosmo, como se sentisse sua alma. – “Consegue me ouvir?”

“...- Em alto e bom tom!” – Não pôde deixar de receber a resposta com alívio, não só porque o canceriano estava por perto, como também por estar bem.

“-Os espectros ainda estão contigo?” – Questionou com urgência seguindo com sua exploração.

“...-Não, eles acabaram de retornar ao submundo, por quê?” – Agravou, notando a preocupação contrária. “-O que houve?”

“...Preciso que você vasculhe dentro das casas, Chronos atacou embaixo dos nossos narizes, usando Medusa.”

Um silêncio grave se seguiu, cortando-se com uma pergunta aflita.

“- Ersa está bem?! E Alba?!”

Em outro momento acharia graça que, apesar de suas palavras anteriores, Ângelo parecia tão preocupado com sua família quanto ele mesmo.

Estão seguros, nós tomamos precauções. E eu disse para Albafica sair daqui antes de descobrir sobre essa situação”

“-...Entendo...Ainda assim, não saia de perto deles! Eu verificarei o perímetro o mais rápido que puder, também devemos avisar o ancião, não?”

“Não se preocupe, não vou sair. Sim, avise Dohko, por favor. E...Eu estou aqui com Jabu”

“-Jabu?! – Repetiu surpreso – Ei, eu sei o que você pensa dele, o que a maioria pensa, mas o moleque não é um desperdício total, temos que admitir que ele é rápido, deve servir de alguma coisa até eu chegar.”

“Isso espero” – Então parou frente a uma porta meio arrombada de onde o choro vinha. “Tome cuidado”

“-Você também.”

E entrou, arrancando o que restava nas dobradiças.   

Com sua rosa posicionada em mãos, olhos fechados e sentidos aguçados deu os primeiros passos dentro do que parecia ser um quarto.

- Q-quem está aí?! – Respondeu a fonte do choro. O mais velho reconheceu essa voz de imediato.

- Engoní? – Chamou.

-...S-senhor Afrodite?

- Sim, sou eu, pode sair.

Abriu seus olhos, uma vez que havia identificado a única presença no local.

A jovem de cabelos castanhos iguais a de sua avó, abriu a porta de um armário de madeira com força e correu para os braços do mais velho.

  - Ah senhor Afrodite! Foi horrível, horrível! A vovó...A vovó...- E desatou a chorar copiosamente.

Sabia que não haviam palavras suficientes para consolar a jovem que por muitas vezes o ajudou ficando na floricultura quando precisava sair. Não eram realmente íntimos, porém sempre tiveram uma relação muito cortês, sem mencionar que a senhora Kyría havia ajudado no parto de Julian, como também de seu próprio filho, e de Izo, antes que Kiki assumisse as funções médicas do santuário.

Deviam muito a essa família, e deixar que isso acontecesse era uma péssima forma de retribuir.

Enquanto a jovem seguia seu pranto, levou uma de suas rosas à sua têmpora, assim conseguindo acessar seu sistema nervoso e suas lembranças* para melhor identificar o que havia acontecido, mesclando suas capacidades botânicas com um nível de telepatia que apenas ele era capaz de fazer. 

Pôde vislumbrar, como se fossem suas próprias lembranças, como cobras haviam invadido aquela casa, como a neta tentou pegá-las antes que machucassem sua avó, no entanto, um bote certeiro de outra serpente, verde, no meio da sala, ao invés de transmitir veneno, começou a transformar a senhora em pedra.

Desesperada e em choque a menina fugiu quando tudo que restava era uma estatua de pedra, para então se esconder naquele armário.

- ...Então Medusa está usando serpentes ao invés dos olhos – Resmungou para si mesmo, enquanto tirava de suas vestes a mesma espécie de raiz que deu a Albafica e oferecia a Engoní – Coma isso, irá te acalmar.

Trêmula a jovem aceitou, e quase imediatamente, desmaiou nos braços do cavaleiro.

- Preciso levá-la daqui – Disse erguendo-a em seus braços.

“Máscara, eu descobri a forma que Medusa está assumindo” – Decretou em tom sério.

Longos segundos se passaram enquanto saía da casa, buscando algum réptil que ainda estivesse presente. O receio sobre o que a falta de resposta poderia significar começou a invadi-lo.

“-MÁSCARA?”

“...- Aaah! Estou aqui, florzinha!” – A resposta, mesmo ofensiva, trouxe consigo novamente o alívio. Nunca antes havia se sentido tão tenso numa guerra, não sabia se era devido ao seu “destreinamento”, ou tudo que havia em jogo dessa vez, porém um mau pressentimento o consumia, seu sexto sentido praticamente gritava que algo ainda pior aconteceria em breve. “- Por Zeus! Não grite na minha cabeça, estou ocupado aqui matando as primas da Shina.”

A princípio franziu a expressão sem compreender a brincadeira, mas logo a compreensão o atingiu.

“-Você também achou as serpentes?”

“..-Sim, algumas dezenas.” – Então seu tom se tornou mais mordaz – “-E, infelizmente, quatro estatuas novas em Rodorio também. Porém, resgatei três sobreviventes e os enviei a um lugar que eles não corressem o risco de um novo ataque."

“ E que lugar...” – Começou a dizer, porém seu raciocínio se auto interrompeu quando um local concreto surgiu em sua mente. “- Espere um pouco! Você não PODE estar falando do Yomotsu?!”

“...-Oras, e você tem ideia melhor? Eu não estou conseguindo falar com Dohko ou qualquer um fora você e o filhote de cavalo com chifres, estamos sozinhos nessa fratello, e essa foi a solução imediata que eu achei.”

Passando pela sala novamente, Afrodite lançou um último olhar a velha enfermeira.

“-E o que Shun disse quanto a isso?!”

“...-Muita coisa aconteceu. Porém de forma resumida, Shun está fora, Daidalos deu uma saída e o atual responsável do submundo achou muito engraçado que eu mandasse um bando de refugiado para o submundo para não se tornarem pedra.”

“- E que tipo de demente acharia isso engraçado?!” – Exaltou-se, saindo pela porta de entrada que ele mesmo havia derrubado.

- Afrodite! – A exclamação do cavaleiro de bronze interrompeu seus pensamentos, porém o mesmo teve o bom senso de não sair de frente da floricultura – Máscara me disse o que aconteceu, essa menina está bem?

- Na medida do possível – Sua resposta foi simples, sem grandes dissertações, ainda mais quando viu o cenário a sua volta.

Haviam pelo menos trinta cobras mortas num raio de três metros, dispersadas por todos os lados envolta de sua loja.

- O que houve aqui? Você matou todas?

- Sim. Eu as senti se aproximando nas redondezas das casas, espreitando, e as matei. Achei muito suspeito ter tantas assim por aqui, então resolvi matá-las ao invés de ficar me questionando a razão, pelo jeito eu estava certo, pelo que Máscara me disse. – Vendo a expressão franzida do dourado, apressou-se a acrescentar – Mas eu juro que não me afastei mais do que milésimos de segundos da loja! Achei mais seguro limpar o perímetro do que ficar aqui parado.

Matar primeiro, perguntar depois, essa atitude não podia ser mais escorpiana, pensou peixes vendo os repteis dilacerados.

-...Como você pôde senti-las? São cosmos tão mínimos que são impossíveis de identificar.

- Eu treinei na Argélia, em Orã – Explicou simplesmente enquanto o mais velho se aproximava – Existem centenas de Macroviperas por lá, por ser uma região semidesértica, eu tive diversos problemas com víboras quando estive em treinamento. Essas cobras têm um péssimo temperamento, por isso tive que dar um jeito de encontrá-las antes que me atacassem – Deu algumas pisadas no chão, como se trotasse – Eu uso minha telecinese junto com meus pés, eu tateio o solo para sentir vibrações ao meu redor.

- Como escorpiões usam o pente que tem embaixo do corpo para perceber sua presa – Seguiu o raciocínio.

- Exato! – Acrescentou animado e orgulhoso – Foi deles que tirei a ideia! Não funciona tão bem em batalha, quando já podemos sentir o inimigo pelo cosmo, mas me ajudou a evitar muitas mordidas quando era criança.

- É, suponho que isso servirá de alguma coisa - Declarou, sem dar o braço a torcer, entrando em sua casa para deixar a jovem, sem poder evitar de pensar que Jabu, no fim, poderia ter sido um bom sucessor para Milo, se não fosse pela própria estupidez.    

Retornou poucos minutos depois, com uma expressão ainda mais preocupada que antes.

- O que fazemos agora? – Questionou unicórnio, sem desviar a atenção de seus entornos, ainda assim, agilmente conseguiu capturar no ar algo que foi lançado em sua direção pelo mais velho – O que é isso?

- Sementes de romã e antidoto para minhas rosas – Disse simplesmente, enquanto o mais novo via um pequeno saco de pano fechado e umas sementes negras- Não coma essas sementes sob hipótese alguma se não quiser morrer, apenas leve-as contigo. E tome esse antidoto se precisar entrar na casa, todas as saídas foram fechadas pelas minhas rosas.

Unicórnio piscou surpreso.

- Como pôde fazer isso tão rápido?!

- Desde que comprei essa casa eu mantenho jardins suspensos por cordas próximos ao teto, se qualquer inimigo surgisse, era só baixar os jardins, coisa que minha esposa já fez – Explicou simplesmente, enquanto fechava os olhos, tentando se comunicar com Dohko.

- Espera! Você não comprou essa casa há uns dezessete anos?! Tem mantido isso desde essa época?! – Espantou-se – Não acha que é um pouco de exagero?!

- Você pode tirar um soldado da guerra, mas não pode tirar a guerra de um soldado – Explicou simplesmente, com um deixe de frustração quando sua tentativa de contato com o substituto do Grande Mestre se viu frustrada. Passou então a tentar buscar Aioria, o tinha sentido brevemente próximo a Rodório.

- ... Eu só não entendo para que tanta precaução. – Teimou, com desconfiança – Ninguém esperava uma nova batalha. Shiryu nos reuniu apenas para a cerimônia de sucessão de Albafica, mas acabou coincidindo perfeitamente com essa guerra...Perfeitamente demais.

- É lógico que você não entende minha precaução – Respondeu de mau grado o pisciano, sua tentativa com Aioria se mostrando inútil – Você não tem uma esposa ou um filho para zelar. Sequer parece ligado a qualquer um de seus meio-irmãos, como se eles nem fossem sua família, você só convive com eles, mas nunca se filiou a nenhum, mesmo com Kiki tudo que você possuía era rivalidade.

- Ei! Não fale como se eu fosse um egoísta! Você não sabe nada de mim para tirar essas conclusões! -Exaltou-se irritado.

- Se você não quer que eu fale sobre sua vida, então não se meta na minha. – Disse de forma ríspida, tentando, dessa vez, encontrar Camus em algum lugar próximo a biblioteca – Você pode até ter todos os requisitos para ser um cavaleiro de Escorpião Jabu, mas ainda será o primeiro e único escorpiano que caminha sozinho, sem um irmão de armas que sacrificaria a própria vida por você.

O japonês engoliu em seco, desviando o olhar, decidindo ficar calado. Era suficientemente maduro a essa altura da vida como para saber que não era o momento nem o lugar para puxar uma discussão assim.

- Estamos sozinhos aqui, não consigo entrar em contato com ninguém. – Seguiu Afrodite, indiferente ao efeito que suas palavras tinham causado no menor. Ponderou sobre pedir auxilio ao submundo, pisando mais uma vez sobre seu orgulho, mas se Máscara sequer havia mencionado essa opção, e os espectros já se haviam retirado, era fácil deduzir que o acordo de Shun e Athena havia sido um fracasso.

- E se usássemos um telefone ao invés de telepatia? Eu duvido que essa coisa de Miasma impeça sinal de satélite. – Deu a sugestão o escorpiano, ainda se sentindo contrariado.

Peixes piscou, olhando para o menor ligeiramente surpreso. Essa ideia sequer havia ocorrido à sua cabeça, como ocorreria, não tinha um desses aparelhos móveis desde sua aventura na Itália, mas sua casa tinha uma linha fixa, mesmo Ersa e Alba tinham um celulares.

- Não são muitos aqueles que tem um telefone desses no santuário, mas suponho que é o melhor que possamos fazer por agora.  – Comentou, recordando-se que os únicos números que possuía anotados em sua casa eram o de Camus, Milo, Máscara e Albafica. O de Camus havia anotado na época que Soleil ainda era um menino, para que assim, quando dormisse em sua casa, pudesse ligar para seu pai para avisar, tinha o número de Milo pelas mesmas razões, Máscara havia anotado o seu por conta própria, por mais inútil que isso fosse, e Ersa anotou o do próprio Albafica quando comprou a linha.

Mentalmente encarregou sua esposa desse labor, precisavam informar da situação de Rodorio de algum modo. Sabia que o aquariano deveria estar mentalmente instável depois da morte de Milo, mas se tentassem falar com Albafica, o mesmo retornaria imediatamente, e não era isso que desejava.

- Eu pedi que ela te avisasse caso não conseguisse contato com ninguém- Disse simplesmente, invocando uma nova rosa.

- Como assim? Aonde você vai? – Perguntou tenso.

- Atacar a vila onde eu moro, é uma afronta tão grande a mim quanto atrever-se a desafiar o décimo segundo templo! – Seu cosmo emanava, reforçando suas palavras – Jamais deixarei que tal ação saía impune, encontrarei os culpados e os julgarei de meu próprio modo.

Ao ver que Peixes partiria, Unicórnio quase tão rápido quanto uma brisa repentina de vento, adiantou-se até ficar de braços estendidos frente ao outro.

- Eu não vou deixar você ir sozinho assim, eu realmente posso ajudar com isso das serpentes! – Alegou com força. – Não é o momento de ser arrogante ou esnobar-me! Pode confiar em mim!

 - Não me subestime Unicórnio – Bramou – Ademais, eu estou te deixando aqui, cuidando de parte da minha família, e da sua também ou acaso esqueceu que Seika provavelmente é sua meia irmã também?! Quer uma prova de confiança maior do que essa?

Jabu engoliu suas palavras por alguns instantes, para logo acrescentar, mais ponderado.

-...Ir na direção do inimigo sem sequer trajar uma armadura, ainda mais um inimigo capaz de te transformar em pedra, é suicídio. – Alegou por última vez.

- Eu sei – Foi a resposta taxativa de Afrodite – Mas eu prometi que não iria morrer.

E sem dar mais espaço a replicações, se foi pelo vilarejo.

- Jabu – A voz de Ersa surgiu num pequeno alto falante, embaixo do balcão da loja, fazendo o escorpiano se sobressaltar de susto– Estou com Camus na linha.

-.-.-.-

Um rapaz alto, de cabelos verde água, pele absolutamente pálida e lábios arroxeados desligava o telefone que a segundos usara.

- Muito bem, e o que vai fazer agora? – Dizia uma figura à sua frente, interessada.

- Exatamente o que eu disse que faria, você estava ouvindo – Respondeu simplesmente, olhando para suas mãos e estralando-as. – Não te devo mais explicações do que isso.

- Huuuu, grosso. E olha, eu não faria tantos movimentos se fosse você, dentro de uma hora a tendência é se contrair, e só irá voltar ao normal depois de vinte e quatro horas, não temos tanto tempo assim, eu sinceramente só devo aguentar umas três.

- É o suficiente. E o que você vai fazer? – Questionou, não olhando para o individuo em questão, e sim a grande quantidade de sangue que encharcava a terra ao redor dos únicos presentes no local.

- Minhas ordens agora são permanecer aqui até que tudo acabe, para então podermos ir. – Em resposta, recebeu um olhar franzido – Não se preocupe, eu não serei visto, pode não acreditar, mas eu sei ser discreto quando quero.

Observou a figura de cima a baixo discretamente, e não acreditava realmente em suas palavras.

- Nos veremos mais tarde então – Ia começar a caminhar, mas hesitou, sem virar-se acrescentou – Obrigado...

- Boa sorte, mon chéri~

-.-.-.-.-

Afrodite andava a passos firmes por Rodorio, tomando atenção para qualquer som e movimentação, invadia ou entrava nas casas dos arredores em busca de sobreviventes, mas algumas estavam até mesmo vazias, indicando que os moradores tinham fugido, em outras, achava pessoas apavoradas, a qual orientava para procurar abrigo em sua loja, sua casa não era suficientemente grande para tantas pessoas, mas não conseguiria abrir um portal para o submundo como Máscara, mesmo usando as sementes de romã*.

Num recorrido de pelo menos dez casas, encontrou apenas uma estátua, também de uma pessoa mais idosa que não pôde se safar sozinha, tentou usar suas rosas para ver suas memórias, mas era impossível em um organismo que já tinha virado pedra, contudo, ao tato, pôde perceber que a rocha ainda estava quente. A serpente que fez isso ainda estava próxima.

Seus sentidos apitaram de repente, saltando para trás, justo a tempo de evitar dito réptil.

- Rosa Adaga!* – Exclamou, lançando de modo certeiro uma rosa azul na cobra de cor escura, cortando-a facilmente em duas, como se tivesse lançado uma faca.

Porém, outras seis saíram de diferentes partes da sala, em sua direção.

- Rosas Piranhas! – Em alta velocidade, lançou suas flores em diversos alvos simultaneamente, elas perfuraram sofás, cadeiras, rasgaram cortinas, e dividiram em dois até mesmo uma velha televisão de tubo, porém sempre acabaram atingindo seu alvo de forma certeira, mas criaram muitos ruídos e destruição ao seu redor.

- Maldição – Deu um passo para trás, enroscando assim o pé no fio de um abajur. – Droga!

Puxou para se soltar, derrubando a velha luminária com um som agudo, que disfarçou o bote de mais três serpentes.

Contudo, criou um escudo de rosas a tempo de impedi-las em seu bote, para então fatiá-las com suas rosas azuis.

- Tenho que sair daqui – Comentou para si mesmo, estava em desvantagem em um ambiente tão fechado e poluído, mas os repteis pareciam obstinados a não permitir que isso acontecesse facilmente, como se tivessem mentalidade própria.

Ou quem as estava controlando conseguia observar tudo.

O caminho para a entrada estava repleto de cacos de vidro, frutos da lâmpada estilhaçada, caminhou de costas, atento a novos movimentos, pisando sobre os fragmentos sem se importar, mesmo não estando de armadura, suas botas de jardinagem eram suficientemente grossas como para protegê-lo.

Quando pisou sobre um caco razoavelmente grande, uma nova investida se fez presente, dessa vez de suas laterais, entrando pelas janelas, quebrando-as sem dificuldade, porém, essas serpentes eram diferentes de todas as outras, pois entravam como lanças perfurando tudo, não era possível ver suas caudas, como se continuassem do lado de fora.

Desviou com um salto para trás, lançando suas Rosas Adagas, mas essas conseguiram desviar, surpreendendo-o, com outro salto lateral, chegou a parede próxima a porta, atacando com suas rosas piranhas, que destruíram ainda mais a estrutura da casa, que aos poucos começou a desabar.

E mesmo assim as duas novas serpentes desviaram também.

- Rosas Diabólicas Reais! - Disparou três pares de suas rosas vermelhas, que igualmente que as anteriores, não atingiram seu objetivo, mas não era necessário.

Um forte veneno desprendeu no ar, fazendo as serpentes-lanças se contorcerem, e retornarem para a janela de onde haviam surgido.

- Aaah! – Uma exclamação de dor surgiu espontânea em sua boca quando sentiu uma aflição latente em sua perna, as duas cobras de antes haviam sido usadas como distração para um ataque por baixo, fazendo-o perder o equilíbrio, como se tivesse sido acertado por uma dolorosa agulha escarlate.

Seu coração vacilou por alguns instantes, até reconhecer a serpente que o havia atacado, uma mamba negra, o mesmo tipo que atacou e hospitalizou Camus antes.

Ao tentar reerguer-se do chão, a palma de sua mão direita cortou-se com os cacos de vidro de antes, mas isso não importou minimamente o pisciano, que agarrou a serpente com as mãos nuas antes que armasse um novo ataque, enquanto a segurava com a ferida, mantendo distância de seu debater, ergueu parte de sua calça para analisar a mordida.

Sangrava, mas ainda era de carne e osso, sem sinais de petrificação.

Sem dar tempo para um novo ataque, ergueu-se e dirigiu-se a saída.

Ali, como suspeitava, lhe esperava alguém.

- Você deve ser Afrodite de Peixes.

Era uma bela mulher, pele clara e corpo perfeitamente delineado, trajava apenas uma toga grega de dois ombros, até os joelhos, contudo, para horror do pisciano, além de seus cabelos feitos de serpentes esverdeadas, as mesmas que o haviam atacado pela janela antes, a visão de seus olhos era repugnante, sob suas pálpebras havia uma grossa camada de uma espécie de areia tostada, como para torná-la mais dura, ao redor, o nome de Chronos em grego antigo.

- E a senhorita deve ser Medusa – Seguiu as apresentações o sueco – Vejo que Chronos não foi nem um pouco gentil ao garantir que você não seria uma faca de dois gumes ao seu lado, petrificando mesmo os seus.

Em seguida, sorriu de forma prepotente, erguendo a mão que segurava a Mamba na direção da grega.

- Creio que isso te pertence, ela conseguiu me atingir, meus parabéns.

- Tu não pareces preocupado – Declarou ela com curiosidade.

 Em resposta, Afrodite mostrou seu melhor sorriso prepotente.

- Uma das cobras mais venenosas do mundo, em nada se compara com um cavaleiro de Peixes – Dito isso abriu a mão, liberando o réptil, que apesar de seguir vivo, não tentou escapar ou atacar novamente, ao invés disso, se debatia compulsivamente.

- O que fizeste? – Questionou ela, impressionada.

Ao invés de responder, Afrodite abriu sua palma sangrenta, a que antes segurava o réptil, deixando que mais algumas gotas caíssem sobre a serpente, fazendo-a retorcer-se ainda mais, até definitivamente morrer.

- Parece que a Mamba não pôde resistir ao meu sangue, que irônico, não?- Sorriu, levando uma de suas rosas vermelhas à boca – Agora é sua vez, irá morrer dolorosamente pelo que fez a minha vila!

Sem mais esperar, deu um grande salto, lançando Rosas Diabólicas Reais para todas as direções.

- Veneno tampouco irá funcionar em mim cavaleiro. Sendas de Mármore! – Seus cabelos esverdeados cresceram como lanças ondulantes, e devoraram todas as rosas.

- O que pensa que está fazendo?! – Questionou o sueco, pousando ainda próximo à casa que havia entrado antes, e que começava a ruir aos poucos.

Assim que as serpentes haviam ingerido as flores preenchidas de completo veneno, outras cobras pertencentes ao cabelo da górgona, as morderam e arrancaram, deixando ao chão as petrificações envenenadas.

- Engenhoso, grotesco, mas engenhoso – Admitiu. – O que acha de um corte de cabelo mais radical?

Dito isso, começou a correr lateralmente, formando um círculo envolta da górgona, lançando diversas de suas rosas adagas. Contudo, os cabelos dela agilmente erguiam-se e contorciam-se para proteger sua ama à perfeição, sendo mutilados e mortas, porém não permitindo que sua senhora sofra qualquer arranhão, e crescendo com uma velocidade absurda depois, como se fossem a própria Hidra.

Ao completar meio círculo, estando de frente para às suas costas, começou então a focar o pescoço contrário até retornar a sua posição de antes fechando o círculo, suas ações irritando a grega.

- Acha que eu morreria da mesma forma outra vez? – Impacientou-se ela, sem sequer se mexer – Não permitirei que cortem a minha cabeça como Perseu fez no passado a mando dos deuses.

- Muito bem então, mudaremos a mira, sejamos originais, eu não gostaria de aborrecer uma mulher tão bela – Gracejou invocando sua rosa branca, parando novamente frente à casa de antes, agora completamente demolida.

- Que amável,  eu não recebia um cortejo desde que Poseidon usou-me e descartou-me – Disse num tom claramente amargo.

- Cortejo não, por favor, eu já sou casado, desculpe pelo mal-entendido, em troca, te ofereço algumas flores brancas.  ROSAS SANGRENTAS! – Sem sair de seu lugar, dessa vez, desferiu doze rosas, em intervalos curtos e depois mais longos, buscando a todo custo acertar o coração da Górgona.

Mas não obteve sucesso, uma a uma, suas serpentes a defendiam de forma suicida, morrendo imediatamente depois, enchendo o chão de pedaços de réptil e rosas avermelhadas de seu sacrifício.

- Obrigada, mas eu não gosto de flores, eu prefiro pedras preciosas – Disse sorrindo com cortesia, como se estivesse se divertindo – E lutar comigo usando projeteis será completamente inútil.

- Muito bem, mudemos de estratégia então. - Dito isso concentrou o cosmo em suas mãos, e assim conseguiu ampliar o caule de uma de suas rosas, formando assim um chicote de espinhos.

- Uma chibata de espinhos? – Impressionou-se verdadeiramente ela – És um homem sem dúvida versátil. Digno de minha atenção.

- Com todo o respeito, essa conversa está ganhando um viés estranho, e eu temo mais a ira de minha esposa do que a de qualquer servo de um deus – Respondeu ele, aproximando-se diretamente dela.

Medusa riu com graciosidade, que nada se comparava com o aspecto monstruoso da grega com seus olhos selados e cabelo ao ataque.

Com uma destreza impecável, caminhando para um golpe direto, Afrodite cortou todos e cada um dos cabelos que tentava se aproximar, chegando cada vez mais perto de seu alvo.

- Eu pensei que os cavaleiros de Athena não usassem armas.

- Isso não é uma arma, é só um caule alongado e espinhoso – Contestou, cortando cinco serpentes de uma única vez, estando a menos de um metro de seu alvo. 

- Nada como sair pela tangente, não crês? – Depois de uma ágil investida, o cavaleiro estava a menos de três passos da jovem, mirando seu pescoço mais uma vez - Gárgula Górgona*!

Contudo, ao invés de acertá-lo, seu chicote enroscou numa estátua humanoide e corcunda, que simplesmente brotou do chão como um Golem que protege seu senhor, perdendo a cabeça em seu lugar.

- Mas o quê?!

Saltou para trás, recobrando a distância, surpreendendo-se ao ver mais gárgulas surgindo do chão, elas possuiam presas de javali e asas de morcego, aparência a qual os mitos diziam que pertencia a própria Medusa, ao menos era isso que sempre lhes foi ensinado no santuário.

Como se lê-se seus pensamentos, Medusa respondeu.

- Não parecem nada comigo, não? Porém foi assim que Athena vendeu minha imagem para vós. Um monstro. Eu era sua fiel sacerdotisa, sua confidente, sua acompanhante. Fui cortejada por Poseidon e enganada para coitar em um templo da deusa, e fui amaldiçoada por isso, e continuarei assim até que sua deusa morra!

Enquanto a mulher destilava seu ódio, Peixes pousou sobre a cabeça de uma das gárgulas antes que essa começasse voo, deu um mortal para o chão, enquanto cortava aquela que lhe serviu de apoio e partiu para as outras, passando a lançar suas rosas azuis e negras quando elas começavam a se desprender do solo.

Sua respiração estava arfante, seu corpo começava a exigir descanso, com a eminente sucessão de seu filho e as responsabilidades de ajudar sua esposa grávida na floricultura, não havia se metido em um treinamento intenso há quase um ano, o que não tinha sido suficiente para manchar suas habilidades, mas aparentemente estavam cobrando seu preço em sua resistência física.  

Ainda assim estava conseguindo se manter, entre destruir uma e outra estátua, lançou um olhar lateral a Medusa, ela também estava cansada, bem mais cansada, o que significava que se mantivesse esse ritmo, ganharia eventualmente, mesmo que não conseguisse um golpe direto.

Não seria uma vitória grandiosa, mas ainda era uma vitória.

- SOCORRO! POR FAVOR! ALGUÉM ME AJUDE!

O coração de Afrodite deu um salto, quando viu uma sobrevivente completamente desnorteada correndo na direção deles.

Medusa franziu a expressão.

- Eu evitei de perseguir aqueles que conseguiam escapar, mas seria castigada se fizesse isso com alguém que vem a minha direção – Comentou a grega com certo tom de tristeza.

Tudo aconteceu muito rápido. Com as Sendas de Mármore as cobras partiram na direção da jovem. Passando por entre os braços das gárgulas, Afrodite correu na direção da civil, lançando suas rosas cortantes nas cabeças que tentavam atacá-la, e até mesmo criando um escudo na sua frente.

- VÁ EMBORA DAQUI IMEDIATAMENTE! – Bramou com urgência, fazendo a moça tremer, em choque, mas ela manteve-se em seu lugar.  

Sem remédio, parou na sua frente, de forma protetora, e passou apenas a defender.

- Me escute – Disse, tentando soar mais calmo, pegando com a mão esquerda um pouco mais da raiz de asfodelo, enquanto se defendia com o chicote na mão direita, trocando o olhar da luta para a mulher e vice e versa – Eu sei que essa situação toda é insana -  Com isso, descascou um pouco da casca com a unha de seu polegar, formando um pó similar a canela e soprou no rosto da mulher – Vá para a floricultura, lá estará segura.

O pó teve um efeito amortecedor na adrenalina contraria, fazendo-a voltar a raciocinar um pouco menos em pânico.

- S-sim... – Disse ainda trêmula – O-obrigada... – E correu na direção indicada.

Como mencionado por Medusa antes, a Górgona não tentou atacar uma vez que o alvo estava fugindo, estranhando o pisciano.

- Quer dizer que existe um pouco de honra em você? – Questionou com ironia, vendo como ela recolhia seus cabelos.

- Eu não estou feliz em matar inocentes, se é o que vós quereis dizer – Declarou ela solenemente – Nunca tivesses que realizar fardos horríveis em nomes de suas ordens, cavaleiro?

Afrodite engoliu em seco.

- Sim. E por isso posso te dizer com antemão que compactuar com ordens que sabe que são erradas vão custar um enorme preço quando chegado seu julgamento no submundo. – Disse com conhecimento de causa.

Desse momento em diante o enfrentamento já não estava tão equilibrado, Peixes havia usado, sem ressalvas, boa parte de sua reserva de energia e forçado seu corpo ao máximo para conseguir salvar aquela jovem a tempo, estava desgastado, cansado, seus movimentos eram mais erráticos e incertos, por centímetros, às vezes milímetros, não era atingido por novas gárgulas e pelos cabelos de Medusa.

Tragando seu orgulho. Era o momento de clamar por ajuda.

“Máscara...” – mesmo num esforço mental, sua voz saía arfante “Eu preciso de ajuda...Não vou aguentar por muito mais tempo”

Quase imediatamente, a resposta soou, exasperada, num tom que em nada recordava seu debochado amigo.    

“-Onde você está?!?! Acabei de chegar na sua casa e só tem o Jabu aqui!”

“Lutando, contra Medusa, onde ficava a casa daquele velhinho que jogou a bengala em você depois que Piada encheu o telhado dele de papel Higiênico” – Respondeu, desviando de um voo rasante de uma gárgula e de um dos cabelos de medusa.

Anormalmente, o italiano não riu da anedota.

“-Sim, eu lembro onde fica. Como você pode estar tão cansado? Não deve estar lutando mais do que há alguns minutos! E o que resta do miasma em Rodorio não te afetaria, uma vez que você tem as sementes do submundo contigo.”

“Eu dei todas as sementes que tinha” – Respondeu, percebendo que o cansaço então podia provir além da sua falta de treinamento, mesmo que a quantidade agora fosse mínima, como a antigo barreira no castelo de Hades, o miasma podia ser suficiente para consumir aos poucos seu poder?

Talvez todo o desgaste mental e a idade faziam parte da conta também, era difícil saber.

“- SEU IDIOTA! “ – Foi a resposta em fúria do mais velho – “-Estou indo até ai!”

  “Não grite na minha cabe-“ Porém a mensagem não seguiu, porque o mais novo falhou em desviar de um golpe certeiro na boca de seu estomago, aproveitando isso, a outra gárgula o segurou pelos cabelos, elevando-o no ar.

Afrodite?!”

- Acabou Afrodite, tu lutaste bem. – Declarou Medusa aproximando-se. Grunhindo de dor, o cavaleiro soltou seu chicote, o golpe tinha sido suficiente para quebrar algumas costelas.

 Sua respiração doía em seu peito e sua visão ameaçava em falhar, sem mencionar na dor de ser erguido pelo couro cabeludo.

Medusa estava a apenas alguns passos de distância, todos os seus cabelos serpenteando em sua direção.

- ...Você também, lutou bem – Disse Afrodite. Estando agora bem próximos, invocou uma de suas rosas azuis e a utilizou para cortar o chumaço de cabelo que o prendia, deixando-o completamente desigual.

Caiu no chão apoiado com a palma das mãos e os joelhos, no que Medusa se surpreendeu pelo ato, dando ao sueco alguns segundos de vantagem até ela processar o fato e tentar se afastar. Para garantir a fuga de sua senhora de um ataque direto, a gárgula que antes o segurou pisou em sua mão direita, ainda assim, Afrodite lançou sua rosa branca com a esquerda.

 Devido à pouca distância de manobra, as cobras no cabelo não conseguiram defender a górgona a tempo, permitindo que a flor atingisse seu coração.

 Contudo, o custo foi alto. Uma delas, como se fosse em sinal de vingança, mordeu a mão ainda presa do cavaleiro.

A grega levou a própria palma ao peito, sentindo a rosa que começava a avermelhar-se numa velocidade impressionante.

- Parece que foi um empate. – Disse ela com um sorriso deixando-se cair ao chão, sentada – Mas a minha alma, com Chronos, pode se refugiar em outro corpo, enquanto tão belo rosto será apenas uma estátua de Rodorio agora.

Com esses dizeres, todas as serpentes do cabelo dela se voltaram para o pisciano, prontas para atacar.

  -...Não. – A resposta dele foi taxativa, levantando o rosto com firmeza, tentando erguer sua mão direita, notando, porém, que mesmo que a gárgula estivesse ruindo e o soltando, sua mão agora estava presa ao chão, como uma massa de concreto. – Eu não vou morrer. Há pessoas esperando meu retorno!

Enquanto as serpentes preparavam o bote final, Afrodite conseguiu alcançar seu chicote com o braço esquerdo, matou algumas e então...

Cortou fora o próprio braço, pouco acima da altura do cotovelo.

Medusa abriu a boca surpresa, sem poder evitar de recordar-se daquele escorpiano que havia sacrificado o próprio corpo para salvar seu companheiro.

Será mesmo que Athena era a única razão que levava esses guerreiros a ir até tão longe?

 Um grito agudo desprendeu da garganta da górgona, impedindo qualquer intenção de um novo ataque, quando assim que o membro foi cortado, o sangue venenoso jorrou pela ferida aberta atingindo-a, e não obstante, formando uma espécie de nevoa avermelhada ao redor de ambos, enquanto o cavaleiro começava a pender para o lado.

- AAAAAAAAAAAAH!

Seu grito cortou o ar, enquanto ela arranhava seu próprio corpo, tentando deter a sensação que o veneno possuía, enquanto queimava sua pele. Suas serpentes tinham ficado descontroladas, mordendo umas as outras ou mesmo o chão e os destroços das gárgulas.

Afrodite apenas observava a cena, se alguma mais tentasse pegá-lo, não teria forças para impedir, sua sobrevivência, ironicamente, dependeria do veneno de seu sangue.

Então um tiro seco e de pouco ruído passou próximo à sua orelha, e frente aos seus olhos que não conseguiam processar direito o que via, atingiram a jugular de Medusa, fazendo-a imediatamente cair ao chão empapando-se em seu próprio sangue, logo em seguida, as pedras dispersas da Gárgula de forma telecinetica caíram sobre seu corpo, como para garantir sua morte.

- NÃO ENCOSTE NO MEU MARIDO! – Gritou distante a voz de uma mulher.

- Tio Dite! O senhor está bem?!

-...Mas...Isso...- Porém sua consciência não era mais capaz de processar tanto, enquanto seu corpo pendia de uma vez.

Entretanto, o que sentiu não foi o impacto do chão, e sim algo muito mais acolhedor.

- Você conseguiu, Rivera! E eu não acredito que você acertou de tão longe, Ersa! – Exclamou impressionado aquele que o segurava – Fiquem aí, essa névoa é altamente tóxica, não se aproximem!

-...Ângelo? Você trouxe...Os dois? – Disse semiconsciente, vendo como seu amigo o tinha segurado e o observava lívido, estava até mesmo ligeiramente tremulo, e pela primeira vez em muitos anos, havia medo em seus olhos.

- Ei...Fratello, você fez um estrago aqui, e você sabe que eu sou péssimo para dizer não, esses dois foram bem insistentes – Disse tentando um sorriso que estava a ponto de vacilar, encarando o braço perdido do companheiro e como aos poucos a falta de sangue o deixava pálido.  - ...Ainda bem que você já é casado, então essa mão não te fará tanta falta assim!

- ...Seu...- Conseguiu dizer, começando a fechar os olhos - ...Idio...

- ...Afrodite? – Chamava, uma expressão de pânico formando-se em seu rosto.

 Ersa deixava seu rifle m4a1 cair, porém não se aproximou da nuvem tóxica pelo bem dos filhos que carregava no ventre, enquanto o pequeno Rivera amarrava sua faixa da cintura no rosto para poder se aproximar, apesar dos avisos anteriores. Mesmo que suas habilidades de cura fossem mínimas, como lemuriano queria poder ajudar.

– AFRODITE! – A voz de Ângelo ecoou pela vila.

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Notas Finais


Esse é um daqueles capítulos em que o título mais significados tem, vocês conseguem interpretar todos?

*Sun Tzu, suposto autor de A Arte da Guerra, livro ao qual essas frases que Verônica citou pertencem. E segundo Verônica, um cavaleiro de Libra.

*Lá no longiiiinguo Capítulo VIII - A voz da alma -, MdM mostra ser capaz de aproximar-se de Ikki sem ser notado, o que irrita e surpreende muito o nosso fênix.

* Apesar de ter se afastado do Santuário, tanto Mist quanto Asterion conheceram o Muh e o viram "atuar" no campo de batalha, isso no mangá, daquela luta da praia e do Mist peladão XD.

*Como já dito algumas vezes na estória, depois da morte de Astéria, Erisictão ficou "sob os cuidados" de Póllux, que acabou anotando a decaída e o suicídio do pobre aquariano. Segundo Saga suspeita, esse interesse tem a ver com a caixa de Pandora, embora Eri tinha tudo, menos um coração de gelo.

*Como dito em vários capítulos também, Shunrei educou primariamente todos os mais jovens do santuário, e acabou pegando gosto de ser chamada de Mama por todos, embora só os mais jovens façam isso, e Geki, pq isso deixa Shunrei feliz, então ele faz xD

* Acessar o sistema nervoso através do uso de rosas é uma habilidade de Afrodite explorada em Soul of Gold.

* Como mostrado no Capítulo XLIV 3 da madrugada - por Mist, os espectros também podem retornar ao submundo através das sementes de romã com um pouco de seu sangue, isso serve para retornar ao submundo quando não tem a sobrepeliz e não podem usar cosmo (Para n chamar a atenção, por exemplo) Como dito no mito de Persefone e no Capítulo XLV- Mortos contam histórias., o submundo conta com uma grande plantação de romãs.

*Rosa Adaga - Golpe original de Cardinale de ND.

* Gárgula Górgona - Golpe criado por mim. Gárgulas são desaguadouros, estatuas de aspecto terrível presentes em construções antigas com a função de escoar água da chuva. Górgonas são um grupo de três irmãs, a qual Medusa pertence, e é a única mortal.

E por hoje é só! O próximo cap se passa no passado, ooou seeeja, vai demorar um pouquinho pra saber da situação do Dite, mas ele falará mais sobre o que tornou MdM e Dite mais próximos nesses vinte anos, além de outras coisinhas mais.

Deixem um comentário por esse capítulo giigantesco e...É isso! Nos lemos ;D


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