História Limerence - Capítulo Único

Son Chaeyoung era minha melhor amiga, e para ser totalmente honesta, a única que eu tinha. Nos conhecemos quando me mudei para o fim da rua 14, poucos metros antes de uma falha na grande parede de arbustos que cercava um lago de água verde espessa, o que eu, junto com uma menininha pequena, denominei uma passagem secreta para o local. 

Chaeyoung tinha uma bicicleta azul celeste e me lembro perfeitamente de como subia as meias até perto dos joelhos antes de subir no veículo com rodinhas de apoio, suas mãos suavam sobre o guidão da bicicleta, eu a olhava na rua pela janela do quarto do meu irmão mais velho, e quando ouvia seus passos em direção ao cômodo, corria para fora do lugar, mas sempre era segurada pela gola da camiseta e ouvia: “Se quer tanto brincar com ela, desça as escadas e vá, Tzu.”, mas nunca fazia o que me era dito.
 

Exceto naquela tarde, no início das férias de verão, em que o tédio me esmagava, subi as escadas e lá estava a pequena Chaeyoung, com seus cabelos presos em uma maria-chiquinha e as meias brancas até os joelhos, com meus dedos tamborilando o vidro da janela eu cogitei ir brincar. E então fui. 

Assim que ela me viu do outro lado da rua, com as mãos atrás das costas, correu para a lateral visível da bicicleta e posicionou-se em frente as rodinhas, para que não pudesse ver. Olhei para os dois lados, tentando adiar nosso diálogo, pois sabia que o movimento de carros na rua 14 era baixíssimo. 

- Eu também não sei andar sem rodinhas. - Foi o que disse, e Chaeyoung abaixou o rosto, voltando para trás da bicicleta. - Meu nome é Tzuyu. 
Sorri para ela, que me encarou por um tempo e depois me mostrou um sorriso em que dois dentes faltavam, coincidência demais para ser verdade. 

- Meus dentes também começaram a cair! Quantos anos você tem? - Eu disse animada, e me aproximei inocentemente de Chaeyoung, que riu ainda mais e mostrou o número seis com as mãos. 

Passamos aquela tarde brincando, e me lembro de como ela era tímida no começo, mas depois falava como se não soubesse parar, me contava péssimas piadas e animava-se sobre os últimos episódios do desenho que nós duas acompanhávamos avidamente. 

O resto das férias foi assim, após o almoço, eu encontrava Chaeyoung do outro lado da rua e a observava andar de forma trêmula sobre a bicicleta azul, desbravávamos a grande parede de arbustos, corríamos em volta do lago e acabávamos por sentarmos na grama, cansadas, e caímos em gargalhadas. 

No começo do ano letivo seguinte, insisti para minha mãe me colocar na escola que Chaeyoung estudava, e ela consentiu. No primeiro dia de aula, chorei por medo do novo ambiente, mas lembrei-me de que minha melhor amiga estaria comigo e me daria forças, e então levantei os ombros e caminhei até a escola naquela manhã. 

Os anos passaram-se e Chaeyoung sempre estivera ao meu lado, largamos as rodinhas das bicicletas, nossos dentes cresceram de novo e o desenho que assistíamos chegou ao fim. 

Com a chegada do ensino médio, fomos expostas a novas experiências, Chaeyoung entrou para o time de natação da escola, e eu, fazia aulas de piano. Ela fez novas amigas na equipe e eu senti medo de ser esquecida. Quando saímos da escola para tomar sorvete, Chaeyoung dizia como Nayeon era divertida, ou como Mina era inteligente. Meu coração apertava-se, mas eu focava em ficar feliz pela felicidade de minha amiga. 

No meu aniversário de 16 anos, Chaeyoung me deu uma foto nossa, de quando tínhamos seis anos e posávamos com nossas bicicletas, mostrando os sorrisos incompletos. Também recebi uma carta escrita à mão, com palavras tão bonitas que não pude evitar de molhar o papel lilás com lágrimas de felicidade. Son Chaeyoung era tão especial. 

Especial ao ponto de me fazer deitar em minha cama e adormecer pensando em seus olhos brilhantes, tão especial que fazia meu estômago congelar quando aproximava-se de mim para arrumar a minha gravata vermelha do uniforme, tão especial que me fazia sentir feliz ao acordar cedo mesmo nos sábados para vê-la competir com sua equipe de natação. Son Chaeyoung era o meu ponto de equilíbrio e minha dose diária de felicidade. 

Até o que eu não esperava, acontecer. Num fim de tarde quando o céu escurecia com rapidez e os barulhos de trovão eram cada vez mais altos, entrei no vestiário de natação para esperar Chaeyoung e irmos patinar no gelo, era o que fazíamos nas quintas-feiras. O cheiro de eucalipto era inconfundível, a menina estava tomando banho no vestiário vazio. Estava escorada na parede de azulejos, recusei-me a sentar nos bancos de metal pois imaginei que estivessem frios. 

- Son Chaeyoung, vamos logo! - Eu reclamei, e a ouvi murmurar algo de volta. 
O vapor correu para o teto do local quando ela abriu a porta da cabine, enrolada na toalha branca e com os cabelos vermelhos recém-pintados molhados. Sorriu para mim, o que acelerou meu coração de forma diferente. 

Virei-me de costas para minha amiga, dando privacidade para ela se vestir, ela pigarreou indicando que já estava pronta. Virei-me novamente e vi Chaeyoung tão atraente, usava uma blusa de mangas compridas branca e calça jeans clara, roupas comuns, mas, o brilho em seus olhos era tão intenso, seus lábios rosados pela água quente me fizeram querer me aproximar, e sem controle do meu corpo, foi o que fiz. 

Chaeyoung levantou o queixo, para que pudesse me olhar nos olhos, e sorriu, tinha as bochechas vermelhas. Ela era admiravelmente mais baixa do que eu, e eu passei um de seus fios de cabelo para trás de sua orelha, nossos corpos estavam cada vez mais juntos e eu não me incomodava com isso. Encarava-a nos olhos, e ela fazia o mesmo comigo, as borboletas em meu estômago estavam quase saindo pela boca, quando Chaeyoung selou nossos lábios tão suavemente que fechei os olhos de imediato. 

Aquele era meu primeiro beijo, e com minha melhor amiga. Tudo estava confuso, mas, ao mesmo tempo, parecia fazer tanto sentido. Coloquei uma mão na cintura de Chaeyoung e continuamos o ato tão sereno, nossos lábios se encaixavam tão bem que sentia como se fossem destinados uns para os outros. Quando ela afastou sua boca da minha, senti meus músculos relaxarem, ter beijado Chaeyoung pareceu ser a peça que faltava. 

- Tzu...- Ela disse, ainda me olhando nos olhos. Estava acanhada e tocou levemente os seus lábios com as pontas dos dedos enrugados por terem ficado muito tempo na água.- Eu não sei o que houve. 

Naquele momento, sendo guiada mais do que nunca pelos instintos, abracei Chaeyoung e não liguei se seus cabelos molhariam meu uniforme. Meu coração acelerado era quase audível, e eu queria que fosse, queria que ela o escutasse tentando explicar o que eu estava sentindo. 

Eu estivera durante muito tempo apaixonada por Son Chaeyoung, da forma mais pura que existe. Entendi, por fim, que queria Chaeyoung ao meu lado de qualquer forma, queria sua companhia, suas piadas ruins, seu senso artístico e sua habilidade de me fazer tão feliz com gestos tão simples. 

Naquela noite, saímos de mãos dadas do vestiário e não nos importamos com a chuva, fomos andando até o lago, passamos pela nossa passagem secreta e nos sentamos na grama. Entrelacei meus dedos na mão pequena de Chaeyoung e ela apoiou sua cabeça em meu ombro, e ficamos ali, sentindo os fogos de artifício que explodiam em nosso consciente, e dando os segundo, terceiro, quarto beijos. Eu queria que aquela noite durasse para sempre, pois tinha certeza de que minha ligação com Son Chaeyoung duraria.