História Intoxicate - 19- The Blue Ice 3

- Vocês sabem algo sobre o Brad e a Angela? Nunca mais eles saíram com a gente – Perguntei mantendo meus olhos na estrada. Era meio nostálgico estar na mesma estrada em que sofri um acidente há alguns meses atrás, até mesmo estar com as mesmas pessoas, indo ao mesmo lugar, mas isso não significava que era uma lembrança boa.

- Uh – Nick olhou para Holly no banco de trás que soltou uma risada – bom... Aconteceu algo nesse tempo em que você esteve ausente. Brad meio que voltou para o Canadá e levou a meia irmã junto com ele.

- Por quê? – Perguntei realmente decepcionado. Brad não era tão próximo como Nick ou Holly, mas ainda assim era meu amigo desde o início e nem se quer havia se despedido. Por um momento eu pude perceber o quanto estava ausente da minha vida. Sempre focado em ter problemas pessoais e descontar isso em Harry que só piorava tudo, e olha que durante esse tempo nós estávamos tentando seguir em frente.

- Ele tinha um caso com a meia irmã e a mãe dela descobriu – Holly disse de uma vez e eu a olhei com os olhos arregalados pelo retrovisor. Como ela solta uma dessas como se não fosse nada? Ainda com um sorriso na cara.

- Na hora eu também fiquei como você, mas depois até que ficou engraçado – Nick disse rindo baixo – Ele descobriu que ela só tinha vindo morar com ele porque sempre foi apaixonada e não porque queria estudar. Mas eles nem se quer eram irmãos de sangue nem nada de qualquer forma, a mãe dela casou com o pai dele e tal.

- Uau – Eu suspirei absorvendo aquilo. E eu achando que minha vida era uma grande novidade – Não que eu ache isso ruim. Amor é amor e eu não julgaria se eles fossem irmãos de sangue ou algo do tipo, mas ele nem se quer se despediu.

- Ele estava bem abalado – Holly disse finalmente ficando séria – Seu pai havia ligado e foi uma grande confusão, acho que você entende certo? Você estava do mesmo jeito há algumas semanas atrás.

Suspirei e voltei minha atenção na estrada até que parasse em frente à fachada azul escrito "Blue Ice", essa era a hora de voltar a minha vida normal e provar que não iria mudar só porque Harry estava de volta. Depois que descobrimos esse lugar, que definitivamente se destacava na cidade inteira, ele se tornou definitivo nos finais de semana. Pelo menos foi o que Nick disse enquanto eu estava ausente. Eu até me surpreendi de ele estar tão familiarizado com uma boate sem gêneros. Da última vez que Nick foi a uma junto comigo ficou meses irritado por um homem ter passado a mão em sua bunda, mas eu sabia que isso não era nada homofóbico ou algo do tipo, apenas algo que me fazia gargalhar muito. Diferente dele, Holly havia adorado a boate e dançado a noite toda com vários caras que não tinham intenções nenhumas além de se divertir na pista.

- Você nunca me contou o porquê de não querer ficar com ninguém naquela noite em que viemos aqui pela primeira vez – Eu disse a Holly assim que entramos e eu me lembrei da vez em que ela se agarrou a mim tentando afastar qualquer cara que pensasse em tentar algo. Logo depois aconteceu o acidente e o Harry... Não tive a oportunidade de perguntar.

- Eu fiz isso? – Ela perguntou sonsa, acha que eu não a conheço – Nossa devia ser um dia em que eu estava de TPM – Ela disse de uma vez e caminhou mais a frente seguindo Nick que ia até o bar para abrir a conta. Que eu esperava que fosse no nome dele e não no meu.

É claro que eu estava curioso, Holly é como minha irmã mais nova e ela estava agindo estranha há bastante tempo, mas eu estive realmente distante essas semanas e decidi esquecer isso. Do mesmo jeito que eles me respeitavam e esperavam meu tempo para contar as coisas, eu também esperaria o dela.

Segui meu caminho até a mesa que eles escolheram, mas acabei esbarrando em algumas pessoas no caminho, todas elas alheias a mim e ao resto do mundo, porém isso era maravilhoso. Eu continuaria seguindo se não fosse por um rapaz loiro que segurou meu braço me olhando surpreso. Assim que o olhei nos olhos o reconheci, sentindo um leve déjà vu.

- Louis, certo? – Ele perguntou e eu concordei – Eu sei que não deve se lembrar de mim, provavelmente não – Ele rolou os olhos sorrindo para a própria besteira e logo continuou – Mas nós meio que ficamos no ano novo, você foi o meu beijo na virada.

- É claro que eu me lembro – Forcei um pouco a mente – Denny certo? Eu não estava tão bêbado. – Eu disse e ele riu. As covinhas marcando suas bochechas me fazendo engolir em seco ao lembrar o porquê de ter ficado com ele. 

- Isso já é um ponto, eu achava que você nem se lembrava de onde passou o ano novo. – E no início eu realmente não queria lembrar, porém ao longo da noite isso acabou mudando.

- É eu me lembro, todo mundo da cidade estava na praça aquela noite – Realmente havia sido algo memorável. Aquela noite ficou marcada como a noite em que eu comecei a amar essa cidade.

-Eu realmente fui invejado naquela noite. Muitos gays e a maioria das mulheres dessa cidade queriam estar no meu lugar – Ele disse e eu franzi o cenho sorrindo para sua idiotice. Eu nem se quer era alguém conhecido. – Oh não faça essa cara. Sua história já foi contada várias vezes, seja como o homo que superou a homofobia e trouxe o respeito a essa cidade ou como o homem que é dono da loja mais produtiva da cidade.

- Que em breve crescerá ainda mais – Eu disse entrando no clima e ele riu. Porém eu continuava levemente confuso pelos comentários passados.

- Porém eu acho que não teria essa chance novamente – Ele disse com os olhos nos meus, sua feição séria, mas eu apenas sorri e neguei com a cabeça.

- Sinto muito, mas eu já sou comprometido – Eu disse sem nem perceber, do modo mais automático possível. Por um momento eu parei para perceber que finalmente minha mudança estava se tornando palpável. Estava tudo real agora.

- Wow, é sério? – Ele perguntou e eu apenas acenei com a cabeça, não conseguindo digerir o quanto isso era sério – Eu achei que não teria chance porque você não ficava com a mesma pessoa duas vezes seguida, mas comprometido? – Ele sorriu sem graça – Desculpe, acho que eu tinha uma imagem de você que na verdade não tem nada haver.

-  Não se preocupe, eu cometo esse erro com muita frequência – Eu sorri sabendo que cometia esse erro comigo mesmo e logo me despedi indo me sentar com Nick e Holly. Os dois conversavam animados e nem me notaram virar dois shots seguidos enquanto ainda pensava sobre o que estava acontecendo. A chegada não tinha sido muito animada, mas ainda assim eu conseguia rir com os comentários da Holly enquanto ela ficava bêbada e sem travas na língua. Eu iria beber mais alguns copos, porém quando percebi Nick virar suas bebidas uma atrás da outra e Holly já bêbada rolei os olhos sabendo que seria eu a os levar para casa hoje. Era injusto como eles decidiam isso sem nem me pedir ou avisar, apenas jogando sobre mim como se eu fosse o mais responsável. Pelo amor de Deus eu sou um inconsequente. Okay eu não sou inconsequente, mas a ideia de ser o mais velho e responsável, aquele que sempre dava as broncas e ficava de vigia para não beber não era muito o que eu procurava para manter a minha imagem de cara normal que não vai mudar depois do relacionamento. Céus isso é difícil.

- Nick não chama ele – Holly disse se pendurando no ombro do mais velho – O Louis é um velho que não sabe se divertir. – Ela disse me fazendo a olhar no mesmo estante, aparentemente eles estavam me chamando enquanto eu, novamente, estava distraído.

- Não é que ele não saiba se divertir, ele só tem sido um chato ultimamente. A idade chega para todos – Nick disse sorrindo enquanto bebia o resto do seu copo e logo se levantou juntamente com Holly. Me deixando ali abismado que suas brincadeiras agora se resumiam em me transformar no chato do grupo. Como se isso já não me deixasse psicótico só em pensar.

- Hey, eu não ando chato ultimamente – Eu os segui até a pista de dança. Acomodando-nos mais para o canto onde a música não estourava nos nossos ouvidos – Eu só ando com muita coisa na cabeça.

- Você mudou Louis, aceita – Holly soltou sua fala arrastada, claramente bêbada, enquanto balançava o corpo lentamente olhando para os lados. Eu sabia que não deveria levar isso tão a sério, ela estava bêbada e brincando, mas os bêbados sempre falam a verdade né?

A verdade é que eu não queria mudar. É claro que eu não queria voltar a ser o Louis-sem-amor, mas eu também não queria voltar a ser o Louis-que-só-sabia-se-divertir-quando-estava-perto-do-Harry. Porém, foi uma mudança tão rápida que eu não sabia nem se quer como agir para continuar sendo eu mesmo, sem ser eu mesmo.

- Cara – Nick me cutucou – Não fica ai parado no meio da pista, seu estranho – Ele disse fazendo Holly gargalhar e eu tentei sorrir um pouco, mas aquilo estava demais para mim. Se tinha uma coisa da qual eu odiava era não poder aproveitar o tempo com meus amigos por estar estressado.

- Eu vou lá nos fundos, preciso de um ar – Eu disse próximo de Nick que concordou com a cabeça já sabendo que isso nas entrelinhas seria fumar, mas na verdade eu estava tentando parar com o cigarro e tentaria ficar apenas sentado pensando no quanto minha vida estava uma merda. Parecia melhor do que ficar aqui dentro onde eu sou um peso morto para os meus amigos, já que não consigo mais me divertir – Já volto.

Distanciei-me vendo os dois se aproximarem e continuei meu caminho. Diferente da minha galeria, a boate parecia estar mais vazia nessa época do ano, talvez as pessoas estejam optando por aproveitar o tempo para ficar em casa. Essa era uma boa época já que ficava frio sem ser um frio extremo como o do tempo de tempestade, apenas algo confortável. Abri a porta dos fundos sentindo o vento gelado no meu rosto. A cidade já era fria por natureza, perto do fim de ano então... Nas próximas férias eu definitivamente iria para um lugar com muito sol.

Sentei-me em um banco próximo a porta e logo reparei em uma menina que chegou depois de mim cambaleando. Ela parecia estressada enquanto tentava acender um cigarro com um fósforo, logo o jogando no chão e chutando quando conseguiu.

Ela tragou fundo levantando a cabeça e soltando a fumaça para o alto. Ótima cena para quem quer parar de fumar.

- Eu posso ter um? – Perguntei chamando a atenção de seus olhos que brilhavam por lágrimas.

Ela suspirou vindo em minha direção e se sentando ao meu lado enquanto me entregava sua caixinha amassada junto com os fósforos.

- Desilusão amorosa? – Perguntei quando finalmente acendi meu cigarro, olhando em sua direção.

- Antes fosse.

- Desculpa isso pode soar meio preconceituoso da minha parte, mas você é tipo, meio nova para ter problemas pesados – Eu disse de uma vez, me perguntando se aquela frase tinha feito algum sentido. Ela rolou os olhos tragando novamente e eu soube que deveria ter falado merda.

- Olha, você não me conhece – Ela disse me fazendo ficar calado. Okay então. Continuei tragando meu cigarro sentindo o silêncio incômodo. Já não sei se era pior ficar lá dentro tendo que encarar que estava para baixo demais para me divertir com meus amigos ou se era ficar aqui fora ao lado de uma pessoa aparentemente pior do que eu e me fazia ficar mais desconfortável ainda. Meu cigarro já tinha acabado e eu já estava quase me levantando quando ela colocou outro cigarro na minha frente, me impedindo de terminar. – Me desculpe, eu sou um porre, mas poderia me ajudar a acabar com esse maço? Não posso entrar no abrigo com ele.

Encostei-me novamente no banco. Era certo que eu havia prometido que pararia de fumar, mas ela parecia precisar de companhia e eu não seria um babaca de deixá-la sozinha, mesmo que eu nem a conheça.

Eu acendi novamente o cigarro deixando o silêncio voltar. Ela estava bem no final do seu e logo que o terminou ela o jogou no chão pisando em cima. Suas próximas ações foram as que realmente me assustaram. Em um movimento rápido ela se colocou sobre o meu colo tentando me beijar. Eu a afastei me colocando de pé no mesmo segundo enquanto ela me olhava assustada.

- Eu sou gay – Disse as primeiras palavras que vieram na minha mente – E comprometido. – Ela ainda me olhava com os olhos arregalados pela mudança repentina, sem entender. Eu respirei fundo e logo ela se sentou reta apoiando o rosto nas mãos.

- Eu tenho uma ótima capacidade de sempre conseguir piorar tudo – Sua voz transbordava raiva e logo eu pude ver seu corpo balançar com o soluço que ela deu. Eu estava sem reação.

Eu me sentei ao seu lado de novo, lentamente colocando o braço pelas suas costas. Eu não era muito acostumado com isso, mas eu sempre achei que o mundo deveria ser mais compreensivo e as pessoas deveriam ser mais solidárias, eu seria muito hipócrita se apenas desse as costas para ela e fosse embora.

- Me desculpe por isso – Ela disse soluçando – Eu lido com homens dessa forma desde os meus quinze e nunca os tratei de outra forma que não fosse com meu corpo. – Ela sorriu sarcástica levantando a cabeça e secando as lágrimas – Deve ser por isso que agora eu estou com um filho de um cara que nem me conhece.

Meu corpo gelou. É claro que lidar com meus problemas e as coisas que aconteceram era difícil, mas eu nunca passei por algo assim, algo que a pessoa levaria consigo, como um filho.

- Filhos não são para trazer o mal – Eu disse algo que sempre ouvi da minha mãe, na expectativa de trazer algo bom, mas ela apenas gargalhou uma risada sem humor e sim com a tristeza transparecendo.

- Pois então que levem esse filho para alguém que queira – Ela disse se levantando e ascendendo mais um cigarro, pelo que eu sei esse seria o terceiro da noite – O dia em que eu achar o pai daquela criança, pode ter certeza que se ele jogá-la no lixo eu não vou me importar. Eu fiz a minha parte e voltarei para Londres com menos um problema. – ela divagava e eu apenas a encarava perplexo com suas palavras. É claro que não conhecia sua história ou se quer sabia seu nome, mas apenas pelas suas palavras eu já não conseguiria a entender nem se ela explicasse. Estava claro que ela era uma pessoa sem amor, muito mais do que eu um dia achei que fui, mas eu não entendia como ela poderia dizer coisas assim de um filho que aparentemente saiu dela. Nem um pouco de afeto.

E do mesmo jeito que ela apareceu, ela se foi. Ela suspirou soltando a fumaça e me olhou dizendo apenas "Desculpe por isso" e "Adeus" logo sumindo no final do beco. Eu ainda fiquei um pouco ali sentando naquele banco gelado. De alguma forma isso acabou sendo bom para mim. Todos os problemas que rodeavam minha mente durante esses meses pareciam nada comparado a tudo que aquela garota estava passando. É claro que me sentia mal por ela, jamais desejaria isso para alguém, mas depois disso eu percebi que estava me torturando por medo das coisas boas que estavam acontecendo.

Com um último suspiro eu me levantei sentindo uma fina neve começar a cair. Ajeitei minha jaqueta e entrei na boate novamente sentindo o clima quente me acolher. A música alta e todas aquelas pessoas dançando. Eu gostava disso, porém preferia estar em casa assistindo um filme ou algo do tipo.

Eu fiquei bem melhor ao notar que esse pensamento não me tornava alguém dependente de um relacionamento, pois eu gostaria disso seja com a Holly ou Nick, Harry ou qualquer outra pessoa que eu considere. Talvez infelizmente eu esteja cansando disso, ou talvez Harry tenha voltado trazendo o Louis responsável de antes. Isso não seria tão horrível.

Continuei pela pista a procura de Nick ou Holly, mas não os encontrei em nenhuma parte. Peguei meu celular vendo algumas mensagens de Harry, mas as ignorei enquanto ligava logo para Holly.

- Lou? – Ela perguntou e o som de sua voz estava bem limpo – Você ainda está ai dentro?

- É claro que eu estou, você também estava aqui da última vez que eu te vi – Eu disse impaciente e segui para a saída. Ou ela estava no banheiro ou lá fora.

- Eu e Nick estamos aqui fora perto do carro – Ela disse e eu logo os avistei no estacionamento, desligando a chamada.

- A gente já estava ligando pra você – Nick disse e eu apertei o botão na chave fazendo o carro destrancar e entrei no mesmo fingindo não ver o batom borrado de Holly e a cara de culpado do Nick. Coisa demais para mim.

- Parece que a noite não terminou tão boa assim – Eu disse assim que liguei o carro, não era comum nós sairmos assim da boate, sem nem estarmos loucos o suficiente. Holly no banco de trás estava emburrada e Nick não estava diferente na frente.

- Acho que estamos ficando velhos para isso – Nick disse e eu reparei que ele olhava no retrovisor para Holly.

- Estamos ficando velhos o tempo todo, para muitas coisas.