Sabe, eu nunca entendi como todos poderiam gostar dela. Ela era metida, arrogante e irritante, ou pelo menos, era assim que eu a via, antes de a conhecer. Akkie mudou a minha vida, a forma como eu via a vida e a forma que as pessoas ao meu redor me viam. A loira me transformou, me fez ser gentil com ela, e agora, sou uma pessoa melhor a cada dia.
Aquela menina me causava curiosidade e estranhamento. Sempre que eu a via sorrir, ficava sem jeito, e isso me irritava. Seu sorriso era como um raio de luz, brilhante e... lindo. Eu a via como uma igual, mesmo não parecendo. Quando a machuquei, na nossa única briga corporal, fiquei mal depois. Eu não queria ser um cara agressivo, mas ficar sem reação perto dela era desconcertante, e, de certa forma, desorientador.
Quando as meninas disseram que ela foi ao hospital por minha causa, gelei na hora, eu lembrei de quando meu irmãozinho estava no hospital, foi horrível. Mas, quando aquelas idiotas disseram que era brincadeira, eu fiquei aliviado, por dentro, e irritado por terem brincado com aquilo, era algo muito sério. Entretanto, depois, resolvi devolver seu pingente de bola, que havia arrebentado quando brigamos e peguei, era importante pra ela, eu via como ela sempre mexia nele.
Depois de um tempo, comecei a perceber seus olhares, rápidos e tímidos. Me senti estranho, e infelizmente, comecei a observá-la também. A forma como ela ria, se divertindo com seus amigos, como colocava as mexas de seus cabelos loiros para trás das orelhas, para não atrapalhar quando estava concentrada em algo, tudo era peculiar. Comecei a ficar incomodado sempre que aquele amigo loiro dela chegava perto e olhava para ela, ele era tão óbvio, por isso, atentava ela com o suposto namoradinho, mas era irritante e eu estava muito mais agressivo por causa disso. Sorte que a loira sempre negava, me deixando, de algum modo, mais tranquilo.
Quando Akkie apareceu na escola, de boné e o tirou, mostrando que tinha rapado seu cabelo, fiquei estático, será que fiz mal em mandá-la subir na passarela improvisada? E o pior é que todos ficaram em silêncio, mas graças a seu amigo baixinho mané, todos voltamos a nos divertir.
No acampamento, estávamos já nos dando bem, e melhorou depois dela confiar em mim para a tirar da árvore a qual havia subido para se esconder. Menina maluca. Eu fiquei muito feliz por isso, por estarmos nos entendendo, até a contei sobre meu irmão, justificando minha falta de ir ao hospital. Vi que o clima ficou pesado depois disso e tentando amenizar, resolvi que deveríamos voltar, sugeri que subisse em minhas costas, tanto para não cansá-la como para saldar minha dívida da aposta, mas quando senti seu perfume doce tão próximo e ela tão... tranquila e feliz, fiquei um pouco desorientado e sem jeito a princípio, porém continuei andando e logo começamos a conversar.
- Joep... - ouvi ela chamar, tão próximo que arrepiei um pouco - Obrigado... por me tirar da árvore e por não alertar os outros.
Fiquei em silêncio por alguns segundos, raciocinando o que deveria falar.
- Não foi nada - digo e fico pensativo por alguns instantes - Akkie...
- Sim? - questiona ela curiosa.
- Desculpe - peço ao me lembrar de que já a machuquei.
- Pelo que? - pergunta sem entender.
- Pela briga, antes, no parquinho - relembro-a ficando rígido.
- Foi um mano a mano justo, não se desculpe - ela fala brincalhona depois de alguns segundos notando minha mudança.
Sorrio um pouco, constatando que essa menina realmente é maluca. E esse jeito dela... me faz bem, me sinto bem com ela. Ao chegarmos na base do acampamento, ela desce e somos separados, sinto uma sensação de perda me tomar, mas ignoro, observando todos preocupados com a menina a minha frente. Depois, mais tarde em volta da fogueira, eu pretendia sentar perto dela, mas seu amigo Laurens teve a mesma ideia, eu tinha começado a achar bom a amizade deles, só que realmente queria ficar perto dela, e acredito que ela também, por seu olhar, acho que ele percebeu e cedeu seu lugar, a partir daí comecei a gostar mais dele, o agradeci depois de sentar. Akkie tinha uma energia tão boa que contagiava todos a sua volta.
Ao saber de sua indisposição na manhã do dia seguinte, quando íamos discutir a formação do time, resolvi ir vê-la, para saber como estava e ao chegar, constatei como estava mal, fiquei preocupado e um pouco sem jeito por sua mãe estar ali. Quando a mãe dela saiu e ela me permitiu sentar perto de si, notei como estava mais pálida e triste, me senti mal por não poder ajudá-la, impotente. Queria animá-la um pouco, e acho que consegui, só que a senhorita sabichona tinha mais conselhos pra mim e fez mais bem para mim do que pude fazer por ela, acho.
Quando estávamos treinando de manhã, vi ela se aproximar e lancei a bola pra ela, mas a loira caiu, me deixando extremamente preocupado, tentei fazer com que me respondesse, no entanto não tive respostas, o que só me deixou mais aflito. Ouvi a professora dizendo que teríamos que tirá-la dali, então a peguei no colo com todo cuidado, levando-a até a cabana. Logo sua mãe, muito mais preocupada, se aproximou e me ajudou a colocá-la em uma cama, depois, só ouvi que a mãe ligaria para o pai e eles iriam ao hospital. Ela acordou quando a mãe foi falar com o pai, que chegou depois de um tempo, e nesse curto período, me aproximei dela quando as meninas foram arrumar suas coisas e os meninos haviam saído.
- Desculpe, acho que não vou poder jogar - disse com o semblante triste, sem olhar pra mim.
- Ei, olha para mim - peço baixo segurando sua mão de repente, eu estava triste também - Promete que vai ficar bem?
Ela ficou em silêncio, abaixou o olhar, depois olhou nos meus olhos novamente, com lágrimas nos seus.
- Se eu não ficar, o Dr. Bigode vai ter que raspar o bigode - fala tentando brincar, e sorri, me fazendo dar um sorriso também, pequeno.
Solto sua mão quando seus pais voltam e me afasto, dando espaço para eles, que logo a levam embora. Mais tarde, já de volta na cidade, ficamos sabendo que Akkie piorou e ficará mais tempo no hospital, isso me deixa perdido, me faz lembrar novamente meu irmão, e eu sei o que acontece no final. Me irrito, saindo de perto de todos e vou embora para casa, chegando, vou em direção ao meu quarto trancando-o em seguida. Fico com raiva e irritado com o que está acontecendo, tenho raiva do hospital, da doença e... dela, por ter me feito sentir alguma coisa por ela, por Akkie ter me feito amá-la. Logo a raiva se transforma em lágrimas, lágrimas de dor e tristeza. Eu não quero que ela morra! Não quero que ela deixe o nosso time, a escola. Não quero que ela me deixe! Não quero perdê-la!
~ Quebra de tempo ~
Quando o Laurens e eu fomos ao hospital, tentar fazer a Akkie, de algum modo, assistir ao jogo, nos deparamos com uma barreira enorme, o estado da loira tinha piorado muito e ela estava impossibilitada de deixar o hospital. Tento ignorar o sentimento ruim que cresce mais em mim, tanto pelo fato de estar em um hospital como pela situação, busco uma ideia, uma saída, e ela surge, quando olho pela janela, reparando no campinho logo abaixo, na área do hospital. Converso com o Dr. Bigode e eu e o Laurens vamos avisando todos da ideia, fazendo com que divulguem.
Ao ter a aprovação do hospital e a colaboração de todos, nos encaminhamos para o quarto da Akkie, para buscá-la. Paro, por um instante, notando onde estava... de novo, no quarto de um hospital. Penso em sair dali, mas vejo a loira, dona dos meus pensamentos, deitada, e não recuo, avançando, com nossos amigos. O sorriso que ela dá e seu olhar são hipnotizantes, só que volto a mim quando ouço sua voz, e, com o maior cuidado, a levamos até a sala do Dr. Bigode, onde tem a vista para o campinho.
Após todos saírem, para se preparar, fico e entrego o meu celular, sabendo que a narração seria feito pelo baixinho Brammetje, amigo dela e, agora, meu. Tal foi a minha surpresa quando ela me entrega seu colar de estimação, o pingente com a bola num cordão azul, como seus olhos.
- Joep... - ela chama, colocando sua mão por cima da minha, me surpreendendo mais.
Entrelaço minha mão na sua, sorrindo com o fato, e por impulso, a beijo, roubando seu primeiro beijo, e ela, o meu. Seus lábios são frios, como uma manhã nublada, mas são macios, como marshmallows. Fico com medo de que ela me rejeite, mas seu sorriso meigo me tranquiliza. Entretanto, logo um sentimento ruim me invade, e tento afastá-lo, por enquanto. "Até breve Akkie, nos observe por enquanto" murmuro em meus pensamentos, despedindo-me temporariamente. Ou pelo menos, foi o que pensei.
Fiz o gol de brincadeira querendo mostrá-la o quanto queria a deixar feliz. A comemoração de todos ali era boa e contagiante, mas ainda sentia uma sensação ruim, depois, soube o que era. Ao voltarmos para dentro, soubemos que Akkie se foi, enquanto assistia o jogo. A notícia foi um choque, não só pra mim, mas para todos.
Na manhã seguinte, em um lugar improvisado, os amigos dela montaram um local de presentes para a loira. Tinha uma foto sua, olhando para algum lugar e com um pequeno sorriso, mexendo em seu colar precioso, era bonita, expressava sua despreocupação e alegria, de certa forma. Não consegui conter as lágrimas de tristeza, a dor era insuportável, deixei meu presente, uma bola assinada, seu hobbie preferido pelo que sei. Brammetje veio do meu lado.
- Sente saudades dela também? - pergunta chorando.
"Você não sabe o quanto" digo em minha cabeça.
- Sinto - respondo concordando. Ele me olha, me analisando.
- Só criança chora - brinca tentando me animar.
Olho para ele e vejo sua tristeza também, abraço-o brincando consigo e noto mais ainda o quando Akkie mudou minha vida. A dor vem em dose dupla, me fazendo voltar a ficar sério assim que o pequeno sai, então aperto minha mão, notando algo nela. Ao abri-la vejo seu colar, o coloco lembrando do beijo, de seu sorriso e sua confiança em mim, sorrio ao olhar de novo sua foto, sabendo que ela desejaria me ver bem e o que ela deixou em minha vida, o que ela transformou. Até meu pai mudou comigo, nos tornamos mais próximos, amigos.
Nos dias que se aproximavam do nosso jogo importante, decidimos mudar o nome do time, ele agora seria Akkie. E, em homenagem a ela, muitos do hospital compareceram, incluindo o Dr. Bigode, que parecia estar em um relacionamento com a nossa professora, além de seus pais e amigos, que agora também eram meus amigos.
Depois do que aconteceu, o número 4 se tornou o meu favorito, e briguei por ele quando fomos escolher os números das camisas. No fim, eu acabei ficando com o número, houve um jogo que nossos amigos criaram para decidir, foi um jogo sobre ela, mas infelizmente perdi, pois não a conhecia tão bem quanto seus melhores amigos, só que acho que a Elise, amiga mais próxima dela, viu o quão decepcionado eu fiquei e decidiu me deixar usar, logo depois de explicar, só pra ela, porque eu estava usando o colar da Akkie.
No início, eu não quis comentar do beijo, mas a garota insistiu tanto que eu falei, ficando completamente sem graça depois, situação a qual era riu e disse que percebeu que a Akkie estava gostando de mim, já que ela perguntava algumas vezes. Eu fiquei feliz, e depois triste de novo, então ela me estendeu a camisa, como forma de selarmos um segredo só de nós três, eu, Akkie e ela, apesar de eu imaginar que o loiro Laurens já tinha ideia.
Elise jogava bem, e marcou o ponto no nosso jogo, o qual comemoramos a vitória gritando para homenagear a Akkie. Algumas lágrimas saíram do meu rosto enquanto eu olhava para o céu, onde a loira deveria estar agora, sorrindo, comemorando com a gente.
~ Quebra de Tempo ~
Com o passar dos anos, a dor era diminuída, mas nunca foi embora, Akkie sempre estaria comigo, na minha cabeça, na minha vida, nas minhas amizades e no meu coração. Viajei por diversos lugares e conheci muitas pessoas, estudei muito e, por influência familiar e da Akkie, virei médico, um pediatra, cuidando de crianças e bebês e tentando, a cada dia, encontrar novas formas de ajudar quem precisa. Casei quando tinha já meus 32 anos e tive a notícia de que seria pai aos 34. Minha linda menininha nasceu em 4 de agosto e, em recordação e comemoração, nomeamos, minha esposa e eu, nossa princesinha de Akkie, e fiquei muito feliz por saber que meu amor seria eterno para as duas pessoas mais importantes em minha vida, além da minha maravilhosa esposa e minha família.
Mantive contato com a Elise, mas perdi com o Laurens e o Brammetje, além dos meus outros amigos do ensino fundamental. Minha esposa conheceu a Elise e as duas ficaram próximas, convidamos ela para ser a madrinha da nossa pequena Akkie, sabendo o quanto significava para ela e para mim. Mais tarde, resolvemos procurar o loiro e o baixinho, e os encontramos, um em Londres e o outro em Dubai, ambos trabalhando muito. Por incrível que pareça, Brammetje ainda era solteiro, e tive a oportunidade de ver os melhores amigos da loira, Brammetje e Elise, se apaixonarem. Laurens já tinha se casado também, com três filhos que acabaram misturando muito da mãe e do pai, sua mulher era uma ex-modelo negra muito bonita e alta, conhecida da Elise. E descobri que os dois mantinham contato por isso.
Antes de nos casarmos, eu contei para Julie sobre a Akkie e ela entendeu e aceitou, que eu já tive um profundo amor que perdi tragicamente. Foi até ela que sugeriu inicialmente para colocarmos esse nome, tendo em vista que eu nunca esqueci Akkie. Serei eternamente grato por Julie e amarei incondicionalmente as duas mulheres que agora tenho em minha vida.
Com toda certeza do mundo, Akkie fez uma grande diferença na minha vida, e me fez ser quem sou, até os dias de hoje.
~ Quebra de Tempo ~
Agora, sentado nessa cadeira de balanço velha, estando velho, sabendo que meus netos correm no campo de futebol que fiz atrás da minha casa para eles, me despeço dos meus amores neste mundo e vou para o lugar onde a loira, que conheci muitos anos atrás, está, me aguardando. Jogaremos muitas partidas de futebol e riremos das diversas brincadeiras que faremos quando nos encontrarmos, assim, poderei ver novamente seu sorriso, sua alegria.
De lá, estarei protegendo minha família que ficou e mandando sempre boas energias, pois estarei bem acompanhado, e muito feliz, por tudo que fiz em vida e tudo que farei na morte, pois a morte é apenas uma fase, uma preparação para a próxima etapa.
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