História Justine - Um

Final de Julho de 2010

Madrid na Espanha

Sobre audiências e trabalho.

Ainda que estivesse na Espanha, o dia estava muito quente. O termômetro digital posicionado fora do fórum marcava 19º e ela desejava ter ido de vestido largo e sandálias rasteiras. Mas a vida não era muito justa com advogados.

Alisou o terninho preto, verificando se a saia justa estava no lugar e suspirou para seus saltos 12 cm. Verificou de longe que o luxuoso carro prateado já estava estacionado e ficou esperando a deixa de entrar nos prédios antigos e que ilustravam mais ainda a arquitetura rústica da cidade de Madrid.

Aquela semana tinha sido uma loucura, era fato. Como conseguiu lidar com tudo, ainda não sabia. O que ela sabia era que estava na frente do fórum municipal de Madrid, esperando Cristiano Ronaldo se camuflar mais ainda dentro do carro para que ela pudesse ir até a audiência que decidiria sobre a guarda do filho do craque português.

Cristiano, ainda que ele não fosse participar da audiência, fizera questão de, ao menos, ir até o Fórum para esperar o final da sessão com o juiz.

Ela lembrava-se muito bem do dia que recebeu uma ligação do jogador. Ah Cristiano estava eufórico e, ao mesmo tempo, era possível sentir o medo e a tensão. Nem quando ele estava prestes a encarar uma final ele ficava daquela maneira.

Cristiano, em meio a risos e lágrimas, contou para ela que iria ter um filho. Como assim um filho? Essa foi a pergunta que saiu dos lábios da advogada incrédula. Ele nem namorava! Como que iria ter um filho?

- Doutora Parron, vamos entrar? Está quase na nossa hora. – a voz grossa do promotor a acordou dos devaneios.

Justine estava parada no meio das escadas encarando através dos óculos escuros o estacionamento. Por quanto tempo ela havia ficado ali?

- Claro, vamos entrar. – respondeu guardando os óculos na bolsa e colocando o celular no silencioso. Antes de sumir de vista, acenou com os dedos para o carro prateado e sorriu em resposta quando viu um aceno de volta.

~♥~

- Encerro essa audiência com a síntese da sentença feita por mim. – o juiz de meia idade disse e todos os presentes se levantaram, esperando o veredito do homem. O ar condicionado estava ligado, gelando tudo, mas a sensação térmica de Justine era muito mais alta que a do sol que brilhava lá fora. Estava ansiosa. Era um dos primeiros casos que ela pegou do craque português e sabia muito bem que dependia desse resultado para o seu sucesso e reconhecimento na profissão tão concorrida. – Em acordo com os genitores do menor, decido que: Ao senhor Cristiano Ronaldo dos Santos Aveiro, representado pela sua advogada, será dada a guarda exclusiva e definitiva do menor Cristiano Ronaldo dos Santos Junior, hoje com quinze dias de vida. O menor irá residir com o pai e a avó paterna em Madrid e durante o primeiro ano de vida será acompanhado pelo serviço social do Estado. A advogada do senhor Aveiro poderá estar presente nas visitas da assistente social. A mãe de Cristiano Ronaldo Junior abre mão de todos os benefícios, direitos à visita e até mesmo terá o nome retirado da certidão de nascimento do menor. O senhor Aveiro irá fazer o pagamento da quantia acordada até o próximo dia útil para que essa sentença seja dada como definitiva e para que os trâmites aqui decididos sejam realizados. Ainda lembro que os presentes nessa audiência privada assinaram termos de confidencialidade e sofrerão sanções altíssimas caso alguma cláusula seja quebrada. Estão dispensados.

As poucas pessoas que ocupavam a sala de audiência saíram pelas portas principais e Justine ficou para trás. Pegou a bolsa e colocou nos ombros, tirando o celular de dentro para ver as horas.

Ao levantar seus olhos, cruzou com o olhar da mãe de Junior.

Era uma moça simples de olhar cauteloso e feições ambiciosas. Certeza que tinha sido seduzida pelo fato de que o craque português havia demonstrado interesse nela. Obviamente que não esperaria ficar grávida e gerar o herdeiro de Cristiano Ronaldo, o camisa 7 do Real Madrid e da seleção portuguesa de Portugal. Menos ainda esperava a quantia absurda que lhe fora oferecida para que ficasse de boca fechada e abrisse mão da guarda do menino.

Justine sorriu fraco para a moça.

Infelizmente existiam pessoas ambiciosas demais no mundo.

- Parabéns, o limãozinho é seu. – ela anunciou ao celular, colocando os óculos escuros e olhando para Cristiano que ainda estava camuflado em seu carro. Ela ainda não entendia como alguém achava ficar escondido dentro de uma Mercedes reluzente, mas esse era Cristiano Ronaldo. Não tinha muito sentido nas coisas que ele fazia.

Tipo quando ele ligou para ela falando que ia ser pai, que ia oferecer muito dinheiro para a mãe do menino e que ela, Justine, recém formada, ia representá-lo nessa empreitada.

Oi?

Pois então, era isso mesmo.

- É sério isso, Just? – ele perguntou e o sorriso nos lábios vermelhos da advogada abriu mais ainda. Ela amava quando ele a chamada de Just. Por mais que seu nome fosse difícil de apelidar, ela sempre fazia beicinho enfezado para o apelido que ganhara ainda na infância: Tine.

- É sério isso, Ronaldo. Ele vai ficar com você e sua mãe agora, definitivamente. – completou as informações rumando para o próprio carro. Destravou as portas, jogando a bolsa no banco do passageiro e abriu os vidros.

- Precisamos comemorar, você sabe né? Já fiz uma reserva naquele restaurante que você gosta. Te encontro lá em dez minutos. – Cristiano decretou e ela revirou os olhos.

- Não é assim que funciona. – ela praticamente cantarolou de forma irônica – Eu preciso voltar para o escritório terminar de arrumar as coisas do processo. Sabe né? Esse tipinho para quem eu estou trabalhando é foda.

- Nossa, estás engraçadona, hum?

- Não fale assim. – Justine riu, dando partida no carro – Eu preciso te passar algumas informações sobre o que aconteceu na audiência e sobre o que foi decidido... cancele a reserva de agora e passe no escritório para eu te deixar por dentro. Não é um pedido. Você tem um prazo muito curto para dar andamento nesse processo.

- Ahh eu fico por dentro, advogada. Fico onde você me quiser. – ela sentiu a malícia na voz dele e revirou os olhos  - Just, você sabe muito bem o que me causa você me dando ordens dessa maneira.

- Ah Ronaldo, dá um tempo! – ralhou Justine – Anda logo e passe no escritório. Depois você me levar para jantar, estou morrendo de fome. – e então ela desligou.

Justine não gostava de dar moral para as coisas que ele falava. Cristiano Ronaldo era um rapaz perigoso.

Se ela fosse dar atenção para tudo o que ele falava, iria enlouquecer. Até porque o jogador já rondava os pensamentos dela muito antes de ela se formar e ir para a cidade espanhola. Justine sempre fora uma apaixonada por futebol, e, todos sabiam que era impossível falar de futebol sem o nome do jogador português ser citado.

Além de que, ainda que tivesse passado a temporada de jogos sem títulos, o atacante madridista havia acumulado gols e batido recordes mais uma vez com sua atuação pelo time da capital.

Justine havia se mudado para Madrid há poucos meses, menos de um ano. E ela amava a cidade, as pessoas, o seu apartamento pequeno no centro da cidade, o seu escritório pertinho de casa e até mesmo começou a se interessar pelo time da casa.

O Real Madrid estava ganhando espaço no seu coração, ao lado do time, até então, dono do seu coração todo: Bayern de Munique. Afinal, os bávaros faziam parte de sua infância, seu crescimento e sua vida. Eles eram os responsáveis pelos muitos palavrões proferidos para a televisão ou para os gramados, eram responsáveis pelas lágrimas derramadas de tristeza e pelas derramadas de alegria.

Ligou o som e aumentou o volume. Deixou que os acordes latinos de uma banda qualquer preenchessem o espaço no carro até ela se preparar para o encontro com o jogador português.