História O fantástico bosque - Capítulo 1 - Aoita

Na calada da noite, em uma casa afastada da cidade, um homem apagava mais uma bituca de cigarro em seu cinzeiro enquanto observava o céu estrelado. Esse homem, Suzuki Akira, esta noite era vítima de insônia, talvez fosse pela sua recém saída se uma rotina estressante ou talvez fosse apenas por não estar adaptado ao lugar.

O lugar em questão era uma cabana grande e bonita, toda de madeira com acabamentos bem trabalhados e de ar rústico. A cabana ficava no meio de um belo bosque de árvores antigas em uma vegetação variada.

Naquele dia, Reita, como era conhecido,acabara de se mudar para a cabana, pois decidido a ter uma vida mais tranquila, havia largado um posto respeitável de uma grande empresa para seguir seu sonho de ser escritor. Aquela noite agradável era sua primeira em um ambiente tão silencioso e isso o causava estranheza.

Na varanda de seu novo lar Akira ficou por um bom tempo, aproveitando os sons da natureza e a vista linda da noite estrelada, até que uma melodia bela chegou aos seus ouvidos. O Suzuki estranhou aquilo, em um lugar tão isolado não devia haver ninguém, então, se perguntava da onde vinha a melodia tão bela.

Olhando mais para dentro da mata, pode ser um garoto loiro, tocando uma ocarina e rodopiando ao ritmo da música. Akira ficou curioso. Quem era o garoto e o que fazia ali?

Determinado a achar respostas ao seu questionamento, o homem andou em direção ao garoto que sumia em direção a floresta. Por sorte, Reita tinha seu celular em mãos e usou a lanterna deste para seguir o garoto. O menor sumia por entre as árvores e o outro o seguia como podia, hora seguindo o menino, hora seguindo o som de sua ocarina. Andaram bastante até chegarem em um encantador riacho. A luz da lua iluminava as redondezas do riacho que não possuíam árvores, a água era como uma piscina com luzes ao fundo tornando a água brilhante e vagalumes enfeitavam o local. Mas não era a beleza do lugar que encabulou Reita.

Do lado de uma rocha repousava um homem, mas não um homem qualquer, e sim um homem metade cavalo que observava o garoto loiro com um brilho amoroso no olhar. Sentado na pedra tinha outro homem, mas dessa vez, era metade bode com as pernas do animal e chifres também. Na água, um belo rapaz sorria e atrás de seu tronco uma cauda de peixe podia ser vista. Os três agora citados, batiam palmas no ritmo da música que tocava o garoto loiro, este que Reita agora via que tinha orelhas anormalmente pontudas.

Escondido por entre a mata, Akira observava as criaturas com tamanho espanto que sequer podia se mover. Os seres riam e cantarolavam ao som da melodia e logo mais animais chegavam para participar da bela festa. E as três criaturas que antes já estavam ali começaram a cantar.  

Maware maware maware yo
Mizuguruma maware
Mawatte ohi-san yonde koi
Mawatte ohi-san yonde koi

Tori, mushi, kemono
Kusa, ki, hana
Haru natsu aki fuyu tsurete koi
Haru natsu aki fuyu tsurete koi

Maware maware maware yo
Mizuguruma maware
Mawatte ohi-san yonde koi
Mawatte ohi-san yonde koi

Tori, mushi, kemono
Kusa, ki, hana
Saite miyoute shinda to te
Umarete sodatte shinda to te

Kaze ga fuki ame ga furi
Mizuguruma mawari
Tengurii inochi ga yomigaeru
Tengurii inochi ga yomigaeru

(Tradução)

Gira, gira, gira
Roda de água, gira
Gire e chame o senhor sol
Gire e chame o senhor sol

Pássaros, insetos, bestas
Grama, àrvores, flores
Traga a primavera e o verão, outono e inverno
Traga a primavera e o verão, outono e inverno

Gira, gira, gira
Roda de água, gira
Gire e chame o senhor sol
Gire e chame o senhor sol

Pássaros, insetos, bestas
Grama, àrvores, flores
Flor, frutifique e morra
Nasça, cresça e morra

Ainda assim o vento sopra, a chuva cai
A roda de água gira
Vidas vêm e vão no seu tempo
Vidas vêm e vão no seu tempo

Se recuperando do choque, Reita pretendia apenas sair sem ser percebido, mas acabou pisando em falso e caiu, fazendo barulho e, consequentemente, chamando atenção dos seres estranhos e espantando os animais.

– Quem está ai? – O ser metade homem metade cavalo, um centauro, levantou-se e se pôs em alerta, andando até o garotinho loiro e ficando perto do mesmo. – Apareça!

Então Reita se levantou e saiu das sombras das árvores, caminhando um pouco pra frente. Nesse momento, o garoto loiro e o rapaz no riacho soltaram exclamações baixas enquanto os outros dois seres se postavam em defesa deles.  

– Quem és e o que fazes aqui? – O centauro perguntou, seu semblante era sério e, até mesmo, assustador, intimidando Reita que permaneceu calado. – Responda!

O centauro gritou e passou a andar em direção do humano, mas teve seu braço delicadamente segurado pelo loirinho, que o pedia para ter calma.

– Deixe-o, Kai. Ele deve apenas ter seguido a música, eu fui um pouco longe esta noite, a culpa é minha. – Disse o pequeno elfo, suas bochechas e orelhas estavam vermelhas em constrangimento e sua voz saiu baixa, mas não menos bonita.

– Ruki! Já te dissemos para não ir para longe, agora temos um humano aqui! – o sátiro, que se mantinha calado até o momento, se pronunciou, repreendendo o amigo.

– Eu, sei, desculpem-me. – Disse tristonho, sendo abraçado pelos ombros pelo centauro denominado Kai.

– Olhem, eu não queria atrapalhar nada, apenas vim por curiosidade, juro que não conto nada a ninguém! – Reita disse, gaguejando levemente em nervosismo, não queria problema com ninguém, muito menos com criaturas fantásticas.

– Eu vou levá-lo de volta à sua casa. – O sátiro disse, caminhando até o humano e segurando em seu braço, puxando levemente o outro pelo caminho de volta.

– Cuide bem do humano, Aoi. – O tritão que nadava no riacho disse em tom malicioso, sendo repreendido pelo sátiro que murmurou um “cala-te, Uruha”.

Seguiram em silêncio pelo bosque, Reita cheio de perguntas assim como Aoi. Acabou que as dúvidas de Reita falaram mais alto então ele decidiu finalmente se pronunciar.  

– Vocês… Er…?

– Se somos criaturas reais? Sim. – respondeu o moreno, rindo de leve ao terminar. – Se mudou para cá recentemente?

– Na verdade me mudei ainda hoje. Sou Suzuki Akira, mas me chamam de Reita. – O loiro disse, se apresentando. Por entre as árvores, a cabana de Akira já podia ser vista.

– Sou Aoi, e espero que como um novo morador desse bosque seja um apreciador de mistérios, Reita. – Aoi disse, deixando o outro curioso. O loiro apenas desviou o olhar por um segundo para sua casa, e quando tornou a olhar para o lado Aoi já não estava mais lá, o que entristeceu Reita, achando que jamais veria o outro novamente.  Porém, ele estava enganado, aquela seria apenas a primeira vez de muitas que ele encontraria Aoi e seus amigos fantásticos.

•◈•

Reita acordou com o canto dos pássaros, se espreguiçou e levantou de sua cama. Foi ao banheiro e fez a sua higiene matinal antes de rumar a cozinha, onde o tilintar de pratos e talheres se faziam presentes. Ao chegar no cômodo, pôde ver Aoi arrumando a pia e o café da manhã na mesa. O loiro então andou até o sátiro e abraçou-o por trás, beijando sua nuca carinhosamente.  

– Bom dia, meu amor. – Murmurou o humano, sorrindo ao notar os pelos do outro se arrepiarem com sua voz e toque.

– Bom dia, querido. Fiz o café para nós dois. – Aoi se virou, ficando de frente para o namorado, deixando que o mesmo visse o sorriso em seu rosto.

– Sabe com oque eu sonhei hoje? – Reita perguntou, recebendo um questionamento em resposta. – Com a noite em que nos conhecemos.

– Ah, nem parece que já fazem três anos, parece que foi ontem. – Disse Aoi, antes de beijar os lábios do companheiro com amor. Depois do beijo se findar, sorriram um para o outro e se sentaram à mesa para tomar o café da manhã conversando animadamente, com uma enorme diversidade de assuntos que sempre tinham. Passaram a tarde juntos e de noite se reuniram com os outros no riacho, para mais uma noite passarem em alegria.

Já se faziam três anos da noite em que Reita se isolara da cidade, que conhecera Aoi e descobrira que era um grande apreciador de mistérios, principalmente, os que envolviam o bosque onde vivia.