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História O Herdeiro do Fogo - Dezoito


Escrita por: bleedingrainbow e grouwundzero

Notas do Autor


Oi, amores, tudo bem? Semana que vem não haverá novo capítulo, voltando na próxima semana. Para não ficarmos muito apertados nesse começo de ano profissional e letivo decidimos deixar esse intervalo, que provavelmente vai se repetir. Mas continuaremos postando, viu? A história vai muuito longe. Só o intervalo será maior por um tempo.

Espero que gostem do capítulo! Abraço!

Capítulo 18 - Dezoito


[Eijiro Kirishima]

Perceber os pensamentos que estava tendo com relação a Bakugo me fez acordar do gostoso transe em que me encontrava. Meu peito subia e descia rápido, tentando recuperar o ar que perdi quando o metal gelado tocou meu rosto quente. Ainda o olhando nos olhos dele estendi minha mão a ele, um sinal de trégua. 

— Admito, você venceu… Agora me ajuda a levantar. — Tomei coragem para falar e sorrir pra ele foi automático.

[Katsuki Bakugo]

Não compreendi de pronto a expressão dele pelos momentos que precederam aquela sua frase. Ele pareceu ter aceitado uma derrota contra a qual ele lutou habilmente até o fim quase como se eu o tivesse dando um presente, como se do começo ao fim tudo o que viesse fosse sublime. Não senti, todavia, como se apenas tivesse se rendido, mas sim quase como parte daquela paixão que senti vinda dele e que tanto me enchia de emoção aquele tempo todo. Eu nem sabia o que era mas parecia que me sentia corresponder. Eu ainda sorria para ele e estendi-lhe a mão.

— Você já é digno que eu tire a espada já no começo da batalha, devo te dizer. —  Ele a segurou e eu o puxei na minha direção para que ficasse de pé à minha frente. — Também digo que, contudo, só o fiz porque você lutou com garra o suficiente para me obrigar a fazê-lo. Vi como o modo legítimo de te vencer ali.

Ao que ele parou ali diante de mim, eu notei que sentia algo completamente estranho se espalhando pelo meu peito. Era um pouco ainda da minha animação por aquela batalha divertida, mas tinha alguma outra coisa. Não fazia sentido nenhum me orgulhar de outra pessoa; se qualquer coisa, eu deveria estar orgulhoso de mim por tê-lo ensinado tão bem. De algum modo, porém, eu sentia que não era vaidade. Eu admirei a garra que já sabia existir dentro dele e que estávamos fazendo transparecer cada vez mais. Ele era alguém que eu iria querer ter ombro a ombro em um campo de batalha. Ele me respeitava e respeitá-lo se mostrava cada vez mais fácil, quase instintivo. Ele era... ele era mesmo especial. 

Observei-o bem por aquele segundo, como tinha suado, como tinha dado tudo de si. Os fios que se soltaram da fita caíram à frente de seu rosto e colavam nele como se refletissem, vermelho contra o róseo de suas bochechas, o ar indo e vindo forçoso por lábios também avermelhados que ele tinha. Emendei mais uma frase depois de um suspiro.

— Você não é nada mau, Kirishima. 

Estiquei a mão para o rosto dele para afastar aquelas longas mechas que entravam no caminho de seus grandes, brilhantes olhos de rubi para deixá-las atrás de sua orelha, e foi apenas quando minha luva tocou o rosto dele que eu percebi que nada naquilo tinha qualquer sentido.

O que diabos eu estava fazendo?

— Hm, — limpei a garganta e desci aquela mão para o ombro dele — vire-se, vou te ajudar com as fivelas da sua armadura.

[Eijiro Kirishima]

Se ele não estivesse segurando minha mão, com toda certeza não teria me levantado. Suas palavras fizeram minhas pernas tremer, pode parecer exagero, mas pra mim significava muito ser reconhecido por ele. Ouvi-lo dizer que o obriguei a usar sua espada e que ele viu que essa era a forma legítima de me vencer, foi além recompensador. Estava feliz, orgulhoso de mim mesmo. A cada dia me sentia mais perto de ser alguém digno de lutar lado a lado com ele. Tão próximos no campo de batalha quanto estávamos agora que me levantei.

Surpreendi-me com o seu toque, sutil e delicado apesar das luvas. Meus olhos arregalados enquanto ele gentilmente tirava o cabelo do meu rosto e o prendia atrás da minha orelha. Não esperava uma atitude tão doce e cuidadosa vindo dele, mas seus toques eram sempre bem vindos. Sua mão desceu até meu ombro, ele parecia desconcertado e isso me fez corar ainda mais, sem falar nada apenas me virei de costas e puxei meu cabelo para frente, não queria que enroscasse nas fivelas como já aconteceu quando fui tentar fazer isso sozinho. Livre da minha armadura, voltei a me virar de frente para ele.

— Sei que não precisa, mas quer ajuda pra tirar a sua? — Perguntei enquanto me livrava das luvas.

[Katsuki Bakugo]

Eu realmente não gostava que mexessem em minha armadura, mas sem me dar conta disso naquele momento virei-me e deixei que soltasse a minha - notei apenas quando a presença dele às minhas costas me fez arrepiar. Esquisito. 

— Está bom assim. — Eu resmunguei quando a mais difícil das fivelas estava solta e já dei um passo adiante. 

Nós ficamos na presença um do outro tão fácil nas últimas semanas que percebê-lo perto chegava a ser massacrante, porque nem o percebia. Notava sua falta, ao invés. 

— Deixe um pouco de água fria em seu ombro e braço para evitar os hematomas. Mas ainda bem que não deixei nenhum sinal no rosto do príncipe aniversariante. A roupa para o baile deverá esconder qualquer marca.

Liberei a deixa caso ele quisesse falar de seu aniversário. Queria mais informações sobre como estava sendo, apesar de ele já ter me dado as informações úteis. Eu só... Queria saber o que ele estava achando. Por alguma razão. Por mais imprático que isso fosse.

[Eijiro Kirishima]

Aproximei-me e o ajudei com as fivelas da sua armadura, teria ajudado a remover as placas como ele fez comigo, mas logo depois que abri a fivela mais inacessível, disse que já estava bom então me afastei. Um sorriso bobo tomava conta do meu rosto, enquanto o via se livrar daquele peso extra. Sabia que Bakugo não costumava pedir e nem aceitar ajuda de ninguém, então para ele me permitir ajudar e me aproximar tanto, devia significar alguma coisa… talvez confiança?

—  Não sei como a roupa vai ser, o alfaiate vem hoje depois da aula de dança tirar minhas medidas e ouvir meus pedidos… Estou pensando em fazer uma coisa mais simples, com menos babados e sem aquela pompa toda das roupas formais, me incomoda demais. De qualquer jeito, duvido que meus ombros e braços vão ficar à mostra, então os hematomas não são um problema… — Enquanto falava comecei a alongar meus braços e ombros na intenção de relaxá-los pelo menos um pouco, quando chegasse no castelo, pediria pro Hanta preparar um banho bem gelado e ficaria uns bons minutos lá de molho.  — Não vejo a hora do baile chegar, espero poder te fazer companhia e te apresentar direito para os meus amigos… Te apresentaria pro meu irmão também, mas ele deve passar o baile inteiro com a Senhorita Nejire.

[Katsuki Bakugo]

Tentei imaginá-lo em mangas bufantes e realmente quis rir. Nunca vou entender essa tal de moda.

— Não vou ser sua melhor companhia, estou certo de que ainda não sou muito bem-vindo no Palácio. Já espero que não deva gastar seu tempo em minha companhia, tendo todos querendo um pedaço do ilustríssimo aniversariante. Meu convite é padrão para os cavaleiros. E não que eu quisesse ir de todo modo. — Passei por ele como se para ir reunir as armaduras em uma pilha, e nisso acertei o ombro dele com o meu em um empurrão para provocá-lo. — Mas ai de você se não me convidasse.

[Eijiro Kirishima]

— Claro que eu te convidaria, meu pai não ficou muito feliz, só que como é meu aniversário deixou passar… Mas já que não quer ir, e nem me fazer companhia, posso retirar seu convite, o que acha disso?   — Virei-me para ele, braços cruzados sobre o peito e sobrancelhas arqueadas, retribuindo sua provocação.

[Katsuki Bakugo]

Cruzei os braços. Ele estava mesmo me desafiando?

— Ah, é? Faria isso? Depois de ter me entregue em mãos com aquele seu sorrisinho constrangido e me feito buscar por um presente e polir minha armadura comemorativa o príncipe vai cometer essa desonra quanto à sua palavra? Assim pode sobrar um convite extra e um lugar à mesa para que chame uma senhorita e se entreter tal qual seu irmão?

Eu só o estava provocando, mas percebi que meu tom se transformou de provocativo para ácido na frase final.

[Eijiro Kirishima]

— Você preparou um presente?! Sério?! O que é?! — Perguntei animado, olhos brilhando, e minha voz subindo um tom. Perdi totalmente minha pose, mas a recuperei assim que notei minha falha. Balancei a cabeça e limpei a garganta, voltei a cruzar os braços e endireitei minha coluna. — Se minha palavra não estivesse em jogo, retiraria seu convite só pela insolência… Que senhorita chamaria? Sabe que não tenho interesse e, outra, tenho você como convidado exatamente para me entreter. — Dei as costas para ele e andei alguns passos em direção ao carvalho, parando no meio do caminho para olhá-lo sobre o ombro. — Falando em me entreter, me deve o último capítulo do livro, acha que me esqueci?

[Katsuki Bakugo]

Eu já estava sentindo meu rosto queimar quando ele mencionou aquilo de entretenimento e prestes a ralhar com ele quando se fez a questão sobre o maldito capítulo do livro.

— Você que é o insolente aqui. Estou com cara de seu bobo da corte, por acaso? Eu não te devo entretenimento, tenho só que te contar o resto desse livro estúpido porque você me emprestou mesmo sem eu ter pedido!

Bem, antes falasse de uma vez. Era o maldito livro que ele me emprestou e só eu tinha esse conhecimento agora, por mais absurdo que fosse tal conteúdo. 

Voltei até o grosso tronco do carvalho e ainda trocamos umas cotoveladas e cutucões quando andávamos lado a lado até que sentei-me à raiz da frondosa árvore. Entre aquelas de torcidas havia espaço para que nos sentássemos lado a lado, e o fazíamos às vezes. Em outras estávamos jogando pedras no riacho ou nos alongando, às vezes até deitávamos na grama para descansar ou eu o acompanhava andando até um pedaço seguro. Nunca era muito tempo, porque a manhã estava sempre prestes a chegar, mas era um tempo que destoava do restante de uma forma que eu não compreendia perfeitamente, mas apreciava, ansiava até por como seria discutir com esse imbecil cabeça oca sobre mais alguma bobagem com a qual ele teimava até quando eu estava contando alguma maldita história. 

Recostei-me contra a larga raiz para sobrar espaço para ele. O riacho e um mato baixo era  tudo o que se via à frente até chegar na muralha, acima desta um céu púrpura do amanhecer.

Eu não me demoraria, não daria espaço para antecipação e nem faria a expectativa que o livro gostaria que eu fizesse. Não para uma morte - duas mortes - tolas daquelas. Em nome de todos os dias que passamos ali e gastamos naquela história, contudo, achei que mesmo o mais horrendo dos finais merecia um mínimo de respeito pelo que o precedeu. Então evitei gritar ou xingar e deixaria ambos para minha reação ao final apenas.

[Eijiro Kirishima]

Deixei que passasse por mim e se sentasse primeiro entre as raízes do nosso carvalho. Me sentei ao seu lado como sempre fazíamos quando não estávamos caminhando juntos por aí ou deitados na grama. A história começou de onde paramos, o cavaleiro e seu jovem escudeiro contra o inimigo final, o momento mais tenso e que mesmo com um final previsível me pegou de surpresa. 

O escudeiro, por impulso pulou na frente de um ataque da criatura na intenção de proteger seu companheiro, mas o cavaleiro foi mais rápido e o empurrou, salvando a vida dele mas em troca recebeu o golpe. Vendo seu amado mestre no chão, quase morto, o escudeiro, tomado pela fúria foi com tudo para cima do monstro e conseguiu finalizá-lo, mas sofreu muitos danos e seus machucados só permitiram que ele se arrastasse até o cavaleiro. Os dois morreram lado a lado e de mãos dadas. 

A essa altura eu já chorava inconsolável abraçado ao Bakugo e com a cabeça encostada no seu ombro. Minhas lágrimas molhavam sua camisa, entre soluços, não conseguia formar sequer uma frase para expressar o que estava sentindo. Acompanhar os dois, que começaram como duas pessoas de mundos completamente diferentes, aos poucos se aproximando durante incontáveis treinos e aventuras, só para terminar dessa forma, um dando a vida pelo outro, era bonito e doloroso na mesma intensidade. 

— Esse não pode ser o final, você tá mentindo pra mim… — Foi o que consegui em um breve intervalo que tive, só para voltar a chorar sem parar logo em seguida.

[Katsuki Bakugo]

Eu estava tão furioso àquela altura que nem conseguia medir. Por que aquele livro tinha que ser assim estúpido? Por que Kirishima teve que me dar esse fardo para passar para ele? Por que uma história tinha que acabar assim? Por que o maldito estava chorando por dois imbecis e uma história horrível dessa? 

— Eu bem que gostaria, mas eu não minto, nem se for para te poupar disso. Acha mesmo que eu acho divertido te ver nesse estado? — Puxei o meu ombro um pouco para ver como ele estava e realmente eram lágrimas copiosas. Como podia ser tão tolo? Meu braço ficou atrás do tronco dele com aquilo, então segurei-o como se meu braço apoiasse suas costas, minha mão segurando seu ombro. A voz que mantive foi severa, mas baixa. — Pare com isso! Eles são dois imbecis! Essa história é horrível e eu disse desde o início! Ela não merece essa sua emoção! Eu consigo pensar em pelo menos dez formas de como os dois saírem vivos até com aquela idiotice do escudeiro! Não fique de luto por um imbecil que não quis nem tentar!

[Eijiro Kirishima]

Já esperava por essa resposta, nunca que Bakugo poderia inventar um final desses, se estivesse mentindo pra mim, os dois estariam vivos e o cavaleiro teria vencido aquela criatura de algum jeito bem mirabolante e incrível. Seu braço me envolveu, sentir seu aperto no meu ombro enquanto me puxava para mais perto fez com que as lágrimas aos poucos fossem parando de cair. Permiti-me me aninhar um pouco mais contra ele, foi um ato quase instintivo atrás de consolo e conforto.

Minha cabeça repousava quase no seu peito, podia ouvir seu coração batendo forte e sua voz reverberando, o tom severo porém baixo, não era uma bronca, parecia mais preocupação. Pensar que Bakugo estava preocupado comigo me fez sorrir de leve. 

— O que você teria feito? — Levantei o rosto, secando as lágrimas com a manga da minha camisa.

[Katsuki Bakugo]

— Acha que eu vou contar pra você todo chorão assim? — Com a mão que não estava atrás dele o segurando eu toquei o rosto dele; sequei as lágrimas que ainda estavam ali quase agressivamente. Eu não era lá muito delicado e nem queria ser ali, empurrei as bochechas rosadas dele até. Queria que ele risse do que eu estava fazendo ou brigasse comigo por estar arranhando seu rosto ou qualquer coisa. — Só vou contar para você quando estiver assim, ó. — Apertei a bochecha como se forçasse um sorriso todo torto esperando que fazer aquilo gerasse um genuíno e aquela tristeza pela obra ridícula se dissipasse de uma vez. — Volte amanhã com a sua cara de bobão de sempre que daí eu te conto!

[Eijiro Kirishima]

Bakugo nunca falhava em me surpreender e eu amava conhecer e revisitar cada um dos seus lados. Sei que muitos o viam como alguém distante, rude, difícil de se aproximar e tudo mais, mas nada disso é verdade, não pra mim. Por trás dessa barreira, tinha alguém doce, cuidadoso, carinhoso e que me deixava confortável como ninguém. Conviver com ele é fácil, agradável, até o fato de não poder contar nada sobre ele pra ninguém era bom, éramos o segredinho um do outro. Tudo nosso. 

Já sorria enquanto ele secava minhas lágrimas, a tristeza pela morte dos personagens sendo arrancada a força de mim. Não me aguentei e cai na risada quando puxou minhas bochechas, formando um sorriso todo torto e esquisito… Nenhuma pessoa fazia com que eu me sentisse tão bem como ele.

— Para com isso Bakugo… — Falei ainda rindo, afastando suas mãos do meu rosto. Ele tinha falado sobre voltar amanhã para saber o resto, o que me fez lembrar que teria que ir embora hoje. — Não quero voltar amanhã, quero ficar o dia todo com você aqui hoje — Me afastei do seu abraço e me deitei na grama, apoiando minha cabeça nas suas pernas.

[Katsuki Bakugo]

Olhei para baixo e, ao notar o sorriso doce no rosto dele, suspirei quase como se tivesse trancado a respiração todo esse tempo. 

— Você sabe muito bem que não pode. Quem sabe depois de seu aniversário e de virar um homenzinho poderá decidir melhor sobre o que faz com seus dias, mas eu não apostaria nisso. Ainda vai ficar cada vez mais nas rédeas da família real e de seus caprichos, então não dê-lhes margem. — Escorei minhas costas na árvore e ergui o olhar dele para o horizonte da aurora. Também não queria que ele fosse. — A menos que você vá ganhar de presente um feudo inteiro seu para governar em algum lugar do reino. Nesse caso, eu vou fazer o grande sacrifício de aceitar ser seu general e conselheiro antes que você leve seu próprio castelo à ruína.

[Eijiro Kirishima]

— Seu otimismo é sua melhor qualidade… — disse em um tom irônico, aprendi a falar assim com ele. — Sei que só vai piorar daqui pra frente, talvez aumentem meu tempo com a tutora porque querem que eu me torne o “braço direito” do meu irmão, ou então passem a me obrigar a participar dos encontros oficiais, não sei… Então como não pedi um feudo como presente e você não vai poder ser meu general, quero aproveitar bastante essas semanas de treino… Acho bom não pegar leve comigo — Falava olhando para o céu, a ironia e a brincadeira deram lugar a um ar mais pensativo. 

Não sabia como as coisas seriam depois dos meus dezoito anos. A vida do meu irmão virou de ponta cabeça no dia do seu aniversário, do nada ele passou a ser tratado como um adulto, encheram-no de responsabilidades sem o preparo ideal, fora o casamento e todas as questões diplomáticas implícitas com que ele precisava lidar sozinho… Não queria isso pra mim.

Evitava ao máximo refletir sobre esse assunto, porque, no fundo, sabia que existia uma grande chance dessa coisa especial que construí com o Bakugo ser destruída por pilhas e pilhas de livros e documentos, por viagens chatas que nada tinham a ver com as aventuras que queria ter. Temia que os nossos encontros fossem substituídos por reuniões desagradáveis com aqueles velhos que só ligam para a quantidade de dinheiro recolhida em impostos. Não seria fácil toda essa mudança na rotina. 

O sol começou a bater nos meus olhos, a luz incomodava não só pela claridade em si, mas porque gritava que era hora de voltar. Suspirando, voltei a me sentar na grama e me espreguicei antes de me levantar.

— Minha hora chegou… precisa de ajuda? — Estendi a mão para ele, oferecendo ajuda para ele se levantar também.

[Katsuki Bakugo]

Eu havia esticado minha mão para ele antes de pensar se queria, porque era óbvio que eu não precisava de ajuda para levantar. Pus-me de pé só apoiando de leve na mão que eu segurava e logo a soltei, quando nos encaramos uma vez mais. Seguiu-se um pequeno momento estranho que não sei definir, como se não soubéssemos o que dizer naquele momento, um momento em que percebi que queria dizer demais. Dei as costas para ele em um aceno breve dizendo "então amanhã te conto o que eu faria no lugar desse cavaleiro idiota do livro" e me virei como se me preocupasse com ir recolher as armaduras.

Tinha sido uma madrugada tão intensa, aquele par de horas indo de êxtase a lágrimas, de fúria a placidez, de orgulho a... afeto? 

Olhei para trás e meu olhar cruzou com o dele antes de eu disfarçar de novo e ir recolher as placas das armaduras. 

O mesmo homem que me deu a melhor luta desde que me lembro chorou em meu ombro pela triste sina de uma dupla de cavaleiros ficcionais que se amava. A pureza do coração dele era inegável, em sua energia bruta e em sua inocência intocada. Queria ser capaz de esquecer-me de quando o corrompi naquela noite tórrida e como mesmo naquela ocasião ele fora visceral e intenso. Havia tanto nele que eu era incapaz de compreender, como se sua própria essência e os mínimos dos detalhes. 

Eu passei minha vida só e sempre estive bem assim. Era o ideal, não podia me dar ao luxo de qualquer pessoa me arrastar. De certo modo, nem na minha infância, que dividi com outras pessoas, de mestre a afins, permiti que se aproximassem de verdade. Todoroki, que veio a lutar comigo, de quem relutantemente aprecio a companhia e a quem eu confiaria minha vida, jamais passou disso, do homem ao lado do qual eu lutaria.

Agora lá estamos. Aceitei porque alguém faz parte da minha meta e acho que usei isso como subterfúgio em algumas etapas. Ninguém jamais me tocou do modo que Kirishima fizera, literal e figurativamente. Estava errado? Era o certo? Era como as pessoas se relacionavam? Eu conhecia as etiquetas bem o suficiente para saber que ninguém as respeitava. Eu sabia que todas as regras eram uma piada interna para as pessoas quanto mais elas se afastavam da nobreza. Só que era uma piada que eu notava que existia, porque os via rir, mas não sabia qual era.

De todo modo, duvido que exista algum tipo de etiqueta ou regra de conduta para treinar escondido o príncipe mais novo de seu reino, de talentos inexoráveis, para depois ambos terem sido deturpados juntos por um súcubo, ele o visitar na prisão para oferecer sua misericórdia e por fim tornarem a treinar em prol de um reino digno enquanto trocam histórias fictícias.

O quão Kirishima era único, o era o relacionamento de nós dois, por certo. Doía em meu peito aceitar, como se precisasse partir minha carapaça, mas uma vez lá, o sentimento fazia-se em casa.



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