A luz do Sol entrava fracamente pela janela, filtrada por cortinas brancas e se derramando pelo chão de madeira. Abri os olhos, de má vontade, sentindo como se não tivesse dormido nada. As cobertas ao meu redor estavam bagunçadas e antes mesmo de levantar, sabia que meu cabelo devia estar um desastre.
Pisquei e arrisquei olhar pra cima. Símaco estava de pé na janela, olhando para a rua por uma pequena brecha nas cortinas de algodão. Por algum motivo, não consegui falar nada. Só o encarei, observando sua expressão melancólica e roupas desalinhadas. Então ele se virou e percebeu meu olhar.
– Ah, bom dia. Não vi que você tinha acordado.
Funguei, sonolenta e tentei me situar e lembrar do dia anterior. Logo antes de adormecer, eu tive a ideia de falar com Arabella... mas como faria isso com ele por perto o tempo todo?
— Ei, você está se sentindo bem? – ele perguntou, franzindo as sobrancelhas e chegando mais perto. Estendeu a mão para o meu rosto e automaticamente desviei pra longe, como um reflexo.
— Ah, sim. – menti – Só estou com sono.
Ele me lançou um olhar surpreso mas logo mudei de assunto, olhando para o chão.
— A quanto tempo você está acordado?
— Não muito. – ele respondeu vagamente, voltando-se para a janela de novo com um ar pensativo e cansado. Era claro que também não tinha dormido direito. Desde o dia anterior, quando brigamos na mesa, as coisas estavam estranhas. Eu podia quase tocar a tensão no ar. E eu estava cada vez mais curiosa sobre a maldição que ele se recusava a liberar informação.
Ele virou o rosto na minha direção e nos encaramos em silêncio por alguns segundos. Alguma coisa em mim pulava, e meus pulmões queimavam. Eu queria desviar o olhar mas não conseguia. Quando estava prestes a explodir, ouvi a campainha e olhei para a porta do quarto.
— Eu...vou ver quem é. – levantei rapidamente. Ele ainda não tinha tirado os olhos de mim, apesar da campainha. Sai do quarto e desci as escadas tentando deixar meu cabelo vagamente decente. Ao passar pela mesa da cozinha, notei um pequeno papel amarelo e conjecturei que devia ser mais um aviso de minha mãe de que passaria o dia no hospital. Agradeci mentalmente por essa dádiva, que assim permitia que eu escondesse a suspensão por mais algum tempo.
A campainha tocou novamente. Abri a porta só pra querer fechá-la de novo ao ver o rosto de Sofia me esperando.
— Ah...é você. – fiz uma careta – O que você quer?
Ela encarava o chão, parecendo aborrecida e melancólica ao mesmo tempo. Murmurou:
— Quero pedir desculpas.
Um silêncio se abateu, quebrado apenas pelo canto baixo dos pássaros de inverno, e o vento suave que se infiltrava pelo meu casaco leve e me deixava com frio. Ela olhou pra mim com relutância, parecendo ainda mais irritada.
— Não vai falar que me perdoa? – perguntou, e eu estreitei meu olhar.
— Perdoar o que, exatamente?
Ela fez um biquinho, percebendo o quanto eu estava aproveitando aquele momento. Empinou o nariz, tentando conter um pouco de dignidade em si mesma.
— Desculpe por ter te tratado de forma tão ruim no café, e na escola, e pelo tapa... – ela continuou - ...e por ter duvidado da sua inteligência quando você foi bem na prova, e aquela vez no quinto ano quando...
— Ok, chega. – levantei a mão, fazendo-a parar. Então percebi que apesar de sua expressão esnobe e convencida, ela estava sendo sincera. Afinal, as desculpas de Sofia era peculiarmente raras.
Mas ainda assim... eu sempre a perdoava. Talvez fosse a hora de parar com aquilo. Talvez fosse a hora de mostrá-la que não se pisa na melhor amiga de infância tantas vezes sem consequências. Não era a primeira vez que ela me tratava daquele jeito, e eu tinha certeza de que se a perdoasse tão facilmente, não seria a última.
— Eu cansei. – disse, olhando-a profundamente nos olhos – Cansei mesmo de ser tão maltratada por você. Talvez você deva ter mais um tempo pra pensar no que faz.
Então tentei fechar a porta, mas fui impedida por um sapato delicado cor-de-rosa. A abri novamente.
— Você vai mesmo fazer isso? - ela perguntou, claramente magoada.
— Eu já fiz. – respondi, tentando parecer neutra – Talvez assim você aprenda que eu não sou uma boneca de pano.
Então, antes que ela pudesse me impedir de novo, fechei a porta direto em sua expressão chocada. Ao me virar, me deparei com Símaco de pé na minha frente, o moletom desalinhado e uma cara desapontada no rosto.
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