História Inverdades - 4

Tudo começou com um mensageiro chegando pela manhã enquanto Hoseok e Yoongi tomavam o café da manhã em silêncio. Era seu quinto dia vivendo na mansão e as coisas iam melhor do que Hoseok esperava. Viver com o loiro era confortável, sentia a sinceridade em que o Min aguardaria seu tempo. Ele respeitava os momentos em que Hoseok preferia o silêncio, raramente o tocava sem sua permissão, seu tom era sempre gentil e quando o moreno falava, recebia total atenção do Min.

Naquela manhã, Hoseok acordou pensativo sobre coisas demais, e todas o levavam a culpa. O coração estava pesado, a preocupação de como seria mais para frente sempre presente chegava a tirar seu sono. Min Yoongi era um rapaz que merecia o melhor por ser uma boa pessoa. Uma mulher de verdade, uma doce dama que o visse como sua luz e entregasse seu coração e alma.

Sentia a cada dia que precisava conversar com alguém, falar com quem sabia sobre tudo. Não deveria ter permitido que Ellen fosse para Daegu antes; ela estaria ali, tentando acalmá-lo e dizendo para se manter focado no objetivo porque tudo ficaria bem. Egoísmo o levaria à liberdade.

A comida parecia não ter gosto, o cheiro o deixava embrulhado e o ânimo para comer era nulo, mas não queria fazer desfeita, mesmo que seu desejo fosse subir para o quarto e se trancar até que Ellen aparecesse, penteasse seus cabelos e dissesse conselhos enquanto o repreendia. Ela diria que uma mulher casada não deveria agir assim, não em frente de outros. Tinha um bom conhecimento de como seria o sermão da melhor amiga se ela estivesse aqui e o jovem Min lhe contasse seus planos para a tarde. “Precisa parar de se esconder, Hoseok. Se vai mesmo enfrentar aquela mulher, precisa aguentar firme”.

Levantando o olhar quando uma empregada entrava acompanhada de um garoto, Hoseok notou que ele estava ofegante. Deveria ser algum recado urgente e estranhamente despertou a curiosidade de Hoseok. Algo poderia ter acontecido em Daegu. Quando Yoongi pegou a correspondência e leu o remetente, esperou que o loiro abrisse a carta na mesa, contudo se levantou e caminhou para o escritório, pedindo que o mensageiro o acompanhasse.

Optando não continuar na mesa, Hoseok agradeceu as moças que vieram retirar a mesa pelo alimento; dirigindo-se para a biblioteca. Poderia pegar algum livro e lê-lo no jardim ou dar alguma caminhada. Ainda não conhecia o terreno completamente e os poucos cantos que conheceu eram tão lindos, principalmente a montanha que subiu a cavalo com Yoongi. Nunca havia visto algo tão puro. Poderia passar horas admirando o laranja espetacular no céu, o sol sumindo pacificamente no céu.

Uma visão que todos deveriam ter oportunidade de ver na vida e Hoseok era grato por tê-la.

Na biblioteca, procurou o livro que iniciou na noite anterior, encontrando-o no mesmo lugar que o deixou, sobre a poltrona que ocupou. Certificando-se que ainda estava marcado na página em que parou, se prendendo rapidamente, mesmo estando em pé. Era uma parte marcante, cada palavra parecia enlaçar Hoseok que chegava sentir tensão em algumas partes devido as decisões dos personagens. E tamanha distração, sequer notou duas batidas na porta e o barulho da mesma se abrindo, dando espaço para Yoongi.

Preocupado com Hoseok, havia procurado sua esposa, mas a conhecendo imaginou que estivesse ali e estava certo. Observando-a, sorriu pequeno com a maneira concentrada que a morena tinha para ler, até mesmo conheceu uma expressão que não havia visto antes. Se aproximando, mordeu o lábio para não rir quando Hoseok se sobressaltou, claramente assustada. 

— Me desculpe, me pareceu tão entretida. — parando ao lado da poltrona, encostou o braço nas costas longas do móvel. — Eu vim para dar algumas... notícias.

Hoseok estremeceu, o tom do Min parecia cauteloso e instantaneamente começou a pensar no pior.

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Subindo para dentro da carruagem, Hoseok se ajeitou rapidamente no banco macio de couro, ficando ao máximo no canto oposto a saída. Queria o mínimo de proximidade possível de SunHee. Virando o rosto, observou a paisagem. Estavam na mansão, então o caminho para a saída do terreno demoraria um pouco. Hoseok não tinha ânimo para sair e com sua família presente a falta de vontade apenas diminuía. Yoongi tinha um aviso para dar aos Jung e mesmo que o moreno mostrasse não gostar da ideia, queria ter um jantar com seus sogros enquanto estavam em Gwangju.

Observando a mãe por visão periférica, ela sorria de orelha a orelha. Deveria estar pensando que seus planos estavam indo como esperado, Hoseok quase riu. Quase.

E ele não estava errado, SunHee pensava grande. Várias oportunidades passavam por sua cabeça, esperança que o genro ofereceria um alto cargo para seu marido. A mulher pesquisou sobre os Min e também conseguiu algumas informações com a mãe de Yoongi na festa de noivado, seu esposo sempre deixava alguém responsável pelas terras que ficavam em outras cidades já que ficava difícil administrar tudo morando em Daegu. Poderia ser a chance perfeita que tanto buscavam.

SunHee acreditava que merecia ser servida como uma rainha.

Ajeitando seu vestido no banco, pela primeira vez que entraram no veículo, levou seu olhar para Hoseok. O teatrinho não era necessário quando Yoongi estava longe, não precisava se forçar a dizer “minha querida” ou mostrar afeição, sem contar que seu sangue fervia ao se lembrar da outra noite em que não foi recebida, Hoseok sabia bem que estava pensando sobre isso, já que sorriu. 

— Você não quer brincar comigo, Hoseok. 

— Paguem o que consumirem — após um momento em silêncio, Hoseok se manifestou, ignorando o comentário da mãe. 

SunHee riu.

— Me diga Hoseok, como está convencendo Yoongi a não tomá-lo na cama? — perguntou presunçosa, sorrindo de canto. Tinha que admitir, Hoseok estava conseguindo. Imaginava que logo na primeira noite seu genro poderia desconfiar, era um plano arriscado desde o começo, mas o rapaz parecia acreditar sem sombras de dúvidas que Hoseok era uma mulher. 

— Paguem o que consumirem. — reforçou — Não vão subir nas costas de Yoongi. — Hoseok tentava ao máximo manter um tom com seriedade, não fraquejar. — Não vai subir nas minhas costas para ter que quer. 

— Hoseok, morando comigo por todos esses anos, deveria saber que consigo tudo que quero — o Min apertou seu vestido de cetim verde, se irritando com o comentário. — Eu já disse o que preciso que faça e talvez, talvez, o deixe em paz.

— Você já recebeu o dote. O que mais você quer?! 

— Os Min não tem um responsável pelas terras de Gwangju. Convença Yoongi para deixar seu pai com a responsabilidade das terras, e veremos se posso te deixar em paz, — Soltou um risinho — por um tempo. 

— SunHee, você ganhou seu dinheiro com o casamento, era esse o combinado...

Sua família sempre queria mais, e esse era o maior dos seus problemas. Nunca ficariam satisfeitos, mesmo quando chegavam ao seu limite e era esse o maior temor de Hoseok. Ele sabia muito bem, desde sua conversa com a mãe antes do casamento, sabia que não se contentaram apenas com o dote. Nem se tivessem todo o dinheiro dos Min isso os saciaria. 

— Eu decido qual o combinado, garoto. — se aproximando de Hoseok, segurou o sorriso quando o filho foi para trás. Mesmo querendo mostrar coragem, era óbvio o medo que ele tinha. — Você acha mesmo que pode se livrar de mim? Todos esses anos não mostraram que me obedecer é melhor, querida? 

Não respondendo, o mais novo desviou o olhar para a janela; sentia arrepios horríveis graças a tensão no ar. As mãos tremiam sobre o colo, as palavras presas na garganta e, por um segundo, Hoseok pensou que choraria. Ainda a temia, seu corpo era uma prova disso. 

Ouvindo uma risada, prendeu o lábio com força, abaixando a cabeça. Era um tolo por novamente se diminuir na frente daquela mulher. 

— Essa noite, o convença a passar o cargo para seu pai. — reforçando seu pedido, direcionou um olhar duro para o filho.

Hoseok permaneceu em silêncio, implorando que chegassem logo ao maldito restaurante e não precisasse dividir um espaço tão pequeno com SunHee. Era tóxico dividir o mesmo ar, o moreno conseguia sentir seu corpo ficando mais e mais pesado em cada inspirar e expirar.

Quando chegaram ao seu destino, quem abriu a porta da carruagem foi Yoongi, que primeiramente ajudou a sogra e depois sua esposa. O loiro tinha um sorriso cortês e bonito quando a viu e Hoseok nunca se sentiu tão aliviado em toda sua vida. Apertando a mão do marido com mais força que deveria, tentou o melhor de si para manter-se em pé quando saiu da carruagem. 

— Está tudo bem? — preocupado, Min sentiu a mão alheia tremia sobre a sua. — Hoseok…

— N-Nada… — balbuciou, direcionando um sorriso — Estou apenas com um pouco de frio…

Optando não forçar, Yoongi aceitou a resposta sem sentido, já que a noite era quente ao ponto de suas mãos suarem. Via em seus olhos a inquietação e algum desespero. Passando o braço por sua cintura, a conduziu para dentro do restaurante chique.

Ao entrarem, não foi difícil para Hoseok notar que era um restaurante que apenas a mais alta sociedade pisava. O estabelecimento era luxuoso, com belos lustres no teto, janelas exageradamente enormes e cortinas chamativas. As mesas cobertas por toalhas bordadas e talheres reluzentes. O jovem não negaria ficar tentado em pegar uma das colheres em volta de seu prato e se observar.

Sentando-se em sua cadeira após o loiro afastá-la gentilmente, agradeceu assim que ele se sentou ao seu lado.

— Você já sabe que vai pedir? — Yoongi, curvando-se para o lado, sussurrou próximo de Hoseok. Os cardápios já em suas mãos, uma comida mais estranha que a outra para o ex Jung. Negando com a cabeça, tinha medo de pedir alguma coisa e não gostasse. Seria um desperdício. — Quer que eu peça o mesmo para nós dois? 

Concordando, Yoongi escolheu um prato simples, também com o leve medo de não gostar da comida. Eram refeições diferentes de Daegu, mas o pouco que veio para Gwangju com seus pais, tinha leve conhecimento de alguns pratos bons.

— Esta muito linda essa noite, minha filha — elogiou senhor Jung, para a surpresa de Hoseok — Creio que seu vestido seja um presente do seu esposo...

Hoseok quis vomitar. 

— Obrigado, pai.

— Me alivia que seja tão gentil com minha filha, senhor Min — atrevidamente SunHee entrou na conversa, recebendo atenção do genro — Um perfeito cavalheiro, como muito ouvimos de sua mãe.

— Eu apenas estou cumprindo minhas juras perando a Deus, senhora Jung… Meu dever como marido é tratar Hoseok como uma mulher merece ser tratada — secretamente Yoongi entrelaçou suas mãos por baixo da mesa, acariciando a pele macia com o polegar.

— Palavras tão sinceras… — sussurrou apaixonada, sorrindo docemente — Qualquer dama ficaria maravilhada em ter um marido como você. Minha filha é uma mulher de sorte. 

Palavras falsas junto de um sorriso fraudulento.

Isso que Hoseok teria que suportar por todo jantar com sua família. 

Com os pedidos feitos e o garçom afastando-se da mesa, os Jung iniciaram um assunto com Yoongi sobre negócios de família, dizendo tudo que sabiam sobres terras e seus (inexistente) negócios na cidade. Com a mente viajando, acompanhava a maneira dos garçons ao servirem o vinho. Hoseok nunca provou bebida alcoólica, mas o pouco que sabia sobre elas não arriscaria aprender na prática. 

— Seu pai nos comentou sobre seus negócios em Gwangju na festa do seu casamento — iniciou o pai de Hoseok, enquanto tomava de seu vinho — Como é difícil confiar em alguém para cuidar de tudo enquanto moram tão longe. 

Ele escolhia cada palavra com calma, aparentando não ter interesses pelo cargo. Mas Hoseok suspeitava que Yoongi desconfiasse, ele parecia ser um homem esperto e atento a todos a sua volta. 

— Sim, estamos tendo problemas em achar um responsável por aqui… Sempre é difícil encontrar alguém de confiança, em Busan levamos anos para encontrar a família Jeon — Yoongi era sutil em sua resposta, observando o próximo passo dos sogros. Era visível o desejo que passasse a responsabilidade para eles, mas Yoongi não se deixaria levar apenas porque casou-se a filha deles. Tinha suas desconfianças com a família de sua esposa. — Mas creio que encontremos. Não queremos vender tudo que temos na região. Meu pai, ele comenta muito que cada cantinho é uma história para nossa família.

— Bom, se precisarem de ajuda com isso… — SunHee iniciou, ajeitando seu guardanapo sobre seu colo — Meu esposo conhece muito bem as terras de Gwangju mesmo sendo um homem do banco — riu — Família serve para ajudar um ao outro, não?

— Eu agradeço muito — Yoongi sorriu gentil, entrelaçando seus dedos com Hoseok, que ficou surpreso com o ato — Mas seu marido deve ser um homem ocupado com seus negócios do banco, não quero que seja uma carga para ele. 

— De maneira alguma, Yoongi. Eu ficaria muito satisfeito ajudando o homem que cuida tão bem de minha filha. 

Em seus dezoitos anos, Hoseok nunca viu seu pai falar tanto como nos últimos cinco minutos. Era assustador ouvir tanto sua voz. 

— Tenho alguns homens em mente, senhor Jung. Mas agradeço sua oferta. Quem sabe futuramente possamos fazer algum negócio, no entanto, é melhor as famílias não se misturarem — o tom era tão calmo que Hoseok ficou surpreso. As palavras vieram firmes e gentis, destruindo todos os caminhos que seus pais poderiam ter para conseguir o negócio. 

Com a resposta clara, Hoseok não demorou em sentir um par de olhos o queimando, fazendo-o se sentir desconfortável a mesa. Mesmo que sua mão estivesse tremendo e o coração agitado, não faria que ela mandava em um pedido silencioso. 

O silêncio reina um pouco a mesa, não que fosse um incômodo para Hoseok mas sentia Yoongi meio desconfortável. Se perguntava se ele estava arrependido, não que ele devesse, mas quando encontrou seus olhos, eles mostravam claramente isso. 

— Eu e meu marido estivemos de olho em comprarmos uma terra próxima das províncias, dizem que essas áreas são boas para gado — se pronunciando, Hoseok levantou uma sobrancelha. Conhecia seus pais perfeitamente bem e sabia muito que eles não entendiam nada de terras — O que acha, Yoongi? 

— É um bom investimento, creio. — respondeu, tomando mais um gole de seu vinho — Que tal mudarmos de assuntos? Eu e Hoseok temos algumas novidades para contar a vocês.

— Oh, e que seriam?

— Meus pais solicitaram que voltassemos mais cedo para Daegu que o planejado e como conversamos essa manhã, decidimos voltar amanhã. 

— Mas… Mas o combinado era a lua de mel de vocês aqui para que Hoseok se acostumasse com a vida de casada e que pudesse nos ter para qualquer dúv- 

— Senhora Jung, eu sei o combinado… Por isso conversei com minha esposa sobre e ela se mostrou aberta em ir — Interrompeu sua sogra. Não esperava aquele tipo de reação, na verdade, acreditava que ficariam bem com isso, mas suas expressões mostravam o desagrado — Nós cuidaremos perfeitamente dela, minha mãe a fará companhia nos primeiros dias já que ficaremos com eles até a reforma de nossa casa estar finalizada. 

— Hoseok? — chamou o filho, olhando com certa descrença no que ouviu do genro — Você tem certeza que quer ir para Daegu? 

Hoseok sorriu, assentindo enquanto recebia o olhar impassível de sua mãe ao respondê-la.

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— Foi realmente uma noite longa… — comentou Yoongi com uma risada divertida. Tirando seu paletó, agradeceu a empregada que rapidamente pegou a peça de roupa e a levou para o andar de cima. 

— Não esperava que eles ficassem com a cara fechada a noite toda depois da notícia? — perguntou o Min mais novo, que caminhou para a sala principal da casa. Queria se sentar um pouco, ainda se sentia um pouco tonto do pouco vinho que tomou. Mesmo que não fosse certo, Hoseok se sentiu tentado a experimentar e acabou por gostar. 

— Eu não esperava muitas coisas, mas outras creio que eu esperava. Não tão cedo, mas imaginei que surgiria em algum momento. — comentou, abrindo uma das janelas do cômodo. 

— Refere-se a…?

— Hoseok, você… Você sabe que seus pais mentiram sobre as terras... — encostado próximo a janela para tomar um ar, observou Hoseok se sentar no sofá macio e relaxar ali — E que tentaram me convencer a passar o cargo de administrador das terras da cidade para seu pai.

— Yoongi, eu sou grata que não tenha passado. Seria um erro — Hoseok conseguia sentir seus pés latejando contra o sapato alto, mal via a hora de se livrar daquelas roupas pesadas.

— Eu… — Iniciou, contudo, logo desistiu — Nada, esqueça — virando o rosto, observou para a vista de seu terreno no escuro, apenas banhada pela luz da lua pela sua janela. Yoongi fechou seus olhos, aproveitando a brisa fria.

— Yoongi… — o chamou após um tempo, recebendo o olhar quente do loiro, fazendo com que Hoseok se perdesse por alguns segundos Balançando a cabeça, culpou a bebida que ingeriu. — Eu gostaria de agradecer… Você tem sido gentil, amável e paciente comigo... Obrigada.

— Não deve me agradecer, esse é um papel de um homem para com sua esposa. Se faço que faço é porque desejo que seja feliz ao meu lado.

Culpa. Culpa. Culpa.

Assentindo com o dito, Hoseok se levantou do sofá, era melhor subir e trocar de roupa. Não suportaria olhar a cara de Min Yoongi por mais tempo sem que a culpa o afogasse. 

Jung Hoseok se sentia um perfeito monstro, igual a sua mãe.