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História Into The Dead - Capítulo 55


Escrita por: control5h

Notas do Autor


Olá, meus amorzinhos! Adivinha quem voltou com a segunda comemoração pelo um ano da fic?
Ao mesmo tempo em que tô feliz em Havana por isso, estou triste no clube, pois ITD está começando a caminhar para a reta final. Não sei ao certo quantos capítulos, porque a autora aqui adora escrever e criar mais situações, mas que estamos começando andar a esse rumo... nós estamos!
Quero agradecer os incentivos, as críticas, as homenagens, aos comentários! Eu leio tudo e guardo no meu coraçãozinho de gelo!

Cá está outro capítulo! Boa leitura, me perdoem pelos erros e segurem-se, porque hoje vamos ter ação em Havana oh na na all night!

Capítulo 55 - Capítulo 55


Fanfic / Fanfiction Into The Dead - Capítulo 55

CAMILA PDV

Lentamente, recobrando a consciência, eu consegui ouvir ao fundo os grunhidos guturais tão conhecidos por mim após três anos de Apocalipse Zumbi.

Tudo doía. Desde a base dos meus pés à minha cabeça, que, pelo latejar, certamente possuía um corte expelindo sangue.

Com choramingos saindo por meus lábios, aos poucos vou buscando forças para abrir os olhos. Pisco ainda abobalhada, percebendo que as últimas rajadas laranja e roxo no céu denunciavam o pôr do sol e a chegada da noite.

Após finalmente relembrar o que aconteceu, eu giro o rosto e, mesmo enxergando tudo embaçado, a primeira silhueta que busco é a de Lauren.

A jovem estava apagada e dependurada de lado como eu, permanecendo nessa posição graças ao cinto de segurança que felizmente todas nós usávamos. Ela possuía apenas algumas escoriações na pele branca, provenientes dos cacos de vidro.

Lauren estava bem.

Um pouco mais calma após notar sua respiração, que indicavam que estava viva, eu olho ao redor e tento entender de onde vinha o rosnado gutural que me irritava.

- Merda! – eu arregalei os olhos ao encarar o zumbi batendo contra o para-brisa, tentando passar a cabeça por uma brecha.

Atrás dele para completar a maravilhosa situação, havia pelo menos mais quatro amigos que grunhiam e, tão grotescamente nojentos quanto, tentavam escalar o Jeep SUV capotado de lado.

Veronica e Lucia também estavam apagadas, na cabine. A motorista possuía sangue seco nas narinas, certamente após atingir o rosto no volante e a Rainha estava, ao que aparentava, em uma posição desagradável e com um filete vermelho escorrendo de seu supercílio direito. Seu taco de beisebol estava caído aos seus pés.

O morto-vivo grunhia irritado e tentava, cada vez mais, quebrar o para-brisa que já estava quase completamente trincado. A pele do desgraçado era praticamente pus e ficava presa ao atritá-la no vidro, deixando carne podre e negra em companhia à gosma fedorenta.

- Lauren, acorde! – eu grunhi.

Faço uma careta ao mexer meu braço direito, extremamente sensível. Por todo o meu antebraço pedaços de caco de vidro estavam penetrados na pele vermelha, gerando uma ardência quase insuportável.

- Alguém acorde! – eu falo mais alto, entre os suspiros de dor.

Após receber mais silêncio e mais grunhidos dos zumbis como resposta, eu decido agir por conta própria.

Inspiro o ar para dentro dos pulmões, ordenando à minha voz interior para não chorar.

Levo a mão esquerda até a trava de liberação do cinto de segurança e a destravo. Por causa da gravidade, todo o meu peso despencou para baixo pressionando ainda mais os cacos de vidro na pele do meu antebraço.

Engulo o grito de dor fechando a boca e os olhos com força.

Entretanto, não pude hesitar mais, pois o zumbi estava prestes a perder toda a pele do rosto – que o prendia ao vidro – e adentrar no interior do Jeep SUV. Eu poderia, muito bem, deixá-lo atacar Lucia Vives, a qual seria seu primeiro alvo, mas, por mais que uma parte maléfica minha pedisse por isso, a outra, que sempre pensava no bem alheio, gritava para que eu não deixasse isso acontecer.

Até porque, se ele entrasse, logos os companheiros entrariam e atacariam Lauren e eu.

Ignorando a dor latejante, eu levo a mão esquerda até o cano da minha bota e busco o cabo do canivete que sempre ficava ali. Ao pegá-lo, eu me arrasto para ficar de pé dentro do carro capotado. E, livrando-me do único braço que o morto-vivo conseguiu colocar para dentro do SUV, eu retiro a lâmina do canivete e a penetro no meio de sua testa enrugada por pus.

Sem forças para retirar o canivete dali, eu deixo o morto-vivo, que mais parecia uma gelatina, dependurado no para-brisa evitando assim que os outros entrassem.

- Lauren? – eu chamo pela jovem outra vez, girando meu corpo e, meio agachada pelo estado do veículo, vou até ela. – Lauren?! Por favor, me responda!

De leve, começo a bater em suas bochechas. Felizmente, a jovem ao poucos acordou, resmungando pela dor que regia todo o seu corpo preso.

Ela abriu os olhos, grogue, e demorou alguns segundos para entender onde estava e o que havia acontecido.

- Camz?! – ela arregalou os olhos, atordoada. – Você está bem?! O que aconteceu?!

- Estou bem. Precisamos sair daqui! – eu tento acalmá-la ao ver o desespero. – Vou soltar o seu cinto, mas preciso que me ajude a segurar o seu peso para que você não caia nos cacos, ok?

Lauren concorda com a cabeça e esperou até que eu desprendesse a trava de liberação de seu cinto. E, assim que o faço, ela grunhiu ao apoiar a perna direita para evitar cair sobre o estofado do banco traseiro.

Por causa dos barulhos, Veronica aparentemente começou também a despertar. A motorista choramingava ainda de olhos fechados, com as mãos sobre o nariz dolorido. E, assim que despertou de vez, a primeira pessoa que ela buscou foi Lucia ao seu lado.

Ela ignorou por completo a própria dor e começou a apalpar a Rainha, tentando acordá-la.

- Lu, por favor, acorde! – ela implorou, afagando o rosto da namorada. – Lucia!

Um resmungo arranhou a garganta da Rainha e ela franziu o cenho, certamente absorvendo toda a dor que vinha como um tsunami a cada segundo que a inconsciência ia embora.

- Quem foi o desgraçado que fez isso?! – ela rosnou, abrindo os olhos e encarando o ambiente do carro capotado. – Eu vou matá-lo bem devagar...

Veronica suspirou aliviada ao ver a jovem bem.

- Vocês estão bem?! – a motorista perguntou, girando o rosto em nossa direção no banco traseiro.

- Nunca estive melhor! – Lauren ironizou, com caretas de dor. – Eu faço isso todos os fins de tarde...

- Precisamos sair daqui. Há zumbis se acumulando do lado de fora! – eu digo.

Veronica concordou e, devagar, se soltou do cinto de segurança também, apoiando-se ao volante para não cair sobre Lucia no banco do carona. A Rainha ainda grogue como todas, balançou a cabeça procurando a consciência e agarrou o seu taco de beisebol, logo ao se desprender do cinto.

Lauren foi a primeira a escalar o veículo capotado de lado e sair através da sua janela, que possuía o vidro quebrado. Ela passou pelo buraco e esticou a mão para me ajudar. Apoio um pé no banco de Vero e me impulsiono para cima, grunhido de dor quando meu braço direito raspou na lataria.

Ainda sobre o carro, Lauren sem hesitar, retirou as suas Desert Eagles do interior dos coldres axiais e atirou, sem errar, nas cabeças dos seis zumbis que zanzavam o SUV. A fumaça subia do motor, indicando sua perda total. A lataria só não havia despedaçado e gerado nossas mortes graças às inúmeras estacas e proteção de metal que Veronica havia detalhado nas laterais.

- Olhe o que essa pessoa desgraçada fez com o meu carro! – Veronica resmungou ao pular no asfalto, ao lado de Lucy.

A Rainha possuía as mãos apoiadas no joelho e corpo inclinado para frente, com caretas de dor por ter absorvido muito da pancada.

- Vocês duas estão bem? – Vero pergunta outra vez, erguendo o olhar para Lauren e eu. – Camila? Seu braço...

Olho para meu antebraço e vejo o sangue pingando lentamente por causa dos cortes causados pelos vidros ainda presos na pele. Latejava como o Inferno.

- Me deixe te ajudar... – a Rainha falou, retirando a jaqueta do corpo e caminhando até mim.

Com uma expressão de dúvida no rosto, analiso Lucy – usando apenas o topper agora – pegar o meu braço com cuidado e começar a retirar os cacos de vidro superficiais. Suspiro por causa dor, fechando os olhos para evitar que as lágrimas ganhassem a luta. Após retirar o máximo possível, a jovem envolveu meu antebraço com sua jaqueta, estancando o sangramento para que ele coagulasse e parasse de sangrar por si só.

- Pronto... – ela terminou com um nó nas mangas do tecido e ofereceu um sorriso amigo para mim.

Realmente amigável e carinhoso.

Isso me deixou um pouco atordoada, confesso.

 - Quais são as chances de possuirmos hemorragias internas e morrermos até chegarmos à Lésvos? – Veronica choramingou, com um braço apertando a barriga.

- Elas são realmente grandes e só vamos perceber quando for tarde demais. – Lauren completou, escorando-se a lataria amassada e inspirando fundo ao tocar as contusões pelo corpo. – Se alguém desmaiar, avise!

- Vocês duas são realmente positivas! – resmungo, com uma sobrancelha erguida.

- Obrigada! – elas falaram assustadoramente ao mesmo tempo.

Lucia, ao contrário de nós que estávamos felizes por estarmos pelo menos vivas, prestava a atenção em outra coisa. Seus olhos enraivecidos analisavam um ponto específico em meio à escuridão que aos poucos abrangia a rodovia que parecia ter uma curva no horizonte. Assim como a chegada da noite, grunhidos e rosnados arrastados ao longe indicavam zumbis passando por perto – talvez não em nossas direções, mas próximos.

Enquanto uma mão segurava firmemente a base do taco de beisebol, a outra foi até a testa e secou o excesso do sangue que escorria pelo rosto bonito.

- O quão distante estamos de Lésvos? – eu pergunto, segurando meu antebraço contra o corpo.

- A pé?! – ela responde ainda encarando a rodovia penumbrosa. – Aproximadamente umas quatro ou cinco horas. Isso... se formos otimistas.

Engulo seco e deixei que o silêncio reinasse. Apenas os barulhos dos grilos e de outros animais noturnos ecoavam em meio à floresta que nos rodeava.

- O que vamos fazer agora? – Veronica questiona, agachando-se para pegar o fuzil por entre as latarias amassadas do carro. – Vamos ir perambulando iguais quatro andarilhas em direção da comunidade com a noite chegando?

- Você tem uma ideia melhor?! – Lauren rosnou com caretas de dor, ficando de pé após passar alguns minutos escorada ao SUV.

- Eu tenho... – o tom sério na resposta de Lucy fez com que nós três a olhássemos. – Nós vamos achar quem nos atingiu! – ela rosnou, apertando o taco na mão direita.

- Querida... seja ela ou ele... está longe daqui! – Vero tentou argumentar e deu um passo em direção da namorada.

- Não, não está! – Lucy balança a cabeça e ergue o dedo indicador para o horizonte da rodovia.

Sigo a direção em que ela apontava e vejo, em meio às penumbras causadas pela Lua no céu estrelado, a sombra apagada do que parecia ser uma picape abandonada.

Ela estava deixada na lateral da estrada, em meio aos galhos.

- Está vendo no chão? – a Rainha diz e dá alguns passos à frente, agachando-se e ficando sobre um joelho enquanto tocava em um líquido negro no asfalto, o sentindo entre os dedos. – É óleo de motor! E está fresco, o que significava que quem nos atingiu tentou fugir com a picape, mas ela se danificou demais por causa das estacas do SUV.

- E qual é a sua ideia?! – Lauren retrucou tão fervorosamente que nem notou a ausência do vocativo. – Adentrar na escuridão e marchar em direção de uma cidade cheia de zumbis... atrás de algum desgraçado?

- Algum desgraçado que possuía razões para querer nos matar! – Lucy ficou de pé e girou o corpo abruptamente para nós duas. – Ou você acha que quem nos atingiu fez “Sem querer, querendo”?

- Eu concordo com a Lauren, mas... – Veronica suspirou, passando a alça de seu fuzil pelos ombros. – Precisamos comparar as distâncias das viagens: quatro ou cinco horas até Lésvos ou apenas uma hora e meia até Omaha?

- Eu entendo o receio de vocês duas... – a Rainha murmurou, surpreendentemente compreensiva.  – Mas precisamos de um carro, de qualquer jeito. Veronica ainda está mancando. A Camila está sangrando. Lauren mal consegue ficar de pé direito sem fazer uma careta! Vamos para a cidade, procuramos um carro que preste e... se acharmos o responsável... ótimo! Se não... voltamos. Eu prometo!

Nós três nos entreolhamos por alguns segundos, nos questionando o quão honesta e sincera Lucia Vives estava sendo em sua promessa.

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Com uma careta, eu levanto o tecido da jaqueta negra para checar como meu braço estava. O sangue estava seco e, felizmente, uma crosta de plaquetas coaguladas havia impedido que mais líquido vermelho esvaísse. Entretanto, o pior era o fato de não possuirmos um mísero anti-inflamatório ou qualquer remédio contra dor para aliviar a ardência que me consumia.

Enquanto caminhávamos, apenas os barulhos de nossos passos no asfalto ecoavam em meio à noite. Nós quatro estávamos no centro da rodovia formando uma linha, cada uma atenta que nos rondava e com as próprias mochilas nas costas.

Descanso a mão sobre a minha Dan Wesson no coldre da coxa e suspiro. Lauren vagava ao meu lado com uma Desert Eagles na mão direita, pronta para qualquer movimento estranho. Veronica estava do meu lado direito, portando um fuzil militar com uma lanterna acoplada utilizada para iluminar o asfalto e, Lucia ao mais extremo, segurava seu taco de beisebol.

- Olhem aquilo... – Veronica murmurou, chamando nossas atenções.

Uma série de cinco zumbis estava espalhada pelo asfalto. Eram três andarilhas e dois andarilhos, todos em graus de decomposição avançados com as peles secas pelo clima e vermes se alimentando das carnes podres. As cabeças estavam rachadas indicando suas devidas mortes.

Com a luz do fuzil de Vero, nos aproximamos dos cinco corpos fedorentos estirados.

- O sangue não está seco... – Lauren anuncia, ao se agachar e analisar mais de perto a gosma coagulada escorrendo das cabeças rachadas. – Foram mortos há pouco tempo.

- E tem sangue humano fresco aqui... – Lauren apontou para uma poça aos meus pés. – A pessoa que os matou está machucada.

- Pode ter sido qualquer um... – eu digo, encarando a Rainha de forma sugestiva.

- Sim, mas isso também significa que há vivos por perto... – a Lucy retrucou, revirando os olhos para minha petulância.

Sem conseguir exprimir outra reação a não ser de dor, eu engulo um choramingo quando um latejar atravessou todo o meu antebraço machucado.

Era como se cada pedaço de pele estivesse em chamas, ardendo.

- Nós precisamos limpar esse teu braço, senão isso vai gerar uma infecção e as marcas serão permanentes. - Lucia murmura, analisando de longe o tecido da sua jaqueta preta.

No meio tempo em que caminhamos por aquela rodovia interestadual os sinais do apocalipse se fizeram presentes outra vez. Carros e mais carros abandonados se mostravam inúteis pelo fato de os tanques de gasolina estarem completamente secos por duas, e óbvias, razões: 1) oxidaram ou evaporaram e 2) foram roubados.

A poeira acumulava nas latarias amassadas, com rajadas escuras certamente advindas de sangue espirrado.

Qual seria a solução? Continuar andando e procurar casas com alguma gasolina bem guardada.

À medida que continuávamos, a floresta ao redor diminuía e dava indícios de residências e lojas, que ficavam distantes do centro comercial. Por causa da penumbra da noite os arranha-céus estavam apagados e possivelmente se encontravam na mesma situação em que todas as outras construções: vidraças quebradas, teias de aranha, pichações ofensivas e xilogravuras religiosas.

Minhas pernas já doíam tanto pelo incômodo das pancadas que havia recebido no capotamento do SUV quanto pelos quilômetros que percorremos.

Um trailer Motorhome estava largado no centro da estrada, bloqueando a passagem para seis carros e uma moto. Papéis sujos e amassados junto às malas de roupas criavam um aspecto agourento ao fato de, no passado, terem pertencido a pessoas que tentavam fugir da cidade que se eclodia em um número massivo de mortos-vivos.

Caminhamos por entre os veículos e paramos ao nos escorarmos ao trailer, buscando fôlego.

- Beba! – Lauren ofereceu a sua garrafa de água, a única que conseguimos salvar entre as latarias amassadas.

Mesmo com um olhar de repreensão por ela se preocupar ao ponto de me dar sua água, eu aceito o líquido quente.

- Nenhum grupo virá atrás da Rainha? – alfinetei, semicerrando os olhos em afronta para Lucy.

Talvez a dor estivesse me dando mais coragem ou mais estupidez.

A jovem me lançou um olhar de soslaio e sorriu ironicamente, sem mostrar os dentes.

- Eles virão, pela manhã. Há um protocolo de doze horas... Sabe como é... Uma Rainha não pode deixar seu Reino por mais tempo do que isso!

Uso boa parte do meu autocontrole para não bufar mediante ao seu egocentrismo.

- Pessoal... – o tom de voz preocupado de Veronica fez com que eu e Lucy parássemos de nos encarar e olhássemos para a jovem segurando o fuzil. – Calem a boca e escutem!

Os coros sinfônicos de rosnados e grunhidos guturais arranhavam o silêncio da noite quente. Os mosquitos sobrevoando e a carniça que vinha junto à brisa abafada sinalizavam o óbvio: havia zumbis agrupados por entre as casas e prédios daquela fatídica cidade.

- Precisamos encontrar o maldito carro ou um lugar para passarmos a noite. Esses malditos vão nos cheirar! – Veronica rosnou, erguendo o fuzil na linha dos olhos e fitando os arredores do trailer.

- Nós temos duas opções... – Lauren diz, retirando sua segunda Desert Eagles do coldre e ficando em posição defensiva. – Ou procuramos algo nesse condomínio a oeste ou passamos pela Bob Kerrey Pedestrian Bridge e adentramos na cidade!

- Passar pela ponte?! – Veronica retruca a jovem. – Está louca?! É de lá que os zumbis estão vindo!

- Sim... mas eu tenho plena certeza que não há nada nos condomínios da periferia. Esses foram os primeiros locais a serem saqueados, vão por mim. – ela murmurou e quase, quase, olhou em minha direção.

Sim, Lauren... eu me lembrava desses tempos também.

- Conseguiremos passar pela ponte! – Lucy falou, com uma convicção invejável.

Mesmo resmungando, Veronica se viu obrigada a recomeçar a caminhada após desviarmos do trailer.  Eu não estava de acordo com aquela decisão, mas sabia que voltar após termos percorrido tanto já não valia de nada. Nós quatro então, meio agachadas, começamos a perambular por entre os carros, motos e trailers abandonados por toda a extensão da ponte que ligava área verde à área industrial de Omaha.

Era uma ponte feita exclusivamente para pedestres, mas, aparentemente, em meio ao desespero pela fuga da grande cidade, as pessoas tentaram inutilmente passar por ela usando os veículos. Atitudes erradas que geraram um engarrafamento que resultou na morte da maioria que não conseguiu fugir. Mochilas, malas, portas abertas, papeis no chão, cheiro de carcaça e corpos estirados fazia parte das sombras que bailavam a cada vez que Vero iluminava o nosso caminho.

Todos os veículos que pensávamos em pegar: ou estavam com o taque vazio ou com os pneus furados. Além de, também, estarem em posições desfavorecidas para que déssemos partidas e fugíssemos. Usávamos nossas facas e canivetes para aniquilar os zumbis individualizados que surgiam, buscando percorrer toda a extensão da ponte em silêncio e sem alarmar a massiva horda que perambulava entre os prédios, que ficavam cada vez mais próximos.

O rio abaixo da ponte seguia seu curso normal, alheio às todas as ações antrópicas que o homem causou.

Nós demoramos quase meia hora para atravessarmos toda a extensão da ponte. Indícios de que pessoas, momentos atrás, haviam passado por ali se faziam cada vez mais presentes: com zumbis aniquilados e frescos por todos os lados.

Perto do final da Bob Kerrey nos paramos e aproveitamos da brisa fresca do rio para respirar.

O vento fazia com que as madeixas de nossos cabelos balançassem. Lauren estava escorada ao parapeito, tentando descansar por alguns segundos, enquanto Veronica amarrava a blusa na cintura se preparando e Lucia olhava ao horizonte distante.

Após aqueles minutos, recomeçamos a caminhada dessa vez com a luz da lanterna de Vero apagada, evitando sermos vistas ao longe. Usávamos apenas a luz da Lua no céu para vagarmos pelo jardim de grama já alta de uma espécie de parque ou jardim, que era o final da ponte.

Entulhos, carros abandonados, corpos, mosquitos, cheiro de borracha queimada, carniça e pichações.

Aquilo parecia ter se tornado padrões por toda a área periférica. Os prédios próximos estavam com as estruturas negras, que sinalizavam as grandes explosões aconteceram ali.

O maldito Major Justin estava certo: eles jogaram Napalms nas cidades.

- Merda, merda, merda! – escuto Veronica resmungar, à minha esquerda.

Com os olhos atentos, giro o rosto em direção de onde seu fuzil apontava. Nós estávamos em frente às construções medianas, em um bairro que talvez um dia foi de classe média. Mercenárias saqueadas, vidraças trincadas e outras residências compunham a vizinhança. Entretanto, nas esquinas, corpos perambulantes e caquéticos estavam de pé e rosnavam à medida que tentavam cheirar nossas essências no ar.

Cerca de oitenta zumbis agrupados, como sempre.

- Não façam nenhum movimento brusco! – Lauren ordenou totalmente paralisada.

Porém, eu tive a mísera impressão que Lucia Vives não entendeu muito bem o significado daquela frase.

E como se não houvesse escutado, a Rainha girou o corpo abruptamente na direção de um vulto alto que passou correndo em um beco existente entre dois prédios de tijolos vermelhos.

- Tem alguém vivo aqui! – ela anunciou, com a esperança psicótica evidente em sua voz.

Antes que pudéssemos segurá-la, Lucy segurou firmemente o taco com as duas mãos e começou a correr em direção da escuridão, onde jurou ver o vulto.

- Ah, não... – eu fecho os olhos, sabendo o que iria acontecer.

Felizmente, o barulho dos passos da jovem alarmou apenas os zumbis mais atentos, os primeiros da pequena horda. Eles giraram seus corpos em nossas direções, grunhiram e deram início a sua marcha lenta e característica. E, mesmo sendo poucos, seria apenas uma questão de tempo até que os outros amiguinhos viessem atrás.

- Que merda, Lucia! – Veronica rosnou, irada pelo comportamento da namorada. – Argh! – ela grunhiu e girou o corpo também, começando a correr mancando atrás da jovem.

Eu e Lauren nos entreolhamos, com expressões incrédulas.

A jovem balançou a cabeça negativamente e, dando de ombros, não teve outra opção a não ser se jogar também na escuridão entre os prédios.

- Inacreditável! – suspiro, segurando minha Dan Wesson com raiva e adentrando na escuridão.

No final do corredor havia uma porta de abrir lateralmente. A madeira estava manchada por fuligem e possuía uma maçaneta com correntes trançadas a um cadeado preso na parede. Uma pequena brecha, que passariam apenas pessoas medianas, era a única entrada para o prédio que aparentava ser um teatro municipal – com estruturas semelhantes a um mausoléu.

Do interior, ouviam-se os passos pesados das pessoas que corriam.

Agacho-me e me espremo na brecha da porta, tendo uma grande dificuldade em passar por debaixo da corrente. Após grunhir e quase minha bunda ficar presa, eu me impulsiono para frente e caio estabanada no chão.

Pela ausência de luz, pisco com rapidez para me acostumar.

- Lauren?! – eu sussurro baixinho e espero cerca de dez segundos pela resposta.

Tudo o que recebi de volta foi o silêncio.

Resmungo interiormente e, após fechar a porta, dou passos temerosos por cada corredor do teatro abandonado.

Cheirava a mofo e fezes de roedores.

Abaixo a cabeça assim que sinto meu pé batendo contra um objeto metálico no chão. Agacho e o pego, o tateando para “enxergá-lo”. Giro a base e a luz se fez presente, demonstrando que aquilo era uma lanterna.

A pessoa que Lucy estava perseguindo certamente havia deixado cair.

Começo a iluminar o lugar, às vezes escutando o arranhar das unhas dos zumbis do lado de fora, querendo entrar. Alguns cadáveres estavam jogados nos cantos das paredes, com diversos buracos sinalizando que foram baleados até a morte. Era artilharia pesada, que denunciava a possível obra de militares no começo do Apocalipse, pelo simples fato da carcaça já estar em decomposição há anos e por causa dos diferentes tamanhos e formatos dos buracos.

Porém, um corpo me chamou mais a atenção que os outros. Ilumino-o, me deparando com um homem recém-morto contra a parede.

O sangue, diferente das gosmas apocalípticas, ainda estava quente e escorria da lateral de sua cabeça, que estava com um trauma feio.

Ele era humano quando morreu.

E isso acontecera há minutos atrás.

Com meu coração batendo na garganta, continuo a percorrer o corredor até perceber que me encontrava no lobby do teatro. Escombros e poltronas rasgadas estavam espalhados por todos os lados, com rastros humanos.

Um arrepio cruzou toda a minha espinha quando, subitamente, passos ecoaram às minhas costas.

Giro o meu corpo já com a arma levantada, e me deparo com a silhueta feminina me encarando com a respiração descompassada.

- Abaixe-se, agora! – Lauren arfou, passando um braço sobre os meus ombros e forçando-me para baixo.

E, assim como um estralar de dedos, a sinfonia de tiros ecoou acertando todos os móveis ao redor. Meu coração veio até minha garganta por causa da adrenalina repentina quando Lauren me puxou para detrás do balcão principal do lobby, nos escondendo das balas que voavam.

Elas atingiam os espelhos e as garrafas, fazendo com que mais cacos explodissem no ar.

Engatinho para a esquerda, buscando a parte mais côncava do balcão. Ergo um braço e o coloco na frente do rosto para tentar me proteger dos estilhaços, sem parar de arrastar até que assustei ao deparar-me com duas mulheres ali.

Veronica e Lucia também estavam abaixadas atrás da madeira, encolhidas.

- Que merda está acontecendo?! – eu grito acima das sinfonias.

- Tem mais gente aqui dentro! – Veronica vociferou de volta.

A jovem sequer hesitou e se pôs de pé, usando o quase inexistente intervalo entre os tiros para apertar o gatilho do seu fuzil. Ele tremia em seus braços à medida que as balas voavam e ela só voltou a se baixar quando as pessoas que tentavam nos matar retaliaram.

- Por que eles estão atirando em nós?! – eu grito para Lucy. – São as pessoas que nos atingiram?

Segurando o seu taco e sem poder fazer muito, Lucy estava prestes a responder quando foi interrompida.

- Eu acho que não! Mas essas parecem não querer nossa presença aqui também! – Veronica respondeu no lugar da namorada, contraindo-se com as explosões das garrafas próximas.

Respiro fundo e levanto-me junto com Veronica e Lauren. Com a minha Dan Wesson no nível dos olhos, começo a dispará-la na direção do banheiro do lobby, que parecia ser o local do esconderijo. As pessoas que atiravam usavam a brecha da porta e colocavam apenas os canos dos fuzis para fora, tentando nos acertar.

Nós três nos abaixamos ofegantes enquanto recarregávamos nossas armas.

- Pessoal... é que... acidentalmente... eu acho que matei um do grupo deles na entrada. – Lucy murmurou em um muxoxo, com uma vozinha cheia de culpa.

- Lucia! – nós três a repreendemos ao mesmo tempo.

- Me desculpem! – ela ralhou, com o taco cheio de sangue na mão direita. – Eu pensei que fosse um zumbi! O desgraçado do homem veio sorrateiramente por trás! Não foi minha culpa! Esse eu realmente matei sem querer!

Balanço a cabeça negativamente e esfrego meu rosto com as mãos, sem acreditar.

Isso explicava o porquê de estarem querendo nos matar arduamente.

E se esses filhos da puta tivessem artilharia pesada? Se fossem muitos?!

Estaríamos mortas!

Mais uma sinfonia de tiros ecoou, gerando mais estilhaços de vidros voando e nos obrigando a proteger os rostos.

- PAREM DE ATIRAR! – eu grito com todos os meus pulmões, escorando-me ao balcão com a respiração ofegante.

- Vocês mataram um dos nossos! – uma voz feminina, surpreendentemente, ecoou após os tiros cessarem.

- Eu não tive a intenção! – Lucy gritou, sentando-se sobre os calcanhares e apertando o taco em mãos. – Foi sem querer!

- SEM QUERER?! – a voz ralhou, como se não acreditasse que a vida de alguém fosse tão banal. – VOCÊ MATOU O MEU MARIDO SEM QUERER?!

- Lucia, fique quieta! – Veronica repreendeu a namorada, lançando um olhar mortal. – Você só está piorando as coisas!

A Rainha bufou, quase em uma birra, e deu de ombros.

- Olhe... nós não queremos nenhum problema com o seu povo! – Lauren gritou para a escuridão. – Nós estamos atrás de uma pessoa! Essa pessoa estava correndo de nós e acidentalmente entramos aqui!

- Era um homem alto que usava um capuz? – uma voz masculina, mas que parecia ser jovem demais, perguntou.

- Cale a boca, Jonas! – a mulher que estava com ele o repreendeu.

- Sim! – Lucy confirmou, animada. – Você o viu, garoto? – ela pergunta, sabendo que era um rapaz pelo timbre da voz.

- Ele atravessou o lobby e fugiu pela janela antes de vocês chegarem matando o meu tio, desgraçadas! – o jovem gritou, irritado. – Nós só estávamos nos escondendo aqui enquanto os Carnívoros não iam embora! E vocês o mataram!

Antes que pudéssemos fazer qualquer coisa, o metralhar do dos fuzis ecoaram novamente. Encolhemo-nos outra vez, tentando desviar dos cacos de vidros e lascas de madeiras que voavam em nossas direções.

- Nós vamos ter que matá-la! – Lucy rosnou, como se não gostasse do fato. – Uma mulher desperdiçada, não acredito!

- Mulheres podem ser tão ruins quanto os homens, Lucy. Não seja tão ingênua! – eu rosno de volta, enquanto colocava as balas no tambor da minha arma.

A Rainha semicerrou os olhos para mim, travando o maxilar por eu ter lhe respondido daquele jeito.

Retribuindo ao olhar cheio de rancor, eu jogo o tambor para dentro da Dan Wesson outra vez.

- Vamos ter que limpar bagunça alheia... – sussurro para mim, mas com plena certeza que Lucia escutava.

Segurando minha Dan Wesson com maestria e ignorando sua expressão surpresa por minha audácia, eu me levanto rapidamente já mirando a porta do banheiro.

- Lauren, estou te cobrindo. Vai! – eu ordeno, escondendo-me atrás de uma máquina de refrigerantes sobre o balcão.

Com um sorrisinho orgulhoso no canto dos lábios, Lauren encaixou os dois pentes recarregados em suas Desert Eagles e colocou-se de pé com a mesma agilidade. Ela girou o corpo e, com os dois braços erguidos, começou a disparar enquanto dava a volta no balcão.

- Veronica, vá pela direita! Me cubra! – digo, dando passos para esquerda enquanto atirava contra a porta.

Lauren, meio abaixada, escorregou pelo chão empoeirado até se esconder por detrás de uma poltrona no centro do lobby. Veronica sorrateiramente se deslocava contra a parede lateral do banheiro, com intenção de encurralá-los perto da entrada.

Os tiros continuavam a vir em direção do balcão e das poltronas, sem saberem da existência da dona do fuzil.

E então os disparos pararam, indicando o fim da munição deles.

- Vocês estão encurralados. Parem antes que os matemos! – eu aviso, de pé atrás da beirada do balcão bem à frente a entrada dos banheiros.

Restava-me apenas uma bala no tambor da Dan Wesson e eu implorava para não precisar recarregá-la de novo.

- Joguem suas armas para cá e saiam com as mãos na cabeça! Acabou a brincadeira! – Lauren rosnou por detrás da poltrona que estava à esquerda da porta do banheiro.

Alguns segundos se passaram e apenas os rosnados das criaturas atraídas pelos disparos ecoavam do lado de fora do teatro. Aquele tiroteio havia, no mínimo, atraído zumbis de todas as redondezas da cidade.

- Ok... vamos jogar nossas armas... – Jonas gaguejou.

Lentamente uma mão apareceu na brecha da porta e um fuzil foi passado, sendo jogado ao chão. Ele escorregou um pouco para frente e, momentos depois, outro surgiu acompanhado por uma pistola MM9.

Dando passos vagarosos começo a me aproximar das armas, com Lauren e Veronica atentas, me cobrindo.

Agacho-me com um braço erguendo minha arma e uso outra livre para tentar alcançar as alças dos fuzis, com a intenção de puxá-los para longe da porta do banheiro.

*Music On* (Sail – Jack Trammell – EPIC COVER)

- AH, CARALHO! Que merda é essa?! Tem anões zumbis me atacando! – os xingamentos urrados de Lucy ecoaram, fazendo-me girar o rosto institivamente em direção da mulher atrás do balcão.

A mulher tentava arduamente acertar as cabeças dos mortos-vivos com o taco de beisebol, mas, que por causa da baixa estatura, cambaleavam e desviavam sem querer de seus golpes. Eram aparentemente dois irmãos, ambos com as peles extremamente podres e com vermes dependurados na boca.

Entretanto, mal tive tempo de exprimir qualquer reação, pois, minha atenção foi totalmente absorvida pelos vultos no alto da escada que levava ao palco onde o show acontecia. Certamente a mulher, Jonas e o cara morto por Lucy não checaram o andar superior, pois, agora, de uma porta negra saíam mortos-vivos com roupas teatrais e rostos decompostos cheios de maquiagem.

O grupo composto por cerca de uma dúzia e meia de zumbis costumava ser os atores e quem sabe até telespectadores da peça, mas, agora, despencavam escada abaixo como formigas desesperadas.

Um homem gigantesco com maquiagem de palhaço era o primeiro da horda e foi, também, o primeiro a ser morto com um tiro advindo do fuzil de Veronica.

Tudo entrou em caos muito rápido.

Lauren se levantou desesperada e começou a disparar contra três mortos-vivos vestindo smoking caro. Uma senhora obesa, próxima da casa dos sessenta anos, rastejava pela escada com uma bolsa de banha pendurada e cheia de gosma, indo em direção de Lucia que terminava de acertar os anões com o seu taco de beisebol.

E antes que eu pudesse fazer o mesmo, um vulto feminino correndo da porta do banheiro veio na minha direção.

O golpe me acertou no meio da barriga e me fez cair para trás no chão empoeirado do lobby.

Minha arma escorregou da mão, deslizando até perto de um banco longe. A mulher que era loira e magra caiu por cima de mim e aproveitou da minha zonzeira para tentar me sufocar apertando as mãos ao redor do meu pescoço.

- Ah, merda! – Lauren tentou girar o punho para atirar na loira, mas um zumbi negro e gordo veio para cima dela.

Sentada sobre a minha cintura, a mulher colocava uma força surpreendente nas mãos para me sufocar. Meu pescoço ardia e as vias áreas começavam a arder como Inferno, gerando uma pressão sanguínea na minha cabeça. Tento arranhá-la no rosto ou atingi-la de qualquer modo, mas seus olhos azuis pareciam estar tão focados em me matar que isso se tornou seu grande objetivo.

Eu nem sabia o seu nome e ela estava tentando me matar.

E foi nesse exato momento que algo despertou dentro de mim.

Usando meus polegares, os pressiono com força contra seus olhos e eu faço a loira gritar pelo fato de minhas unhas estarem quase penetrando seus globos oculares.

Ela afrouxou, institivamente, suas mãos ao redor do meu pescoço e eu usei esses segundos para torcer seu braço direito brutalmente, gerando o som do seu ombro deslocando. Levantando ainda o cotovelo, eu o atinjo na lateral do seu rosto fazendo a mulher cair para o lado.

Inverto as posições e dessa vez me sento em sua cintura, começando, com violência, a desferir socos em seu rosto.

Não sei explicar ao certo o que aconteceu comigo naqueles instantes, mas tudo, exatamente tudo, que se passava na minha mente era que eu queria matar aquela mulher.

Tudo o que eu pensava era em me vingar por suas atitudes idiotas, me vingar do fato de quase ter nos matado por não obedecer.

A cada murro que eu dava, a cada latejar de meus dedos em resposta, eu sentia mais vontade de matá-la. Talvez ao fazer isso eu me sentisse saciada, talvez isso fizesse a raiva ácida parar de gritar dentro de mim.

O rosto da loira já estava totalmente coberto por sangue e o edema das pancadas realumiavam acima de seus ossos.

Os lábios inchados e trincados com a baba vermelha escorrendo, os olhos moles por causa da sonolência do espancamento, a fraqueza de seus braços que já não tentavam se livrar de mim.

E eu não cessava as pancadas, mesmo com minhas mãos também sangrando e o líquido espirando no meu rosto.

- Pare, Camila! Ela já está morta!

As mãos de Lauren agarram abaixo das minhas axilas e me puxou bruscamente pra trás, retirando-me de cima do corpo já imóvel. Eu queria voltar para continuar a atingi-la, porém a jovem foi mais rápida e se colocou na minha frente, impedindo-me.

Pisco atordoada, e analiso o espaço ao redor. Aos poucos a minha visão voltava ao normal e eu percebi que todo o caos já havia sido resolvido.

Os zumbis estavam devidamente mortos e Veronica e Lucia me encaravam com expressões assustadas.

Encaro minhas mãos trêmulas e inchadas. Meu antebraço ardia como o Inferno mediante meu esforço e agora sangrava também. A loira, estirada mais à frente, possuía o rosto quase irreconhecível pela quantidade de edemas e roxos.

Que merda aconteceu comigo?!

Lucy segurava seu taco pingando gosma e com pele dependurada nas lascas, me analisando com curiosidade.

- Você tem problemas com a raiva, Camila. – constatou, com uma Veronica concordando ao seu lado. – Assim como a Shay e inúmeras mulheres na comunidade! É exatamente por isso que você ganhou o torneio de lutas. Você canalizou! – Lucy acusou, observando Lauren me ajudando a ficar de pé. – Mas dessa vez você não conseguiu parar!

Abaixo a cabeça, envergonhada, com meu corpo tremendo pela sensação pós-adrenalina.

 - Envolva suas mãos... – a voz de Lauren foi o único fator que me fizera elevar o olhar outra vez.

A jovem segurou a barra da blusa que usava e rasgou uma tira significativa, partindo-a em duas logo em seguida. Lauren tocou de leve minhas mãos e as envolveu com o pano, o amarrando contra as palmas para pressionar o inchado e o sangue que saía pelos cortes.

Ainda sentindo os olhares julgadores de Veronica e Lucia, eu caminho até a minha Dan Wesson caída aos pés de um banco. Pego-a, checando seu estado.

- E-eu... e-eu não quero morrer! – o tom de voz masculino se fez presente de dentro do banheiro, nos surpreendendo por termos nos esquecido da existência de Jonas. – Por favor, não me matem!

- Saia do banheiro! – Veronica ordenou.

- Quem nos garante que não irão me matar?! – ele gritou.

Hesito por alguns segundos, ponderando. Olho para Lauren e vejo que ela também me analisava.

- Eu prometo! – respondo, erguendo minha Dan Wesson em direção da brecha na porta.

- Ok... estou saindo! – ele choramingou, dando passos pesarosos até a porta.

A pouca iluminação proveniente apenas da luz no fuzil de Veronica e da lanterna que eu antes portava, mas que agora Lauren a segurava, deixou o corpo do jovem à mostra. Ele possuía os cabelos raspados, rosto sujo e magro. As mãos trêmulas estavam levantadas e o medo era expressivo em suas órbitas claras.

- Em Lésvos conversaremos sobre isso, Camila! – a Rainha anunciou, me olhando por cima do ombro e, em seguida, para o banheiro. – Se me derem licença, tenho que matar um garoto!

- Não me matem, por favor! – ele praticamente grunhiu, se agachando em meio ao choro.

- Lucia! – eu grito antes mesmo de filtrar minha ação. – Você não vai matar esse garoto!

A Rainha parou de andar no centro do lobby cheio de corpos e sangue espirrado para todos os lados. Com um sorriso irônico, Lucy Vives girou o seu corpo e semicerrou os olhos para mim.

- O-olhe... – eu gaguejo, ao notar Veronica e Lauren apreensivas pela situação. – Ele é apenas um garoto! Deve ter o quê?! Uns... 16 anos?! Pelo amor de Deus! Prometemos não matá-lo!

- Você está me dando ordens, Camila?! – Lucy rosnou entre dentes. – Você realmente quer brincar desse jogo? Onde vamos medir quem é a mais ativa aqui dentro? Porque todas sabem... eu sou!

- Eu apenas estou pedindo para... – começo a argumentar.

Veronica bufou alto, visivelmente entediada com a mesma discussão que estava prestes a começar. A mulher então, em um simples e rápido movimento, ergueu o fuzil no nível dos olhos e apertou o gatilho uma única vez.

*BANG*

Assusto-me com disparo e arregalo os olhos ao ver o buraco perfeito aberto no meio da testa de Jonas, que caía ao chão assim como um boneco de pano.

- A promessa de não matá-lo foi sua e não minha! – Veronica deu de ombros, abaixando o fuzil com tranquilidade. – Já acabaram com a palhaçada? Estou com fome e quero ir embora!

Com a boca entreaberta e pasma, olho para Lauren buscando alguma reação dela perante o que acabara de acontecer. Mas a jovem de olhos verdes não podia fazer mais nada, assim como eu.

Lucia estava pronta para continuar a me contra-atacar quando um choro agudo e alto ressurgiu por todo o lobby penumbroso.

Nós quatro petrificamos no mesmo instante, pois qualquer pessoa reconhecia aquele som.

Era um bebê chorando.

Antes mesmo que raciocinasse, eu já corria com minha Dan Wesson erguida. Meu lado materno praticamente berrava enquanto eu adentrava na escuridão do banheiro onde Jonas e a mulher loira estavam escondidos antes. O porcelanato e as pedras polidas que enfeitavam o cômodo estavam totalmente destroçados por nossos tiros que atravessaram as paredes.

Lauren veio logo atrás e, com a lanterna iluminando o banheiro, me ajudou a vascular à procura do ser que chorava compulsivamente.

E então eu o vi.

Meu coração apertou quando a luz pousou sobre o pequeno bebezinho que se debatia entre panos brancos, debaixo de uma pia grossa que serviu de esconderijo. Uma proteção feita basicamente por headphone e fita isolante grossa tampavam os ouvidinhos da criança, evitando aquele tempo todo que ela escutasse o tiroteio. O bico, que o manteve em silêncio, estava caído ao lado da sua boca.

- Oh meu Deus... – eu sussurro enquanto encaixava minha Dan Wesson no coldre e me ajoelhava ao lado do bebê.

Tudo fazia sentido agora.

O porquê de Jonas e a loira estarem defendendo aquele banheiro tão arduamente:

Aquele era o filho da mulher que eu matei.

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*Music On* (To Be Human - Sia feat. Labrinth)

- Tem um carro aqui e o tanque está pela metade... – a voz de Veronica se fez presente na escuridão.

- Não vai adiantar nada, tem muito deles lá fora... – Lucia retrucou a namorada, ficando na ponta dos pés e analisando a rua através de uma pequena janela.

Porém, enquanto as duas discutiam como seria nossa fuga daquele teatro abandonado, tudo o que eu conseguia fazer era pensar como a vida era curta à medida que analisava o pequeno bebê enrolado em panos, nos meus braços.

Lauren estava ao meu lado acariciando a bochecha gordinha com a ponta do polegar, com um sorriso de lado.

- Façam Coquetéis... – eu digo para as duas mulheres, sem retirar os olhos do bebê.

- Nós queremos é sair daqui e não ficarmos bêbadas, Camila! – Veronica revirou os olhos e continuou a vasculhar a garagem do teatro.

Com uma expressão tristonha, eu ergo o rosto para as duas.

- Eu estou falando sobre Coquetéis Molotov. São fáceis de fazer e serão úteis para atrair os zumbis. Basta ir até o telhado e jogá-los o mais longe possível. Assim vamos ter menos desses desgraçados na frente da garagem e poderemos fugir pegando a esquerda, no sentido em que viemos.

Veronica franziu o cenho, certamente percebendo minha tristeza e certamente também atordoada por minha facilidade.

- Você é boa com planos! – elogiou, mesmo sentindo o olhar gélido de Lucia sobre mim.

Apenas ameaço um fraco sorriso em agradecimento, mas logo abaixo o olhar outra vez para o bebê em meus braços.

Eu não sabia o seu nome, nem quantos meses possuía, qual sua descendência.

Nada!

Mas minhas mãos estavam inchadas e sangrando por ter espancado sua mãe até a morte.

A culpa, que era um sentimento já familiar, queimava o interior das minhas entranhas.

Eu matei a mãe daquele bebê.

Eu havia feito aquilo que mais oprimi, aquilo que mais julguei, aquilo que mais odiei:

Eu matei.

E agora um ser inocente, sem nenhum pingo de maldade, me analisava com os olhinhos cheios de curiosidade. Era um lindo menininho de cabelos negros e íris claras. Afobado pela fome que o incomodava, ele sugava com força o bico da mamadeira de plástico que eu segurava, a qual encontrei no interior da mochila de Jonas.

- Camila, não foi culpa sua... – Lauren sussurrou baixinho, aproveitando do fato que Lucia e Veronica voltaram até o lobby para buscar quaisquer garrafas com álcool que sobreviveram ao tiroteio. – Ela estava tentando te matar e iria fazer isso caso você não contra-atacasse!

- Eu sei... – murmuro, fungando para segurar o choro.

A jovem de olhos verdes suspirou, com pesar, ao notar que eu estava sofrendo.

Ela odiava me ver assim.

O silêncio por parte de Lauren denunciava que ela me encarava como se estivesse cogitando uma ideia.

- Camz... vamos adotá-lo! – ela sussurrou ao pé do meu ouvido.

Um arrepio cruzou todo o meu corpo, fazendo que meu coração desse um solavanco. Assustada e de olhos bem abertos, eu procuro o seu perfil bonito na penumbra da garagem.

- O quê?! Nós não podemos! A Lucy nunca irá perm...

- Apenas quando tudo isso terminar, meu amor! – Lauren me interrompeu, levando as mãos até meu pescoço ainda avermelhado pelo sufocamento. Ela acariciou a pele sensível, buscando aliviar de algum jeito e também manter-me focada em seu rosto. – Eu tenho plena certeza que podemos ser as mães dele! Poderemos ensiná-lo o certo e o errado, poderemos guiá-lo a ser uma boa pessoa! Eu quero fazer isso ao seu lado e apenas ao seu lado, meu amor. Somos defeituosas, somos imperfeitas, mas nos amamos! E isso é meio caminho para a resolução de vários problemas! Por favor, eu ficarei honrada em formar uma família com você... vamos adotá-lo, Camila!

Estudando os olhos carinhosos de Lauren eu cheguei à conclusão que não importava o quão ruim ou traumático o dia foi, o quão perto a morte havia se aproximado... nada importava porque eu sabia que Lauren Jauregui estava esperando para me amar.

Aquele amor? Maior que o Universo? Tão forte quando sua magnitude?

Gritava dentro de mim, misturado com alívio, culpa, tristeza e alegria.

Era como se eu estivesse me afogando e Lauren pulasse em alto mar para me salvar, pelo simples fato de saber que eu faria o mesmo por ela.

Meu peito se aqueceu com uma chama tão intensa que eu não soube expressar quaisquer palavras coerentes para a mulher a minha frente, que sorria apaixonada por mim.

Ela estava fazendo planos, com a certeza que tudo terminaria bem? Ela queria ter filhos comigo?! Uma vida... normal?

- Eu amo você! – sussurro, embalando o bebê que se remexia manhoso.

- Eu amo você também, Camz... – ela fecha os olhos e deixa um beijo carinhoso em minha têmpora esquerda.

Isso significava que ela estava ali comigo... ajudando-me a carregar o fardo do mundo.

**

O plano saiu exatamente como planejamos. Lucia e Lauren subiram até o telhado do teatro abandonado e calculara uma distância segura para jogarem os Coquetéis Molotov prontos. As garrafas se quebraram explodindo fogo para todos os lados, principalmente nos papeis e trapos nas ruas. As chamas logo cresceram e o seu crepitar caloroso rapidamente chamou a atenção dos quase cem zumbis que cercavam o local.

Os mortos-vivos, assim como animais irracionais que eram, cambalearam em direção fogo ao mesmo tempo em que abrimos a porta da garagem. Já no interior do furgão antigo, eu e Lauren nos apertávamos na parte de trás enquanto Lucia dirigia e Veronica lhe acompanhava na cabine, atirando nos zumbis que estavam no caminho.

Voltávamos para Lésvos cansadas, machucadas, sem munição, com um bebê, um homem foragido que tentara nos matar e uma grande e perigosa desavença entre Lucia e eu que apenas crescia.

Mas, por hoje, o que importava era que estávamos vivas.

Por enquanto...


Notas Finais


Chorando no clube, chorando em Havana, chorando em posição fetal em como meu Camren é lindo!
Tantas coisas aconteceram nesse capítulo! Eu REALMENTE quero saber as opiniões e PRINCIPALMENTE as ideias de vocês, porque, como disse, ITD está começando a caminhar ao final e talvez ainda dê tempo de algum desejo seu entrar na história!

Até a próxima oh na na


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