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História Não Pule no Fogo - O Êxtase do Ouro, Pós Tempestade


Escrita por: vixen

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 6 - O Êxtase do Ouro, Pós Tempestade


Fanfic / Fanfiction Não Pule no Fogo - O Êxtase do Ouro, Pós Tempestade

Perdi completamente a contagem dos dias desde que as aulas de iniciaram. Acho que hoje faz um mês e meio.

Dormi na casa do Lars bebendo, comendo e jogando conversa fora, como de costume. Acho que finalmente alguma pessoa pode me tirar a paranoia perseguidora que corria pelos meus neurônios desde que eu estive próximo da casa do Sr. H. ontem. Foi tão paranoico que sonhei com isso e acordei suado e com calafrios, imaginando a possibilidade dele descobrir alguma coisa.

Acordei no dia seguinte morto de ressaca, pois as bebidas escandinavas que tomamos ontem desceram cortando o meu fígado no meio. Lars, sendo dinamarquês, não sentiu nem cócegas – mesmo sendo uma péssima pessoa para se convidar pra beber. Me levantei daquele colchão de espuma que eu dormi essa noite e não encontrei ele na cama ao lado. “Esse garoto acorda muito cedo” pensei.

Me levantei, dobrei as cobertas e pus o colchão no armário onde ele sempre guarda, após dar uma arrumada na cama dele.

 

- Bom dia. – disse ele, só de cueca na porta, bocejando.

- Seus pais realmente deixam você andar assim?

- Meus pais fazem pior.

 

Fiquei enojado ao imaginar os país dele sem roupas, passeando pela casa. Isso não é coisa que se diz para um amigo - mesmo sendo intimos.

 

- O que você fez ontem? – perguntei, mudando de assunto.

- Fiquei em casa com o Kirk. Ele joga Tank Plus melhor que você.

- O que? Ninguém destrói barreiras naquele vídeo-game melhor que eu!

 

Fiz ele sorrir enquanto se vestia. Me sentei na cama e continuei olhando para o nada, pensando, com o olhar fixo em algo.

 

- Dave? – disse ele.- DAVE! – exclamou, me tirando daquele pré-transe.

- O que houve? – perguntei.

- Eu que te pergunto o que houve. Você ficou olhando eu por as calças por um tempão.

- Só estava pensando.

- Pensando? Em quem? Naquela garota ucraniana da outra sala? Duvido.

- Não. Não estou pensando em ninguém.

- O Kirk me disse que estuda com ela. Ela é amiga de todo o mundo.

- Bom pra ela.

 

Lars terminou de se vestir e se sentou ao meu lado.

 

- Teve alguma coisa importante nas aulas de ontem? – perguntou.

- Não. Os professores irão começar as provas depois de uma severa revisão... como disseram.

- Posso pegar o seu caderno emprestado?

- Pode.

 

Ao dizer isso, ele se levantou e abriu a minha mochila, pegando o caderno de matérias. Deu uma olhada no caderno e pôs na sua bolsa, retornando para minha.

 

- Esse caderno tem algo importante?

 

Quando ouvi isso, a única coisa que pensei em fazer foi gritar:

 

- NÃO ABRA ISSO! – exclamei, me levantando.

 

Era tarde de mais. Ele abriu o caderno com rapidez, derrubando dezenas de fotos no chão. “Merda” pensei, pondo minha mão direita nos olhos, com medo do que ele pudesse fazer.

 

- O que é isso? – perguntou, agachando-se e pegando foto por foto.

 

Lars fitou cada take durante um bom tempo, com os olhos arregalados, impressionados. Depois, colocou as fotos de lado e leu as minhas anotações, pondo a mão na boca, não acreditando no que tinha lido.

 

- Não faça isso, Lars. – disse eu, desesperado. – Por favor.

 

Ele não fez mais nada. Pôs as fotos no caderno e fechou-o em seguida, mantendo a mão sobre a boca. Minha vontade era de pegar os meus cadernos e correr dali o mais rápido possível, mas as minhas pernas tremiam e o meu coração batia forte.

 

- Cara... – disse ele, por fim. – Eu não... ...nossa...

- Não queria que descobrisse assim. – respondi. Na verdade, não queria que ele descobrisse nunca.

- Há quanto tempo faz isso? – perguntou, tirando a mão da boca.

- Mais de um mês.

- E ele não descobriu?

- Ele não pode descobrir.

- Mas você não pode continuar assim.

- Então o que eu devo fazer?

- Diga à ele o que sente.

- Eu não sinto nada por ele.

 

O dinamarquês finalmente teve coragem de me fitar, franzindo a testa com desaprovação.

 

- Sente sim. – rebateu.

- Não sinto.

- Então porque tem três ou quatro fotos dele sem camisa?

- Porque... porque... porque eu estava no banheiro, e ele...

- Dave, eu zoava você quando dizia que vocês dois eram enrustidos, só não imaginei o quanto eram...

 

Aquilo doeu como uma facada. Olhei para o caderno que continuava na sua mão esquerda, tremendo de raiva, querendo queima-lo à qualquer custa. Não consegui segurar a tremedeira, então deixei uma lágrima escorrer lentamente, depois outra, e outra...

Lars percebeu a minha situação, pôs o caderno no meu colo e me abraçou.

 

- Nunca é fácil essa transição. – disse ele.

 

Transição. Uma boa palavra para usar nesta situação. Mas eu não era gay. Não gostava de homem algum. Não me imaginava vivendo como os homossexuais californianos viviam.

 

- Eu não sou gay, Lars... – disse eu, aos prantos, apertando aquele caderno com força.

- Você não era até conhece-lo. – respondeu ele, sorrindo, tentando me animar.

 

Aquelas palavras foram tão confortantes que me fizeram parar de chorar em questão de segundos. Ele tinha toda a razão. Eu não era assim até conhece-lo. Não era esse garoto possessivo, curioso e destemido até conhece-lo.

 

- Eu não posso gostar dele. Eu odiava ele no começo.

- Isso ficou no passado. Sei que ele fez algo para você admira-lo como admira.

 

E novamente o dinamarquês acertou. Não paro de pensar nele desde a expedição ao Science Center, onde ele me mostrou aquela constelação que havia aberto os meus olhos para a realidade triste na minha casa.

Decidi contar aquela história para ele, já que o pior ele tinha descoberto sozinho. Ele se mostrou interessado naquela historia, como se fosse um filme do Woody Allen. Após terminar de contar até o último detalhe do que me levou até a casa dele no último dia, senti um peso saindo das minhas costas, a minha alma limpa e o meu coração pulsando normalmente.

 

- Cara... – disse ele, tapando a boca novamente. – É muita coisa pra digerir. – disse ele, com uma voz abafada saindo dentre os dedos. – Ele foi gente boa na segunda vez que vocês se encontram.

- Foi por isso que segui ele e fui na sua casa.

- Eu posso ler? – perguntou, apontando para o caderno no meu colo.

 

Mesmo tremendo e prestes à chorar de novo, entreguei o caderno. Ele abriu, pôs as fotos na cama e devorou pagina por pagina, demonstrando-se completamente incrédulo com muitas coisas que eu escrevi. E após pouco tempo de leitura, ele fechou o caderno e decidiu ver as quase sessenta fotos que eu tirei desde o inicio da minha caçada. Vi ele sorrindo algumas vezes, como se achasse tudo isso fofo, de alguma forma.

 

- Nem parece que foi você quem fez isso. É por isso que acho incrível. – disse ele, ao observar a última foto. – Ele é poderoso, tem dois carros e uma Harley. Tem uma casa grande e um cachorro bruto. Tudo isso combina. Que incrível!

- Isso não é incrível se a única coisa que você diz é que eu devo falar com ele.

- Li na primeira pagina que ele não se mostrava interessado pela Srta. Denver, que é carinhoso com o seu cão e que já pegou ele falando sozinho algumas vezes.

- E dai?

- Você deve ser a companhia que ele precisa.

- Lars, você ainda não entendeu como a situação é complicada. Sou vinte anos mais novo e somos do mesmo sexo. Qual a probabilidade disso der certo?

- Não precisa ter probabilidade, só força de vontade.

- Você conseguiu o filipino tímido assim?

- Foi. E é assim que você vai conseguir o Sr. H.

 

                                                                                      [...]

 

 

Fomos juntos para a escola sem tocar no assunto depois dessa conversa. Ainda me sentia mal pela forma com que ele descobriu isso, e com a forma com que descobri o meu gosto pelo meu professor. A pior parte é que hoje é quarta-feira, dia cuja a última aula sempre é física, independentemente da troca de horários que acontece quase toda semana.

Após passar o intervalo com a Winter e o Lars, além do namoradinho filipino dele, a aula de inglês não conseguia me deixar completamente curado da paranoia de sentir que alguém sabia do meu segredo. Essa paranoia era quase esquizofrênica, pois imaginei, durante alguns minutos, que Lars pudesse ter contado isso para alguém durante o intervalo. Suei frio só de imaginar.

O penúltimo sinal soou. O sinal que era o elo entre a quarta aula e a quinta, fazendo com que todos os professores deixassem as salas e fossem direto para as outras, sem nunca perderem o ritmo. Porém, após o Sr. Wolf de inglês ter deixado a sala, uma outra pessoa tomou da hora-atividade  da disciplina de física. À nossa frente estava a pedagoga responsável pelos alunos do turno da manhã, a Srta. Landers, vestindo uma voluptuosa jaqueta de pluma preta com uma saia até os joelhos, meia calça e salto alto. Estava parecendo uma dançarina de cabaré dos anos vinte.

 

- Bom dia, alunos. – disse, forçando um sorriso. – Hoje o Sr. Hetfield não pôde vir. Disse que estava com alguns problemas de saúde e trouxe um atestado médico para justificar a falta. Então nós tomamos a liberdade de dispensar vocês agora, pois outras turmas já foram embora e essa é a última aula.

 

Essa noticia animou muitos alunos, principalmente os que sentavam no fundo. Me senti aliviado por não olhar para a cara dele naquele dia, mas não por muito tempo, pois a coragem de fazer o que tinha que ser feito estava indo embora. Pus os meus cadernos na bolsa e sai da sala acompanhado do Lars.

 

- Como se sente? – perguntou, ao passarmos pelo portão.

- Não sei o que te dizer.

- Segunda-feira você faz o que tem que fazer.

 

Balancei a cabeça, gelado ao ver que ele ainda se lembrava do que havia acontecido hoje. Afinal, quem esqueceria a noticia de que seu melhor amigo é um admirador secreto do professor de física? Nem a pessoa mais tola se esqueceria. Olhei para o lado e vi o dinamarquês conversando com a Winter, imaginando que ela já soubesse de alguma coisa. Respirei fundo e esqueci disso, até eles se despedirem, tomando um outro caminho para as suas casas.

Eu cheguei na 12th Ave, a rua da minha casa, e parei na esquina, fitando todas as casas que estavam à minha frente, além dos carros e das calçadas rachadas. Cerrei o meu pulso esquerdo com força, não me sentindo à vontade nem com disposição para ir pra casa – mesmo sabendo que a mamãe estaria me esperando à essa hora para o almoço. Certamente a Debra foi almoçar hoje com ela, sem deixa-la sozinha, então dei meia volta e andei até o final da rua, sem nenhuma direção em mente.

Parei em um ponto de ônibus e vi se ainda havia algum dinheiro sobrando na minha bolsa para pagar uma passagem que me levasse para longe de lá. Encontrei algumas notas de cinco dólares, que já era o suficiente – naquela época. O ônibus chegou em menos de dez minutos e consegui embarcar. Subi as escadas e perguntei ao motorista onde seria o ponto final dele após pagar a passagem.

 

- Vai até a Exposition Ave, próximo ao Museu de História Natural de Los Angeles e o Califórnia Science Center.

 

“Califórnia Science Center”

 

- Obrigada. – respondi.

 

Pela primeira vez no dia, me senti com sorte – e relativamente, azar.

No meio da jornada, me lembrei do dia da exposição, quando estava bisbilhotando a revista que ele lia pelo canto dos olhos, então, me assustando, ele perguntou se eu gostava de instrumentos musicais. Hoje eu revejo essa situação e percebo o quão ingênuo eu fui por não ter puxado mais assunto. Estava com tanta raiva dele por ter me dado uma detenção sem motivo que só via a sua camada bruta e monstruosa.

Na verdade, eu nem me lembrava do dia da detenção.

Foi tão exagerada a minha reação e o embaraço que eu passei no dia, que lembrar dela seria assinar o atestado de vergonha alheia. Dei um sorriso no canto da boca ao me lembrar da risada sem motivo na hora da detenção, fazendo-o me calar logo em seguida. Ele mudou tanto após as semanas, e eu também. Ele deu algumas detenções para alguns alunos por indisciplina, da mesma forma que havia dado à mim. Também via ele mandando-os calar a boca e, algumas vezes, sentia que ia explodir à qualquer momento durante a aula. Isso acabou mudando com o passar do tempo, pois nos acostumamos com a sua presença – principalmente eu.

Abri o meu caderno e decidi fazer algo com tudo aquilo. Peguei as fotos desnecessárias como as da casa dele ou do carro e rasguei-as uma por uma, jogando para fora da janela do ônibus em seguida. Fiz questão de que sobrasse apenas as fotos onde ele aparecia. Fotos dele comendo, conversando com os professores, dando aula, dirigindo, estacionando, entrando no prédio e lendo. Eu sentia necessidade de manter estas. Colei as melhores na contracapa com cola bastão, e as outras eu prendi com um clip de metal nas folhas das minhas anotações, pois a cada anotação, eu batia uma foto. Me senti uma adolescente de doze anos colando foto de ídolos teens. Me senti como a minha irmã se sentia, idolatrando quem nem à conhecia ou jamais saberia da sua existência. A diferença é que eu via ele todos os dias, e ela não.

Folhei aquelas paginas como se fossem um álbum de fotos, ou uma compilação de um colecionador nato – afinal, aquele arsenal de fotos verdadeiramente era uma coleção. Olhei para a janela parcialmente embaçada ao meu lado e percebi que já estava no ponto onde eu devia descer. Corri para a porta afim de que ela não se fechasse, então, o ônibus se foi, me deixando na frente do enorme pátio de entrada do Science Center. Pus meu caderno na bolsa, guardando as fotos dentro e pondo-a nas costas. Comecei a andar pelo lugar, reparando em detalhes naquele pátio que eu não havia percebido no dia da expedição, graças ao nervosismo. A entrada daquele museu era triunfal e parcialmente iluminada pelo pouco de luzes colorida que o dia deixava brilhar.

Passei pela estatueta do globo terrestre em frente à escadaria da entrada. O globo era realmente gigante, durado e minimalista, dando a entender que era um modelo atômico, e não o globo terrestre. Subi as escadas de mármore e parei em frente às portas de entrada do museu. Observei a paisagem dos pequenos jardins à minha volta graças a vista privilegiada que a escadaria me proporcionou. Me virei para frente e, ajeitando da forma mais confortável a mochila nas minhas costas, passei pela porta de entrada a fim de não sair tão cedo.

 

- Boa tarde. O que deseja? – perguntou uma moça de sotaque diferenciado e aparência mexicana.

- Boa tarde, - respondi, tirando um pouco de dinheiro do bolso. – Quando é pra entrar?

- Se estiver sozinho, é vinte dólares. – respondeu a moça sorrindo com o canto da boca, apontando para um quadro médio ao seu lado com uma tabela de preços por pessoa.

 

Contestei mentalmente esse preço absurdo, afinal, consigo fazer muita coisa com vinte dólares. Percebi que não iria ao fliper o resto da semana.

Entreguei os vinte dólares e assinei o meu nome em um livro de visitas. A mexicana sorridente me entregou um papel verde-limão escrito ‘pagante’ e me deixou passar pela catraca da entrada, liberando o caixa para outras pessoas pagarem sua visita.

Saindo da área dos caixas, pude ver novamente aquele aeroplano no meio de uma sala ao lado, mas não tinha interesse em passar por ele novamente. Dei meia volta e me dirigi à aquela sala fascinante de artes plásticas. Ao parar em frente à porta da sala, li uma placa ao lado escrito ‘A Química em desenvolvimento – Uma Arte Exata’. Aquilo me chamou a atenção. Não podia acreditar que pessoas tão inteligentes pudessem ter um gosto para a arte. Por um bom tempo, imaginei que pessoas desprovidas de uma inteligência mais desenvolvida pudessem aproveitar uma musica, um livro ou um quadro, pois nunca vi um gênio matemático dizendo que se interessa por obras tão profundas sobre a natureza humana. “Ninguém que tenha uma inteligência lógica liga para sentimentos”, era o que eu pensava até então.

Entrei na sala parcialmente cheia, cujas luzes vermelhas haviam sido mudadas por luzes verdes, dando mais contraste às obras coloridas com prata lapidada e fundida. Aquelas artes coloridas e brilhantes não me chamavam a atenção. Eu me interessava puramente nas obras de chumbo negro e carvão, postadas de formas peculiares na parede, como um premio ao lado de tantos quadros e esculturas sem sentido. Aquelas artes eram apreciadas por pessoas inteligentes e, por um momento, me senti parte daquelas pessoas.

Andando de escultura à escultura, quadro por quadro, nada me passava pela cabeça. Esqueci meus problemas, meus medos, minhas vergonhas e minha derrota mental. Eu poderia ficar naquela sala por dias, admirando e estudando os detalhes nas saturações cinza e preto que o chumbo contrastava.

Decidi sair daquela sala com dificuldades quando muitas pessoas entraram lá aos poucos, faltando espaço para todos se moverem. Voltei para a entrada do museu. Do lado direito estava a sala do aeroplano colorido. Do lado esquerdo estava a sala das artes onde eu havia me retirado, então fui reto pelo centro do museu, onde mais uma escultura de metal com o logo do California Science Center se encontrava. As pessoas passeavam pelas parte central como se estivessem em um shopping: não tinham interesse em entrar em nenhuma das salas para encontrar algo; Estavam lá apenas pelo divertimento da companhia de alguém. Finalmente, após andar de sala em sala a fim de encontrar novos ares, os ‘velhos ares’ voltaram novamente quando dei de cara com a enorme cápsula, cuja sinalização indicava se chamar ‘Planetário’. Parei na frente da porta colada à parede arredondada da capsula imóvel, sem intenção de movimento. Dei poucos passos e pus meu braço esquerdo na maçaneta branca, com um design futurista, idêntica ao resto da capsula. Abri ela com delicadeza, como se estivesse abrindo a porta do carro do meu pai. Entrei e fechei a porta rapidamente, com a intenção que ninguém me visse em seguida.

Lá estava eu, no planetário. As luzes de cinema que estavam nas cadeiras inclinadas para cima não deixava as luzes das estrelas brilharem. Subi alguns degraus a fim de encontrar a sala de comando do telão principal. Me sentei na cadeira sob o comando de um maquinário digno de filmes sobre ficção cientifica e tomei a iniciativa de apagar todas as luzes, contrastando ainda mais a via láctea acima de mim. Mexi naquela máquina por alguns segundos, até entender os seus comandos para ir aonde eu quiser naquele universo. Peguei um controle remoto que estava ao lado da máquina e pude controlar os movimentos no telão usando-o. Logo pude sentar-me em um dos bancos da plateia e ter o comando do planetário em minhas mãos com aquele controle.

Aumentei a resolução das luzes, para que aquele lugar ficasse iluminado apenas com o brilho no telão. Mudei diversas vezes a posição da via láctea a fim de encontrar a terra e a lua, mas a aproximação não era suficiente. Aquele planetário não mostrava os planetas, apenas as galáxias e constelações. Pude ver as constelações do zodíaco, como o meu livro de astrofísica para iniciantes indicava. Cada constelação tinha uma cor diferente para serem identificadas. A mais interessante era a de Virgem. Não apenas por ser a do meu signo, mas por ser considerada uma constelação de Inverno, assim como Libra, Aquário, Sagitário, Capricórnio e Escorpião. Se eu soubesse que depois de tantos anos Plutão não seria mais considerado um planeta, a astrologia não me interessaria.

Por fim, comecei a bisbilhotar o máximo que pude entre as constelações de Touro e Gêmeos, tento uma visão ampla e solitária da constelação que me agraciou com essa curiosidade mutua. Ela era tão brilhante e com uma simbologia tão fácil de ser identificada, como se fizesse parte do zodíaco – poderia ser o décimo terceiro signo. Como os astrólogos, tão natos em fé e em pseudociências, podem explicar a identidade de um astro com tão pouco estudo preciso? E os cientistas, natos em verdades exatas, podem explicar suas diversas histórias verdadeiras durante milhões de anos a fundo?

Ao tentar refletir a possível resposta que cada uma dessas pessoas dariam, fui assustado pelo som da porta sendo aberta, revelando a luz do Science Center do outro lado. Desliguei o telão na hora, assustado com a possível aparição do vigia ou das pessoas que marcaram horário para visitar.

 

- Mustaine? – perguntou a pessoa do outro lado.

 

Não fiz questão de responder. Era provável que essa pessoa trabalhasse no museu e soubesse o meu nome porque eu assinei ele no livro de visitas.

 

- Eu sei que é você, David.

 

Me abaixei lentamente na poltrona, a fim de que não me visse entre naquele escuro.

Ouvi passos daquela pessoa subindo o pequeno corredor de escadas ao lado das poltronas e indo em direção a fileira que eu estava sentado, no meio da sala. A pessoa se sentou ao meu lado, como se já soubesse onde eu me encontrava. Senti que ela pegou o controle da minha mão direita, ligando o telão acima e iluminando o local com a luz das estrelas.

 

- Não imaginei que pudesse encontra-lo aqui. – disse a pessoa, me fitando.

 

Era o Sr. Hetfield. Não pude acreditar. Fiquei mais assustado por tê-lo visto naquelas condições que ele ter me encontrado nesse lugar.

Impossibilitado de me mexer pelo susto, apenas disse:

 

- S-S-S-Senhor...

- O que faz aqui, garoto?

- Eu devia perguntar isso ao senhor. – respondi, me recompondo.

- Eu estava doente, fui me consultar e voltei do consultório agora.

- E decidiu vir ao Science Center doente?

- Na verdade, estava passando aqui na frente quando vi você descer do ônibus e andar lentamente pelo pátio, até subir nas escadas e entrar. Pensei em voltar pra casa, mas não tenho nada para fazer em casa.

- Parece comigo. – comentei, murmurando.

- Procurei por você pelas salas de artes até acha-lo aqui.

 

O assunto se encerrou. Obviamente não havia nada para lhe dizer. Estava tão vermelho ao imaginar que ele havia me procurado que minha língua chegou a travar, não saindo do lugar um momento sequer.

 

- Você não respondeu a minha pergunta. – disse ele, inclinando-se para cima, observando as estrelas.

- Não tinha nada para fazer. – comentei, retornando a olhar as estrelas.

- Escolheu um bom lugar.

 

Sorri pelo canto esquerdo da boca. Naqueles poucos segundos que ficamos calados, observando as estrelas, me senti cada vez mais intimo dele, afim de perguntar-lhe qualquer coisa que viesse na minha cabeça - só não queria faze-lo. Queria mantê-lo ali, do meu lado, sem deixa-lo sem graça ou incomodado. E, naquele silencio, ainda éramos apenas professor e aluno, e não aquilo que eu pensava ser.

 

- Eu penso nessa constelação desde que o senhor me mostrou. – comentei, sem pensar.

- Imaginei que sua história pudesse ser compatível com a dela.

- E é. – respondi, murmurando.

 

O silêncio retornou. Senti que ele não estava ali por causa de mim, ou por causa das constelações. Senti que ele estava ali pelo mesmo motivo que eu estava. Ele poderia ter tantos problemas como eu, ou até os mesmos.

 

- Há quanto tempo estamos aqui, Dave? – perguntou ele, com o olhar fixo no telão.

- Já se passou dez minutos desde que o senhor chegou.

- Eu te procurei durante tanto tempo nas salas deste museu que acabei perdendo o horário de voltar pra casa. – comentou ele, levantando a parte de cima do seu corpo da poltrona.

- O senhor vai embora? – perguntei, em um tom quase contestador.

- Infelizmente. – respondeu ele.

 

“Não vá” pensei, estremecendo por dentro.

Senti, enfim, que os meus problemas voltaram a pesar tudo de uma vez nas minhas costas. Cerrei meu punho ao vê-lo tentando se levantar da poltrona.

 

- O senhor não pode ir. – disse eu, destemido, sem pensar novamente.

- Porque não? O que houve?

 

Naquele momento, tomei os demorados dez segundos de coragem para fazer algo que em sã consciência jamais faria. Me aproximei de sua poltrona e beijei-o apaixonadamente, deliciando-me de cada instante como se não houvesse reação alguma após tal ato. Ele logo relutou, como era de se esperar. Vi ele tremendo e me fitando com surpresa no olhar. Levou os dedos da mão esquerda até o seu lábio inferior, contestando com os olhos. Para a minha surpresa, aquela relutância não durou muito tempo, e ele logo se aproximou da minha poltrona, tornando a levar os seus lábios aos meus novamente.

Desta vez o ato foi caloroso. Pude sentir seu jeito bruto dentro de mim, como se fosse a minha droga favorita. Ele passou sua mão direita na minha nuca, trazendo-me para mais perto. O encosto que separava uma poltrona da outra atrapalhou a nossa aproximação, então puxei-o para trás, liberando o caminho para os nossos corpos se encontrarem com mais proximidade. Vi-o tirar sua mão da minha nuca e despir-se aos poucos, jogando no chão sua jaqueta de couro e o cinto da calça. Não pude me controlar ao ver isso. Cerrei meus dois punhos com força, com medo do desejo que me cercava.

Ele foi descendo os seus beijos aos poucos, indo para o meu pescoço e passando suas mãos quentes no meu corpo por baixo das roupas. Mordi meu lábio inferior e fechei os olhos, esperando sua próxima ação. Foi tirando minha jaqueta e depois minha camisa, deitando-me em seguida. Ao me deitar naquela poltrona, deixei claro que não me responsabilizava pelos meus atos - e ele também.

Ele tirou sua camisa. Não vi-o fazendo isso, mas senti, pois ele permanecia parado, entre as minhas pernas parcialmente abertas. Lá estávamos nós dois, apenas de calça, prontos para cometer um ato que não poderia ser desfeito. Um elo que não seria quebrado.

Tirei minha calça, fitando seus olhos azuis que maliciavam os meus a cada momento. Ele também tirou as suas, deixando a mostra seu sexo já ereto. Após vê-lo nu, fechei meus olhos e mordi meus lábios inferiores, afim de mostrar-lhe concordância com o que iria fazer. Ele tirou minhas calças, revelando também o meu membro pulsando com desejo.

Deitou em cima de mim, fazendo-me sentir sua respiração ofegante em meu ouvido esquerdo e penetrando-me logo em seguida. Fiz uma careta, como já esperava, mas era exatamente aquilo que eu queria. Nada podia ser melhor que aquele momento; O momento em que ele estava dentro de mim.

Foi movimentando-se lentamente enquanto mordiscava meu pescoço com prazer.

Por apenas um momento, olhei nos olhos dele. Este momento foi pouco antes do ápice, quando ele encostou a sua cabeça na minha e eu senti sua respiração lenta ir de encontro ao meu rosto. Fitei-o com amor, com calor e muitos outros sentimentos que eu não descreveria com facilidade. Depois de fita-lo, fechei os meus olhos, gemi e cheguei ao meu extremo junto dele.

Curtirmos este momento com muita proximidade. Deixei de sentir seu corpo próximo ao meu, e ele voltou a se sentar na poltrona ao lado.

Eu estava nu, com a minha nudez revelada pelas luzes das estrelas acima da gente. Ele, também nu, com uma expressão diferente da minha, completamente agraciado com aquele momento como se fosse uma performance, e não a junção de sentimentos que eu acreditava ter sido.

Me senti mal.

A culpa veio misturada com o medo e aquilo me martirizava a cada momento.

Levantei-me da poltrona, procurando minhas roupas em seguida. Estava tão envergonhado que decidi desligar o telão brilhante, fazendo com que a cápsula virasse uma escuridão sem ponto de fuga.

 

- Hey, Mustaine. – disse ele, sentando-se na poltrona após o desligamento das estrelas.

 

Permaneci quieto, vestindo minhas roupas e procurando meu sapato que ele havia jogado pra longe.

 

- O que está fazendo? – perguntou ele, apertando o meu braço.

- Eu tenho que ir. – respondi, nervoso com a situação.

- Fique, por favor.

- Não devíamos ter feito isso.

- Mas fizemos.

 

Me sentei na poltrona após por minhas calças e cobri os meus olhos com a mão direita.

 

- Quero sua companhia, Dave. – disse ele, em um tom que eu jamais havia ouvido sair de sua boca.

 

Senti meu coração pulsar novamente. Um sorriso escondido queria aparecer no meu rosto, mas aquele não parecia ser o momento certo.

 

- Podemos nos ver algum dia desses? – perguntei, respirando fundo.

- Quando quiser.


Notas Finais


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