História Memories and histories and that's all - Do anything you say

1964

David Robert Jones mais uma vez solta pesadamente o ar pela boca após um longo inspiro, e ao olhar para Caiteli, um sorriso brota em seu rosto. A menina estava o encarando com um sorriso de lado, e uma feição qual ele não conseguia decifrar ao certo, ela arqueia as sobrancelhas e se aproxima lentamente de David

- O que foi? - ele pergunta curioso enquanto sorri nasalmente, Teli por sua vez apenas balança a cabeça negativamente, ffaendo com que um feição de tédio surja no rosto de David

- Não, não é nada...é só que - ela passa seus dedos sobre o pesado e grosso sobretudo do rapaz - eu acho que você irá aparecer naquele palco, agarrar aquele microfone e mandar ver - ela olha em seus olhos enquanto fala e logo percebe que ele está tentando conter o riso - o que? 

- É que, eu não pude evitar de ter um pensamento inadequado com o "agarrar aquele microfone e mandar ver" - ele explode em risadas ao ver a feição de horror no rosto da garota

- Davie! - ela exclama em uma tentativa em vão de segurar o riso 

- Me desculpa! Você sabe que a minha mente é um lugar inabitável - Teli concorda com a cabeça e ele a puxa para um abraço - Teli...obrigado por sempre me apoiar, e por estar aqui, e por me emprestar aquele shampoo - os dois riem mais uma vez e Cait fecha os olhos, sentindo o calor daquele abraço quentinho e apertado

- Tudo bem, coisas assim não precisam de agradecimentos, lembra? 

- Com licença, mas está na hora - um homem com uma prancheta em mãos fala a David e sai antes de o mesmo pronunciar algo 

- Boa sorte! - é a última coisa que o rapaz escuta antes de entregar seu sobretudo a garota e sair ao encontro do resto da society

David sempre quisera aparecer ao mundo, esse era um dos seus sonhos, se não o maior; e naquele momento ele estava prestes a aparecer como o porta-voz da Society for the Prevention of Cruelty to Long-Haired Men, uma sociedade onde ele tinha sido um dos fundadores, para protestar contra os tratamentos que ele e outros jovens recebiam por conta de seus longos ou excêntricos cabelos. Ao contar sobre essa ideia a Teli, a menina o apoiou e ainda o ajudou com o nome do grupo; isso era uma das milhares coisas que David gostava em Caiteli, ela sempre o apoiava quando o mesmo precisava, sempre o entendia e se esforçava para entender, o escutava e, quando necessário, dava-o alguns puxões de orelhas, como ela o conhecia bem. E vice e versa, pois David sabia mais do que ninguém, que por trás daquela menina sorridente e tímida, existia uma certa melancolia; e ele fazia o máximo para ajudar Cait, que por mais que tentasse, nunca sabia esconder de seu amigo quando não estava bem. Os dois eram assim, apoiavam-se um ao outro, sem se importarem com esse mundo esquisito e as pessoas mesquinhas existentes nele

 O programa da BBC estava começando, e Caiteli assistia tudo pelo fundo do local, estava feliz por seu amigo, ele estava ali de certo modo realizando um sonho, e isso a deixava feliz

- É realmente para a proteção de músicos pop, e aqueles que possuem seus cabelos longos - David falava ao entrevistador, Cait não pôde deixar de sorrir com as palavras de seu amigo, estava orgulhosa - Qualquer um que tenha a coragem de usar o cabelo abaixo dos ombros tem que passar um inferno. É hora de nos unirmos e defendermos nossos penteados. Todo mundo faz piadas sobre você no ônibus, e se você passar por marinheiros fazendo trabalhos na estrada, é um assassinato!

Caiteli olhava para o nada com um sorriso de lado no rosto, sua mente começou a pensar no passado, momentos bons...nostalgia; ela passou alguns minutos relembrando as coisas boas da vida, até que seus pensamentos chegaram nos momentos ruins, eles estavam mais uma vez voltando e a assombrando, Teli solta um longo suspiro e veste o sobretudo de seu amigo, afim de tomar um ar. Ao sair encontrar a saída, ela põe as mãos no bolso esquerdo do sobretudo e encontra ali um isqueiro junto a uma carteira de cigarros; não, ela não era de fumar, mas quando estava mal acabava se rendendo a tentação do hábito, as vezes a acalmava. Acendeu um cigarro logo dando uma longa tragada, observando os movimentos lentos e calmos da fumaça que saía de sua boca, estava funcionando, ela estava calma

Caiteli passou um bom tempo escorada naquela parede fria do beco do local, até que o barulho da porta abrindo a assusta 

- Você está aí! Venha, acabamos a entrevista - um dos amigos de David a chama - e mandamos muito bem - ele faz cara de sabichão e sorri junto com Teli, que apaga o terceiro cigarro que fumava na sola de seu sapato, logo sendo puxada pelo garoto e voltando para o camarim onde estavam o resto do pessoal

- Teli! Você estava certa, nós mandamos ver - David a abraça entre risadas - a única diferença é que não deu pra agarrar o microfone do Cliff Michelmore - os dois explodem em risadas enquanto os demais ali ficaram com sorrisos confusos

- Piada interna, rapazes - Cait se pronuncia se recuperando dos risos

- Hey! Devíamos sair para algum lugar e comemorar! Quer dizer, mandamos bem, merecemos algo - um dos garotos fala e todos ali concordam, aliás, se divertir não era lá uma má ideia

Após algumas conversas com as pessoas que trabalhavam no local, todos saíram a procura de beber algo, jogar conversa fora e etc, coisas que os jovens fazem em suas saídas. David andava ao lado de Caiteli com um braço envolta dos ombros da garota, enquanto murmurava algumas palavras que mais tardes, ambos sabiam que aquilo provavelmente daria origem a algum poema ou algo do tipo, pois David sempre costumava fazer isso. Two by two, they go walking by, hand in hand, they...watch me cry

- Two by two - David repete mais uma vez e sorri

- Hand in hand - Cait fala após pegar a mão de seu amigo e apertá-la, os dois se olham e sorriem, encostando suas testas brevemente 

O grupo de jovens andaram pelas ruas com um pouco de frio devido ao tempo nublado, andaram até a casa de um dos garotos da society, os pais do garoto estavam de viagem no momento e sua irmã, provavelmente saíra para aproveitar com o namoradinho, deixando assim a residência vazia. Todos estavam livres para fazer e beber o que quiser, mas exceto as bebidas caras, relembrou o jovem chamado Charlie, deixando que todos se acomodassem e se esquentassem ali. Enquanto todos davam ideias de pedir comidas e dar início a uma festa, o céu ficava cada vez mais escuro

...

Eu não sei ao certo o que exatamente eu bebi, e nem como vim parar aos beijos com um dos garotos que chegaram depois que a festa começara a ficar mais movimentada, provavelmente David o conhecia...e aliás, eu não tinha a menor ideia de onde o meu amigo estava, se divertindo com alguma garota talvez. Ótimo Davie, me empurre bebidas com coisas desconhecidas e depois saia para saciar suas vontades sexuais. O garoto com quem estava provavelmente percebeu a feição confusa que estava em meu rosto, pois logo parou o beijo

- Não está gostando - Joey pergunta me fitando e eu começo a rir

- Não...quer dizer, não é isso! É que, bem, eu não sei onde o meu melhor amigo está - falo gargalhado e apoio a cabeça em seu ombro ainda rindo. Caramba, eu estou muito bêbada 

- Ah, David - ele fala enquanto me acompanha nas risadas - da última vez que o vi ele estava subindo as escadas com Bruna, uma prima de Charlie

- Oh, sim...legal - sorrio - mas ainda não sei como eu, nós voltaremos para casa

- Olha, eu posso dar uma carona para você, e a David caso ele não esteja muito ocupado com outras coisas - Joey faz uma careta e eu rio, o beijando logo em seguida - agora vem, vamos para um lugar mais reservado 

Joey e eu saímos em direção a algum quarto, ele me guiou até a cama entre beijous, e eu apenas deixei-me levar pela emoção. Ele foi atencioso e cuidadoso o tempo todo, até ambos cairmos lado a lado ofegantes e exaustos. Ficamos mais um tempo conversando e, ao contrário do que eu achava, Joey tinha 21 anos e apareceu ali após ser chamado por um dos amigos de Charlie, já que estava no tédio, não achou uma má ideia. Ele era atraente, e não tinha como negar que o rapaz possuía um belo sorriso; seu cabelo era bem escuro assim como o meu, e seu físico meio robusto

Dei um pulo da cama quando vi que o relógio do cômodo marcava 3:40 da manhã, eu não fazia ideia de que era tão tarde e saí do quarto totalmente perdida a procura de David. O lugar estava cheio, mas não tanto a ponto das pessoas esbarrarem umas nas outras enquanto andavam, e depois de um bom tempo andando olhando para todos os lados com o intuito de achar meu amigo, o encontrei no jardim da residência sentado na grama junto de uma moça de cabelos negros e com belos cachos, ela era muito bonita. Cheguei com Joey ao meu lado

- David! - ele olhou para trás assustado e voltou a rir assim que me viu - Temos que ir para casa - falei cautelosa

Ao ouvir as minhas, o sorriso no rosto de David sorriu mais uma vez, ele franziu as sobrancelhas e virou as costas para mim, voltando a conversar com Bruna como se nada tivesse acontecido, me agacho para ficar na sua altura, ele estava muito bêbado 

- Davie...é sério - ele continua me ignorando completamente e explode em gargalhada por conta de algo que Bruna falara, sem nem lançar o olhar para mim - vamos lá, já está muito tarde - suspiro e ele para de rir, desviando seu olhar para o chão 

- Maybe...i'll do anything you say - ele aperta minha mão e eu aperto a sua de volta, sorrindo de lado 

- Two by two, they go walking by - falo enquanto o olho nos olhos - hand in hand... - faço uma careta para lembrar o resto 

- They watch me cry, two by two hand in hand - ele continua e eu o puxo para cima enquanto também me levanto 

Joey e eu nos despedimos de Bruna enquanto meu amigo bebia água, e ela parecia agir naturalmente com a situação, nos abraçou e assentiu, dando um breve aperto de mão. Logo saímos para a rua em direção ao carro de Joey que já havia tirado a carteira de motorista, falei para ele dirigir até a minha casa e entrei no banco de trás ao lado de David que encostou a cabeça em meu ombro enquanto eu lhe fazia cafuné, em seu rosto e em seus longos e lisos cabelos claros, quase loiros. Durante o trajeto ele murmurava algumas coisas e sorria, Joey e eu também sorríamos 

Ao chegarmos em minha residência, me despedi de Joey com um beijo e o agradeci por tudo, o mesmo disse não ser nada e me lançou alguns elogios, me deixando um pouco sem graça, ele era um cara legal. Peguei o braço de David e passei ao redor de meus ombros, o guiando o mais silenciosamente possível até meu quarto, tirei seus sapatos e deitei-o em minha cama, ele não demorou a pegar no sono o que me deu um suspiro de alívio com uma leve mistura de cansaço. Deitei devagar ao seu lado e olhe para o teto, perdida em meio a meus pensamentos, fechei os olhos quase que automaticamente e não sei dizer a última coisa da qual eu lembro, exceto de David suspirando e falando baixinho 

- Lonely nights, i dream you're there - não pude deixar de sorrir antes de ser levada pelo sono e cansaço que sentia

...

David Robert Jones presumia ser ainda manhã quando o mesmo abriu os olhos e despertou em um quarto que não era seu, mas mesmo assim, era bastante familiar e o rapaz o conhecia quase como se fosse seu. Levantou-se da cama sentindo levemente os sintomas da noite anterior, tentou reorganizar seus pensamentos, pegou uma uma caneta e um papel, começando logo a escrever as frases que o mesmo falara e murmurara no dia anterior. Morning sun, and you're gone, o jovem escrevia

- One desire i ask of you...please be mine - David fala em voz alta enquanto escreve as palavras na folha amarelada de papel