História Noir - Especial Natal

O trautear era baixo, mas tão melódico e hipnotizante como as luzes decorativas penduradas nas árvores na rua. A música em si era facilmente reconhecida, "I'll be home for christmas" e a dona da voz, Helena Cole, a sua assistente à apenas quatro meses, a quem tinha deixado claro que não era preciso aparecer na semana de Natal. Mas ali estava ela, acabando os últimos retoques na árvore de Natal que Gabriel não sabia da existência, enquanto cantava aquela música e por mais que Gabriel gostasse de a observar a trabalhar tão concentrada no que trabalhava que a fazia esquecer do mundo à sua volta, ele precisava de captar a atenção da mesma.

-Pensava que tinha deixado claro que não era preciso nada disto. -diz Gabriel desencostando-se da beirada da porta, donde a esteve a observar, apanhando-a desprevenida

-Eu sei o que disse e peço desculpas por estar a ir diretamente contra as suas ordens chefe, mas achei que este lugar precisaria de um toque mais natalício. -responde-lhe Helena com um dos maiores sorrisos que Gabriel já tinha visto

-Já disse milhares de vezes para não me chamar de chefe. Por favor, é demasiado formal para mim. O meu nome é Gabriel, não 'Chefe' afinal de contas. -brinca Gabriel com um leve sorriso nos lábios, fazendo uma pausa para admirar a decoração feita por Helena antes de continuar- De onde vieram as decorações todas? Há anos que não vejo nem uma bola de Natal.

-A Rose ajudou. -explica a mulher, acabando por pôr a peça final da árvore- Voilá! Então? O que me dizes? O que achas?

-Nada mal.

-O quê? Só um 'Nada mal.'? -pergunta Helena imitando Gabriel numa expressão exageradamente rabugenta

-Eu não disse dessa maneira. -refere Gabriel, fingindo-se ofendido por tal ação

-Pois não. Foi mais assim! -exclama Helena antes de repetir a expressão ainda mais exageradamente do que antes, obrigando Gabriel a rir-se

-Toché! -exclama Gabriel sentando-se no sofá- Mas porquê o esforço? Para não falar da tua presença aqui!

-A minha presença incomoda a sua majestade? -brinca Helena sentando-se na poltrona à frente de Gabriel

-Não. Nada disso.

Pelo contrário.

-Então o quê? -pergunta Helena

-Não existirá alguém por aí à tua espera para passar o Natal contigo? -pergunta Gabriel de alguma maneira temendo a resposta à pergunta

-Talvez. Mas ele ou eles terão que esperar até o próximo Natal, pois este eu irei passar aqui para dar alguma luz a este rabugento aqui sentado à minha frente!

-Hey! -exclama Gabriel rapidamente se jugando para cima de Helena, atacando-a com cócegas que rapidamente pede que a deixe

-Gabriel! Para! Por favor! -exclama Helena quando consegue puxar algum ar para os pulmões

-O quê? Não consegui ouvir!

-Gabriel Noir! -grita Helena antes de ser atacada novamente- Por favor!

-Mas o que vêm a ser isto? -pergunta Rose entrando no escritório com uma bandeja nas mãos antes de acrescentar uma boca que faz Helena corar apercebendo-se do que Rose se referia enquanto Gabriel a larga e se senta ao seu lado, no braço da poltrona, sem se aperceber do duplo sentido das palavras- Os vossos gritos ouvem-se pelo prédio todo. Talvez queiram falar mais baixo vocês os dois ou ainda vão ter que lidar os vizinhos mais cedo ou mais tarde.

-E o que traz a Rose para nós? -questiona Gabriel tentando ver o que trazia Rose na bandeja, vendo apenas duas grandes canecas em cima da mesma

-Um pedido especial da menina Helena. -trauteia Rose rapidamente se aproximando da secretária para deixar a bandeja

-Em cima da secretária não. -avisa Gabriel, rapidamente se levantando e retirando as canecas de cima bandeja- Pode ficar com a bandeja.

-Claro que posso! -retroque Rose dando-lhe com a mesma de leve da cabeça dele antes de se ir embora- Espero que gostes. A receita foi ali da querida Helena.

Com isto a velha se vai embora, resmungando para si mesma depois de piscar o olho para Helena que aceitava uma das canecas que Gabriel possuía.

-Chocolate quente. -murmura Gabriel para si mesmo apercebendo-se o conteúdo das canecas

-Sim. Uma receita antiga de família. -responde-lhe Helena enquanto começava já a beber o seu- Devíamos mesmo arranjar uma mesa de centro para o escritório. Já que não podemos colocar nada na tua preciosa secretária-.

-E colocaríamos a mesa onde? -pergunta Gabriel demasiado distanciado do momento presente por conta do doce conteúdo da caneca que lhe trazia memórias à décadas esquecidas

-Entre o sofá e a poltrona? Acho que seria um bom lugar. O que achas?

-Se quiseres podemos ir já a comprar. -diz Gabriel rapidamente, despertando para o presente, longe das lembranças que tanto tentava esquecer

-O quê? -exclama Helena, tanto confusa como entusiasmada

-Considera-a como o meu presente de Natal para ti.

-Então parece que terei que repensar o meu presente para ti. -afirma a mulher levantando-se determinada, fazendo Gabriel soltar um leve riso contente e distraído