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História Lifeline - Before the End - Carma


Escrita por: DixBarchester

Notas do Autor


Eita que esses 15 dias pareceram um mês!!

Quem estava com sdds? Eu estava, acreditem, sofri de abstinência, DixChechas é minha droga aushaushuhs

Mas finalmente estou de volta e vocês não tem nem ideia da minha felicidade quando abri o Nyah e vi que Lifeline ganhou outra recomendação!!!! Eu tive um treco de felicidade e dei vários pulinhos de alegria OBRIGADA MESMO CakePops POR ESSE PRESENTE LINDOOOOO
Ela toda linda e perfeitinha, foi aqui do Spirit até lá só pra fazer esse mimo, tem como não amar, gente?

Obrigada tbm as lindas e maravilhosas que comentaram no cap passado.
O que seria de mim sem vocês??? ❤❤❤❤❤

Esse cap fecha o ciclo de erros da Natalie e da uma conscientizada sobre o assunto, além de ser bastante focado em desenvolvimento de personagem, ele é mais de dialogo, mas eu amei escrever e focar um pouco em outros personagens, espero que gostem tbm.

Boa leitura.

Capítulo 17 - Carma


Fanfic / Fanfiction Lifeline - Before the End - Carma

 

• NATALIE COOPER •

Sabe o que é carma? Carma é uma definição mística para causa e efeito, algo como "toma lá, dá cá". Um jeito irônico da vida esfregar na nossa cara que não podemos sair por aí fazendo o que queremos.

Se eu acredito em carma? Bom, me embebedei pra caramba, enchi a cara de heroína e em consequência passei mal uma noite inteirinha, coloquei, literalmente, tudo que tinha no meu estômago pra fora. Se isso não é carma, não faço ideia do que seja.

Minha cabeça latejava, meus olhos doíam e eu não fazia ideia de que horas eram. Coloquei o braço sobre o rosto tentando ajeitar os pensamentos no lugar.

Eu tinha vomitado tanto na noite passada que mal me lembrava de ter ido pra cama, acho que teria que agradecer ao meu pai por isso.

Tentei levantar, mas meu corpo não obedeceu essa vontade, então eu apenas me virei e me enrolei na coberta. Meu estômago ainda estava revirado e eu gemi de pura frustração.

Cenas da noite anterior dançaram por meus pensamentos. Será que o Daryl ainda está bravo comigo? Provavelmente...

Dava pra anotar minhas cagadas no Guinness Book das cagadas, mas pelo menos eu, finalmente, tinha colocado pra fora tudo que eu sentia. Esconder estar apaixonada por Daryl Dixon tinha sido a coisa mais difícil da minha vida.

Não era só o fato de ser um clichê ambulante "apaixonada em segredo pelo melhor amigo", era também por estar sempre tensa, como se eu tivesse dor de barriga constante, era horrível e pelo menos isso eu tinha tirado das sombras.

Contudo, eu sabia que provavelmente Daryl não lidaria bem com aquela revelação, mas eu podia lidar com Daryl, ou, pelo menos, esperava poder.

Vai que ele se descobre apaixonado por mim também... Ri da minha ressaca de otimismo e me enrolei ainda mais nas cobertas dormindo novamente e tendo um sonho bastante agradável com Daryl.

Acordei um tempo depois, como se eu tivesse acabado de percorrer o Saara ou como se estivesse passando sede por dias. Mesmo sem querer, levantei da cama e me arrastei até a cozinha, prometendo pra mim mesma que voltaria a dormir, quem sabe o domingo todo. Ótima ideia.

Desci as escadas meio dormindo, eu podia sentir meu cabelo todo embolado e a minha cara totalmente amassada.

Meu pai estava sentando na cozinha, as mãos apoiadas na mesa, como se estivesse esperando por alguma coisa.

— Oi. — Murmurei, ainda cambaleando.

— Boa tarde. — Respondeu, em um tom bastante sério.

Franzi um pouco as sobrancelhas sem entender, enquanto bebia praticamente um litro de água. Ele se levantou e veio até mim, encheu uma xícara de café e empurrou pela bancada, junto com um comprimido de advil.

— É pra sua ressaca, saímos em cinco minutos. — Declarou, e eu estranhei ainda mais.

— Não sei se estou muito afim de sair não... — Resmunguei, encarando a xícara de café.

Olhei para meu pai por um segundo e ele era um misto de decepção, tristeza e raiva, tremi involuntariamente. Minhas ações um tanto rebeldes passaram pela minha cabeça.

Se quando estava com a minha mãe, eu adorava ver que minhas ações a afetavam, com meu pai o sentimento foi o total oposto. Bebi o café e o segui até o carro.

Nenhuma palavra. Nada. Peter Cooper permaneceu em silêncio e eu fui ficando cada vez mais tensa sobre o destino daquela viagem. Talvez Daryl tivesse contado tudo pra ele, talvez meu pai estivesse, naquele instante, me levando de volta para minha mãe por causa do meu comportamento deplorável. Quem podia culpá-lo? Claro que eu podia ficar furiosa e acusá-lo de hipocrisia, afinal Peter Cooper tinha sido traficante a vida toda e eu usara heroína uma única vez, ainda assim....

Não. Chega. Não vou surtar por isso. Daryl não contou nada, ele não é assim. Meu pai não sabe de nada. Obriguei a mim mesma a voltar para a realidade, dar uma de Rainha do Drama não combinava comigo.

— Então, onde vamos nessa madrugada ensolarada? — Perguntei, tentando quebrar o clima.

— São três da tarde, não tem nada de madrugada. — Respondeu ainda seco. — Você já vai ver onde vamos.

Assenti um tanto assustada e tentei me concentrar em não criar paranoias desnecessárias na minha cabeça.

Meu pai continuou dirigindo por longos e angustiantes minutos, até que enfim chegamos ao que me pareceu ser a parte mais pobre da cidade.

Se eu já achava Dawsonville meio ordinária, aquela ruazinha sem saída era até triste de ver.

A única casa ali era de madeira, mas não do tipo cabana, do tipo barraco mesmo, as janelas caindo, o mato alto e lixo por todo o canto. Quatro crianças sujas, seminuas, com carinhas tristes e narizinhos remelentos perambulavam por ali. Pareciam ter idades diferentes, mesmo que próximas umas das outras, talvez um ou dois anos de diferença apenas.

A primeira impressão foi a pior possível, era triste e deprimente, fora o enjoo que eu senti porque todo o lugar fedia.

— O que estamos fazendo aqui? — Perguntei confusa.

— Eu quero que veja uma coisa.

— O que diabos teria pra eu ver aqui?

Peter ergueu a mão no ar e ficamos esperando, eu comecei a ficar um tanto impaciente, até que uma moça saiu de dentro da casa, devia ter uns quarenta anos, ela estava um tanto suja assim como as crianças, era muito magra, exceto pela grande barriga evidenciando sua gravidez avançada. Percebi que ela tremia levemente enquanto andava, falando algo com os pequenos e parando como se estivesse sem forças.

— Aquela é Diane, eu a conheci quando ela tinha uns dezessete anos. Quantos anos acha que ela tem agora? — Meu pai falou finalmente e eu quase não acreditei que estávamos ali stalkeando a mulher.

Aquilo não seria uma segunda família, seria? Eu esperava que não.

— Uns quarenta e poucos? — Respondi incerta, vendo novamente a aparência da moça.

— Ela tem vinte e sete.

Olhei pra ele totalmente assustada, não era possível que aquela mulher tivesse apenas vinte e sete anos, não com aquela aparência.

— O que estamos fazendo aqui? — Perguntei, totalmente tensa.

— A primeira vez que ela usou drogas, foi de mim que ela comprou. Ela estava triste e queria algo pra alegrar, só aquele dia, só daquela vez. A maior parte dos jovens se engana pensando que é só uma vez. — Ele riu sem humor, segurando o volante com força e eu entendi do que se tratava no mesmo instante.

Não podia ser apenas coincidência aquele assunto. Gelei dos pés à cabeça e fui incapaz de dizer qualquer coisa.

— Menos de um ano depois, quando eu a vi novamente, ela já estava viciada, vendia as coisas dos pais pra comprar drogas, roubava deles. Tornou a vida da família um inferno. Um ano depois disso o pai dela morreu de infarto. Diane ficou gravida do primeiro filho, não sabia quem era o pai. A mãe a internou em uma clínica, pensou que ela ficaria bem. Não ficou... — Meu pai continuou, encarando fixamente a figura da mulher que fumava em frente a casa, mesmo com aquele barrigão. — A próxima vez que eu vi Diane ela tentou trocar serviços sexuais por drogas, eu não aceitei, mas sei bem que outros tantos traficantes não se importavam com isso. Ela era uma garota muito bonita. Não é muito difícil de imaginar de onde vieram as outras crianças, não é? Depois disso fiquei sabendo que a mãe dela morreu. Diane continuou nessa vida, muita gente já tentou ajudar, mas não adianta. Uma vez que você as drogas te pegam, você não consegue mais escapar.

Comecei a ficar um tanto horrorizada pelo relato, senti que tinha um nó na minha garganta.

— Uma vez, Natalie. Ela disse que seria só uma vez. Ela era jovem, bonita, inteligente e com um futuro inteiro pela frente, agora ali está ela com quatro filhos, uma nova gestação de risco e sozinha. Mesmo agora ela faria qualquer coisa por um pouco de heroína. Ela não tem mais controle. Eu posso provar, se você dúvida...

Ele se ajeitou no banco e abriu o porta luva, tirando de lá um saco com algo que eu reconheci imediatamente: Heroína.

Não demorei dez segundos pra entender o que ele pretendia e fiquei um tanto chocada com isso. Eu realmente não queria ver aquilo.

— Não, pai. — Segurei o braço dele antes que pudesse sair do carro. — Por favor, eu já entendi, 'tá bom? Sério, entendi mesmo, eu cometi um erro, ferrei tudo, mas não precisa disso. Vamos embora por favor.

Ele assentiu vagamente e colocou a droga de volta no lugar, fechando a porta do carro e dando a partida. As crianças ficaram observando o veículo se afastar com seus olhinhos tristes e eu fiquei mais triste ainda de saber que não podia fazer nada pra ajudar.

Sempre ouvimos sobre pessoas viciadas em drogas, sobre como a vida delas acaba, sobre o fundo do poço e tudo mais. Mas era diferente ver ao vivo, era diferente estar tão perto de algo daquele tipo e saber exatamente qual era o fator chave na desgraça.

De repente aquela coisa de drogas não era mais tão divertida igual a galera sempre pintava. Era triste e desolador. Era vida ou morte.

Meu pai parou o carro perto de um riacho que corria próximo a estrada, pegou o saquinho com drogas no porta luva e desceu, observei-o jogar tudo na água e então retornar, tudo isso sem realmente olhar pra mim.

— Como você soube? — Perguntei, encarando meu próprios dedos que se contorciam em minhas mãos.

— Quantos anos você tem, Natalie? — Devolveu, ainda sem me encarar

— Vou fazer dezoito daqui alguns meses... — Respondi, sem entender a pergunta.

— Eu lido com drogas há mais tempo do que você é nascida, achou mesmo que eu olharia nos seus olhos ontem e não saberia?

Ele me encarou finalmente e eu me senti pequena, frágil e muito envergonhada, não era como eu me sentia quando a minha mãe apontava meus erros e gritava.

— Desculpe. — Foi só o que eu consegui dizer.

— Não é culpa sua. É minha. Você tem dezoito anos e eu nunca fui seu pai. Eu devia estar lá pra te explicar que não é como as pessoas pintam. Eu queria poder brigar com você e te colocar de castigo. Mas não posso fazer isso, não tenho moral, não te ensinei pra poder cobrar. — A decepção dele me fazia sentir ainda pior.

— Você é sim meu pai. Você pode brigar comigo se quiser e pode...

— Não sou. — Ele me interrompeu antes que eu terminasse. — Nós mal nos conhecemos, não dá pra recuperar dezoito anos perdidos ou agir como se eu estivesse lá o tempo todo. Eu não sei ser pai, eu nunca tive tempo de aprender, e isso é minha culpa também. Então de repente você está na minha porta e é ótimo, mas ao mesmo tempo é assustador, porque eu não faço ideia do que fazer, ou de como te mostrar o caminho certo.

Peter passou a mão pelo rosto e era como se eu pudesse tocar seu desespero. Senti meus olhos encherem de lágrimas.

— Eu já vi muita coisa feia nessa vida, e eu devia estar lá do seu lado pra te ensinar aos poucos, mas eu não estava, então de uma hora pra outra você toma o caminho errado e eu não consigo pensar em uma forma de te fazer ver o quão ruim ele é, a não ser mostrando pra você. A realidade é forte e feia, é chocante e traumatizante, mas foi o único jeito que eu encontrei de ter certeza que você não vai continuar nesse caminho. Eu não quero que você acabe como a Diane... E honestamente eu nem sei se esse é o jeito certo de te ensinar isso.

— Eu não quero acabar como a Diane. — Consegui dizer, sentindo minha garganta engasgar. — Eu não quero seguir esse caminho, eu só cometi um erro.

— Certos erros não vem com segundas chances...

Ficamos em silêncio, eu tentava absorver tudo aquilo. A preocupação do meu pai, a realidade dura de Diane, meu recentes erros e todos os outros depois deles.

"Certos erros não vem com segundas chances" Peter Cooper estava certo, você faz, você paga, mas as vezes a dívida é muito alta e isso acaba com você. Carma.

Continuamos parados ali, eu tentava encontrar algo pra dizer que acertasse as coisas, mas honestamente não conseguia pensar em nada.

— Por que você nunca perguntou? — Meu pai indagou, quebrando o silêncio.

— Perguntei o que? — Franzi as sobrancelhas sem entender.

— O motivo de eu nunca ter te procurado, o motivo de eu não ter sido seu pai por todos esses anos. — Se virou para me encarar.

— Eu sei porque. É culpa da minha mãe. — Respondi sem pensar muito, afinal era isso que eu achava realmente.

— Não é... — Ele negou um tanto triste. — Debby não pode ser culpada pelas minhas atitudes, ou melhor, pela falta delas. É triste que você pinte sua mãe como um demônio e eu como um santo, talvez você não seja tão boa em ler as pessoas, principalmente quando se trata de mim e dela.

Controlei minha vontade de revirar os olhos, pensar em Deborah Spelman como uma santa era como aceitar que dois mais dois são três.

— Você não conhece minha mãe, ela é impassível, controladora... — Retruquei, meio contrariada.

— Conheço sua mãe melhor que você, eu conheço cada defeito dela e conheço os motivos pelos quais ela os tem. Eu sei que ela só estava fazendo o melhor por você, talvez os métodos dela não sejam os melhores, mas ela estava fazendo o melhor que podia, nunca duvide disso. — Era sempre irônico ver meu pai defender minha mãe daquele modo, enquanto eu sabia bem que ela não media esforços para criticá-lo. — Você tem que ver que ela fez a parte dela na sua criação, fui eu quem não fiz a minha, estamos aqui sentados agora, porque eu foi um pai ausente que não deu um bom exemplo e que não fez o papel que lhe era devido.

Sim, eu tinha que ver que meu pai foi mesmo ausente, devia até condená-lo por isso, mas eu simplesmente não conseguia, afinal das contas eu não podia culpá-lo por não querer mais contato com a minha mãe, eu própria não queria.

Além do que, mesmo a minha mãe, não tinha nada a ver com minhas decisões da noite anterior, ninguém tinha culpa das minhas cagadas, apenas eu mesma.

Infelizmente não dava pra explicar para o meu pai que eu tinha cheirado um monte de heroína apenas por que as coisas com Daryl Dixon não iam bem.

E pensando melhor, tinha sido mesmo uma coisa bem tosca pra se fazer.

— Você não pode assumir toda a culpa, foi um erro meu, não tem a ver com ninguém. Eu aprendi a lição, não vou fazer de novo. Eu não te culpo por nada. — Declarei o mais sincera que eu pude.

— Mas você devia me culpar ás vezes. Sua mãe não é uma vilã, toda história tem mais de um lado, talvez se soubesse o lado dela, você entendesse as coisas. — Meu pai tentou mais uma vez, como se minha relação saudável com a minha mãe fosse uma coisa realmente importante pra ele

— Cada vilão é um herói na sua própria mente? — Citei a frase de um filme e ele concordou. — Eu entendo isso, mas não espere que eu apague uma vida de problemas com ela da noite para o dia.

Peter ponderou o que eu disse por um momento, assentindo e respirando fundo.

— Um dia você vai ter que lidar com isso. — Advertiu.

— Um dia... Mas não hoje. A única coisa que eu posso fazer hoje é construir minha história com você e prometer que não vou cometer o mesmo erro outra vez. Nada mais de drogas na minha vida. — Levantei a mão direita pra ilustrar, não que eu precisasse realmente, afinal eu levava minhas promessas muito a sério.

— Isso é o bastante por enquanto. Eu confio que você vai cumprir sua palavra. Agora vamos, você deve estar faminta, deixei panquecas prontas. — Sorriu em resposta e foi como se um peso de uma tonelada saísse das minhas costas.

➷•➷•➷•➷•➷

Felizmente, minha manhã/tarde com meu pai botou um ponto final nos meus erros de uma noite e tudo voltou ao normal, fiquei aliviada que não ficou um clima chato. Eu entendia o meu erro, foi mesmo burrice encher a cara de heroína, mas se eu estivesse com a minha mãe ela faria questão de deixar o clima insuportável pra eu lembrar do meu deslize a cada minuto.

Eu entendi que meu pai não queria que eu visse minha mãe como a vilã, mas era meio difícil quando eu fazia comparações entre os dois.

Segurei meu diário no colo e senti que não escrevia nele há séculos.

"Nem tudo é preto no branco.
Nem tudo é preto no branco, repito.
Mas o que exatamente isso quer dizer?
Será mesmo que as nuances de cinza
vão fazer toda a diferença?
Suponho que essa seja mais uma
daquelas coisa que ninguém explica...
Nem tudo é preto no branco, que saco.
Eu não gosto de cinza."

Uau, um texto que não é sobre Daryl Dixon, que progresso. Ri comigo mesma. Aquilo era uma coisa atípica nas últimas semanas, afinal eu só escrevia sobre ele. E mesmo sem querer acabei vagando no pensamento de volta aqueles olhos azuis. Daryl me deixava confusa e isso era uma grande merda.

Larguei o diário por ali mesmo e desci as escadas, meu pai estava parado, encostado no batente da porta olhando a oficina, ele estava tão inerte nos próprios pensamentos que mal me notou chegar.

— Eu acho que a gente precisa mudar a decoração. — Comentei, parando ao lado dele. — Queria a minha mesa mais pra frente, gosto de ver a rua enquanto trabalho, o que acha de mudarmos quando o Daryl chegar amanhã?

Meu pai me encarou por um longo momento, exatamente como alguém que sabe de algo muito ruim que você desconhece.

— Você não sabe, não é? — Abaixou a cabeça e assentiu como se tivesse entendido a situação.

— Não sei o que exatamente? — Perguntei desconfiada.

— Daryl telefonou essa manhã, antes de você acordar... Ele está fora. Não vai vir mais pra oficina. — Revelou devagar.

Doeu? Claro, foi um belo golpe, mas era só um trabalho, desde o começo Daryl sempre disse que não ficaria muito tempo, não significava que a decisão dele tinha algo a ver com a minha confissão de noite passada.

— Merle está na cidade, vai arrastar o Daryl por aí, a gente dá conta até ele cansar de caçar e voltar. — Ri um tanto nervosa, tentando amenizar os efeitos daquilo em mim.

Peter me olhou como se eu fosse uma criança de cinco anos que acaba de ver um familiar vestido de Papai Noel e tenta a todo custo achar uma desculpa, porque não pode aceitar que Papai Noel seja uma mentira.

— Ele não está na cidade, Natalie...

— Merle deu o fora de novo? Típico. — Dei de ombros. — Daryl vai estar de volta ainda essa semana.

— Natalie, Daryl não está na cidade, ele se foi com Merle ontem à noite, eu não sei pra onde ou por que, eu não sei quando ou se ele volta.

Senti cada palavra me furar como uma faca afiada, não soube o que responder, apenas deixei meu corpo cair sentado no sofá, enquanto eu olhava para o nada, revendo tudo que eu tinha dito e feito e sabendo que era minha culpa. Daryl tinha deixado Dawsonville por minha causa. Carma era uma merda.

— Ele parecia... diferente. E agora você parece chocada, tem algo que eu devia saber? — Meu pai perguntou, dando um passo na minha direção.

— Isso é carma. — Respondi, depois de um tempo, erguendo a cabeça para encará-lo e ele franziu as sobrancelhas sem entender. — Fazemos uma coisa e então algo equivalente acontece, dois pesos, duas medidas. Pelo visto nada nesse mundo fica sem retribuição.

Me levantei, ainda meio atordoada e rumei para a porta.

— Onde você vai? — Ouvi meu pai perguntar e me virei para fitá-lo.

— Eu só preciso de um pouco de ar puro, só... caminhar um pouco. — Respondi, ainda apática.

— Natalie...

— Eu estou bem, pai. Aprendi minha lição, só preciso de um tempo, 'tá legal?

Ele assentiu e eu deixei a casa, sem saber muito bem pra onde ir, andando apressadamente, a respiração irregular e os olhos ardendo. Merda, o que eu tinha feito?! Não devia ter contado nada para o Daryl, eu devia ter previsto que ele reagiria daquela forma.

Continuei andando no mesmo passo, como se fugisse de mim mesma. Eu era muito estúpida, tinha conseguido ferrar com semanas de progresso em uma única noite, era como se o chão estivesse sumindo bem debaixo dos meus pés e eu sabia perfeitamente que a culpa era minha.

Quando vi estava na frente da casa dos Dixon, a entrada totalmente vazia, o buraco que a caminhonete azul desbotada tinha deixado ali era bem semelhante ao buraco que eu existia no meu peito. Okay, isso foi exagero, você vai ficar bem Natalie, é só um cara.

Tentei dar ouvidos a minha consciência e voltei alguns metros, mesmo assim me sentei na calçada, próximo da esquina, em um lugar estratégico onde eu ainda podia ver a casa.

O que exatamente eu estava fazendo ali? Sei lá. Talvez uma parte minha ainda achasse que o Daryl sairia da casa dele e caminharia até mim, talvez uma parte de mim ainda não acreditasse que ele tivesse feito aquilo. Mas ele tinha e isso era um saco.

— Natalie? O que está fazendo aqui? — Ouvi uma voz conhecida perguntar alguns metros atrás de mim.

Me virei a tempo de ver Shannon caminhar na minha direção, ela parecia estar vindo do trabalho.

— Oi, Shannon, eu só... estou sentada aqui. — Dei de ombros como se não fosse nada.

— Na frente da minha casa? — Ela apontou e eu reparei que estava sentada na calçada de amplo terreno, com algumas árvores e um trailer estacionado no fundo. — Não é bem uma "casa" mas, você entendeu.

— Desculpa. — Levantei totalmente sem jeito, batendo a calça pra limpar o pó. — Eu só... — Apontei na direção da casa dos Dixons, mas não terminei, na verdade, não soube como terminar.

— Oh, deixe-me adivinhar, você estar sentada na minha calçada com essa cara de enterro tem a ver com um certo caipira de olhos claros e sobrenome Dixon? — Perguntou rindo.

— Está tão na cara assim?

Shannon deu de ombros e fez uma careta.

— Digamos que tenho experiência com esse tipo especifico de problemas. Só que no meu caso o Dixon em questão é mais velho e muito mais desbocado e espalhafatoso. Vem, acho que você precisa de uma bebida. — Me convidou pra entrar, andando um pouco na frente.

— Ah não precisa, não quero incomodar.

— Pelo amor de Deus! Você estava jogada na sarjeta da minha casa, menina, para de fingir que ainda te sobrou alguma dignidade e vamos logo. — Apontou rindo e eu a segui.

O trailer era um lugar apertado, mas muito organizado, me sentei no que devia ser a cozinha e Shannon me serviu um copo de alguma coisa alcoólica, que eu fiquei balançando nos dedos.

— Obrigada.

— Por nada. — Shannon se sentou na minha frente e me encarou por um momento. — Então? Vocês brigaram?

Pensei se devia mesmo compartilhar aquela história com ela, afinal Shannon não era exatamente a pessoa mais discreta de Dawsonville, mas ela era o mais próximo de uma amiga que eu tinha ali, e me julgue, mas eu ia mesmo com a cara dela.

— Na verdade não... Eu disse o que eu sentia e ele deu no pé, sem despedidas, sem brigas, nada, só o vácuo. — Ri da idiotice daquilo e provei da minha bebida, percebendo ser um Whisky bem vagabundo.

— Uau. Eu podia esperar isso do Merle, mas não imaginei que o Daryl fosse assim também. Meus pêsames, sei como é... — Ela encheu o próprio copo pela segunda vez.

— Sabe, é?

— Acha mesmo que é a primeira garota a se envolver mais do que devia com um Dixon e acabar com um buraco no peito?

Encarei Shannon por um momento e ela deu de ombros um tanto chateada. Eu sempre tinha pensado que o lance dela com o Merle fosse só diversão, mas pelo visto ela tinha se envolvido mais do que devia.

— Sinto muito. — comentei, sem saber bem o que dizer.

— Não sinta, eu caí fora, cortei o ciclo, estou com o Jason agora, ele é educado, tem grana, bem sucedido. Foi uma troca vantajosa. — Ela se apressou em responder, mas era como se a própria Shannon não acreditasse muito naquilo. — Eu não vou ser outra garota destruída por um Dixon.

A fitei assustada e um tanto ofendida. Okay, eu estava mal, mas daí a dizer que eu estava destruída era um pouquinho de exagero.

— Ah, não! Eu não estou falando de você — Riu, abanando a mão direita como se não fosse nada, provavelmente tinha percebido minha interpretação equivocada. — Estou falando da Liliane Mazon.

— Quem?

— A mãe do Daryl e do Merle, eles nunca falaram dela? — Shannon perguntou surpresa.

— Eu sei que ela morreu e isso é tudo, Daryl não fala dela.

— Ele era muito novo, mal deve se lembrar. Quer dizer, eu era também, mas Joe a conhecia bem e pelas histórias que ele conta... Eu tenho muita dó dessa mulher... — Fez uma careta e se encostou na cadeira, negando algumas vezes.

— Está me assustando, Shannon, o que exatamente aconteceu com a mãe do Daryl? — Perguntei, sentindo um aperto repentino no coração.

— Okay, se você insiste eu conto. — Ela se endireitou na cadeira, bastante empolgada.

Claro que estava, aquela era a Shannon, falar da vida alheia era o passatempo preferido dela. Muita gente podia considerar um defeito, mas eu tinha aprendido a reconhecer aquilo como uma característica da personalidade dela.

— Joe diz que Liliane e Will se conheciam desde sempre, estudavam juntos, viviam de vai e volta, aquele tipo de relacionamento conturbado e sem nenhuma estabilidade, sabe? Até que eles ficaram grávidos do Merle e se casaram, ou melhor foram viver juntos. Liliane recebia ajuda da mãe, que tinha uma pensão gorda, por causa do marido falecido que era do exército ou algo assim. Quem visse os dois de fora achava uma maravilha de casal, mas Joe conta que o Will vivia no bar, se queixando da vida de casado, traindo a esposa, reclamando do filho. Eu acho até que ele batia neles. Vai saber... — Parou por um tempo analisando a minha reação. Eu tentava imaginar se teria mesmo como eu desgostar ainda mais de Will Dixon. — Mas as coisas pioraram mesmo foi quando a mãe da Liliane morreu, eles ficaram grávidos do Daryl logo depois, Will percebeu que teria que trabalhar, isso o deixou ainda mais violento, sabe-se lá o que acontecia dento daquela casa. Liliane foi definhando depois disso, perder a mãe e ter outro filho de um marido escroto não devia ser fácil. Ela foi se entregando a tristeza um dia após o outro. Bebia e fumava, até que um dia a casa dela pegou fogo, dizem que ela dormiu com um cigarro aceso enquanto os filhos brincavam na rua e o marido "trabalhava". — Shannon fez questão de ilustrar a palavra com aspas e eu me sentia vendo um filme de terror. — Cá entre nós, depois de tudo que eu ouvi do povo daqui e do pouco que me lembro, duvido que tenha sido um acidente, ela desistiu...

— Está insinuando que ela se matou? — Perguntei chocada e Shannon deu de ombros. — Isso é uma coisa cruel de se dizer, sabia?

— A vida é cruel, Natalie. Aqui é Dawsonville, não a floresta encantada, eu tenho trinta e dois anos e nunca vi finais felizes por aqui. Você devia correr enquanto pode, eu faria se tivesse chance, assim que o Jason quiser nós vamos. Acredite em mim quando eu digo que estou esperando por um Dixon faz mais de dez anos, e toda vez que eu penso que as coisas vão se revolver elas acabam ainda piores. Eu não sei se você acredita nessas coisas, mas acho que eles estão fadados a destruir qualquer mulher que se apaixonar por eles, eu não quero essa maldição sobre mim, você não devia querer também. — Shannon declarou, parecendo muito decidida, talvez até um pouco revoltada, em nada parecida com a garçonete alegre e piadista que eu via aos beijos com o Merle.

Eu a entendi, ela estava decepcionada com Merle, eu podia imaginar o quanto ela tinha sofrido naquela relação, se é que poderíamos chamar o que ela tinha com ele de relação. Mas eu não podia deixar que ela projetasse em mim. Nem toda história tinha que ser igual.

— Daryl não é como o pai. Ele é bom. Isso não significa que teremos um final feliz, por que na verdade eu nem sei se teremos um começo, mas ele não é amaldiçoado, não tem nada errado com ele. Qualquer mulher que ele escolher vai ser muito feliz ao lado dele. Daryl não é como o pai. — Eu disse com ainda mais convicção que ela.

— Pensa que Will era assim? Ele era um adolescente bonitão e popular, ninguém diria que ele era um cretino que bateria na esposa, que usurparia o dinheiro da sogra e que não daria apoio emocional a própria mulher. A verdade é que pensamos que conhecemos as pessoas, mas não conhecemos. — Rebateu e pareceu bastante com a minha mãe naquele momento.

— Daryl não é como o pai dele. — Repeti outra vez, ainda mais firme.

— E mesmo que ele fosse, você está apaixonada demais pra ver. — Suspirou um tanto resignada. — Mas você está na minha casa, ou melhor trailer, sentada na minha melhor cadeira e bebendo do meu whisky, então me permita dar um conselho: Não fique sentada na calçada esperando o Daryl voltar pra preencher o buraco no seu peito, porque mesmo que ele volte, mesmo que seja ótimo por um tempo, acredite em mim quando eu digo: vai acontecer outra vez, e outra e outra, até que o buraco no seu peito tenha se tornado grande demais pra ser preenchido. Você precisa seguir em frente.

As palavras dela me causaram um arrepio na espinha, eu conseguia ver que tinha coerência no que Shannon dizia, esperar por um homem que eu sequer sabia se voltaria ou não era mesmo loucura, mas eu ainda era como a libélula e Daryl era a minha luz, eu não conseguia evitar.

— Eu não sei se consigo seguir em frente... — Confidenciei baixo.

Shannon me encarou por um momento, totalmente penalizada, exatamente como os médicos encaram os pacientes com doenças terminais nos seriados de TV, respirou fundo algumas vezes e finalmente falou:

— Então é melhor se acostumar com essa dor, ela vai ser bem frequente na sua vida, cada vez mais forte e maior, eu sei disso melhor que ninguém. Ela vai te destruir até que não reste mais nada a não ser desistir...  

E não era basicamente esse o mesmo fim da libélula que se apaixonou pela luz?


Notas Finais


A função de um pai é educar, mas é difícil cumprir esse papel quando a pessoa não foi pai por 18 anos, eu recebi alguns questionamentos sobre eu deixar esse parte da historia de lado e pintar o Pappa Cooper como um anjo, mas ele não é, todos os personagens aqui tem defeitos e qualidades, por que eu queria que fosse o mais próximo possível da vida real, não temos vilões ou mocinhos, apenas pessoas tentando fazer tudo que podem da melhor forma possível. Alguns personagens são beneficiados ou prejudicados pela visão unilateral dos narradores (como é o caso do Pappa Cooper e da Deborah) mas isso não significa que eles sejam 100% maus ou bons. Até o Will tem um lado bom (eu escrevi isso com uma careta, porque não gosto dele, e ainda não vi o lado bom dele, mas... uahsuashaush)

Shannon é um amorzinho, melhor fofoqueira que você respeita, ela tem um certo destaque no próximo, e conheceremos o namorado dela, Jason.

E o Daryl hein? #VoltaDaryl

Eu tenho que ir pra casa da minha mãe de novo (a bagunça da mudança não acaba, nunca vi alguém pra ter coisa igual minha mãe) porém se nada der errado o cap saí normalmente na sexta que vem. Até lindas e maravilhosas.

Bjss


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