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História Kauê e os filhos da Amazônia - O Sangue da Caipora - Meu inédito companheiro de quarto


Escrita por: Josuel888

Capítulo 8 - Meu inédito companheiro de quarto


Quando sai pra fora, Ágata e Tainá me esperavam perto das enormes estátuas de Tupã e Sumé, quando passei por elas, outra luz me cercou e graças a isso a minha língua parou de coçar e a minha cabeça parou de explodir com tantas lembranças. 

—Agora está livre da bênção de Sumé, pode mentir até pra si mesmo se quiser. — disse Tainá abrindo os braços e me abraçando. — Achei que não fosse sair dessa. 

— Nem eu. — respondi ainda não acreditando nas coisas que ouvi lá dentro. Encarei Ágata, ela parecia mais tranquila desde a última vez que a vi. — Obrigado. 

—Eu que agradeço, nós trabalhamos bem juntos. — ela socou meu ombro. — Nunca vi tanta coragem e burrice misturadas dessa forma. 

brigado, eu acho. — respondi sentindo meu rosto arder.  — Mas e agora? Ouviram o que o Raoni disse, todos devem me odiar nessa altura do campeonato.

—Bobagem, Raoni gosta de provocar. Temos regras aqui, se o conselho disse que você é inocente, ninguém além dos próprios deuses podem questionar as decisões. Eles podem não gostar de você por medo, mas terão que te respeitar. — disse Tainá passando o braço pelo meu pescoço. — Pode contar comigo, com Ágata, com o João, até mesmo com o ranzinza Victor. Só não faça surgir mais nenhuma surpresa, ok.

—Vou tentar. — sorri. 

—Agora vamos, você tem muito o que ver e conhecer. — disse Ágata me pegando pelo braço. — Quero terminar isso antes do almoço. Nos vemos depois, Tainá.

- Preciso providenciar seu papagaio. —  respondeu Taina e eu fiz uma careta— Nos vemos no almoço. 

—Papagaio? — suspirei.

—Todos temos que ter um. — respondeu Ágata. — São nossa maior fonte de informações e aliados. Eles são criados aqui e ficam em lugar especial, os filhos de Polo que cuidam deles. Isso até eles escolherem um semideus para serem seus companheiros a vida toda, claro, isso quando são crescidos.

— Oi? Não sou eu que escolho? A vida toda?! — exclamei, só de pensar em algum parente igual ao Rajada, minha cabeça dói. 

—Claro, ele que tem que gostar de você e escolher. E sim, a vida toda. Não fique tão surtado, imagine ele como seu celular precioso que você leva pra toda parte com todas as suas coisas e você zela por ele como se fosse um filho. — disse ela. — É a mesma coisa. Só não conte segredos pessoais ao papagaio, eles têm a mania de fofocar por aí essas coisas, me siga. 

Ágata me explicou enquanto caminhávamos que essa parte onde estamos é apenas o campo de treinamento de Eldorado. Atrás das altas árvores que ficam ao norte do campo de treinamento, tem uma gigantesca comunidade. Uma cidade enorme para todos os filhos da Amazônia e seus descendentes.  Lá todos podem formar famílias e viverem do fruto do trabalho que eles desenvolvem, sem interferência de ninguém além dos deuses. Mas pelo jeito isso é uma escolha, as vezes alguns preferem tentar a vida fora daqui. Um ato que não é muito encorajado pelos superiores, de acordo com Ágata, mas todos são livres para fazer e viverem suas escolhas. 

Ágata me levou primeiro em frente a um prédio feito de madeira e palha, ao lado dele tinha um escorregador, balanço e redes presas em árvores. Dentro de um cercadinho tinha alguns filhotes de animais como: Onça—pintada, Mico—leão—dourado, Tatu, Lobo—guara e outros.  Dentro da escola tinha crianças e adolescentes e homens e mulheres adultos. Eles pareciam conversar animadamente. 

—Essa é a nossa escola. — disse Ágata com um sorriso, ela parece orgulhosa. — É aqui que os novos semideuses aprendem sobre tudo que precisam, os nomes de todos os deuses, as religiões, as criaturas folclóricas que podem enfrentar e muitas coisas a mais. Temos as matérias de História, geografia, artes, Língua e escrita Indígena e linguagem animal. Falando nisso, precisamos fazer sua matrícula. Podemos fazer mais tarde.

Eu acabei de entrar de férias... e agora ela quer que eu vá pra escola?! Mas ao contrário da minha escola normal, essa parece ser divertida. 

Andamos um pouco mais adiante, havia uma horta enorme em um vasto campo. Nunca vi tanta verdura, legumes e frutas em um só lugar. Canteiros de morangos, alfaces, uvas, pés de Jaboticaba, de banana, laranjas, mandioca, todos carregados e transbordando alimento. Nele também havia homens e mulheres, eles balançaram as mãos e as frutas e legumes saiam voando para um cesto, uma pequena nuvem voava acima dos alimentos os molhando por inteiro. 

—Essa é a nossa horta. — sorriu Ágata. — Aqui que produzimos a maior parte de nossos alimentos e dos nossos recursos financeiros. Os filhos de Sumá, deusa da agricultura que cuidam de tudo. 

—Recursos financeiros? — questionei. 

—Sim, nós vendemos esses alimentos por todo nosso país. — disse ela. — Quando nossas legiões são enviadas por todos os lugares, eles precisam de dinheiro para comerem e beberem, esse dinheiro sai de nossas vendas para a os supermercados e feiras. 

—Sempre pensei que toda aquela comida que eu via mas reuniões eram feitas por sua magia. — respondi. 

—Impossível, não se pode criar comida do nada. Não sou uma deusa. — disse ela. — As cozinheira e cozinheiros da legião que sempre preparavam elas, eu apenas as transportava com meus feitiços. 

Nunca fui muito fã de verduras e legumes, qual é! Eu não sou um coelho, mas esses aqui parecem ser tão gostosos. Só de olhar já sinto meu estômago roncar e pelo jeito ele fez um terramoto, pois Ágata olhou pra mim no mesmo instante. 

—Acredite, quando cheguei aqui e vi essa maravilha, também fiquei doida de fome. Logo iremos almoçar, aguente um pouquinho. — disse ela. 

Fácil ela falar... 

Andando um pouco mais, pude perceber alguns olhares para mim. Não sei dizer que tipo de olhar, mas alguns pareciam ser de medo e raiva. Tentei não me importar, o que me deu força para ignora-los foi um cheiro delicioso que invadiu minhas narinas quando passamos perto de um enorme local cheio de mesas e assentos de madeira. Enormes pilares sustentavam o local.  Pratos e panelas de barro estavam em cima das mesas, algumas mulheres indígenas, brancas e negras estavam cozinhando e pelo cheiro maravilhoso, elas estão cozinhando mais do que muito bem. 

— Aqui é onde as refeições são feitas e onde todos nós comemos. Todos nós comemos juntos, digamos que é um momento de agradecer aos deuses por nossa terra fértil, por nossa fartura. É um dos momentos mais especiais para todos, posso dizer que é como ter um jantar de natal todos os dias. — disse ela. 

Quanto a isso eu não sei, nunca tive um jantar de natal assim. Minha avó sempre se fecha no quarto pra chorar, o dia de natal é aniversário de minha mãe... tanto de nascimento, como de morte... então... é complicado. Todo ano, eu simplesmente vou dormir ou fico na janela vendo os vizinhos comemorando com suas famílias. 

—Só tem mais dois lugares que eu gostaria de te mostrar agora. — diz Ágata — O Centro de treinamento com nosso professor de atividades e seu quarto. Qual quer ver primeiro? 

— O quarto. — estou doido pra ver essa tal oca pra turistas que o Pajécique mencionou. 

—Muito bem. — diz ela andando na frente. 

Esse lugar é tão belo, me traz uma paz que nunca senti antes. Araras—azuis voam pelos céus, assim como as vermelhas.  Um garoto indígena passou na minha frente montado em uma onça—pintada. Isso é algo que nunca imaginei antes. 

—Vocês parecem viver em harmonia com os animais. — disse eu ainda olhando para a onça doméstica. 

— Os animais merecem todo nosso respeito e amor, somos amantes da natureza. Vivemos pra preservar a fauna e a flora e também, a deusa Caipora, protetora dos animais e da floresta é a nossa presidente. — respondeu ela.

— Achei que o Pajécique fosse o líder. — levantei a sobrancelha. 

— Ele é o líder, mas a deusa Caipora está aqui a pedido de Tupã. — sussurrou ela. — De qualquer forma aqui faz parte dos domínios dela, apesar dela não fazer mais suas funções como antes. 

— Como assim? — perguntei. 

—Não é uma história boa de se contar e não fale disso depois, ok. Originalmente ela devia estar percorrendo a floresta e protegendo que tudo que vive nela, todo a nós somos agraciados com sua bênção. Só assim para realizarmos nossas funções, mas aconteceu uma coisa no passado que a deixou em um estado depressivo. — Ágata suspirou, deuses tem depressão?! — Caipora ia se casar com Pã, deus dos sátiros e protetor das floresta da religião grega. 

—Achei que nenhum deus de religiões diferentes pudessem se relacionar assim. — respondi. 

— Não podem, mas Caipora e Pã estavam realmente apaixonados. Nem mesmo Rudá, nosso deus do amor ou Afrodite e Eros puderam impedir esse amor que crescia dentro deles. O deus Hermes, pai de Pã junto da deusa Athena e Héstia Imploraram a Zeus, assim como Jaci implorou a Tupã para que permitissem o casamento acontecer. Por fim, eles permitiram. Mas o casamento nunca aconteceu...

—Por quê? — questionei. 

— Não sei, ninguém além dos deuses sabem ao certo. Parece que Pã desistiu ou não apareceu, algo assim. Isso deixou Caipora arrasada e depressiva até hoje, tanto que ela nem mesmo cumpre suas atividades de deusa protetora. Por sua depressão as florestas e os animais começaram a morrer ou se tornarem agressivos até mesmo conosco. Um tucano que geralmente é inofensivo, atacou e arrancou um olho de um bebe de um casal de pesquisadores que estavam gravando um documentário. Ele o atacou apenas por se irritar com o choro da criança. Os deuses tiveram que agir. Tupã decidiu retirar parte dos poderes dela e dar ao curupira até ela melhorar seu estado. Ele também enviou ela para “cuidar de nós" — ela fez aspas com os dedos. — Como uma forma de terapia, eu acho. Não sei se está funcionando, mas pelo menos se irritando com a gente ela parece mais feliz. Enfim, não fale disso por aí.

—Minha boca é um túmulo. — respondi. 

—Ótimo ou ela pode te transformar em uma tartaruga e você não vai querer isso. — respondeu ela. — Chegamos, aqui que fica seu quarto. 

Não sei bem dizer qual desses lugares ele fica. Tudo que vejo é um espaço circular com diversas ocas ao lado uma da outra. Só que cada oca era diferente uma da outra. Elas não eram simplesmente feitas de terra, mas de madeira, palha e tranco de palmeira. Cada uma delas tinha um símbolo diferente, muito parecidos com as tatuagens nos braços dos semideuses que conheci. 

—Aqui ficam as Ocas dos semideuses em treinamento e membros das legiões. — disse Ágata. — Como pode ver, cada uma delas tem um símbolo diferente representando cada deus. Todos devem ficar com seu respectivo parente divino até um certo tempo. E não se engane, elas parecem ser pequenas por fora, mas por dentro são gigantescas. Isso graças a bênção de Ceuci, deusa da moradia e do lar. Todas as Ocas tem um espaço para adoração e agradecimento a ela. 

A maior delas tinha um símbolo de raio azul esculpido na madeira, essa deve ser a de Tupã... onde com certeza deve ficar o Yancy. 

—Essa é a de nosso grande senhor, Tupã. — disse Ágata. — Geralmente ficava vazia até Yancy chegar aqui, atualmente só tem ele. Você o conheceu não é? 

— Sim o conheci, o rapaz cego, engraçadinho e boni... quero dizer... hã-hã. Ele fica sozinho? — perguntei amaldiçoando minha língua grande e meus pensamentos extrapolados. 

Ágata me olhou com uma careta estranha e um sorriso idiota surgiu no canto de seu lábio. 

— Fica, ele não tem irmãos ou irmãs, além do Pajécique. — respondeu ela dando de ombros. — Mas ele não se incomoda com isso, não é uma solidão enorme. Só é quando ele vai dormir e acredite, eu queria ter essa sorte que ele tem. Meus irmãos e minhas irmãs me deixam maluca a noite inteira. Meu quarto parece uma creche.  

Talvez não pareça uma solidão enorme pra ela, mas pra mim foi. Eu sempre quis um irmão ou irmã para brigamos por qualquer coisa e depois nos perdoarmos. Sempre foi só eu e minha avó... e apesar dela se meter em minha vida, tinha coisas e segredos que eu não podia contar pra ela, mas um irmão ou irmã seria o ideal... será que sou como Yancy? Sem nenhum? Essa merda de não saber quem é o meu pai está me matando a cada segundo possível. 

—A oca ao lado com o símbolo da Lua é da deusa Jaci, deusa da lua, da noite, das plantas em menor grau, esposa de Tupã e rainha dos deuses. Não exatamente nessa ordem. — respondeu Ágata. 

A Oca de Jaci é quase do mesmo tamanho da de Tupã, sua madeira parece ter sido pintada com uma tinta prateada como a lua. Até mesmo a palha é prateada. Essa oca parece cheia, mesmo daqui de fora, posso ouvir risadas do lado de dentro.

 

—João é o líder dessa oca. — diz Ágata. — Ele odeia esse trabalho, mas ele foi eleito, então não tem muito o que fazer. 

A terceira oca tinha um enorme sol amarelo de madeira no teto. A madeira é pintada com diversos sois laranjas e amarelos. Eu me aproximei, esse local me trás sensações familiares. Uma sensação prazerosa, uma calma única. Como se a energia do sol me fortalecesse. Não estou ouvindo nenhum barulho, será que ele também está vazio? 

—Essa pertence a Guaraci, deus do sol. — disse Ágata. — Não está vazio, deve ter uns vinte garotos e garotas. 

Mais adiante tinha uma com a madeira colorida com diversos animais desenhados w pintados. 

—Ao lado dele tem o da deusa Iara, deusa da água, dos rios e dos lagos, está só tem garotas. Iara só tem filhas, o motivo disso eu não sei. O outro pertence a Sumá, deusa da agricultura como disse antes. O outro a Sumé, Deus das leis, todos com uns 30 semideuses cada um pelo que me lembro e diversos outros adiante. Melhor deixarmos pras suas aulas de história. Se eu ficar falando de cada oca e seu representante divino, vamos ficar aqui a manhã toda. — respondeu ela. — Vamos direto ao lugar que você vai ficar. Preciso voltar para Junto de meus irmãos, logo será a hora do almoço e os mais novos sempre esquecem como se comportar em um momento tão sagrado. 

Eu queria reclamar, estava gostando de conhecer e aprender um pouco de tudo agora, mas ela talvez esteja certa. Tem muitas ocas adiante, muitas mesmo. Mais de 20, com certeza e ela parece estar com pressa. 

Eu segui os passos apressados dela sem poder olhar muito e bem no final de todas as Ocas com símbolos, tinha uma comum com apenas uma bandeira branca no topo. 

—É aqui. — disse ela. — A Oca dos turista, viajantes e convidados indesejados.  

—É bem... ah... legal. — murmurei, poxa as outras são tão lindas e coloridas e essa é tão... sem graça. — Por que ela tem esse nome? 

—Acontecia com frequência antes, mas nem tanto agora. Antigamente nós recebíamos visitas de semideuses de outras regiões do mundo, eles vinham pedir auxílio em alguma missão e coisas assim. E ficavam nessa oca, hoje em dia é quase raro isso acontecer. Tanto que só tem uma pessoa morando aí dentro. — disse Ágata com um sorriso estranho. — Vamos entrar. 

Por dentro é muito maior do que eu imaginava, isso não é um quarto, é uma casa inteira! O chão é revestido de com madeira, mas paredes haviam pinturas de diversos animais e índios dançando. Nas paredes laterais haviam redes e camas, todas feitas e prontas. No final das camas haviam baús, aqueles tipos de tesouro que eu estudei nas aulas de história. Também havia mesas de madeira com cadeiras e muitos livros, papeis amarelos enormes e quadros. Se esse lugar e lindo e confortável assim por dentro, fico imaginando como devem ser as outras ocas. 

No final do quarto, havia uma estátua, uma não, mas várias estátuas de madeira com homens diferentes. Um eu reconheci como Tupã, pois já vi a escultura dele no templo de Sumé, mas os outros não são familiares, na verdade eles não se parecem nenhum pouco com algum deus indígena. Um deles, a esquerda de Tupã tem uma barba e um raio em suas mãos. Outro a direita de Tupã tinha uma barba grande também, mas tinha um tapa olho no olho esquerdo e um corvo no ombro. O outro não parece humano, ele é bem mais magro que os outros e sua cabeça é de uma águia. Ele segura um cetro com o símbolo do sol na ponta. A seguinte era um jovem rapaz com enormes asas nas costas e empunhando uma espada sua mão esquerda tinha uma pomba. E alguns outros que não sei dizer o que são na verdade. Os nomes estão escritos com letras estranhas, não consigo entender. 

Ágata se aproximou e se ajoelhou perante Tupã primeiro e depois uma referência aos outros. Será que devo fazer o mesmo?

—Quem são eles? — perguntei. 

—Estes Kauê, são os principais representantes de algumas religiões do mundo. — disse ela. — Está oca foi feita depois da segunda guerra mundial, para representar um símbolo de amizade e união entre todos os deuses do mundo para conosco. 

—Todos eles são deuses de outros lugares? — questionei. 

— São, não consegue ler os nomes? Você precisa mesmo ir pra escola. — ela bufou. — Este é nosso senhor, Tupã. Este com o raio é Zeus, deus grego dos céus e rei dos deuses. Este com tapa olho e o corvo é Odin, deus Aesir de Asgard, pai de todos da religião nórdica, este é Rá, deus do sol da religião egípcia e este é o Arcanjo Miguel, segundo no comando do céu e a pomba que está acima dele representa o Deus cristão e outros são líderes das religiões Maia, Astecas, Hindu e outros que não conheço muito bem. Não que eles sejam amigos, digamos que é um pacto de não agressão e respeito. 

Então todos os deuses se conhecem e são “amigos" talvez essa seja uma palavra forte demais, aliados talvez. Incrível! E pensar que os humanos vivem brigando por causa de suas religiões e os deuses se dão bem, pelo menos é o que parece. 

—Já passaram muitos semideuses de outros lugares por aqui? — perguntei. 

—Já, tipo, antes passavam muito mais. Até onde sei, antes da segunda guerra mundial era recorrente semideuses se encontrarem e se misturarem, mas depois daquele período as coisas mudaram. Se tornou algo raro, tanto que desde quando cheguei aqui, isso a 8 anos atrás, só apareceu um e ele ainda está aqui. — respondeu ela se virando e voltando sua atenção para o quarto. 

— Pode escolher qualquer cama ou rede pra dormir. — disse Ágata indo até uma cama que tinha um enorme livro aberto. — Aquele oxigenado ainda não terminou isso. 

— Oi? — perguntei, não entendendo. 

Ela bufou e fechou o livro. 

—Meu namorado, Robert Winston. — disse ela. Esse nome, com certeza ele é estrangeiro. — Ele dorme aqui, ele é um semideus de outro país, filho de um deus da magia com toda certeza, mas ele não sabe quem e nem nós. Ele vive aqui a uns três anos, podemos dizer que ele passou de turista e viajante para pessoa indesejável para a maioria, incluindo Raoni e seus irmãos. Logo você vai conhecer ele, ele deve ter ido tomar banho, ontem ele ficou de guarda nas fronteiras e foi atacado por um Labatut, um monstro humanoide horrível com dentes de elefante, garras afiadas e seus pelos são espessos como se fossem espinhos. Ele vive rodeando a nossa comunidade atrás dos bebês recém—nascidos. Robert o matou, mas o monstro conseguiu ferir ele com seus enormes dentes. Eu falei para aquele burro, peça ajuda...

—Eu podia ter dado conta dele, se não estivesse ocupado pensando no seu sorriso. — disse uma vez masculina, mas de onde? Eu até olhei pra cima, pensando que fosse outro voador, mas não tem nada. 

—Me poupe das cantadas, Robert. — Ágata sorriu. — Você está melhor? Não consegui vir te ver antes. 

— Estou, espere. Deixe eu me vestir, eu iria ficar pelado, mas agora tenho um novo companheiro de quarto e isso seria constrangedor. — ouvi ele rir. — Esse é o tal matador de cães do inferno? Achei que fosse mais alto. 

O baú no fim da cama dele se abriu e ele pegou algumas roupas, ele as vestiu e por poucos minutos as roupas pareciam vestir nada, isso até o garoto se tornar visível para nós.

Ele é loiro, forte e alto como Raoni, seus olhos são verdes, bem bonito, mas nem tanto quanto Yancy, bom, pelo menos na minha opinião. Por que diabos falei do Yancy de novo?! Na sua perna esquerda tinha um tipo de faixa feito com folhas de bananeira. Ele se aproximou de nós e estendeu a mão para mim.

—Sou Robert, semideus estrangeiro, filho de não sei de quem e namorado da Índia mais linda de Eldorado. Pode olhar, eu sei que sou bonito.  — ele sorriu  e fiz uma careta. —  Você deve ser o famoso, Kauê. Sinceramente obrigado, com você sendo a nova celebridade, alguns podem parar de implicar comigo. Alguns não gostam de mim por mim estar aqui mais tempo do que deveria. O problema é que não tenho pra onde ir. 

— Olá. — apertei sua mão rapidamente, ela é tão gelada.

Ele se aproximou de Ágata e beijou sua testa. 

—Faça como eu, não ligue para que os outro dizem. Se o Pajécique, Curupira e a Caipora deixaram você ficar, ninguém tem que falar nada. Fofoca aqui é o que não falta. — respondeu Ágata. 

É, estou a pouco tempo aqui e posso comprovar que a língua do povo é bem afiada, principalmente para acusar e criticar. 

—Esta bem? Fiquei sabendo que tinha reunião com o conselho. — disse ele. 

—Estou. — respondeu. — Não foi nada demais. E sua perna? 

— Estou ótimo, sou capaz de fazer tudo de novo. — ele sorriu e voltou a me encarar com um sorriso no rosto. — Ele vai ficar aqui? 

—Vai. — respondeu ela. — Finalmente você não ficará mais sozinho, isso até o pai dele se manifestar. 

—Ah, logo agora que estava me acostumando com suas visitas noturnas. — Ele suspirou e Ágata pisou no pé dele.

Visitas noturnas? Ah... entendi.  

—Cala a boca. — disse ela, furiosa, mas pude ver que ela parece envergonhada.

— Ok, ok.  — disse ele se rendendo com as mãos. — Fique a vontade, não tenho muitas regras da minha parte. Claro, não faça o chão de guarda roupa e não ronque. Meus ouvidos são sensíveis. Geralmente a noite eu estudo, mas hoje irei ficar conversando com você, se quiser. 

—Claro, com certeza dormir não está em meus planos. — respondi. — Falando em roupas, cadê as minhas?! 

Meu Deus, só agora eu me dei conta. Cadê minha bagagem e minhas coisas?! 

—Estão no baú. — apontou Ágata. Um baú de madeira com uma insígnia da bandeira espanhola, pelo menos é o que parece. — Espero que goste dos nossos atraentes guarda roupas. São os baús usados pelos portugueses, espanhóis, holandeses e franceses na época que nosso país era colônia lá pra 1500 até 1822. Os semideuses da época eram... como vamos dizer... primitivos. Eles destruíram diversos navios, mas não antes de pegar as coisas incríveis que tinham dentro. Guardamos elas até hoje e as usamos. 

Minha professora de História teria um infarto se visse, escutasse e até mesmo aspirasse tudo isso a minha volta. Isso é incrível, eu ainda não consigo acreditar que isto esteja acontecendo comigo. 

Uma trompa foi assoprada no lado de fora, tão alta que poderia imaginar que o som dela parecia sair pelas paredes da oca. 

—É hora do almoço, preciso voltar para meus irmãos e irmãs. — disse Ágata dando um pequeno selinho em Robert. — Você pode levar ele pro refeitório? 

—Claro que posso. — respondeu Robert. — Nos vemos já . 

—Depois do almoço iremos te matricular na escola. — disse Ágata olhando para mim. — Os novos semideuses já devem ter sido matriculados nessa altura do campeonato. 

— Obrigado, de verdade. — respondi e ela assentiu, saindo correndo. 

—Bom, não vamos deixar a comida esfriar não é? — Robert sorriu e passou o braço por cima de meu ombro. — Imagine o impacto que vamos causar chegando juntos? 

Acredite, eu não quero imaginar... não quero mesmo. 



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