– Acalme-se Jackie! Já disse, isso não passa de sonhos.
– Eu juro, juro que são reais! – insisti.
– Você está atrasada. Levante-se.
– Mas mãe...
– Jackie Matsumoto, é a ultima vez que vou lhe dizer: São apenas sonhos!
Minha mãe retirou-se do meu quarto, me deixando novamente perdida nos meus pensamentos. Como é possível, como é possível ter o mesmo ter o mesmo sonho durante dias, semanas, meses?!
Todas as manhãs quando acordo desses supostos sonhos, meu coração parece arder, como se estivesse pegando fogo.
Tudo que consigo me lembrar é de me ver parada em um outro mundo. Um mundo cheio de ruínas. Com um silêncio horripilante, cuja o mesmo hora ou outra era quebrado pelos cantos de corvos. O que deixava o lugar mais assustador. Vultos de rostos deformados, com olhos costurados, circundavam o meu corpo. Árvores com formatos bizarros tinham suas folhas e tronco, acinzentadas.
“– Ajude-nos!”. – as vozes imploravam.
De repente eu fui transportada para a frente de algo como um tipo de castelo, caindo aos pedaços. Sua cor também tinha um tom cinza, como quase todo o resto daquele mundo estranho. Atrás do portão, havia um grande jardim, com rosas negras. Uma mulher de pele muito clara, estatura média, vestes avermelhadas e longos cabelos negros, levemente ondulados, andava de um lado para o outro, em meio a aquele jardim. Diferente daqueles rostos deformados que antes estavam ao meu redor, a mulher não tinha olhos costurados, e seu rosto era perfeito, sem nenhum tipo de deformidade.
A moça redirecionou os seus olhos a mim. Os mesmos focaram diretamente nos meus olhos. Cerca de segundos depois, os vultos voltaram. Desta vez eles estavam perto da mulher. Num piscar de olhos, os vultos passaram a girar vagarosamente ao redor do corpo da jovem moça. A mesma passou a flutuar. A cada segundo os ventos se tornavam mais gélidos e rigorosos. A silhueta feminina passou a emitir um tipo de luz branca.
E sempre depois desse momento, eu acordava. Era sempre daquele jeito. Sempre a mesma mulher. Sempre os mesmos rostos deformados. Sempre as mesmas vozes. Sempre os pedidos de ajuda. As mesmas ruínas. A mesma sensação do frio intenso. E sempre aquela cor cinza.
– Jackie, pela última vez, desça para o café. – gritou minha mãe.
Olhei no relógio, e eu realmente estava atrasada. Havia me distraído pensando em uma explicação lógica para tudo aquilo.
– Estou indo, mãe.
Lutei contra as cobertas e finalmente quando as venci, me levantei. E me direcionei para cozinha.
– Achei que não viria mais! – disse minha mãe, arrogante.
– Aqui estou.
– Escute, eu marquei uma consulta em uma psicóloga de renome para você, depois da aula, e...
– Eu não vou! – falei fria.
– Essa decisão não cabe a você.
Sai da mesa e fui me arrumar. Quando fui ao banheiro realizar minha higiene bucal, analisei bem os meus olhos. Desde que eu havia começado a ter aqueles sonhos, o contorno dos meus olhos estavam realmente pretos, e eu tinha olheiras enormes.
Aqueles sonhos não estavam afetando somente a minha estabilidade mental, estavam afetando também os meus sentimentos. Minha vida real. Eu estava me tornando mais assustada, mas também estava mais fria com tudo e todos. Aquela garota dócil estava se escondendo, e ocupando cada vez menos espaço dentro de mim.
As aulas passaram mais rápidas que o comum. Justo hoje que eu preferia passar o dia inteiro na escola, do que ir naquela maldita psicóloga.
– Porcaria! Porcaria! Porcaria! – murmurei.
– Jackie? Tudo bem?! – perguntou Lysandre. – Mais um daqueles sonhos? – continuou.
– O que? Não, faz um tempo que não tenho sonhado com aquele... Mundo.
– Ei, você sabe que pode confiar em mim, não sabe? Quando quiser contar o que está acontecendo, estarei aqui.
– E-Eu sei.
– Vai ficar para ajudar no seu clube hoje?
– Na verdade... Eu queria saber se...Você não pode ir a um lugar comigo, hoje depois da aula. Eu acho que não vou conseguir entrar lá sozinha.
– Finalmente decidiu me chamar para sair? – disse Lysandre, brincando.
– Na verdade, minha mãe marcou uma consulta em uma psicóloga, e meio que estou sendo obrigada a ir naquela droga.
– Eu vou contigo.
Lysandre, e eu, caminhamos até o tal consultório em silencio. Acho que ele estava tão animado quanto eu.
Quando finalmente adentramos o lugar, eu vi os vultos estampados em quadros moldurados, como se fossem enfeites.
– Lysandre, eu quero sair daqui...Por favor. – disse, abraçando Lysandre, com força.
– O que foi Jackie?
– Os quadros, eles são como os vultos dos meus sonhos! Por favor Lysandre, me tire daqui! – implorei.
– Jackie, são apenas pinturas de paisagens, não existe vulto algum aqui.
Eu tinha certeza. Certeza, que eram os vultos dos meus supostos sonhos. Como eles podiam ser tão cruéis a ponto de colocar sombras estampadas em quadros?
– Por favor...
Lysandre me abraçou forte como se quisesse passar todas as suas forças para mim, e nós saímos de lá caminhando ainda abraçados.
Pouco a pouco, nós nos afastamos. Passamos a caminhar sem direção alguma. Era como se eu estivesse sonhado novamente, as mesmas sensações.
– Ei, fala comigo. – disse Lysandre, sereno.
– É complicado.
– “Temos todo o tempo do mundo”. – cantarolou.
Contei tudo o que estava acontecendo. Desde os meus sonhos, até o modo em que eu estava me sentindo. Como todas aquelas sensações pareciam reais e que pareciam ter voltado quando entrei no consultório. E também sobre os malditos vultos.
E sinceramente, eu estava com muito medo de que como todos, Lysandre me achasse uma maluca. Mas...
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