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História Landscapes Painted - Capítulo 17


Escrita por: Claustrophobic

Notas do Autor


Olá. Olha, fui editar alguma coisas nesses capítulo e me deparei com uma dúvida: quando um corte é feito na vertical, o sangue coagula mais rápido ou mais devagar? Quem tiver certeza, por favor me ajude. Obrigado. 😊

Capítulo 17 - Capítulo 17


The Only Hope For Me Is You

Eram as mesmas poltronas de veludo marfim desbotado, o mesmo abajur capenga sem lâmpada, os mesmos livros e mais livros nas diversas estantes do mesmo armário de madeira gasta, os mesmos segundos tiquetaqueando cansativamente no mesmo relógio de pulso, os mesmos estalos de juntas de dedos entrelaçados, o mesmo óculos escorregando pela ponta do mesmo nariz. E era nessa mesmice que encontrava-se Sr. Morrison.

Ele lia suas revistas, concentrado, sem levantar seus olhos das páginas por um segundo sequer, apenas movendo-os para acompanhar as palavras em linhas. Até que um ruído de uma maçaneta sendo movida ecoou pelo cômodo, assustando-o, fazendo-o desviar seu olhar imediatamente, dando de cara com Gerard aos prantos.

Ele estava tão pálido, tremendo de forma tão absurda, com tantas lágrimas pelo rosto... Aquilo assustava e impressionava Morrison. Ele nunca imaginou que veria-o tão abatido e frágil, logo ele que se esforçava para manter a fachada de invencível a qualquer custo. Algo muitíssimo ruim havia acontecido, isso era certo.

_Oh, Deus! _exclamou, levantando-se e seguindo na direção de Gerard, segurando a parte superior de seus braços _O que houve, Gerard? _perguntou, verdadeiramente preocupado.

_Me desculpe, mas eu não sabia onde mais ir _alegou.

Ao escutar isso, o velho sentiu uma onda fria atingi-lo e partir seu coração em pedaços minúsculos, como se este fosse feito de vidro, e seu estômago pareceu afundar. Abraçou, então, o garoto, permitindo que ele abafasse o choro em sua camisa, que, em poucos instantes, ficou encharcada.

_Calma, calma. Vai ficar tudo bem _ confortou, depositando pequenos tapinhas em suas costas.

Até mesmo Morrison estranhou a aparente -- ou não tão aparente -- intimidade que havia estabelecido com Gerard naqueles meses. Quer dizer, é preciso conhecer muito bem um paciente para abraça-lo de tal forma. Mas com Gerard era diferente. O sentimento que ele tinha pelo garoto não era apenas superficial, e sim algo quase paterno. Recomponha-se, este é um ambiente de trabalho. No entanto, o choro de Gerard era tão comovente, os ruídos abafados e baixos de seus soluços tão poderosos. Não haveria uma pessoa no mundo que não se sentiria abalado com tal situação.

Após algum tempo, quando Gerard já se encontrava mais calmo, os dois sentaram-se nas poltronas. Morrison ofereceu-lhe uma xícara de café, mas ele recusou, alegando não possuir fome. Assim, o velho serviu-se e acomodou-se num dos bancos, cruzando as pernas e sustentando seus braços nas cochas. Gerard, entendendo essa ação como uma concordância, começou:

_Eu fiz um amigo.

_Isso é ótimo! _declarou, sorrindo sem ser correspondido _ Como ele é?

_Ele é... _soltou um longo suspiro, como se precisasse recuperar fôlego para pronunciar a próxima palavra _Lindo. Ele sempre me ajuda quando eu preciso, me defende, me faz sorrir.

_Então, qual é o problema? _perguntou, confuso, pousando a xícara já incompleta no colo.

_Ele me deixou _contou, abaixando o rosto enquanto brincava com as mangas extremamente grandes de sua blusa.

_Mas por que ele fez isso? _questionou, incrédulo, curvando-se para poder se aproximar do outro, apoiando os cotovelos nos joelhos.

_E-Eu... Eu não sei _ após um tempo, prosseguiu com voz abatida e rouca _ Eu sou um erro.

_Você não é um erro! _afirmou, franzindo o cenho.

_Você não entende, não aja como se entendesse! _retrucou _Eu só estou cansado. Cansado de ser usado, de ser motivo de risada, de ser esquecido, de não ser o bastante. Eu não quero mais.

_Você não pode desistir agora.

_Desistir agora? _ repetiu, indignado _ Você vê isso? Você consegue ver? _ gritou, expondo propositadamente as marcas em seus braços.

Haviam incontáveis cortes; alguns já em forma de cicatrizes, marmorizados e brilhantes; outros eram mais recentes. No entanto, em meio a tantas, duas se destacavam. Eram mais profundas e visíveis, situadas em seus dois pulsos, e estavam na vertical.

Na vertical, o sangue coagula mais rápido. É, parece que o garoto não estava brincando quando fez aquilo. Ele sabia exatamente como fazer, como se houvesse planejado. E era tão triste pensar que um garoto tão jovem se sentisse tão perdido ao ponto de não ver mais saída, ao ponto de optar pela morte.

E aquela cena começou a passar na cabeça de Morrison, como se ele realmente houvesse presenciado. O sangue inundando o banheiro e tingindo de rubro os ladrilhos brancos; Gerard deitado no chão; as roupas e toalhas manchadas; os gritos da mãe dele; o olhar aterrorizado do pai; o cochicho do liquido que escorria pelo ralo, como se narrasse ou zombasse da pequena, frágil e pálida criança que aguardava a tão ansiada e temida chegada da Morte... Aquela visão provocou uma seção de arrepios no homem e ele teve a nítida impressão de sentir seu almoço tentar escapar por sua boca.

_Eu já desisti faz muito tempo, Morrison! Eu estou morto, mas ninguém pareceu perceber. Entenda, eu não tenho solução! _ Gritou, com voz estridente e desesperada.

_Você não precisa fazer isso, Gerard!_contrariou, elevando a voz ao mesmo tom da de Gerard _Você ainda pode ser feliz!

_Para, para, para! _ordenou, pressionando as palmas contra os ouvidos e fechando os olhos, balançando a cabeça de um lado para o outro _Eu não quero mais ter que ouvir isso de ninguém. Eu não estou bem, parem de fingir que não percebem! Parem de dizer que tudo vai melhorar, porque não vai! Nada vai mudar enquanto o mundo continuar me machucando tanto! Nada!

_Você pode enfrenta-lo sozinho! _afirmou, levantando-se da poltrona abruptamente.

_Eu não consigo... _sua voz estava baixa novamente, na tentativa de segurar o choro e, sentado, ele agarrava fortemente o assento, quase perfurando o tecido. Controle, Gerard. Controle.

_Sim, você consegue! _contradisse _Você só precisa querer, Gerard. Ninguém nunca te fará mal enquanto você confiar em si próprio.

_Você não sabe. _alegou. Todo seu corpo tremia e sua cabeça pendia.

_Eu tenho certeza _disse, procurando transmitir confiança a Gerard.

_É mentira, eu sei _contou, subindo as pernas e abraçando-as, apoiando o rosto nos braços cruzados acima dos joelhos, direcionando seus olhos, agora acinzentados, para o chão, vetando qualquer contato visual com o velho.

_Eu não estou mentindo _ jurou, diminuindo a altura da voz, transformando as palavras quase num sussurro.

Ficou observando Gerard, que pronunciava seguidos e quase inaudíveis 'nãos', como se estivesse numa espécie de transe. Ele não respondia os chamados de Morrison, como se nem mesmo os escutasse. Parecia isolado em um mundo próprio, um mundo louco, onde seus problemas fugiam para longe, assim como as pessoas e objetos, deixando apenas ele, só.

Aquilo já estava começando a assustar o homem, que não decidia se aproximava-se ou mantinha distância daquele garoto. E ele já estava mesmo se amaldiçoando por ousar demonstrar sentimentos quando ser psicólogo se tratava exatamente de esquecer os ideias para resolver problemas alheios.

Por fim, optou por chegar mais perto a passos lentos, agachando-se para poder encara-lo diretamente.

_Hey... _chamou, fazendo com que o menor o fitasse.

Gerard parecia terrivelmente melancólico e exausto. Talvez fosse patético, mas, por um momento, Morrison desejou que o menino resmungão e irônico das primeiras seções voltasse e levasse embora aquele reflexo ruim.

_Alguém te machucou? _perguntou, recebendo um aceno positivo como resposta _Quem?

­

_ Ele _revelou, atiçando ainda mais a curiosidade de Morrison.

'Ele'? O homem achou melhor não tocar mais nesse assunto por hora, julgando que Gerard não tinha a menor condição de prosseguir a conversa. Além do mais, ele sabia que, se forçasse algo, o garoto inventaria respostas ou mesmo diria coisas sem sentido para confundi-lo e se livrar da situação.

Gerard sentia uma dor imensa corroer seu coração e ele sangrava continuamente. Aquela ferida era pior do que qualquer corte. Ela não cicatrizaria, secaria e curaria jamais. Permaneceria ali, ardendo.

A dor é absurda porque existe.



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