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História O Herdeiro do Fogo - Sessenta


Escrita por: bleedingrainbow e grouwundzero

Capítulo 60 - Sessenta


[Katsuki Bakugo] 

Era tão satisfatório vê-lo se sujar enquanto comia o peixe e eu sentia que era o mesmo para ele. Eu falava de novo e de novo que depois era só ele se lavar e perguntei se estava vendo alguma tutora de etiqueta ao redor, coisas do tipo para ver se ele parava de tentar ficar incólume pinçando uma carne macia de peixe com dois dedinhos. Ele estava impressionado com estar sujo e aquilo confirmava minhas suspeitas ao mesmo tempo em que me causava alegria justamente poder presenciar a alegria dele. Tudo tão genuíno naqueles pequenos grandes começos. 

Só que ainda eram começos, e eu ria vendo como ele se embananava com um peixe, o que virava vitória quando ele vencia um espinho. Eu tentava explicar, mas logo algum pedaço caía ou ele não segurava direito ou eu via que tinha algum espinho. O peixe dele já estava todo dilacerado e ele tentava saber o que fazer com aquilo. 

— Assim, ó. — Esfacelei o pedaço peixe que estava na minha lasquinha de madeira também.  — Aceita de uma vez que é uma papinha!

Tinha que comer segurando punhadinho mesmo, como um bebê sem dentes. Tinha que lamber os dedos e deixar limão escorrer no chão. Esse era o jeito certo. 

[Eijiro Kirishima]

Ao que terminei de limpá-lo, meu peixe estava irreconhecível, totalmente o oposto do pedaço intacto de peixe que Katsuki tinha em mãos. Ele tentava me explicar como comer, mas não estava dando muito certo, ou eu deixava cair, ou encontrava um espinho perdido, ou não conseguia pegar. Me sentia como uma criança tendo que aprender a comer de novo, foi mais fácil aprender a diferenciar sete tipos de garfo e dez tipos de colher do que usar minhas mãos. 

Tentava copiá-lo, imitar o jeito que fazia. Não estava brincando com a comida, só era engraçado não ter que me desculpar por nada e nem ser repreendido. “Assim, ó”, ele chamou minha atenção e o vi destruindo o seu peixe para ficar igual ao meu. Não posso confirmar, mas tenho quase certeza de que meus olhos brilhavam ao vê-lo fazer tanta bagunça quanto eu. Sorria de imaginar que, se minha tutora de etiqueta visse essa cena, ela com certeza teria um desmaio… Seria esse o meu primeiro ato de negação da coroa? 

Comia os punhadinhos mas relutei um pouco para lamber os dedos, nada que um pouco de incentivo não resolvesse. Devo ter passado a refeição toda sorrindo, ainda mais quando olhava para Katsuki ao meu lado. Tudo começou com um jantar no palácio, e, olhando para o passado agora, posso dizer que foi nessa noite que me apaixonei, sentado à mesa ouvindo suas histórias. Mais um ciclo se iniciava e cá estou eu na mesma posição, me apaixonando de novo e de novo, enquanto jantamos lado a lado para comemorar o primeiro dia de nossa vida juntos.

[Katsuki Bakugo]

Quando terminamos, só a carcaça do peixe à nossa frente, eu apoiava meus antebraços em meus joelhos, apoiando minhas botas no chão, deixando pender minhas mãos imundas entre meus joelhos. E Eijiro estava em uma situação muito semelhante: lambuzado, saciado e feliz. Não era o melhor peixe que já fiz ou comi, mas eu o fiz e comia ali, com ele, então era o melhor peixe que já fiz ou comi.

Tanto que, cheio como eu estava, respirei fundo e, como tinha me proposto, ao que senti meu estômago se assentando contente para digerir, fiz questão de arrotar belíssima e sonoramente, um som para ninguém botar defeito.

[Eijiro Kirishima]

Estava feliz, me sentia completo e, acima de tudo, saciado como nunca antes. Sentado na grama, olhava para o nada, meu corpo já começava a amolecer como se me agradecesse por estar cheio. Teria dormido se não fosse pelo susto que Katsuki me deu. Olhava para ele com os olhos arregalados e a boca aberta, até ser tomado por uma vontade incontrolável de rir. Eu ri alto sem nem tentar me conter, gargalhei até cair deitado na grama.

— O que foi isso? Katsuki, eu não acredito — Falei entre risadinhas que insistiam em me interromper — Como conseguiu?

[Katsuki Bakugo]

Tomou-lhe alguns bons momentos, até fiquei olhando para ele e dei uma risadinha de lado de desafio diante de sua expressão atônita, e segui pra limpar minhas mãos já esperando quando ele iria fingir que estava indignado comigo. Nem essa parte veio, ele nem se deu ao trabalho de fingir. Eu estava pegando o cantil para jogar água nas minhas mãos quando ele caiu na gargalhada

Risadas muito puras o tomaram, ele gargalhou como se fosse a coisa mais engraçada do mundo e só depois notei que derrubei metade da água na terra do chão entre meus pés enquanto o assistia. As risadas dele eram assim, acho que era muito dele ser tão intenso, ser por completo em cada coisa. Eu também ria por reflexo, contagiado, aquele Eijiro com as mãos sujas, cabelo solto ao vento, roupa frouxa e postura errada, tão, tão confortável. Se eu não pulei nele para mordê-lo nem foi porque eu estava lambuzado do jantar, mas porque eu ficava sem reação. Não conseguia conceber que ele me olhasse assim, como se eu tivesse feito algo admirável.

E, quer saber? Isso mesmo, foi um arroto magistral.

— Você acha que é o único capaz de rugir aqui? — Eu disse entre risos também. — É técnica. Tenta aí, manda ver.

[Eijiro Kirishima] 

Apoiado em meus cotovelos, olhava para ele com a expressão mais tola que já devo ter mostrado, e não me envergonho disso, inclusive acho pouco. Seria impossível fazer jus a imensidão de sentimentos que se passavam em meu coração. Katsuki foi o meu primeiro em muitos sentidos, mais até do que consigo pensar e listar, então, não é tão surpreendente assim, que ele tenha sido o primeiro a agir dessa forma na minha frente. Em outros contextos seria considerado uma ofensa grave, um desrespeito sem tamanho, mas entre nós dois, era apenas engraçado. Uma intimidade tão simples, quase infantil, outro exemplo das infinitas formas de liberdade que descobri hoje, mas que pode ser resumida em uma única frase: eu estaria livre e feliz, enquanto pudesse ouvir a risada dele, ainda que isso significasse me sujeitar a esse “desafio”. 

Voltei a me sentar, ainda sentindo a sensação gostosa que vem depois de uma crise de riso, o mundo todo parecia mais leve. 

— Não sei se consigo rugir como você, mas… — Uma risadinha escapou, incrédulo comigo mesmo por aceitar — Mas eu vou tentar. — Era uma técnica nova, que nunca havia ouvido falar ou tido a oportunidade de treinar, o que não me impediu de ter sucesso no final… Quer dizer, depende do sentido que se dá à palavra sucesso. Foi baixo, curtinho e pouco patético? Foi, mas não deixa de ser um arroto.

[Katsuki Bakugo]

Quando vi, agora era eu quem já estava deitado no chão gargalhando.  Aquela foi a cena mais adorável e ridícula e sensacional que eu já vi na minha vida. Que barulhinho mais gentil e estrangulado, a coisinha mais inesperada e ao mesmo tempo mais ideal, eu acho que estava quase aos berros rindo e devo ter até incomodado a Riot, porque acho que a ouvi resfolegar. Que fiasco foi esse, logo por Vossa Alteza Príncipe Dragão Eijiro? Ao mesmo tempo, estava exultante com o fato de que consegui que ele pelo menos tentasse. 

Sem ar, que sensação impossível. Era como se eu pudesse morrer de rir e eu não iria racionalizar aquilo por um instante sequer. Saber que ele ria junto comigo era só o que eu precisava.

— Que orgulho, já consegui corromper sua etiqueta, vamos por etapas. — Respirei fundo, quase conseguindo falar a próxima frase sem interrompê-la com uma risadinha como um soluço. — Continue treinando, você chega lá, meu pupilo. Confio em- — Lá vai mais riso. Limpei meus olhos cheios de lágrimas. — Confio no seu potencial.

[Eijiro Kirishima] 

A reação dele foi além de todas as minhas expectativas. Uma das coisas mais lindas que já tive o prazer de presenciar desde que me entendo por gente, e olha que não é uma competição fácil, entre elas está a primeira vez que o vi sorrir, a visão que tive quando apontou uma espada para o meu pescoço, e também o nosso banho juntos. A risada dele é apenas inexplicável, inconstante, imprevisível e espontânea como o dono. Do tipo que não consegue se ignorar, e só estando morto por dentro para não se contagiar, até mesmo Riot respondeu a ela. Eu só não estava rindo tanto quanto, pois não queria fechar meus olhos e perder um segundo sequer daquela cena rara, dele se perdendo em pura alegria por algo tão pequeno. 

Encantado por cada mínimo detalhe, queria poder eternizar essa cena. O sorriso largo, o jeitinho que os olhos dele ficavam franzidinhos, e as roncadinhas que dava para recuperar o ar, literalmente chorando de rir. 

— Tenho que ficar corrompido o suficiente para não me quererem de volta… Vou arrotar depois de todas as refeições, só andar descalço — agitei os meus dedos dos pés — e viver com a camisa para fora da calça — aproximei minhas mãos da camisa na intenção de puxá-la um pouquinho e dar ênfase no que falei, mas me lembrei do quão sujas estavam e parei no meio do caminho — Mas acho que não posso deixar de lavar as mãos.

[Katsuki Bakugo]

Ainda estava recuperando meu fôlego e não me daria o trabalho de desfazer o sorriso se eu sabia que Eijiro iria esculpi-lo de novo em meu rosto. E lá estava ele, todo relaxado, cabelos desarrumados pendendo sobre os ombros, mexendo os dedinhos dos pés. Que raiva.

Então ele falou e eu ergui a sobrancelha na primeira frase.

— Espera, se você ficar bem corrompido não vão mais te querer de volta? É só isso que custa pra te desprincipezar, você virar um selvagem? Você não vai lavar essas mãos nunca mais. Aliás. — Meti as minhas próprias mãos já molhadas na lama que estava entre minhas pernas desde que derrubei mais água no chão do que precisava para limpá-las. — Venha aqui. 

Eu não queria de verdade sujá-lo com aquela nojeira, então ergui minhas mãos devagar, como se em garra, para dar a ele tempo de reagir ou sair correndo. Só que é claro que eu não sou de fazer ameaças vazias, e é bom ele dar um jeito de escapar porque ai dele se eu o pegar aqui assim.

[Eijiro Kirishima] 

Uh, oh! Conheço esse olhar e essa levantadinha de sobrancelha. Alguma coisa errada se passava naquela cabecinha linda, e eu já estava atento, alerta para qualquer surpresa. É verdade que se eu me tornasse um bárbaro, as chances de me deserdarem são grandes e por isso tentadoras, mas do peixe ao que quer que seja o plano dele, é um salto muito grande que eu não sei se estava disposto a dar. 

— Isso é lama? — Como um gato, me levantei do chão em um pulo, assim que meus próprios olhos responderam minha pergunta — Nem pense nisso… Eu estou avisando. — Minhas mãos já estavam posicionadas à frente do meu corpo, preparadas para segurar as dele em um possível ataque. Katsuki se levantou também e estava em posição para pular em mim. Não vou ser uma presa fácil. — Ai, droga! — Foi tudo o que falei antes de começar a correr das garras enlameadas.

[Katsuki Bakugo]

Lembrei-me da nossa tarde, quando ele tentou me afastar bem assim para não entrar no rio e acabou encharcado. Eu só me sentia desafiado e, bem, quando eu sou desafiado...

Disparamos na clareira ali da margem e entre algumas  das árvores, eu correndo atrás dele. Eijiro era rápido e não tinha medo nenhum de machucar os pés - já me convenci de que ele não os machuca -  mas mesmo assim não era páreo para mim. Fiquei atento caso o rabo resolvesse aparecer de novo pra me repelir, e eu ri que ele não o fez. Como sempre, ele não queria me afastar de verdade. Eijiro queria que eu o submetesse a todo tipo de coisa que o príncipe que resta nele nem sonha em aceitar. Continuamos correndo pela clareira, no máximo até perto de onde o gnomo nos encontrou. 

— Você quer mesmo fugir do grande Katsuki Bakugo, rei dos bárbaros, maior dos rebeldes? — Urrei para ele, já ganhando vantagem com uma arrancada ao que o ouvi rir. — Renda-se de uma vez e eu posso te mostrar misericórdia! 

[Eijiro Kirishima]

Corri com tudo o que tinha. Sem me importar com o chão irregular ou se pisaria em algo que poderia me machucar, estávamos brincando de pega-pega, eu só queria fugir e me sentir vivo com o vento bagunçando ainda mais o meu cabelo. Vez ou outra olhava para trás e lá estava Katsuki me perseguindo enquanto sorria. A ideia de ser pego pelo grande Katsuki Bakugo, rei dos bárbaros e o maior entre os rebeldes, começava a me parecer mais tentadora conforme o meu próprio sorriso aumentava.

— Nunca vou me render! — Gritei, e por tudo que os regentes cuidam neste reino, como é bom poder gritar. 

[Katsuki Bakugo]

Calculei para onde ele iria virar e com isso já estiquei o braço e o agarrei pela cintura com o braço em gancho. Segurei para que não caísse e o apertei em um abraço contra todos seus protestos que só soavam veementes no volume. Até um recruta como o Eijiro poderia me agredir mais do que ele fazia quando batia em meu braço para que o soltasse. 

— Você não se rendeu, agora vai provar da minha fúria! — Ele ria e implorava, mas não me impediu de limpar minhas duas mãos nas bochechas dele, uma e depois a outra: a mão que não o sujava o estava segurando em meus braços. Não estava suja o suficiente, era pouca água e pouca terra, mas foi o bastante para deixar quatro linhas de marrom claro de cada lado de seu rostinho lindo. 

Era assim que se caçava um dragão, cheguei a pensar, quando literalmente me peguei enchendo-o de beijos no pescoço e no maxilar sem nem me dar conta de que o estava fazendo. Quando me apercebi, contudo, não consegui parar e nem queria.

[Eijiro Kirishima]

Estava rindo mais uma vez sem saber ao certo o motivo exato, e talvez isso tenha me distraído, pois no segundo seguinte fui capturado. Ele preparou uma emboscada, antecipou meus movimentos, e me agarrou pela cintura. Tentei protestar e até me soltar… quer dizer, tentei fingir que queria me soltar, e só podia torcer para que parecesse real o suficiente. Eu tentava implorar mas minha risada me traía, tentava segurar a mão dele mas me recusava a usar minha força, sentimentos e ações muito contraditórios. 

No final, ele conquistou seu objetivo. Deixou as marcas de lama no meu rosto, três ou quatro linhas em cada bochecha, e não mostrou misericórdia ao emendar um ataque implacável de beijinhos onde pudesse alcançar. 

— Retiro o que disse, eu me rendo! Eu me rendo! — Minha voz saiu um pouco tremida, pois por algum motivo, mesmo “completamente” humano, estava ronronando mais uma vez, como isso era possível?

[Katsuki Bakugo]

Ele se render tardiamente não o poupou mais, ele agora teria que enfrentar as consequências. De todo modo, logo eu parei, suspirando, e apenas apoiei meu queixo em seu ombro. No fim, estávamos parados ali, abraçados e eu de novo estava com aquela sensação de relaxamento extremo ainda que sem realmente estar com sono. Era aquela vibração dele que se dissipava para mim, em mim.

Eventualmente, tomei um longo fôlego e separei o abraço. Segurei-o pela mão suja, entrelacei nossos dedos sem poder me importar menos. Iríamos até o rio de novo, não sem antes passar pelo nosso pequeno acampamento e pegar alguns de nossos pertences, tanto de higiene quanto o restante dos limões para tirar o cheiro do peixe de nós - inclusive já levo a carcaça para o próprio rio, lugar correto onde devem ficar peixes mortos. 

[Eijiro Kirishima] 

Minha rendição de nada adiantou. O ataque de carinho continuou e eu enfrentei bravamente minha sentença até que Katsuki se rendesse ao aconchego confortável do nosso abraço. A minha vontade de me aninhar melhor ali era tão forte que beirava ao puro instinto, a sensação de ser acolhido em um abrigo seguro começava a me tomar, e eu me derretia todo naquele amparo. Eras poderiam ter se passado e eu não repararia, tudo o que importava era que ele segurava minha mão por mais que eu protestasse por ela estar suja. 

Dedos entrelaçados, caminhamos de volta para o acampamento sem pressa alguma. Pegamos alguns itens importantes de higiene que trouxemos, como escova e pasta para os dentes. Fuçando na bolsa, percebi que me lembrei de embalar um pouco de aloe para quando a situação do meu cabelo ficasse critica, mas me esqueci de trazer sabão. Para nossa sorte, ainda sobraram limões suficientes para cumprir essa função.

[Katsuki Bakugo]

Eu não consegui trazer comigo sabões e quero resolver isso nos mercados da cidade de Oji Harima, mas tenho uma pasta de ervas e especiarias que é suficiente para limpar bem meus dentes. Se eu planejo ficar enliado com Eijiro por todo tempo possível nessa noite antes de começarmos a correr para não gastar qualquer minuto errado, essa experiência tem que ser completamente agradável para ele. 

Quero poder mordê-lo com dentes perfeitamente desinfetados,  foi um pensamento que me correu à cabeça enquanto eu estava ao lado dele agachado à margem do rio, e cheguei a sacudir de leve minha cabeça. Como era possível alguém gerar tantos sentimentos díspares em mim, tantos pensamentos tolos e tantos outros pensamentos impróprios. Fui até um pouco adiante para não o constranger e para tirar meus olhos dele um pouco nisso tudo - até porque eu precisava esvaziar a bexiga de todo modo. Voltando à margem do rio, contudo, iria vê-lo se lavar devagar, tirar as marcas de terra em seu rosto, limpar sua boca e escovar os dentes, passar limão em suas mãos e se lavar até o cotovelo, sentar à margem e lavar os pés - os quais realmente não tinham nenhum mínimo machucado. Uma placidez que combinava com a noite e eu nunca soube gostar até agora, talvez até hoje. Uma noite quieta sempre só me deixava ansioso, e eu não queria pensar naquilo porque me lembraria das razões. Observando-o eu conseguia me concentrar no agora como um lastro, o gorgolejar do rio, o som da água caindo nas pedras cada vez que ele a movia e o crepitar da fogueira não me pareciam presságios ruins, e traziam o que toda vez me atrevo a chamar de paz, algo que ainda não consegui compreender de verdade, tendo crescido em guerra mesmo fora de qualquer batalha.

[Eijiro Kirishima] 

De volta ao rio, me sentia limpo só de colocar os pés na água. Fiz toda a higiene que precisava ser feita com o mesmo cuidado que teria se estivesse no palácio. Katsuki fez a mesma coisa e eu o assisti o tempo todo, ele atrai o meu olhar, do mesmo jeito que uma luz quente atrai insetinhos, sou incapaz de olhar para qualquer outra coisa ou pessoa que não seja ele... quer dizer, eu me virei de costas quando ele foi se aliviar para não dar uma de intrometido inconveniente, ainda sei como privacidade funciona, mas tirando isso, o que quero dizer é: Tudo o que faz parece belo aos meus olhos, até mesmo o jeito desnecessariamente agressivo com que ele escovava os dentes me fazia sorrir. 

Claro que preferiria tê-lo bem ao meu lado para que eu pudesse atazaná-lo um pouco pelos seus rituais noturnos, mas entendendo que é um momento bem pessoal e que talvez ele não queira companhia. Tudo bem, pelo menos assim, eu poderia ter a alegria de sentir meu coração disparar ao vê-lo se aproximar mais uma vez. 

Sentado à margem do rio, com o cheirinho fresco do limão me cercando, e sentindo o gostinho bom das ervas - principalmente a menta amassada e misturada às outras - posso dizer que estava quase completo. Faltava alguém ao meu lado e já podia acompanhá-lo vindo em minha direção. Eu estava terminando de lavar meus pés, e só quando me levantei, percebi que não peguei minhas botas e eles ficariam sujos de novo… É, eles ficariam, isso se não fosse pelo meu cavaleiro que é um verdadeiro cavalheiro.

[Katsuki Bakugo]

Quando ele terminou de lavar os pés, peguei-o em meus braços para que ele não tornasse a se sujar no caminho de volta. Talvez Eijiro incite nos outros a impressão de que deva se manter incólume de algum modo, ou ele apenas me encha da sensação de que gosto de cuidar dele. De todo modo, era como se ele me presenteasse quando ri encantado assim do que faço.

Estávamos de volta à capa e ao calor da fogueira, onde havia menos mosquitos do que bem à margem do rio. Era uma noite de tempo agradável, apenas algumas nuvens esparsas no céu estrelado, mas, longe do fogo, se mostrava ligeiramente fria. 

Deixei-o sentado na capa e sentei-me ao seu lado, suspirando com a sensação de que estava tudo feito e eu, como um tolo completo, apenas estava nas nuvens com algo tão eminentemente simples.

[Eijiro Kirishima]

Katsuki me pegou no colo sem pestanejar, uma facilidade que nunca falhava em me surpreender e me desarmar. Na posição de uma “noiva”, envolver meus braços em torno do seu pescoço não foi nada além da reação natural a se ter, o sorriso bobo em meus lábios era um bônus. 

Pequenas coisas que contam. Ele não precisava fazer isso, eu não pedi para que fizesse ou dei qualquer indício de que queria, mas ele fez mesmo assim e por isso importa. Simples demonstrações de carinho e atenção que fazem qualquer coração derreter… Não pela primeira vez no dia, me vi pensando em como sou sortudo e não mereço tudo isso. Contudo, não sou de negar as coisas duas vezes, a primeira vez já foi dolorosa o suficiente para que eu nunca mais quisesse repeti-la enquanto respirasse, só a breve lembrança já me fez agarrá-lo mais forte na intenção de garantir que ele não iria evaporar e me largar sentado no chão. Essa insegurança chata foi embora no instante em que voltamos para a nossa capa, e eu senti o calor agradável da fogueira… Sentados lado a lado, como deve ser.

[Katsuki Bakugo]

Por um momento que não sei quanto durou de fato além de minha própria percepção, deixei-me só absorver o máximo de tudo ao meu redor mais uma vez, e acabei não pensando em nada, sentindo-me aquecido, satisfeito, repleto. As chamas embaçaram à minha frente. Deixei o silêncio por aquele momento, mas suspirei assim que recobrei minha atenção, acho que segundos depois, com qualquer mero movimento de Eijiro ao meu lado. Virei o rosto para ele, tão mais brilhante de olhar, e aquela minha percepção da profundidade a qual aquele dia alcançou em mim, me fez querer saber até quanto não era um feitiço que eu mesmo conjurei. Passei a mão atrás do corpo dele e a pousei do outro lado de sua cintura, envolvendo-o com aquele braço. A outra mão apoiou no seu joelho e o aninhei contra mim.

— E aí? — Disse ao lado de sua orelha. — O que achou do seu primeiro dia de liberdade?

[Eijiro Kirishima]

Katsuki distraído era uma visão tão rara quanto preciosa. Sua guarda tão baixa a ponto de perder o foco e sequer notar que eu o observava, traçando o seu perfil em meus pensamentos e guardando essa imagem com muito carinho em um cofre com outros tesouros. Seus ombros estavam caídos, a postura relaxada de quem não carrega mais o mundo nas costas. Um incidente diplomático é um preço bem baixo a se pagar pela oportunidade de vê-lo assim, calmo e tranquilo. Suspirei, sendo tomado pela mesma serenidade, e meus olhos também começaram a perder o foco ao que passei a olhar para a floresta no lado oposto.

Meu corpo estava tão acostumado ao toque dele ao ponto de não esboçar o menor susto quando sua mão envolveu minha cintura. Já era hora, pensei comigo mesmo e sorri. Deixei que me puxasse para mais perto, me aninhando naturalmente em seu abraço. 

— Preciso mesmo responder? — Uma pergunta retórica. Virei um pouco mais meu corpo e deixei minhas duas pernas repousando sobre as dele, meus braços ao redor da sua cintura, e minha cabeça repousando em seu peito, levemente inclinada só para que pudesse ver o seu rosto. Praticamente subi em seu colo — Eu estou no paraíso, Katsuki. Foi melhor do que qualquer sonho que eu pudesse ter, até falar que é perfeito parece pouco. — Dei um leve beijinho no seu queixo — O festival que me desculpe, mas esse foi com certeza o melhor dia da minha vida. — mais um beijinho, dessa vez em sua bochecha — E você, o que achou? Já quer me devolver? — brinquei com ele e no lugar de outro beijo, dei uma mordidinha.

[Katsuki Bakugo]

A brincadeira de que eu o devolveria me ofendeu naquele momento, mas a mordidinha que ele deixou em mim desfez minha vontade de dar um tapa na parte de trás da cabeça dele. Também ele estava tão aninhado contra mim que não ia tirar as mãos de suas costas por menos do que algum motivo muito eminente. 

A resposta era inicialmente óbvia. Simples, quase já cuspi logo um “o que você acha? É claro que eu gostei, tonto, e nunca mais me fala merda de te devolver”, mas aquilo acabou não saindo. Tinha alguma coisa, alguma coisa que eu queria falar, que esteve nas entrelinhas de todo esse dia tão poético, que se entrevia como um brilho no canto dos meus olhos me fazendo cogitar se não estava sonhando. Foi o que me fez perder o fio da meada olhando para ele mil vezes nesse mesmo dia, e o que me deixava olhar para o nada até meus olhos embaçarem tanto que pareço estar debaixo d’água mesmo suspirando. 

Ao invés de dizer qualquer coisa como reação, puxei-o para meu colo, aninhando-o sentado no espaço entre minhas pernas cruzadas.

— Achei que foi a merda da melhor decisão que eu já tomei. O tempo todo eu estava tentando agradar meus superiores para reconhecerem que eu sou o melhor e eu poder ter tudo o que eu quisesse. — Ali, tão perto dele, eu não precisava falar alto, mas falei de todo modo sem notar. Então dei uma risada e não me deixei continuar rindo, ou eu teria mais uma crise, uma avalanche de risos, porque era satírico, era tão patético que só podia ser hilário. — E, porra, tem uma ironia ridícula disso. O que eu sinto é que me livrando de tudo isso foi bem quando eu encontrei o que eu queria de verdade. Já me arrisquei tanto mais pelo que nem era meu…

Baixei a voz e naquele momento eu estava mais vulnerável que um filhote. Estava de peito aberto e, de repente, minha garganta trancou. Cheguei a sentir meu rosto queimar, mas eu não conseguiria falar mais nada nem se eu tentasse, nem se fosse para arrancar qualquer palavrão ou sarro que me servisse de escudo agora.

[Eijiro Kirishima]

Ao me puxar para o seu colo e me abraçar apertado, ele já me dizia mais do que qualquer fala poderia expressar. E no aconchego dos seus braços, minha pergunta foi respondida por mais que eu já soubesse a resposta. Estava tocado, sem reação, sentindo meu coração flutuar no peito, um nó em minha garganta, formado pelas palavras que queria dizer, o impedia de fugir e alcançar os céus. Nunca tive medo de expressar meus sentimentos, ainda mais sentimentos tão fortes, me sentia amado de uma forma que nunca senti antes, e sabia que o amava na mesma intensidade ou até mais levando em conta como costumo exagerar em tudo… Mas não podia dizer isso. Lá no palácio, Katsuki me pediu que não o fizesse em promessas vãs. Pelo menos não com as três palavrinhas mágicas “eu te amo”, o que não chega a ser um problema pois o dia de hoje foi uma enorme aula de como dizê-las de outras formas. Katsuki estava fazendo isso nesse exato momento. 

Com uma mão espalmada em seu peito, não só o ouvia rir, como também sentia. Eu o entendia, uma conexão inexplicável em que eu conseguia ler nas entrelinhas. Notar suas intenções no tom da sua voz, frases incompletas ou deixadas em aberto, que se tornavam completas aos serem ditas baixinho. Seu rosto queimava sem ser pelo fogo próximo a nós, achei que estava na obrigação de tocá-lo então o fiz. Gentilmente subi minha mão até sua bochecha, além de corada estava quentinha e isso me aqueceu mais do que qualquer fogueira. 

Katsuki era um homem de ações, não de palavras, e vê-lo tão exposto diante de mim, me dava todo um senso de responsabilidade, maior até do que quando tinha uma coroa em minha cabeça. De peito aberto à minha frente, tenho o dever de zelar e cuidar desse coração como o tesouro que ele é. Nada tão delicado e precioso deve cair em mãos erradas, nas mãos de quem não sabe valorizar a raridade que segura. Eu daria qualquer coisa para manter esse coração assim, inteiro. 

— Sou seu, só seu. — falei sério, mas meu tom suave. Uma reafirmação do óbvio que precisava ser dita — E por isso, vai ter que me aguentar para sempre.

[Katsuki Bakugo]

Meu coração acelerado estava contra o corpo dele, meu rosto corado contra a mão dele, eu era indefeso, exposto, suscetível, destrutível. Eu estava no meu mais frágil, sabia o quanto iria doer feito o inferno se eu fosse ferido agora, e ainda assim me sentia acolhido em todas essas falhas. Ainda assim eu me deixava tocar onde fosse, ver o que visse, penetrar em todos meus poros. Se eu fosse muito arrogante chamaria isso de coragem. 

Porra, eu sou arrogante. Só que se chamar isso de coragem vou também presumir que esta se acabou com a frase dele. Era só demais, muito, transbordando, enchendo meu ser até a garganta e a trancando até de som. Soltei o ar devagar mas ainda não consegui falar. Que experiência horrendamente maravilhosa. Para alguém que aprendeu a se defender e ainda se lembra da dor da última flechada, o suplício estava em controlar cada músculo para não erguer o escudo por reflexo.

Acreditei, porque não sei não ser por inteiro e com tudo que tenho. E nem quero. Eijiro tinha um conforto que eu só queria aceitar, e se era meu, seria de vez. Deixei meus braços envolverem seu torso e nisso pude pousar meus olhos em outro lugar, adiante, seu rosto desfocando. Suspirei até que o fechei em meu abraço. Meus lábios tocaram a curva de seu pescoço e cerrei minhas pálpebras. Ali fiquei pelo que precisei e Eijiro não me soltou.

[Eijiro Kirishima] 

Seus braços me envolveram finalmente, e ele me apertava mais do que parecia se dar conta. Não reclamaria, nunca. Olhava em seus olhos e o via perdido, ele não me enxergava mais. Katsuki tinha um ar  diferente quando eu saía do seu foco, como se uma tormenta se escondesse no vermelho das suas irises. Agora era ele quem precisava de abrigo…

Com o rosto escondido contra o meu pescoço, sentia seus lábios e sua respiração contra minha pele. Katsuki também estava em meus braços. Ficamos assim pelo tempo que foi necessário, sem falar nada além do carinho sutil que fazia em seus cabelos. Imóvel, não queria incomodá-lo e dar a entender que estava tentando afastá-lo, por isso, esperei até que ele desse algum sinal antes de ousar fazer qualquer coisa. Comecei com beijinhos delicados no seu ombro, que vagarosamente subiram até seu rosto como podia. Afastei-me só quando ele fez menção de levantar sua cabeça, parecia confuso com o que estava acontecendo e por isso eu sorri. Voltei a beijar seu rosto, suas bochechas, maçãs do rosto, até finalizar com um beijinho um pouco mais demorado em sua testa.

[Katsuki Bakugo]

Deixei que meus olhos se fechassem e que ele constelasse meu rosto com beijos. Deixei que ele me aninhasse mesmo quando era ele em meus braços e a sensação era maravilhosa, mas demais para mim. O delicado caminho de seus beijos purificando minha pele deixavam um rastro que queimava e acabei segurando suas mãos, um pouco mais de súbito do que pretendi. Ergui meu olhar para ele, seu desenho turvo assim de tão perto, e a ponta do meu nariz roçou em seus lábios que acabaram de deixar um último beijo em minha testa. Procurei-os com os meus sem precisar ou poder pensar em nada disso. O lábio superior dele encaixou entre os meus, e guiei suas mãos com as minhas para que ele colocasse os braços sobre meus ombros. Meu corpo estava rígido, um pouco tenso, sei que meus movimentos eram mais bruscos do que o necessário, não havia pressa nenhuma. Só que eu era menos do que um recruta nesse tipo de batalha, tentando escolher em um arsenal de sentimentos o que fazer com cada um eles. 

Deixei-nos beijar como desse, suave mas permitindo uma doce languidez. Eu não queria, não podia ser frágil perante Eijiro, mas ele era a quem menos me doía mostrar-me patético, mesmo quando era quem eu menos queria que me visse assim. Eu queria mostrar a ele que ainda sou poderoso e que sempre serei implacável, ao mesmo tempo em que me sinto um imbecil bufão por ainda achar que preciso. Eijiro, a bagunça que você faz comigo é inominável e eu não reconheço o Katsuki que te beija assim, mas me sinto cada vez mais perto inclusive de mim mesmo, por mais que exista uma floresta inteira de espinhos para arrancar ainda.

A verdade é que eu me acendo em todos meus impulsos com você, em tudo o que há de visceral em mim e ficou calado por tanto tempo, e eu só quero te beijar cada vez mais, salvar-me e entorpecer-me cada vez mais. Não quero mais ter medo disso, medo do que há em mim e vejo cada vez mais claro. 

Deitei-o na capa. Veja, é claro que posso ser delicado, eu não me criei um maldito perdedor assustado de seu espelho. Nós prometemos juntos que nos encontraríamos, que consumaríamos isso do nosso jeito, que jogaríamos na fornalha tudo que não foi de nosso controle, tudo a que nos submeteram, tudo que não é nosso. Porque nós queremos, aqui fora, onde tudo é apenas de nós dois. Enquanto ele fosse comigo, para todos os efeitos, eu cuidaria dele. Não quero mais hesitar, e nesse desejo é ele o único que me move e deve ser o único que me para.

[Eijiro Kirishima]

Repentino sem ser brusco, apenas súbito e até mesmo com certa gentileza, Katsuki segurou minhas mãos, e levantou seu rosto para que seus olhos se encontrassem com os meus, o vermelho sempre ardente parecia queimar mais intenso do que o normal. Nossa paz começava a ser tomada por um inquietude que ficou latente durante todo o dia, tão íntima e pessoal que não poderia ser presenciada pela pureza do sol… Expostos como estamos, acabaríamos nos queimando em todos os sentidos. E hoje, agora para ser mais exato, a única coisa que quero sentir arder em minha pele, é o toque das mãos dele, guiando as minhas para que meus braços fiquem em torno do seu pescoço. 

Naquele beijo me rendi por completo. Meu corpo derretia em seus braços tensos, e só não chegava a se desfazer pois suas mãos me mantinham inteiro com certa firmeza. Katsuki tem um poder imenso sobre mim em suas mãos, toda vez que me beija é uma reafirmação de que sim, eu seria capaz de fazer absolutamente qualquer coisa por ele, pois só ele, e eu repito, só ele, é capaz de fazer com que eu me sinta especial, com que eu me sinta eu mesmo. Pela primeira vez pude experienciar o que é ser um indivíduo, um ser humano singular e livre. Destituído de meu título, depois de abandonar meu sobrenome, minha história e meu passado, no primeiro dia em que me transformei em um ninguém, nada além de um menino se aventurando em uma floresta e tomando um banho de rio, foi a primeira vez que me senti importante de verdade. Tudo porque ele me beijava desse jeito, me beijava como se não existisse nada no mundo além de mim… Um sentimento que posso entender muito bem, pois no  meu mundo, do inicio ao fim, não existe nada além dele, meu tesouro inestimável.

Sutil ao ponto de eu mal ter notado o que aconteceu, Katsuki me deitou na capa e se posicionou sobre mim. O aceitei e o acolhi, pertencemos um ao outro e esse é o seu lugar de direito. Minhas mãos se embrenharam em seus cabelos, apenas um carinho sutil que seguia o nosso ritmo, um cuidado instintivo e tão natural quanto a sua transformação em algo mais visceral. De repente, tudo parecia quente demais, um calor sufocante que tornava ainda mais difícil a simples tarefa de respirar e fazia com que meu coração disparasse e tropeçasse em algumas batidas, esse calor se espalhava de dentro para fora, e eu me agarrava a Katsuki como se ele pudesse fazer algo a respeito da necessidade que começava a enevoar minha mente. 

Assim como na nossa última noite no palácio, o desejava com tudo o que tinha. O final perfeito para um dia perfeito, que eu não podia permitir que fosse destruído só porque estou deixando o que tenho entre as pernas assumir o controle de minhas ações. Essa noite era nossa, sem necessidade de nos culparmos depois, e nem de nos apressarmos pois nosso tempo juntos é limitado, não queria que minha avidez tirasse esse momento especial de nós dois. 

— Katsuki… — Relutante, segurei os ombros dele e o afastei apenas o suficiente para que seus lábios não estivessem contra os meus — -tsuki, espera… — Ele beijava meu pescoço, e com os olhos fechados eu sabia que cederia se ele continuasse — eu… é melhor nós… Vamos com calma. — Minha situação não estava lá melhorando muito, e definitivamente não se resolveria com ele ainda sobre mim, então tomei a decisão mais dolorosa da minha vida e, com toda a gentileza que pude reunir, o tirei de cima para que ficasse ao meu lado, e me virei de costas. Só então notei como já estava perdido, meu rosto ardia, corado por todas as razões possíveis, desde desejo até um pouquinho de vergonha, essa que só piorou quando puxei minha camisa para baixo, a segurando firme na intenção de esconder o volume da minha ereção. 

Respire, Eijiro, está tudo bem, já vai passar e o Katsuki nem notou… Quer dizer, espero que não tenha notado.

[Katsuki Bakugo]

Tudo estava muito nítido para mim, como se só existisse Eijiro em meu foco. Tê-lo comigo perfeitamente, sem nenhuma restrição, para o que fosse bobo como o jeito que nós brincamos há momentos antes, mas também para o extremo oposto da inocência. Não me atentei quando fiquei tão inebriado em seu cheiro, entorpecido com o gosto de sua pele sob minha língua e com cada músculo sob meu toque. Estava cada vez mais vertiginosamente mergulhando nas sensações, em cada nuance do significado de meu, mas por mais alterado que eu estivesse, por mais que os estímulos fossem todos deliciosos, eu ouvi com muita clareza quando ele me pediu para ir com calma, e foi por isso que meu corpo estava frouxo o suficiente para que ele me tirasse de cima de seu.

Fiquei parado, deitado de lado e apoiado em um cotovelo, cada uma de minhas respirações audível, minha razão se dando ao trabalho agora de avaliar o que fiz quando ela tinha se abstido de fazê-lo desde que nossos lábios se encontraram até aquele momento em que agora ele me dava as costas. Eu o estive abraçando por necessidade, eu o beijei por vontade e uma pitada de desespero, e rápido como eu mesmo escorreguei minha boca na pele dele, vi que despertei aquilo nele de novo. Desejo, fazendo-o se retesar por completo ao notar que tinha ficado ereto com meus beijos e meu toque, a prova de que eu o deixo tão fora de si quanto ele a mim. Diante de mim após me afastar ele se virou como se eu não tivesse enxergado, e como se não fosse perceber contra meus quadris mesmo caso não o tivesse visto, só pela posição em que ele estava no minuto anterior contra mim.

E eu sorri, porque ficou claro quando eu o beijei e está claro de novo. Maldito, ele era mesmo delicioso, lá estava, de novo, cada resquício de pecado no mesmo formato adorável do rapaz por quem eu sentia toda gama de sentimentos gentis, nojentamente gentis. E se fosse por mim, viveria dessa maldita gentileza, mas quero saber o que o está segurando. O que o perturba, por que o que é bom de repente não é mais, e se é pelo mesmo motivo que eu também hesito. Eu não o quero com medo como eu estava, patético, vivendo na tormenta de uma experiência que nos foi cruel dentro de cada uma de suas sensações prazerosas. E sim, é mais fácil decidir do que fazer, mas desde quando me contentei com o que é fácil?

Apoiei-me para frente e juntei meu corpo ao dele, meu peito em suas escápulas, minha barriga em suas costas, e foi quando me encaixei até meus quadris que eu tranquei minha respiração por um momento. Era muito estímulo, meu rosto contra uma cascata de fios de cabelo rubro. A ponta de meu nariz acariciou-os e deixei um pequeno beijo na concha de sua orelha. 

Devagar, Katsuki, devagar.

— O que foi, dragãozinho? — Sussurrei logo ali, como se fosse - e é - parte do nosso segredo, de todas as coisas que são só nossas agora. Não mordi, não mordisquei, não arfei, não rosnei, mas acho que havia um tom muito peculiar no rouco da minha voz agora. Meu coração ribombava em minha garganta. — Se você não quiser que continuemos, é só me falar… mas nós estamos aqui juntos agora, só nós… Eu evitei durante o dia de hoje para não te desrespeitar, mas não precisa ser desrespeito, não é? Eu te desejo, você me deseja, e, se você quiser, vai ser como eu te prometi. Eu vou cuidar direitinho de você.

 



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